Até que ponto podemos extrapolar estudos com modelos animais para a espécie humana?
Biologia
01/02/2013
Para entendermos e estudarmos melhor doenças que afetam o ser humano devemos realizar experimentos em modelos animais por questões éticas, culturais e até mesmo emocionais. Entretanto, até que ponto podemos extrapolar estudos com modelos animais para solucionarmos os mistérios da espécie humana? Sabemos que as diferenças entre as espécies existem, o que por vezes causa problemas em experimentos.
Várias doenças são comuns a grupos de mamíferos, como Alzheimer ou AIDS em humanos e chimpanzés. No entanto, a sintomatologia é bastante variada (como os chimpanzés não sofrerem com o vírus da AIDS, p. ex.), mesmo em espécies proximamente relacionadas, como o caso citado.
O estilo de vida moderno da espécie humana (bastante distinto do primitivo) pode relevar novas susceptibilidades a doenças que até então não eram existentes. Entretanto, algumas diferenças biomédicas de humanos e outros mamíferos não podem ser completamente explicadas pelo estilo de vida {2}. Doenças genéticas podem ocorrer como um derivado de uma adaptação de uma grande vantagem seletiva. Ex: Esquizofrenia (específica de humanos) e Alzheimer (maior susceptibilidade em humanos) podem ser um derivado da função cognitiva superior da espécie. Genes que foram sujeitos à evolução adaptativa desde a divergência de humanos e outros primatas podem estar envolvidos nessa variação de fenótipos e ser chave no entendimento do estado da doença.
Além disso, a genômica comparativa molecular pode oferecer meios de correlacionar diferenças moleculares com os fenótipos das doenças em diferentes espécies, além de esclarecer genes e vias causadoras de doenças. A nível molecular, existem algumas principais mudanças que contribuíram para a diferença de espécies que foram e ainda estão sendo estudadas: - Presença/ausência de genes em diferentes espécies; - Substituições nucleotídicas que podem causar mudanças funcionais; - Variação nos níveis de expressão gênica. A seleção positiva pode ser estudada pelo segundo ponto.
Essa análise pode determinar quais mudanças nucleotídicas contribuem para diferenças biológicas entre espécies. Ela parte da premissa de que a ação da pressão de seleção positiva em genes ortólogos (regiões gênicas equivalentes em várias espécies) durante a evolução é geralmente associada com sub ou neofuncionalização de genes {3}. Determinar esses genes na linhagem humana é um modo racional e promissor de revelar as mudanças moleculares implicadas em doenças específicas de humanos. Genes com seleção positiva tendem a interagir com eles próprios, o que pode significar um mecanismo de co-evolução dos mesmos {1}.
O entendimento da história evolucionária de genes relacionados a doenças são significantemente importantes para a escolha de modelos animais no processo de produção de medicamentos {4} e para um melhor entendimento de diferenças fisiológicas entre as espécies.
Dentro de todo esse contexto, eu me questiono: será mesmo tão alto o preço que devemos pagar por possuir um Sistema Nervoso mais desenvolvido que outros animais a ponto de se tornar por vezes uma desvantagem evolutiva por desencadear uma série de doenças que em primórdios não existiam? Várias doenças exclusivas de seres humanos levam à morte ou simplesmente à incapacidade reprodutiva por muitos fatores. Características primordiais positivamente selecionadas no início de nossa linhagem é agora uma pressão negativa. Até onde iremos a nosso "desenvolvimento" evolutivo?
Referências: {1} Vamathevan, JJ et al. 2008. The role of positive selection in determining the molecular cause of the species differences in disease. BMC Evolutionary Biology 8:273. {2} Varki, A, Altheide, K. 2005. Comparing the human and chimpanzee genomes: searching for needles in a haystack. Genome Res. 15(12):1746-1758. {3} Yang, Z. 2005. The power of phylogenetic comparison in revealing protein function. PNAS 102(9):3179-3180. {4} Searls, DB. 2003. Pharmacophylogenomics: Genes, Evolution and Drug targets. Nature Rev Drug Discovery 2(8):613.
Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.
por Fernanda Rodrigues Soares
Bacharel em Ciências Biológicas com Habilitação em Genética e Biotecnologia pela UFAM (2010), Mestre em Genética pela UFMG (2012) e Especialista em Farmacologia pela UCDB - Campo Grande, MS. Atualmente é aluna de Doutorado (Genética) da UFMG e de Especialização em Farmacogenética Clínica pela Universidad de Extremadura (UNEX - Espanha).
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