Instituições médicas e Estado têm responsabilidade por sangue contaminado

A AIDS é uma doença que aflige uma multidão de pessoas
A AIDS é uma doença que aflige uma multidão de pessoas

Direito

01/12/2011

Monografia:

DA RESPONSABILIDADE CIVIL DAS INSTITUIÇÕES MÉDICAS E DO ESTADO POR SANGUE CONTAMINADO PELO VÍRUS HIV

 

INTRODUÇÃO

O presente trabalho versa sobre um assunto de grande relevância tanto por figurar no campo jurídico como no social. A AIDS é uma doença que aflige uma multidão de pessoas e sem dúvida é um tema palpitante para estudiosos das mais variadas áreas de estudo, dentre as quais os estudiosos das ciências humanas do Direito.

 

O tema em lume abarca além de uma apresentação da doença em si, sua consequência no mundo jurídico, eis que levanta a questão de uma contaminação pela doença decorrente de transfusão sanguínea. Assim, abrange a análise do instituto da responsabilidade civil como agente norteador da estipulação da indenização, para fins de tornar o paciente contaminado em tais circunstâncias ao estado anterior.

 

Os objetivos do presente trabalho são demonstrar qual a forma de responsabilidade imputada ao Estado, enquanto ente de direito público responsável pela fiscalização das entidades que lidam com o sangue, bem como das próprias entidades que ao efetuar o procedimento de transfusão sanguínea em um paciente que dela necessite acaba por injetar-lhe um sangue que padece de qualidade.

 

Para fins de obter êxito nesta monografia foi necessário um árduo trabalho de pesquisa nas mais variadas fontes, quais sejam, livros jurídicos, denominados pela comunidade jurista de doutrina, além de verificação da jurisprudência pátria para aclarar o posicionamento dos tribunais de nosso país a respeito da questão. Utilizou-se ainda de ferramenta elementar nos dias atuais, a internet, como instrumento de alcance do entendimento científico da doença objeto do estudo.

 

Interessante salientar que o tema da monografia em deslinde abrange além da ciência humana, eis que aborda a responsabilidade civil, a ciência biológica, haja vista que traça as características da AIDS, asseverando sobre as formas de contágio da mesma, bem como as consequências da presença do vírus HIV no organismo humano.

 

Outra questão a se considerar é que a presente monografia, além de buscar como fonte os ensinamentos biológicos e jurídicos em si, utiliza-se de uma área ainda pouco divulgada no mundo acadêmico, que é o Biodireito, que visa justamente estreitar, por assim dizer, o liame entre a ciência biológica e o Direito. Destarte, para fins de diagnosticar a problemática da responsabilidade civil em casos de transfusão de sangue contaminado com HIV foi necessário um olhar acurado para essa disciplina que desponta no atual cenário jurídico, que é o Biodireito. Logo, o tema do presente trabalho pode ser considerado multidisciplinar.  

 

Considerando o fato de que foram utilizadas, com predominância, as fontes escritas, ou seja, literatura jurídica e biológica para êxito no trabalho depreende-se que, em sede de metodologia, o objetivo do trabalho em epígrafe é a análise de conteúdo, tendo como método de estudo utilizado quanto à coleta de dados a revisão bibliográfica.

 

Consoante aduzido alhures foi verificado ainda o posicionamento das Cortes brasileiras a respeito de pedidos de indenização em razão de contaminações com HIV nos termos do trabalho, o que revela ainda que a coleta de dados também utilizou-se da análise documental, levando-se em consideração que a decisão proferida por órgão julgador de segunda instância, denominada acórdão, apresenta-se como um documento.

 

No que tange à forma de conhecimento empregada nesta monografia, deve-se salientar que houve acatamento do conhecimento científico em detrimento do empírico para fins de uma fiel apreensão das características da AIDS e principalmente para não dar margem a qualquer forma de posicionamento tendente a encarar o portador do vírus HIV de forma preconceituosa. Buscou-se desmistificar o arcaico pensamento de que a doença acomete pessoas pervertidas dando-se ênfase às mais variadas formas de contaminação com a doença, sendo de suma importância, para tanto, uma base científica. Portanto, a forma de conhecimento adotada foi a científica para prestigiar uma abordagem escorreita e sedimentada em estudos sérios, afastando, via de consequência, eventual posicionamento do senso comum que poderia prejudicar a veracidade das questões ventiladas.

 

Importa ainda reverberar que quanto à participação da elaboradora da presente monografia, o trabalho vertente atende às características de empírico-analítica, haja vista que, conforme explanado outrora, para não eivar esta monografia com qualquer posicionamento passível de ventilações de senso comum, não houve uma apreciação pessoal quanto ao tema proposto, mas uma verdadeira análise bibliográfica e documental.

 

Quanto a divisão dos capítulos da monografia pode-se observar que houve um enfoque do geral para o específico, ou seja, buscou-se primeiramente explanar o grande tema responsabilidade civil, para tão somente em seu derradeiro capítulo abordar a responsabilidade civil como forma de ressarcimento de pacientes que se contaminam em procedimentos de transfusão de sangue.

 

A par do acima ventilado, tem-se que o primeiro capítulo trata da responsabilidade, estabelecendo questões fundamentais desta, desde seus aspectos históricos, conceito, previsão legal no Código Civil hodierno e pressupostos. Destarte, primeiramente fez-se necessário um aprofundamento a respeito do instituto da responsabilidade, para não restar, no transcorrer do trabalho, qualquer dúvida quanto a sua aplicabilidade no ordenamento jurídico pátrio.

 

Em segundo momento, tendo sido superada a fase de exposição de aspectos históricos e evolução da responsabilidade, parte-se para uma minuciosa apreciação das peculiaridades deste instituto civil, onde restam apresentadas as modalidades da responsabilidade civil. Note-se que neste momento do trabalho, são abordadas as diversas espécies desse instituto civil, dentre as quais estão: responsabilidade objetiva e subjetiva; de fim e de meio e, por fim, a modalidade contratual e extracontratual.

 

O último capítulo da monografia vertente versa sobre o próprio tema da mesma, sendo assim, aborda questões atinentes às instituições médicas, o vírus da AIDS, o procedimento adotado em uma transfusão de sangue, o tipo de responsabilidade imputada aos agentes causadores do dano à vítima contaminada e o dano, abrangendo tanto o dano material como o dano moral.

 

Insta salientar que foram utilizadas leis concernentes à política do sangue para embasar o derradeiro capítulo, tudo de forma a sedimentar ao máximo e tornar o mais verossímil possível as considerações tecidas no corpo deste trabalho.

 

Digno de nota que o entendimento jurisprudencial igualmente foi levado em conta ao se traçar a responsabilidade civil das instituições médicas e do Estado em transfusões sanguíneas desastrosas (em razão de contaminação com HIV) eis que um trabalho deve primar além do posicionamento doutrinário, pela apreciação de casos concretos, para demonstrar de forma fidedigna o posicionamento defendido em seu bojo.

 

Na esteira das exposições declinadas, resta patente que o presente trabalho visa aclarar com fidelidade a posição do ordenamento pátrio no que tange às questões sanguíneas, fundamentando toda a posição exarada na consonância de entendimentos idôneos e de reconhecimento no campo jurídico.

1 RESPONSABILIDADE CIVIL
A responsabilidade civil nem sempre teve o formato que é conhecido atualmente. Muitas transformações ocorreram no referido instituto até chegar à configuração trazida no Código Civil hodierno.

A fim de aclarar acerca do nascimento e desenvolvimento deste importante instituto de reparação de danos apresenta-se o capítulo em deslinde, em que serão delineados os pontos iniciais da responsabilidade civil, como seu histórico, conceito, previsão legal no Código Civil de 2.002 e pressupostos.

1.1 ASPECTOS HISTÓRICOS
Para uma acurada análise do tema em lume, faz-se mister uma profunda reflexão sobre a origem do referido instituto.

No Direito não há que se cogitar uma fiel ponderação sobre dado tema, mormente no que tange a sua gênese, sem delinear seu entorno no Direito Romano. Sendo assim, nada mais salutar que trazer à baila a nascença romana do instituto em apreço, traçando, por conseguinte, seus contornos sob a égide das legislações subsequentes à “lei-berço” da responsabilidade civil.

É uníssono na doutrina que o gérmen da “responsabilidade civil” data de tempos remotos; contudo, foi na lei aquiliana que reluziram os traços mais acentuados desta tal como se conhece hodiernamente.

Antes, no entanto, de adentrar na seara da lex aquilia, oportuno o deslinde de toda a cadeia evolutiva da questão das obrigações no direito romano, o que se fará doravante.

Apresentar a Obrigação para o entendimento da responsabilidade civil não é entrar em questão estranha ao tema, pelo contrário, é buscar as raízes desta, posto que, uma e outra têm incontestável ligação.

Para tanto, é de grande relevância apresentar o entendimento da doutrina pátria no que tange à interligação entre a responsabilidade civil e a obrigação.

Silvio Venosa assevera que “O estudo da responsabilidade civil é parte integrante do direito das obrigações, sendo a reparação dos danos algo sucessivo à transgressão de uma obrigação, dever jurídico ou direito”.

Carlos Roberto Gonçalves em sua lição a respeito desse liame entre obrigação e responsabilidade civil preceitua que “A responsabilidade é, pois, a consequência jurídica patrimonial do descumprimento da relação obrigacional”.

A fim de dirimir eventual dúvida que remanesça a respeito da ampla ligação entre a obrigação e a responsabilidade, insta trazer à colação o ensinamento de Cavalieri.

Obrigação é sempre um dever jurídico originário; responsabilidade é um dever jurídico sucessivo, consequente à violação do primeiro. Se alguém se compromete a prestar serviços profissionais a outrem, assume uma obrigação, um dever jurídico originário. Se não cumprir a obrigação (deixar de prestar os serviços), violará o dever jurídico originário, surgindo daí a responsabilidade, o dever de compor o prejuízo causado pelo não cumprimento da obrigação. Em síntese, em toda obrigação há um dever jurídico originário, enquanto que na responsabilidade há um dever jurídico sucessivo.

Da leitura das lições acima colacionadas, tem-se nítida a idéia de que, em regra, é da supressão de uma obrigação que surge a responsabilidade, motivo pelo qual resta incontroversa a necessidade de um entendimento sobre obrigação.

O primeiro passo para se iniciar a análise de determinado elemento jurídico é a apresentação de seu conceito, para que haja uma fiel delimitação do mesmo e, por conseguinte, haja um melhor entendimento deste.

Conforme exposto alhures, o Direito hodierno, apesar de ter passado por transformações no decorrer do tempo, deve sua “formatação-base” ao Direito Romano, onde restaram nascidos muitos dos institutos que são conhecidos na atualidade.

Com a obrigação não foi diferente, tendo sido preocupação corrente desde a era dos jurisconsultos romanos, sendo apresentada sua conceituação tanto na compilação de Justiniano, ao citar Florentino, quanto no Digesto, que traz a definição de Paulo.

Os estudiosos da atualidade igualmente preocuparam-se em conceituar a obrigação, sendo possível extrair excelente definição da mesma da obra que versa sobre o Direito Romano, a qual se transcreve:
 
A palavra obligatio – obrigado – envolve a idéia de laço, liame, nexo, que provém do elemento ligatio, ligação, de ligare, unir, atar, ligar. [...] Obrigação, etimologicamente falando, é palavra que reflete numa situação primitiva de enlaçamento, situação que passará para o campo jurídico, no qual se conservarão traços daquele antigo estado.[5] (Itálico do autor)
 
Superada a questão da definição, passa-se à exposição das diferentes formas de surgimento das obrigações.

No direito romano, eram quatro as formas de nascença das obrigações, sendo elas as obrigações que nasciam dos contratos, dos quase-contratos, dos delitos e dos quase-delitos.

Como o capítulo em tela visa apresentar o histórico da responsabilidade civil e, o apogeu desta encontra-se na edição da lex aquilia (que em breve será devidamente explanada); considerando ainda o fato de que a lei aquiliana versa sobre a responsabilidade civil decorrente da prática de um delito, a questão das obrigações nascidas dos contratos, quase contratos e quase delitos não guarda muita relevância para o presente trabalho, motivo pelo qual a abordagem ater-se-á ao estudo das obrigações nascidas da prática de delito. Urge, no entanto, salientar que isto não significa que em capítulo próprio não haja explanação da responsabilidade contratual que, por óbvio será devidamente apresentada.

A doutrina afeta ao Direito Romano aborda a questão da obrigação decorrente do delito nos seguintes termos:
[...] o delictum é um ato antijurídico do homem, prejudicial a outrem e punível.
[...] O delictum, falta, crime, transgressão (de deliquo, delinquis, deliqui, delictum, deliquere), antes de fixar-se no campo penal ou civil, caracteriza-se por traços inconfundíveis de ilicitude, de prejudicialidade. Ato humano, ilícito, danoso. Imputável a quem lhe deu origem, tem como consequências concretas, no campo penal, sanções de ordem corporal (restrições à liberdade) e, no campo civil, sanções de ordem indenizatória (soma em dinheiro, paga pelo autor do dano à vítima, como compensação aos prejuízos causados).
 
Como se depreende do conceito supramencionado, o delito é tido como algo maléfico, portanto, digno de reprimenda.  Destarte, a sociedade romana tinha na vingança privada forma incipiente, porém compreensível, de punir o mal sofrido.

Sobre o tema leciona com brilhantismo Gonçalves:
Nos primórdios da humanidade, entretanto, não se cogitava do fator culpa. O dano provocava a reação imediata, instintiva e brutal do ofendido. Não havia regras nem limitações. Não imperava, ainda, o direito. Dominava, então, a vingança privada.Dos ensinamentos acima ventilados tem-se a acepção da primeira fase dos delitos privados em Roma. Neste momento, a sociedade romana busca retribuir o mal pelo mal, sem qualquer método ou sistematização. É o momento da chamada vingança privada não regulamentada.

Importante salientar que boa parte da doutrina comunga do pensamento trazido na obra de Cretella Júnior, onde se coloca a vingança privada como o gérmen da responsabilização do indivíduo causador do dano. Todavia, existe outro posicionamento encontrado nas obras jurídicas a respeito do tema em que se entende que antes desta forma de vingança houve uma espécie de reação conjunta contra o agente lesionante.

O posicionamento defendido por Maria Helena Diniz, por exemplo, diversamente do lecionado por Cretella Júnior, sustenta que a vingança privada não foi o início do sistema de delitos privados.

A obra da insigne doutrinadora revela um entendimento pautado em uma fase anterior, em que dominava a vingança coletiva, marcada pela reação conjunta do grupo em face do agressor pela ofensa a um dos seus integrantes.

Na consonância da sistematização de Cretella Júnior, prosseguindo na análise da marcha evolutiva da “expectativa” de reparação dos danos decorrentes de delitos, verifica-se que subsequentemente à vingança privada não regulamentada tem-se a pena do talião, que se afigura ancorada na fase da vingança privada regulamentada.

Apesar de seu caráter cruel, a pena de talião significou grande avanço no tocante à delineação da reparação de danos e esta importância conferida à dita pena encontra-se devidamente disciplinada pela doutrina pátria.

Confira-se:
Embora a nossos olhos a pena de talião se afigure brutal, significa, no entanto, um grande progresso na história do direito. Na fase anterior, em face do delito praticado por uma pessoa, pagava não só ele (às vezes nem ele), como outros de sua família. Com o talião o castigo alcança o autor do delito e a idéia de proporção entre a ofensa e o castigo se vai esboçando, afirmando-se cada vez mais.

Ainda na conformidade da sistematização traçada por Cretella Júnior, posteriormente à vingança privada não regulamentada e à vingança privada regulamentada, surgiram as composições voluntárias e legais.

Na primeira, a vítima deve renunciar ao direito de vingança, para tão somente então, mediante um resgate pecuniário, ver satisfeito seu desiderato, consubstanciado na reparação do dano sofrido.

No que concerne à composição legal, a vítima recebe um valor já determinado, ou seja, anteriormente estipulado, tendo que contentar-se com o quantum arbitrado, eis que este é padronizado.

Somente com a edição da Lex Aquilia, houve o marco na evolução histórica da responsabilidade eis que “[...] veio a cristalizar a idéia de reparação pecuniária do dano, impondo que o patrimônio do lesante suportasse os ônus da reparação [...], esboçando-se a noção de culpa como fundamento da responsabilidade civil [...]”.

A doutrina é vultosa em apresentar a lei aquiliana como a “menina dos olhos” da responsabilidade civil. E não é para menos, porquanto, como foi explanado alhures, as maneiras utilizadas anteriormente à lei em tela para obrigar o agente causador do dano a reparar o mal causado eram demasiadamente instintivas e baseadas muitas vezes na força bruta do lesionado, que tinha o “direito” de vingança sobre seu ofensor.

De fato a lei aquiliana representou grande avanço no concernente ao dever de reparar. Cabe, portanto, neste momento do presente trabalho traçar um comparativo do entendimento de alguns estudiosos do Direito a respeito do grande benefício alcançado a partir da edição da Lei Aquilia.

A obra de Gagliano e Pamplona Filho apresenta como grande virtude da Lex Aquilia a aplicação de penas proporcionais ao dano causado em lugar das multas fixas que muitas vezes não refletiam a realidade dos fatos; enquanto para Diniz a maior inovação da referida lei foi “[...] atribuir o dano à conduta culposa do agente”.

Ora, conforme exposto outrora, quando da fase de composição legal havia uma “pré-fixação” de valores em que a vítima restava vinculada e isto muitas vezes suprimia o direito do lesionado. Já com a elaboração e aplicação da lex aquilia iniciou-se uma fase em que multas fixas restaram relegadas e passou-se a ponderar a pena aplicada ao ofensor com o dano por ele causado a terceiro.

Nesse passo, de grande relevância o entendimento de Gagliano e Pamplona Filho acerca da maior virtude da “lei-berço”.

Não menos salutar é o posicionamento externado por Diniz ao apreciar a maior inovação da lei aquiliana. Sem dúvidas condicionar a condenação em reparação de danos à comprovação da culpa (aqui em sentido amplo, referindo-se também ao dolo) é um dos traços marcantes desta legislação.

Restando codificada em três capítulos, a lei aquiliana compreendeu questões como a integridade de escravos e animais, direito do credor principal ver satisfeito seu crédito sem a interferência dolosa do credor acessório e prejuízos diversos.

Após essa digressão histórica no direito romano, passa-se às ulteriores fases percorridas pelo instituto da responsabilidade civil.

A doutrina, fonte de consulta para a realização do presente trabalho é padronizada no sentido de delinear a evolução da responsabilidade civil, iniciando a abordagem pelo Direito Romano, passando pelo Direito Francês, Português até chegar ao Direito Brasileiro.

Assim, na consonância das obras utilizadas como pesquisa bibliográfica, apresenta-se, doravante, a responsabilidade civil no Direito Francês.

Inobstante ter aperfeiçoado os ideais romanos a respeito do tema, o Direito Francês não adotou o critério de enumeração de casos a serem abrangidos pela composição obrigatória. Ao revés disso, difundiu a idéia de reparação sempre que houvesse culpa e admitiu a existência da culpa contratual, ou seja, aquela surgida da negligência ou imprudência, sem liames no crime ou delito.

Foi nessa época que houve a generalização do princípio aquiliano em que havendo culpa, mesmo que levíssima, existe a obrigação de ressarcir.

Para delinear de forma escorreita a nascença da responsabilidade civil no direito brasileiro, impende trazer à colação sua existência no direito português, uma vez que, o Brasil, sendo colônia de Portugal, teve total influência de sua metrópole no concernente a sua legislação.

Conforme acentua Gonçalves foi da invasão dos visigodos que se traçou a primitiva legislação lusitana. Entretanto, nesse momento da história, ainda não se diferenciava a responsabilidade civil da criminal, o que somente veio a ser feito após a invasão árabe, em que se passou a aplicar a reparação pecuniária concomitantemente às penas corporais.

Em nossa pátria, houve também um momento em que as reparações civis e criminais confundiam-se.

Em 1830, no período monárquico, durante o Primeiro Reinado (1822-1831), correspondente ao governo de D. Pedro I, sob a égide da Constituição de 1824 foi instituído o Código Criminal que, “atendendo às determinações da Constituição do Império, transformou-se em um código civil e criminal fundado nas sólidas bases da justiça e equidade”.

Primeiramente a reparação dependia da condenação criminal, sendo, a posteriori, utilizado o princípio da independência da jurisdição civil e criminal.

Logo, em um momento anterior, se o agente causador do dano não restasse devidamente condenado criminalmente, a vítima não lograria êxito em obter a reparação civil, posto que para que houvesse o direito à reparação na seara cível era necessária uma condenação preexistente no campo criminal.

Já em uma fase ulterior, a áreas cíveis e criminais restaram desvinculadas, possibilitando, portanto, que a vítima pleiteasse a reparação do dano civil mesmo sem haver uma condenação criminal do agente lesionante.

Posteriormente, com a publicação do Código Civil de 1916, surge no Brasil a teoria subjetiva, ou seja, faz-se necessária a prova da culpa ou do dolo, para que tão somente então, possa-se obrigar o causador do dano a repará-lo. Tal teoria, todavia, não propiciava a proteção necessária às vítimas, v.g., de acidentes com maquinários - já que em determinado momento houve o surto do desenvolvimento industrial -, motivo pelo qual houve aclamação por uma teoria que tenha no exercício de atividade perigosa o fundamento da responsabilidade civil. É a teoria do risco.

A teoria do risco encontra-se esculpida na responsabilidade civil objetiva, e será devidamente esmiuçada em momento oportuno.

A Constituição Federal de 1988, em seu Art. 5°, referente aos direitos e deveres individuais e coletivos, logo em seus primeiros incisos alocou a responsabilidade civil, prescrevendo acerca do direito à indenização, nos incisos V e X. Destarte, resta indubitável a importância conferida pela legislação pátria ao instituto que visa resguardar os direitos através da justa reparação de danos causados a terceiros.

O Código Civil de 2002 igualmente reservou dispositivos a delinear a responsabilidade civil, os quais serão abordados em tópico específico.

Importa inferir que é observada atualmente uma crescente batalha travada contra a injustiça consubstanciada em danos não ressarcidos e, de outro vértice, uma luta em prol do fortalecimento da aplicação da instituição da responsabilização civil.

Por hora, na questão histórica da responsabilidade civil, são esses os traços mais marcantes de seu nascimento e evolução, ou seja, sua gênese romana, passando por várias fases de aprimoramento, seguindo para o direito francês com adaptações e, por derradeiro, sua aplicação no direito brasileiro (de cunho lusitano, em razão de nossa colonização).

Impende ressaltar que as várias teorias da responsabilidade civil serão apresentadas nos tópicos referentes às mesmas. 1.2 CONCEITO
Inúmeros os sentidos conferidos à palavra responsabilidade, existindo exemplos clássicos trazidos pela doutrina.

Lato sensu, encerra a idéia de atribuição de dever a um sujeito, v.g., o pai que é responsável pelo filho menor e assume as consequências de um evento concernente ao infante. Outra noção dada à palavra é na questão de capacidade, ou seja, o absolutamente incapaz não responde por seus atos. Contudo, a concepção de responsabilidade que será a seguir aduzida é a de violação de direito que ocasiona reflexos jurídicos.

No que tange ao conceito de responsabilidade civil, muitas são as definições trazidas pela doutrina. Contudo, insta fazer um breve esboço de sua acepção no latim, eis que, como aduzido anteriormente, sua nascença data dos tempos dos jurisconsultos romanos.

Consoante leciona Carlos Roberto Gonçalves:
A palavra “responsabilidade” origina-se do latim respondere, que encerra a idéia de segurança ou garantia da restituição ou compensação do bem sacrificado. Teria, assim, o significado de recomposição, de obrigação de restituir ou ressarcir.

Os doutrinadores Gagliano e Pamplona Filho, corroborando os termos de Gonçalves, acentuam a origem do termo, asseverando:
A palavra responsabilidade tem sua origem no verbo latino respondere, significando a obrigação que alguém tem de assumir com as consequências jurídicas de sua atividade, contendo, ainda, a raiz latina de spondeo, fórmula através da qual se vincula, no Direito Romano, o devedor nos contratos verbais.
 
Sem dúvida, o atual sentido conferido à palavra responsabilidade guarda total conformidade com o verbo latino do qual adveio, posto que, conforme se depreende da lição dos autores acima citados, é uma forma de o agente lesionante compensar o lesado pelo dano por ele provocado.
Por isso, “verifica-se que a responsabilidade civil nada mais é que uma obrigação imposta pela lei às pessoas causadoras de danos perante terceiros de boa-fé”.

Superada a questão da origem da acepção em apreço, vejamos a respeitável definição dada por Venosa ao termo responsabilidade civil:
O termo responsabilidade é utilizado em qualquer situação na qual alguma pessoa, natural ou jurídica, deva arcar com as consequências de um ato, fato ou negocio danoso. Sob essa noção, toda atividade humana, portanto, pode acarretar o dever de indenizar. Desse modo, o estudo da responsabilidade civil abrange todo conjunto de princípios e normas que regem a obrigação de indenizar.
 
Gagliano e Pamplona Filho, em sua lição a respeito do tema em epígrafe, laboraram com brilhantismo ao trazerem o significado do termo no bojo do Dicionário Jurídico da Academia Brasileira de Letras, que assim preleciona:
 
RESPONSABILIDADE. S.f. (Lat., de respondere, na acep. de assegurar, afiançar) Dir. Obrigação, por parte de alguém, de responder por alguma coisa resultante de negócio jurídico ou de ato ilícito. OBS. A diferença entre responsabilidade civil e criminal está em que essa impõe o cumprimento da pena estabelecida em lei, enquanto aquela acarreta a indenização do dano causado.
 
Eis a origem latina do termo responsabilidade objeto do presente capítulo.

Após apresentar essa gama de acepções, impende localizar “geograficamente” a responsabilidade civil no campo do direito material.

A responsabilidade civil, como em momento adequado será apresentada, encontra-se disciplinada no Código Civil, tanto na “classe” dos fatos jurídicos – dos atos ilícitos, como na seara do Direito das Obrigações. Sendo assim, nada mais justo que analisá-la à luz desse dever jurídico originário (obrigação).

É inconteste o entendimento que a responsabilidade surge de uma transgressão de um dever já existente.

Aliás, a doutrina não é cambaleante em afirmar que a responsabilidade, em regra é uma obrigação posterior, como se observa do trecho abaixo:
 Responsabilidade, para o Direito, nada mais é, portanto, que uma obrigação derivada – um dever jurídico sucessivo – de assumir as consequências jurídicas de um fato, consequências essas que podem variar (reparação dos danos e/ou punição pessoal do agente lesionante) de acordo com os interesses lesados.

Na esteira da lição retro, resta clarividente que quando existe violação de um dever tido como originário, estando presentes os requisitos apontados pela legislação - que serão amplamente debatidos oportunamente -, existe o dever de reparar o dano advindo dessa afronta.

Deve-se, contudo, atentar que há casos em que uma existe independentemente da outra, como nos casos das dívidas de jogos, em que há obrigação sem responsabilidade e, de outro norte, o caso do fiador, em que existe uma responsabilidade sem que haja obrigação, eis que esta é do originariamente obrigado.

Urge salientar que apesar da exceção trazida acima, a regra é que da violação de dada obrigação nasce a responsabilização, e é por isso que a doutrina, conforme demonstrado no presente tópico, ao conceituá-la, trata a mesma como “dever sucessivo”. 

Passa-se, doravante, a uma análise a respeito da previsão legal da responsabilidade civil no Código Civil hodierno. 1.3 PREVISÃO LEGAL NO CÓDIGO CIVIL 2002
Enquanto a responsabilidade civil contratual decorre da violação de um dever de cumprimento de uma obrigação, a extracontratual ou aquiliana surge em razão de um ato ilícito gerador de um dano a outrem.

É sob essa ótica que se encontra disciplinada a responsabilidade civil no Código Civil vigente, ou seja, ancorada na Parte Geral, no Livro Dos Fatos Jurídicos, sob o Título Dos Atos Ilícitos. Adiante, o Código Civil, já na Parte Especial, apresenta a responsabilidade civil no Livro Do Direito das Obrigações, cujo Título denomina-se Do Inadimplemento das Obrigações.

Finalmente, o tema é abordado em título próprio denominado Da Responsabilidade Civil, oportunidade em que trata da obrigação de indenizar e, por derradeiro, sobre a indenização.

Analisar-se-á, doravante, cada um dos títulos que versam sobre a responsabilidade civil, apresentando, paralelamente, eventuais coincidências e inovações com relação ao Código Civil de 1916.

O Livro III, denominado Dos Fatos Jurídicos, em seu Título III chamado de Dos Atos Ilícitos, é o primeiro momento em que se verifica a questão da responsabilidade no codex civil.

 Referido Título é constituído por três artigos em que são traçados os pontos relevantes dos atos ilícitos, tais como, sua definição e a apresentação de situações que não constituem atos ilícitos.

Os Arts. 186 e 187 do diploma civil assim prelecionam:
- Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
- Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
Essa primeira manifestação da legislação civil a respeito da responsabilidade trata justamente da responsabilidade aquiliana, ou seja, aquela advinda não da violação de um contrato, mas de um evento danoso - ilícito.

É nesse aspecto da legislação que se encontra ancorada a noção de culpa e dolo, entretanto tais acepções serão esclarecidas no tópico concernente aos pressupostos da responsabilidade.

De pronto, analisando o primeiro enunciado sobre o tema (Art. 186) já se encontra crítica da doutrina a respeito da lacuna deixada pelo legislador no tocante ao dano moral. Carlos Roberto Gonçalves, v.g., é enfático ao acentuar:
 
Perdeu-se a oportunidade, por exemplo, de se estabelecer a extensão e os contornos do dano moral, bem como de se disciplinar a sua liquidação, prevendo alguns parâmetros básicos destinados a evitar decisões díspares, relegando novamente à jurisprudência essa tarefa. [34]
 
Apesar da ferrenha crítica lançada por Gonçalves, Venosa encara com otimismo a positivação da indenização por dano moral. Assim reverbera o ilustre doutrinador ao acentuar sobre a inovação trazida pelo novel diploma civil:
 
Vê-se, portanto, que foi acrescentada a possibilidade de indenização pelo dano exclusivamente moral, como fora apontado pela Constituição de 1988, algo de há muito reclamado pela sociedade e pela doutrina e sistematicamente repelido até então pelos tribunais.
 
Outra modificação sofrida com a edição do novo Código Civil e merecedora de destaque nessa fase do estudo é a alteração conferida pelo hodierno código quanto à redação do Art. 186 CC/2002, que substituiu a terminologia “ou”, anteriormente adotada (Art. 159 CC/1916), pelo termo “e”.

O Artigo 159, do anterior estatuto civil prescrevia que “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano”.

Assim, no Código Civil de 1916, a disposição tal como se apresentava, revelava que não havia a necessidade de cumulação dos requisitos “conduta do agente” e a ocorrência do “dano”. Pela letra fria do anterior diploma legal para a condenação em reparação de dano mister se fazia a ocorrência de apenas um destes requisitos.

Já o Código Civil de 2002, preleciona que “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito” , ou seja, ambos os requisitos são necessários para a caracterização do ato ilícito e, via de consequência, o dever de reparar.

Relevante trazer à baila a conotação díspar dada pela doutrina a respeito dessa alteração da partícula “ou” pelo termo “e” no Art. 186 do código vigente.

Enquanto Venosa corroborando os termos de Stoco reverbera que a alteração restou inexitosa, Gonçalves a trata como um aperfeiçoamento do Art. 159 do código anterior.

Para Venosa, na consonância do entendimento traçado por Stoco, a palavra “e” não reflete o real sentido do dispositivo, pois o mesmo preleciona que só comete ato ilícito quem viola direito E causa dano, contudo, “[...] o ato ilícito existe com ou sem dano. Em outros termos, não há necessariamente dano no ato ilícito”.

Na visão de Gonçalves, foi escorreita a substituição da palavra “ou” pela “e”, pois de fato, faz-se mister que haja, cumulativamente, violação de direito “e” o dano causado a outrem.

Assim, na opinião do douto jurista “mesmo que haja violação de um dever jurídico e que tenha havido culpa, e até mesmo dolo, por parte do infrator, nenhuma indenização será devida, uma vez que não se tenha verificado prejuízo”.

Em suma, a divergência de posicionamento entre os citados doutrinadores se refere à necessidade ou não da existência do dano (prejuízo) para que reste configurado o ato ilícito.

Silvio Venosa entende que não é preciso a configuração do dano/prejuízo para que haja ato ilícito, motivo pelo qual julgam que o Art. 186 trouxe compreensão inadequada.

Carlos Roberto Gonçalves, por seu turno, defende a idéia de que não há que se falar em dever de indenizar se não restar comprovado o prejuízo, razão pela qual aduz ter referido enunciado legal aperfeiçoado o conceito de ato ilícito.

Analisa-se agora a prescrição dos artigos 187 e 188 do Código Civil.

Referido enunciado do Código Civil hodierno (Art. 187) “define expressamente o abuso de direito, [...] norma ausente de forma expressa no sistema anterior, equiparando-o à responsabilidade civil, para fins práticos”; já o artigo subsequente (Art. 188) traz em seu bojo situações que não constituem atos ilícitos.

Finda a explanação concernente ao Título III [Dos Atos Ilícitos], do Livro III [Dos Fatos Jurídicos], em que restou esclarecida a responsabilidade civil por ato ilícito, ou seja, a extracontratual impende trazer à baila os dispositivos que versam sobre a responsabilidade civil contratual. 

Esculpida no Livro I [Do Direito das Obrigações], do Título IV [Do Inadimplemento das Obrigações], mais especificamente nos Arts. 389 e seguintes, bem como Art. 395 e seguintes do estatuto civil, a responsabilidade civil contratual veio regular situações em que não restam cumpridas as obrigações assumidas.

O novel codex trata, por derradeiro, da responsabilidade civil no Título IX – Da Responsabilidade Civil, versando em seu Capítulo I sobre a obrigação de indenizar e, o subsequente, sobre a indenização.

O capítulo tocante à obrigação de indenizar é constituído por dezessete artigos (Art. 927 a 943), enquanto o capítulo que trata da indenização é composto por onze artigos (Art. 944 a 954).

Confira-se, por derradeiro a crítica esboçada pela doutrina acerca do atual diploma civil:
 
O Código Civil de 2002 sistematizou a matéria, dedicando um capítulo especial e autônomo à responsabilidade civil. Contudo, repetiu, em grande parte, ipsis litteris, alguns diapositivos, corrigindo a redação de outros, trazendo, porém, poucas inovações.
 
Cumpre asseverar que toda a composição dos retro mencionados enunciados será apreciada e debatida nos capítulos correspondentes, em que serão abordadas as peculiaridades das responsabilidades extracontratuais e contratuais. 1.4 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL
Para fins de análise dos pressupostos da responsabilidade civil é necessária nova observação à letra do Art. 186 do Código Civil que prescreve que “aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

O enunciado supra, apresenta, para parte da doutrina, quatro elementos indispensáveis para a configuração do dever de indenizar, quais sejam: a ação ou a omissão, o dolo ou a culpa, o dano causado à vítima e por fim, o nexo de causalidade entre a conduta [ação ou omissão] e o dano experimentado pelo lesionado.

Cumpre salientar que a doutrina não é uníssona quanto a essa questão, porquanto há entendimentos ancorados na idéia de que três são os elementos essenciais para a responsabilidade civil, sendo eles a ação ou omissão [conduta], o dano ou prejuízo e o nexo causal.

Aqueles que como Carlos Roberto Gonçalves, asseveram que são quatro os pressupostos da responsabilidade civil, o dizem por entenderem que, inobstante haja em nosso ordenamento jurídico a responsabilidade objetiva [que prescinde de dolo ou culpa], a regra, segundo a teoria adotada em nosso Código Civil, é a responsabilidade subjetiva, ou seja, aquela que depende de comprovação desses elementos.

O posicionamento traçado por Gagliano e Pamplona Filho, por sua vez, é de que, se existe uma teoria que exclui a necessidade de se aferir dolo ou culpa esses pressupostos não podem ser tidos como pressupostos gerais da responsabilidade civil, pois pesam sobre eles [o dolo e a culpa] a exceção trazida pela teoria subjetiva.

Demonstrada a divergência doutrinária a respeito de serem ou não, o dolo e a culpa, pressupostos da responsabilidade civil, prosseguir-se-á com os demais elementos em que não há qualquer debate quanto a sua configuração como pressuposto do dever de indenizar.

 Inicialmente analisar-se-á a questão da ação ou omissão, também denominada de conduta humana.

A doutrina em geral classifica a conduta humana em positiva ou negativa, sendo a primeira traduzida na prática de uma ação pelo sujeito lesionante, enquanto a segunda pode ser interpretada como uma abstenção que pode gerar um dano.

Outro aspecto a se destacar no concernente ao pressuposto conduta humana (ação ou omissão) é que esta acarreta responsabilidade tanto quando o próprio responsabilizado foi quem cometeu o ato ensejador do dano, como também em casos em que apesar de restar responsabilizado, não foi ele quem cometeu a conduta danosa.

Confiram-se, os exemplos trazidos na obra de Carlos Roberto Gonçalves, a respeito de cada uma das responsabilidades decorrentes de conduta, in verbis:
O Código prevê a responsabilidade por ato próprio, dentre outros, nos casos de calúnia, difamação e injúria; de demanda de pagamento de dívida não vencida ou já paga; de abuso de direito.

A responsabilidade por ato de terceiro ocorre nos casos de danos causados pelos filhos, tutelados e curatelados, ficando responsáveis pela reparação os pais, tutores e curadores. Também o empregador responde pelos atos de seus empregados. Os educadores, hoteleiros e estalajadeiros, pelos seus educandos e hóspedes. Os farmacêuticos, por seus prepostos. As pessoas jurídicas de direito privado, por seus empregados, e as de direito público, por seus agentes. E, ainda, aqueles que participam do produto de crime.

A responsabilidade por danos causados por animais e coisas que estejam sob a guarda do agente é, em regra, objetiva: independe de prova de culpa. Isto se deve ao aumento do número de acidentes e de vítimas, que não devem ficar irressarcidas, decorrente do grande desenvolvimento da indústria de máquinas.

O próximo pressuposto a ser analisado é o dano.
Dano “[...] consiste no prejuízo sofrido pelo agente. Pode ser individual ou coletivo, moral ou material, ou melhor, econômico e não econômico”.

Ainda para Venosa, para que seja caracterizado o dano, este não pode ser hipotético, devendo ser certo e atual, sob pena de não corporificação do dever de indenizar.

Por derradeiro, cumpre explanar acerca do pressuposto nexo de causalidade ou nexo causal, trazendo, para tanto, definições doutrinárias, a saber:

Assim define Venosa, o nexo de causalidade:
 O conceito de nexo causal, nexo etiológico ou relação de causalidade deriva das leis naturais. É o liame que une a conduta do agente ao dano. É por meio do exame da relação causal que conclui quem foi o causador do dano. Trata-se de elemento indispensável. A responsabilidade objetiva dispensa a culpa, mas nunca dispensará o nexo causal. Se a vítima, que experimentou um dano, não identificar o nexo causal que leva o ato danoso ao responsável, não há como ser ressarcida.
 
Gonçalves delineia o nexo causal da seguinte maneira:
É a relação de causa e efeito entre a ação ou omissão do agente e o dano verificado. Vem expressa no verbo “causar”, utilizado no art. 186. Sem ela, não existe a obrigação de indenizar. Se houver o dano, mas sua causa não está relacionada com o comportamento do agente, inexiste a relação de causalidade e também a obrigação de indenizar.
São estes, portanto, os pressupostos do dever de indenizar, conduta do agente, dano, nexo de causalidade e, em caso de responsabilidade subjetiva, o dolo ou a culpa. 2 MODALIDADES DE RESPONSABILIDADE CIVIL
Tendo o primeiro capítulo se ocupado em trilhar uma base introdutória da responsabilidade civil, demonstrando seus aspectos iniciais, urge, doravante, adentrar na seara de seus elementos mais específicos.

O capítulo vertente versa sobre as modalidades da responsabilidade civil também denominada pela doutrina de espécies de responsabilidade.

Nas lições doutrinárias pode-se verificar uma variação na abordagem a respeito das modalidades de responsabilidade, em que alguns juristas estendem o campo de análise das mesmas, enquanto outros focam a análise nas espécies mais comuns.

O presente capítulo tratará das seguintes modalidades: objetiva, subjetiva, de fim, de meio, contratual e extracontratual, que são as comumente apresentadas pela doutrina pátria. Assim, o trabalho ora apresentado visa traçar as espécies mais correntes de responsabilidade, de forma a demonstrar de forma clara e objetiva, porém bem consistente, a estrutura de cada uma.
 
 
2.1 RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA
Cuida este subtítulo de analisar a modalidade denominada objetiva, uma espécie de responsabilidade muito importante no Direito hodierno em função de seu caráter facilitador da condenação do agente lesionante em trazer, ou ao menos tentar trazer a vítima ao status quo ante através da justa reparação pecuniária pelo dano causado.

Também nomeada de legal, a responsabilidade civil objetiva é aquela em que se escusa a existência de um dos pressupostos do dever de indenizar. E, exatamente por isso, por prescindir de um elemento, tal modalidade acelera o processo de condenação do causador do evento danoso, haja vista que, eximindo a vítima do dever de comprovar um pressuposto da responsabilidade civil, muito mais fácil é para esta a obtenção da merecida reparação.

Conforme aduzido no tópico deste trabalho denominado “Pressupostos da Responsabilidade Civil”, para que reste caracterizado o dever de reparação do dano, faz-se mister a conjugação de alguns elementos, sem os quais o pleito pela indenização resta inexitoso.
Na oportunidade em que foram mostrados os pressupostos da responsabilidade, esclareceu-se que estes são: a ação ou omissão (conduta humana), o dano, o nexo causal entre a conduta do agente e o dano sofrido pela vítima e a culpa ou o dolo.

Naquela ocasião, fez-se um comparativo entre o entendimento trazido na obra de Gonçalves e de outro norte, o juízo apresentado por Gagliano e Pamplona Filho. Conforme se explanou naquela oportunidade, enquanto para Gonçalves o dolo ou a culpa é pressuposto da responsabilidade, para Gagliano e Pamplona Filho não é, porquanto aferir “dolo ou culpa” não é necessário em todos os tipos de responsabilidade.

Quando Gagliano e Pamplona Filho esboçam o entendimento de que o dolo ou a culpa não é regra na seara da responsabilização, o fazem porque existe uma espécie desse instituto civil em que se prescinde a configuração destes elementos. É a responsabilidade civil objetiva.

Conclui-se, portanto, que a responsabilidade civil objetiva é aquela em que a existência ou não do dolo ou da culpa em nada interfere na responsabilização do agente, eis que este deverá reparar o dano seja ou não encontrada em sua conduta a mácula da culpa.

No subtítulo denominado “Aspectos Históricos” do presente trabalho, onde foi elaborada a evolução histórica da responsabilidade civil, mencionou-se a respeito da positivação desse instituto civil na Carta Constitucional.

Naquele momento, o trabalho ocupou-se em abordar os incisos V e X do Art. 5° da CF, que prescrevem a respeito do direito do indivíduo a perceber justa indenização quando restarem violadas a imagem, honra, intimidade e vida privada.

Com efeito, buscou-se naquela oportunidade, demonstrar a relevância conferida pela Carta Política a um instituto cujo objetivo é sancionar o causador de um dano material, moral ou à imagem, bem como compensar pecuniariamente a vítima daquela lesão.

Como aquele tópico do trabalho visava aclarar a respeito dos aspectos históricos da responsabilidade, não houve um aprofundamento na abordagem do dever de reparação, postergando-se, por exemplo, a elucidação do art. 37, § 6° da Constituição Federal, para uma fase ulterior do estudo.
Como o presente subtítulo versa sobre a modalidade objetiva da responsabilidade civil, passa-se ao estudo do retro citado dispositivo constitucional, in verbis:
 
Art. 37 – A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
[...]
§ 6° - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
 
Pela leitura do caput do enunciado supra in initio, resta evidente que este trata do Estado, tanto na qualidade de administração direta como indireta. Assim, o § 6° deve ser encarado como a responsabilização do Estado por dano causado a outrem.

A primeira parte desta prescrição legal preceitua que quando um agente que esteja no exercício de uma função estatal causar dano a terceiro, o Estado será responsabilizado por tal ofensa, independentemente de o dano advir de atitude dolosa ou culposa. O que se depreende, portanto, é que a responsabilidade do Estado é eminentemente objetiva, ou seja, o fato de restar configurada a intenção ou a negligência, imprudência ou imperícia, é irrelevante nesta espécie de responsabilidade. A conduta, o dano e o nexo causal são suficientes para haver a responsabilização.

A Constituição Federal hodierna prestigia nesse sentido, a responsabilidade objetiva em face do Estado.

Sobre o tema acima explanado, faz-se remissão à obra de Gonçalves, em que o jurista apresenta um tópico denominado “evolução: da fase da irresponsabilidade à da responsabilidade objetiva”, in verbis:
 
A responsabilidade civil do Estado é considerada, hoje, matéria de direito constitucional e de direito administrativo. Em sua evolução, podemos observar que, nos primórdios, subsistia o princípio da irresponsabilidade absoluta do Estado (The King can do no wrong). Após passar por vários estágios, atingiu o da responsabilidade objetiva, consignada no texto constitucional em vigor, que independe da noção de culpa.
 
Insta salientar que não apenas no Art. 37, § 6°, in initio, da CF encontra-se disciplinada tal espécie de responsabilidade civil. A lei n° 8.078 de 11 de janeiro de 1990, que institui o Código de Defesa do Consumidor, reservou capítulo especial acerca da reparação de danos.

O que verifica, por exemplo, de uma análise dos Arts. 12 e 14 caput do CDC é que o fabricante, produtor, construtor ou fornecedor de serviços são responsabilizados de forma objetiva, ou seja, independentemente da aferição de culpa, pelos prejuízos causados aos consumidores. Esta é, portanto, a natureza, em regra, da responsabilidade nas relações de consumo – objetiva.

Por oportuno, transcrevem-se mencionados dispositivos consumeristas:
Art. 12 – O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
Art. 14 – O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre fruição e riscos.
 Justifica-se a adoção da responsabilidade objetiva na relação fornecedor-consumidor, abarcada pelo CDC, em apertada síntese, pelo fato de o fornecedor de produtos/serviços ser considerado a parte mais forte da relação de consumo, em detrimento do consumidor.
Impende salientar que além da Constituição Federal e do Código de Defesa do Consumidor, o Código Civil igualmente alude sobre essa modalidade de responsabilidade, quando em seu Art. 927, § único assim prescreve:
 
Art. 927 – [...]
Parágrafo único – Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
 
Como se observa do dispositivo legal retro citado, haja ou não culpa, haverá o dever de indenizar quando determinada atividade desempenhada oferecer temeridade a alguém. Confira-se o ensinamento doutrinário a respeito do tema:
 
Uma das teorias que procuram justificar a responsabilidade objetiva é a teoria do risco. Para esta teoria, toda pessoa que exerce alguma atividade cria um risco de dano para terceiros. E deve ser obrigada a repará-lo, ainda que sua conduta seja isenta de culpa. A responsabilidade civil desloca-se da noção de culpa para a idéia de risco, ora encarada como “risco-proveito”, que se funda no princípio segundo o qual é reparável o dano causado a outrem em consequência de uma atividade realizada em benefício do responsável (ubi emolumentum, ibi ônus); ora mais genericamente como “risco criado”, a que se subordina todo aquele que, sem indagação de culpa, expuser alguém a suportá-lo.
 
Da leitura do trecho supra se dessume que existem atividades em que o perigo é algo intrínseco a sua realização. Não só isso. Além do fato de o risco ser algo próprio dessa atividade, tal atividade proporciona certo benefício ao agente lesionante. Estes são, portanto, os elementos caracterizadores da teoria do risco: atividade de cunho temeroso conjugada com proveito econômico auferido pelo causador do dano em razão, não do dano causado, mas da atividade em si.

As obras jurídicas trazem uma gama de exemplos a ilustrar situações abarcadas por este tipo de responsabilidade (do Art. 927 § único CC). Dentre os exemplos mais correntes encontra-se o da empresa que fabrica fogos de artifício, porquanto, nas palavras de Venosa “Ninguém duvida de que o trabalho com pólvora e com explosivos já representa um perigo em si mesmo, ainda que todas as medidas para evitar danos venham a ser adotadas”.
 
Outro exemplo que parece bem claro diz respeito a espetáculos populares, artísticos, esportivos etc. com grande afluxo de espectadores: é curial que qualquer acidente que venha a ocorrer em multidão terá natureza grave, por mais que se adotem modernas medidas de segurança. O organizador dessa atividade, independentemente de qualquer outro critério, expõe as pessoas presentes a um perigo.
 
Muito salutar a passagem acima colacionada porquanto não exige qualquer dúvida de que sua atividade é eminentemente de risco.

No caso, por exemplo, de um espetáculo esportivo: o fato de neste local existir um amontoado de pessoas (das mais variadas formas lidarem com situações) aliado ao fato de que estádio de futebol, por sua natureza, gera um instinto de grupo, chega-se à conclusão que em uma situação caótica de briga, pode ocorrer um pisoteamento, ou seja, uma situação de risco. Logo, não há como negar que a atividade do organizador deste evento é de risco. De outro norte, não há que se questionar que o organizador deste evento é beneficiado pela atividade desenvolvida. Destarte, eis exemplo clássico da aplicação da teoria do risco. Não há que se adentrar no mérito “se houve ou não culpa”. Primeiramente questiona-se se é atividade de risco; indaga-se ainda se gerou dano e, por derradeiro se existe nexo causal entre o dano sofrido e a atividade. Se as respostas foram positivas, trata-se de responsabilidade objetiva do § único do Art. 927 do Código Civil.

Para fins de exterminar eventual dúvida que remanesça a respeito da interpretação do § único do Art. 927 CC ora analisado, faz-se remissão à obra de Venosa que assim preleciona:
 
A teoria do risco aparece na história do Direito, portanto, com base no exercício de uma atividade, dentro da idéia de que quem exerce determinada atividade e tira proveito direto ou indireto dela responde pelos danos que ela causar, independentemente de culpa sua ou de prepostos. O princípio da responsabilidade sem culpa ancora-se em um princípio de equidade: quem aufere os cômodos de uma situação deve também suportar os incômodos. O exercício de uma atividade que possa representar um risco obriga por si só a indenizar os danos causados por ela.
 
Além do supramencionado enunciado legal, outro artigo do codex civil versa sobre a espécie de responsabilidade prescindível de culpa, qual seja, o Art. 931 que estabelece que “Ressalvados outros casos previstos em lei especial, os empresários individuais e as empresas respondem independentemente de culpa pelos danos causados pelos produtos postos em circulação”.

Em consulta à lição apresentada por Gonçalves, percebe-se que para o doutrinador, o fato de o dispositivo supra mencionar as palavras “empresários” e “empresas”, não significa que este enunciado civil versa sobre relação de consumo, eis que esta já se encontra abarcada pelos Arts. 12 e 14 do CDC anteriormente mencionados.

Para o jurista acima apresentado, “Na realidade, o dispositivo em questão terá sua aplicação restrita aos poucos casos em que a atividade empresarial não configurar relação de consumo” [66], tais como quaisquer desconfortos à vida, à segurança, enfim, à coletividade como um todo, decorrentes da realização de suas atividades cotidianas.

Induvidosa a necessidade do estudo do § único do Art. 927 e do Art. 931 do CC para um escorreito entendimento do caráter da responsabilidade civil objetiva. Todavia, deve-se salientar que no bojo do Código Civil existem outros enunciados que versam sobre tal modalidade de responsabilidade, os quais não serão aqui enumerados para que o presente trabalho não se torne prolixo. O objetivo central deste subtítulo é apresentar a modalidade “objetiva ou legal” da responsabilidade civil, o qual procurou fazer-se com a apresentação desta no bojo da Constituição Federal, Código de Defesa do Consumidor e da teoria do risco, no Código Civil.

Finalizando esta parte do presente trabalho não é demais repisar que não há que se alegar culpa ou dolo quando tratar-se da espécie objetiva de responsabilidade, porquanto, como foi exposto no decorrer deste tópico, esta visa salvaguardar o lesionado do ônus de comprovar a intenção do agente na ação ou omissão danosa; seja porque este agente é o Estado, que dispõe de muito mais força probante em detrimento de um particular; seja porque o agente é parte mais forte em uma relação onde o lesionado é consumidor, portanto, vulnerável; ou porque a atividade do causador do dano por si só representa risco a terceiros. 2.2 RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA
A responsabilidade civil subjetiva, em linhas gerais, é a modalidade de responsabilidade em que a aferição de culpa ou dolo é determinante para sua configuração.

Trazendo um conceito doutrinário a respeito desta espécie de responsabilidade tem-se que “Diz-se, pois, ser “subjetiva” a responsabilidade quando se esteia na idéia de culpa. A prova da culpa do agente passa a ser pressuposto necessário do dano indenizável”.

Como foi feito em todo o transcurso do presente trabalho, inicia-se o subtítulo vertente com a apresentação do conceito de culpa, eis que a ela é o grande diferencial desta modalidade de responsabilidade, fazendo-se, portanto, imprescindível sua adequada compreensão. Inicialmente deve-se frisar que a culpa é dividida em Iato sensu e stricto sensu.

A obra de Gonçalves apresenta a natureza de cada uma dessas modalidades de culpa, a culpa em sentido amplo e a culpa em sentido estrito. Confira-se:

Se a atuação desastrosa do agente é deliberadamente procurada, voluntariamente alcançada, diz-se que houve culpa lato sensu (dolo). Se, entretanto, o prejuízo da vítima é decorrência de comportamento negligente e imprudente do autor do dano, diz-se que houve culpa stricto sensu.

Analisando-se o entendimento acima externado pelo digno jurista conclui-se que existe o grande gênero culpa, do qual o dolo é espécie. Assim, salutar trazer o conceito de dolo elaborado por Gonçalves “O dolo consiste na vontade de cometer uma violação de direito [...]. Dolo, portanto, é a violação deliberada, consciente, intencional do dever jurídico”.

Extrai-se das elucidações supra que para que haja essa modalidade de responsabilidade civil, dentre outros elementos, é necessária a comprovação da existência de culpa. Culpa essa em sentido amplo, que inclui tanto a culpa decorrente de negligência, imprudência e imperícia, como o dolo, que é a intenção de causar o fato danoso.

De posse dessas informações, conclui-se que para uma acurada análise dessa modalidade de responsabilidade faz-se mister um entendimento pormenorizado dos agentes caracterizadores da culpa, os quais serão abordados em breve.

Antes, no entanto, de analisar a negligência, imprudência e a imperícia, eis que o dolo já foi acima conceituado, oportuno trazer à baila a lição de Caio Mario da Silva que traduz com genialidade o cerne da responsabilidade subjetiva.
 
A essência da responsabilidade subjetiva vai assentar, fundamentalmente, na pesquisa ou indagação de como o comportamento contribui para o prejuízo sofrido pela vítima. Assim procedendo, não considera apto a gerar o efeito ressarcitório um fato humano qualquer. Somente será gerador daquele efeito uma determinada conduta, que a ordem jurídica reveste de certos requisitos ou de certas características.

Assim considerando, a teoria da responsabilidade subjetiva erige em pressuposto da obrigação de indenizar, ou de reparar o dano, o comportamento culposo do agente, ou simplesmente a sua culpa, abrangendo no seu contexto a culpa propriamente dita e o dolo do agente.
 
Importa, portanto, em uma análise a respeito da responsabilidade, primeiramente averiguar se o evento danoso não se encaixa nas situações disciplinadas em lei em que se prescinde a aferição de culpa ou dolo. Em um segundo momento, tendo sido observado que o caso concreto não é abarcado pela responsabilidade objetiva, passa-se a analisar detidamente a conduta do agente lesionante, para fins de apreciar se sua ação ou omissão está revestida dos elementos da culpa. Assim, conforme bem asseverado acima pelo ilustre Caio Mário o comportamento do agente é essencial para se aferir esta espécie de responsabilidade.

Passa-se doravante, à compreensão dos elementos da culpa, já que esta é indispensável na responsabilidade subjetiva.
No subtítulo anterior, onde restou explanado a respeito da responsabilidade objetiva, fez-se remissão ao § único do Art. 927 para demonstrar um dos dispositivos do CC que versam sobre aquela forma de responsabilidade.

Neste momento cumpre trazer o caput do Art. 927 para aclarar a respeito da modalidade subjetiva de responsabilidade civil, o que se fará neste momento.

Versa o Art. 927 que “Aquele que por ato ilícito (Arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo” [72]. Este dispositivo se remete a outros artigos do mesmo diploma legal para clarear a noção de ato ilícito. Ocorre que nos tópicos deste trabalho concernentes à previsão legal no CC/2002 e dos pressupostos da responsabilidade, já se teceu a questão de ato ilícito para a lei civil. Assim, já se sabe que quem comete uma negligência, imprudência ou imperícia é um infrator, por assim dizer, de norma civil.

Mas deve-se estar questionando qual a necessidade de se entender pormenorizadamente os elementos caracterizadores do ato ilícito nessa fase do trabalho que visa explanar sobre a responsabilidade subjetiva. Ora, como foi dito outrora, esta modalidade de responsabilidade depende do elemento culpa e este, por seu turno, é formado pela negligência, imprudência e imperícia. Portanto, de suma relevância aclarar a respeito de cada um desses componentes.

A obra de Venosa apresenta a noção precisa de como se caracterizam a negligência, imprudência e imperícia, a saber:
 
A culpa, sob os princípios consagrados da negligência, imprudência e imperícia, contém uma conduta voluntária, mas com resultado involuntário, a previsão ou a previsibilidade e a falta de cuidado devido, cautela ou atenção. A previsibilidade é aquela aferida no caso concreto, uma definição do previsível. Na negligência o agente não age com a atenção devida em determinada conduta; (...). Na imprudência o agente é intrépido, açodado, precipitado e age sem prever consequências nefastas ou prejudiciais. Na culpa sempre existe o aspecto do defeito da previsibilidade, assim como na imperícia, não trazida ao bojo do art. 186, mas certamente também integrante do conceito de culpa. É imperito aquele que demonstra inabilidade para seu ofício, profissão ou atividade. É imperito o advogado que redige petição inepta e o médico que administra a droga errada e danosa ao paciente, por exemplo.
 
De acordo com o entendimento acima externado por Venosa, ambas as caracterizadoras da culpa advêm de uma ação ou omissão voluntária, mas com resultado alheio à vontade do agente lesionante. Decorrem, portanto, de uma falta de esmero, ausência de atenção, de zelo, de precaução, de vigilância.

A par da defesa acima apresentada, impende ainda trazer à colação a lição de Cavalieri Filho que leciona com muita propriedade a respeito do tema em deslinde:
 
A imprudência é falta de cautela ou cuidado por conduta comissiva, positiva, por ação. Age com imprudência o motorista que dirige em excesso de velocidade, ou que avança o sinal. Negligência é a mesma falta de cuidado por conduta omissiva. Haverá negligência se o veículo não estiver em condições de trafegar, por deficiência de freios, pneus etc. O médico que não toma os cuidados devidos ao fazer uma cirurgia, ensejando a infecção do paciente, ou que lhe esquece uma pinça no abdômen, é negligente. A imperícia, por sua vez, decorre de falta de habilidade no exercício de atividade técnica, caso em que se exige, de regra, maior cuidado ou cautela do agente. Haverá imperícia do motorista que provoca acidente por falta de habilitação. O erro médico grosseiro também exemplifica a imperícia.
 
 
Observando o ensinamento de Cavalieri acima apresentado, percebe-se que é tênue a linha que diferencia a negligência da imprudência eis que ambas surgem de uma falta de cuidado indispensável à determinada conduta. Contudo, enquanto uma decorre de uma atitude omissiva, ou seja, o agente foi omisso em um dever de ação, a outra advêm de uma conduta comissiva, ou seja, de uma ação que merecia relevante grau de atenção, mas não foi devidamente cumprida pelo causador do dano. Já a imperícia ocorre em se tratando de atitude de desmazelo de agente profissional, ou seja, quem deveria ter uma habilidade técnica não a domina.

Devidamente esclarecido o assunto da negligência, imprudência e imperícia cumpre destacar as espécies de culpa na concepção de Cavalieri Filho, que se dividem em: grave, leve e levíssima; contratual e extracontratual; in eligendo, in vigilando e in custodiando; presumida e contra a legalidade e, concorrente.

Essas espécies acima elencadas serão abordadas de forma resumida para que o presente trabalho não teça minuciosamente questões não tão relevantes para o tema central, e acabe por estender-se por demais nesse ponto, em detrimento do último capítulo que de fato tratará de forma específica e profícua a culpa dentro da responsabilidade por sangue contaminado pelo vírus HIV.
Inicia-se a análise das espécies de culpa, asseverando a respeito da gradação de culpa, que pode ser uma culpa totalmente descabida, onde o agente cometeu erro abrupto ao não atentar em sua conduta, ou seja, o lesionante fugiu totalmente do conceito de atenção, sua conduta de descuido é totalmente injustificável. Esta é a culpa grave. Já em casos em que o agente causador do evento danoso agiu com descuido justificável aos olhos de pessoas comuns, por assim dizer, trata-se de culpa leve. Agora, se a culpa foi extremamente branda, advinda de uma conduta em que somente um especialista teria condições de perceber que tal evento causaria um dano, está-se diante de culpa levíssima.

Cavalieri Filho apresenta em sua obra as características necessárias para a correta identificação da espécie de culpa, in verbis:
Examinada pelo ângulo da gravidade, a culpa será grave se agente atuar com grosseira falta de cautela, com descuidado injustificável ao homem normal, impróprio ao comum dos homens.
[...]
Haverá culpa leve se a falta puder ser evitada com atenção ordinária, com o cuidado próprio do homem comum, de um bonus pater famílias.
Já, a culpa levíssima caracteriza-se pela falta de atenção extraordinária, pela ausência de habilidade especial ou conhecimento singular.
 
Existem ainda as espécies de culpa contratual e extracontratual, na qual uma advém de uma relação anterior, onde os agentes já se conhecem e tendo firmado uma relação contratual, uma das partes, por conduta culposa, infringe o pacto que as une, gerando o dever de ressarcir; a extracontratual é aquela em que não existia nenhuma relação anterior entre as partes, mas por ocasião de uma conduta imprudente, imperita ou negligente de uma das partes, lesionante e lesionado vinculam-se pelo dever de ressarcir e direito de ser ressarcido.
 
Aliás, nesse sentido é a lição apresentada por Cavalieri em sua obra a respeito dessa questão.
 
Quanto à natureza do dever violado, a culpa será contratual se esse dever tiver por fonte uma relação jurídica obrigacional preexistente, isto é, um dever oriundo de contrato, do qual nos ocuparemos oportunamente. Se o dever tiver por causa geradora a lei ou um preceito geral de Direito, teremos a culpa extracontratual ou aquiliana, tendo origem este último nome na tradição romana, em razão da lex aquilia.
 
 
Exemplo da contratual é o caso de alguém que firmou determinada avença com outrem e por uma desatenção de um dever de cuidado acaba por dar cabo ao elemento essencial do contrato firmado, como no caso de um contrato de entrega de coisa certa, em que o agente que tem o dever de entregar um determinado bem à outra parte, por uma conduta culposa, destrói o bem que deveria entregar.

No que tange à culpa extracontratual, pode-se exemplificar com uma atitude em que uma pessoa que desconhece o lesionado, por atitude culposa, causa-lhe determinado tipo de prejuízo, tanto material quanto moral. Atente-se que nesse caso as partes não têm qualquer vínculo anterior, mas acabam unindo-se por uma eventualidade decorrente de violação de dever de cuidado com o próximo.

Seguindo ainda a esquematização adotada por Cavalieiri a respeito das espécies de culpa, insta apresentar breve noção de culpa in eligendo, in vigilando e in custodiando, o que se fará com as próprias palavras do autor:
 
Na vigência do Código de 1916 falava-se em culpa in eligendo para caracterizar a má escolha do preposto. A culpa do patrão ou comitente era presumida pelo ato culposo do empregado ou preposto, consoante a Súmula 341 do Supremo Tribunal Federal, em razão da má escolha do mesmo. A culpa in vigilando, por sua vez, decorria da falta de atenção ou cuidado com o procedimento de outrem que estava sob a guarda ou responsabilidade do agente. [...] Já a culpa in custodiando caracterizava-se pela falta de atenção em relação a animal ou coisa que estavam sob os cuidados do agente. Essas espécies de culpa, todavia, estão em extinção, porque o Código Civil de 2002, em seu art. 933, estabeleceu responsabilidade objetiva para os pais, patrão, comitente, detentor de animal etc., e não mais responsabilidade com culpa presumida, como era no Código anterior.
 
 Conforme se dessume do trecho supra, tais modalidades de culpa não estão agasalhadas pelo Código Civil hodierno, mas foi necessário trazê-las para um comparativo entre o atual codex civil e o Código Civil de 1.916, eis que o anterior estatuto previa tais espécies dentro da responsabilidade subjetiva, o que hoje, como se verifica pela explanação acima é abarcado pela responsabilidade objetiva.
Impende colacionar a lição a respeito de culpa presumida e culpa contra a legalidade:
 
A culpa presumida foi um dos estágios na longa evolução do sistema da responsabilidade subjetiva ao da responsabilidade objetiva. Em face da dificuldade de se provar a culpa em determinadas situações e da resistência dos autores subjetivistas em aceitar a responsabilidade objetiva, a culpa presumida foi o mecanismo encontrado para favorecer a posição da vítima. O fundamento da responsabilidade, entretanto, continuou o mesmo – a culpa; a diferença reside num aspecto meramente processual da distribuição do ônus da prova. Enquanto no sistema clássico (da culpa provada) cabe à vítima provar a culpa do causador do dano, no de inversão do ônus probatório atribui-se ao demandado o ônus de provar que não agiu com culpa.

Sem se abandonar, portanto, a teoria da culpa, consegue-se, por via de uma presunção, um efeito prático próximo ao da teoria objetiva. O causador do dano, até prova em contrário, presume-se culpado; mas, por se tratar de presunção relativa – juris tantum -, pode elidir essa presunção provando que não teve culpa.

Fala-se em culpa contra a legalidade quando o dever violado resulta de texto expresso de lei ou regulamento, como ocorre, por exemplo, com o dever de obediência aos regulamentos de trânsito de veículos motorizados, ou com o dever de obediência a certas regras técnicas no desempenho de profissões ou atividades regulamentadas. A mera infração da norma regulamentar é fator determinante da responsabilidade civil; cria em desfavor do agente uma presunção de ter agido culpavelmente, incumbindo-lhe o difícil ônus da prova em contrário.
 
A culpa presumida é aquela em que determinado ato já se encontra previamente definido como evento danoso, cabendo, contudo, ao agente causador deste ato comprovar estar isento de culpa. Destarte, nessa modalidade de culpa, primeiro “acusa-se”, para tão somente depois dar oportunidade ao lesionante de provar que não agiu culposamente.

Quanto à culpa contra a legalidade, depreende-se que o simples fato de o agente atentar contra determinada norma legal já é presumido culpado. Neste caso, como no da culpa presumida existe a possibilidade de prova de isenção de culpa, mas tal ônus compete ao próprio infrator. 

Por derradeiro, apresenta-se a noção de culpa concorrente, nas palavras de Cavalieiri Filho, in verbis:
Fala-se em culpa concorrente quando, paralelamente à conduta do agente causador do dano, há também conduta culposa da vítima, de modo que o evento danoso decorrer do comportamento culposo de ambos. [...] A vítima também concorre para o evento, e não apenas aquele que é apontado como único causador do dano.
 
A culpa concorrente é aquele em que inobstante haver um agente causador de dano a vítima também concorreu para o sinistro. Assim, ambos os agentes, tanto lesionante como lesionado deram causa ao fato-lesão.

Em casos como este, onde ambos os agentes concorreram para o dano, cumprirá ao magistrado, através de apreciação do conjunto probatório, averiguar a gradação de culpa de cada um, para fins de estipular o quantum devido para fins de ressarcimento.

Como se verifica pelo exposto até o presente momento muitos são os aspectos da responsabilidade subjetiva. Contudo, não há como apresentar todas as questões desta espécie de responsabilidade, haja vista que são infindáveis suas peculiaridades. Assim, procurou-se abordar os elementos centrais dessa espécie tão importante de responsabilidade civil adotada pela legislação pátria. O que restou omisso nesse subtítulo e for relevante ao entendimento do tema central desse trabalho, será abordado quando forem apresentadas as responsabilidades das instituições médicas e do Estado no derradeiro capítulo o presente estudo.

2.3 RESPONSABILIDADE CIVIL DE FIM OU DE RESULTADO
Esta modalidade de responsabilidade civil é aquela em que a atividade da qual se ocupa o agente é de resultado, ou seja, ele necessariamente precisa atingir determinado fim, sob pena de restar responsabilizado. Destarte, precisa alcançar o fim desejado por aquele que contratou seu serviço sob pena de ver-se compelido a reparar o dano causado, dano esse consubstanciado na insatisfação do contratante-lesionado.

Exemplo típico trazido por uma gama de doutrinadores é a questão do cirurgião plástico, conforme palavras de Gonçalves:
 
A obrigação que assumem é de “resultado”. Os pacientes, na maioria dos casos de cirurgia estética, não se encontram doentes, mas pretendem corrigir um defeito, um problema estético. Interessa-lhes, precipuamente, o resultado. Se o cliente fica com aspecto pior, após a cirurgia, não se alcançando o resultado que constituía a própria razão de ser do contrato, cabe-lhe o direito à pretensão indenizatória.

No caso do cirurgião plástico, trata-se de responsabilidade de resultado ou fim porquanto seu labor é eminentemente de estética.

Ocorrendo a insatisfação do cliente, em casos de cirurgias estéticas, responde o cirurgião pelo fato de não ter atingido o resultado para o qual foi contratado, eis que quando se busca o auxílio da medicina para melhorar o aspecto de determinada parte do corpo que não agrada a pessoa contratante dos serviços estéticos, existe uma relação de confiança em que o cliente deposita sua imagem nas mãos de um profissional devidamente habilitado. Assim, restando frustrada a expectativa do cliente, que se cercou de todas as cautelas na hora da escolha do profissional bem como no pós-operatório, nada mais justo que haja a condenação do lesionante à reparação do dano causado à imagem do lesado.

Certo é que existem casos em que aquele que pleiteia a indenização por danos estéticos, alegando a responsabilidade de resultado do cirurgião que não logrou êxito na intervenção cirúrgica, não tem o direito à reparação do dano alegado. Isto porque, casos existem em que a pessoa, após uma cirurgia de sucesso não guarda as devidas cautelas do pós-operatório, dando, portanto, ensejo a uma recuperação mal-sucedida. Nesse caso, afasta-se o dever de indenizar, por ocasião de uma excludente do dever de reparar denominada culpa exclusiva da vítima.

Outra questão a se ponderar é que nem sempre a responsabilidade do cirurgião plástico será de fim. Há casos em que a pessoa que procura os serviços do profissional desta área o faz por ocasião de uma deformidade grave de difícil reparação. Nestes casos, não há como se prever um resultado positivo, pois está fora do alcance do médico plástico a recuperação se o grau de deformidade for elevado. Daí surge a responsabilidade de meio, excluindo-se, portanto, a responsabilidade de resultado. Assim, no que tange à responsabilidade do cirurgião plástico, deve-se inicialmente averiguar se a intervenção cirúrgica é estética ou corretiva. Se estética, a responsabilidade é de fim; se corretiva, a responsabilidade é de meio.

No sentido acima explanado, confira-se a lição infra-transcrita:
Importa, nessa especialidade, distinguir a cirurgia corretiva da estética. A primeira tem por finalidade corrigir deformidade física congênita ou traumática. [..] O médico, nesses casos, por mais competente que seja, nem sempre pode garantir, nem pretender, eliminar completamente o defeito. Tudo fará para melhorar a aparência física do paciente, minorar-lhe o defeito, sendo, às vezes, necessárias várias cirurgias sucessivas.

O mesmo já não ocorre com a cirurgia estética. O objetivo do paciente é melhorar a aparência, corrigir alguma imperfeição física – afinar o nariz, eliminar as rugas do rosto etc. Nesses casos, não há dúvida, o médico assume obrigação de resultado, pois se compromete a proporcionar ao paciente o resultado pretendido. Se esse resultado não é possível, deve desde logo alertá-lo e se negar a realizar a cirurgia.
 
Cumpre reverberar que, na opinião de Cavalieri Filho, malgrado o Código de Defesa do Consumidor assegurar a responsabilidade subjetiva para os profissionais liberais (Art. 14, § único), em se tratando de responsabilidade de fim ou resultado, existe a culpa presumida.

Dos pontos acima declinados tem-se que a responsabilidade do cirurgião plástico em caso de cirurgia estética é de resultado.

Em suma, diante das questões acima abordadas, depreende-se que versa a responsabilidade de resultado ou fim daquela modalidade em que não existe um “meio termo”, ou o agente atinge a finalidade para a qual foi contratado ou responderá pela inexecução ou execução mal sucedida.


2.4 RESPONSABILIDADE CIVIL DE MEIO
Diversamente da responsabilidade de fim, a responsabilidade de meio é aquela em que o agente não detém o poder de atingir o resultado esperado por aquele que contratou seu serviço.
No caso da responsabilidade de fim foi utilizado o exemplo do cirurgião plástico de intervenção estética para demonstrar que este tem o dever de atingir o resultado esperado pelo paciente.

Na responsabilidade de meio utilizar-se-á o exemplo do médico do setor de emergência. Ora, quando o paciente adentra um hospital em estado grave e acaba por falecer, não há como imputar ao médico, se este utilizou todos os procedimentos cabíveis para o caso, a responsabilidade por não ter salvo a vida daquele paciente. Neste caso, a responsabilidade é de meio e não de fim.

A propósito, confira-se a ponderação de Cavalieri Filho sobre esse tema:
Nenhum médico, por mais competente que seja, pode assumir a obrigação de curar o doente ou salvá-lo, mormente em estado grave ou terminal. A ciência médica, apesar de todo o seu desenvolvimento, tem inúmeras limitações, que só os poderes divinos poderão suprir. A obrigação que o médico assume, a toda evidência, é a de proporcionar ao paciente todos os cuidados conscienciosos e atentos, de acordo com as aquisições da ciência, para usar-se a fórmula consagrada na escola francesa. Não se compromete a curar, mas a prestar os seus serviços de acordo com as regras e os métodos da profissão, incluindo aí cuidados e conselhos.
 
Importante salientar que a relação médico-paciente é uma relação eminentemente de consumo, sendo, portanto, agasalhada pelo Código de Defesa do Consumidor.

Como foi exposto em momento anterior, a questão da responsabilidade no CDC é abarcada, em regra, pela modalidade objetiva. Assim, o médico, como um prestador de serviço ao seu paciente, não tendo logrado êxito em curar o mesmo, pela regra consumerista seria responsabilizado independentemente da prova de culpa. Contudo, o § 4° do Art. 14 preleciona que “A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa”. Extrai-se, portanto, que nos casos acima alinhavados, a responsabilidade médica, além ser de meio é subjetiva.

O exemplo acima alinhavado demonstra que é de meio e subjetiva a responsabilidade do médico do setor de emergência porque este não detém o poder sobre a vida, que é algo que vai além da sua capacidade técnico-profissional. Logo, diversamente da responsabilidade de fim, a responsabilidade civil de meio, em apertada síntese é aquela em que, apesar de ser cobrada do agente a utilização de todo o esmero na execução da atividade, não tem este o dever de resultado. 2.5 RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL
Tendo o presente capítulo apresentado as mais variadas espécies de responsabilidade civil, insta, por derradeiro, tratar das responsabilidades contratuais e extracontratuais.

Nesse subtítulo especificamente, abordar-se-á a responsabilidade civil contratual, ou seja, aquela emanada de uma violação de contrato.

Diversamente da responsabilidade aquiliana em que não há necessariamente qualquer ligação anterior entre lesionante e lesionado, a responsabilidade civil contratual exsurge quando resta afrontado um pacto, uma avença. Assim, verifica-se que nesta modalidade de responsabilidade os agentes envolvidos já tinham anteriormente uma relação.

Mesmo havendo um subtítulo posterior que versará a respeito da responsabilidade extracontratual é muito difícil fazer uma apresentação da responsabilidade contratual sem que haja uma abordagem, mesmo que a título de comparação, da responsabilidade aquiliana. Assim, neste momento, colaciona-se o entendimento exarado por Venosa em que o respeitável doutrinador faz uma comparação entre as duas espécies salientadas.
 
Na responsabilidade extracontratual, o agente infringe um dever legal, e, na contratual, descumpre o avençado, tornando-se inadimplente. Nesta, existe uma convenção prévia entre as partes, que não é cumprida. Na responsabilidade extracontratual, nenhum vínculo jurídico existe entre a vítima e o causador do dano, quando este pratica o ato ilícito.
 
 
Conforme se denota do trecho supra, na responsabilidade contratual existe o inadimplemento, o descumprimento de uma convenção estabelecida entre as partes, enquanto na extracontratual existe uma violação de um dever de zelo, de cuidado, mas nenhum pacto anterior existe.

Muito se fala em violação de dever preexistente na relação de responsabilidade contratual. Contudo, Sérgio Cavalieiri Filho encara como inadequada a noção de que dever preexistente somente existe na responsabilidade advinda de violação de contrato.

Confira-se a argumentação trazida na obra do respeitável doutrinador sobre essa questão:
Em suma: tanto na responsabilidade extracontratual como na contratual há violação de um dever jurídico preexistente. A distinção está na sede desse dever. Haverá responsabilidade contratual quando o dever jurídico violado (inadimplemento ou ilícito contratual) estiver previsto no contrato. A norma convencional já define o comportamento dos contratantes e o dever específico a cuja observância ficam adstritos. E como o contrato estabelece um vínculo jurídico entre os contratantes, costuma-se também dizer que na responsabilidade contratual já há uma relação jurídica preexistente entre as partes (relação jurídica, e não dever jurídico, preexistente, porque este sempre se faz presente em qualquer espécie de responsabilidade). Haverá, por seu turno, responsabilidade extracontratual se o dever jurídico violado não estiver previsto no contrato, mas sim na lei ou na ordem jurídica.
 
Feita a devida anotação a respeito da crítica lançada por Cavalieri a respeito da partícula preexistente como exclusiva da responsabilidade contratual, prossegue-se no estudo desta espécie de responsabilidade civil.

A responsabilidade contratual encontra-se disciplinada nos Artigos 395 e seguintes e Artigos 389 do Código Civil, conforme já explanado no capítulo 1 deste trabalho, no subtítulo denominado “Previsão Legal no Código Civil de 2002”.

Apesar de haver explicitamente no diploma legal civil a separação entre a responsabilidade contratual e a aquiliana, há quem critique essa diferença de tratamento, eis que entendem serem uniformes os efeitos de ambas. São os partidários da tese monista.

Para os adeptos da teoria monista, a responsabilidade contratual foi absorvida pela extracontratual, haja vista que o fato de alguém inexecutar um contrato importa em um delito, não havendo, portanto, que se dividir a responsabilidade civil em contratual e extracontratual, eis que ambas geram a mesma consequência, qual seja, o dever de ressarcir.

Para Carlos Roberto Gonçalves, contudo, o Brasil adota a tese dualista, ou clássica, porquanto cada uma dessas modalidades exige regulamentação própria, com peculiaridades visíveis e distinguíveis.

Tendo a responsabilidade contratual especificidades próprias, passa-se a demonstrar doravante, suas características.
 
A primeira, e talvez mais significativa, diz respeito ao ônus da prova. Se a responsabilidade é contratual, o credor só está obrigado a demonstrar que a prestação foi descumprida. O devedor só não será condenado a reparar o dano se provar a ocorrência de alguma das excludentes admitidas na lei: culpa exclusiva da vítima, caso fortuito ou força maior. Incumbe-lhe, pois, o ônus probandi.
 
Pela leitura do posicionamento acima apresentado, tem-se que de certa forma, lograr êxito em uma demanda de responsabilidade advinda de inadimplemento de contrato é mais fácil do que em uma responsabilidade aquiliana, pois, conforme exposto acima, faz-se necessário tão somente a comprovação de que o contrato não restou cumprido pela parte requerida. O elemento culpa é dispensável.

Aliás, nesse sentido manifesta-se Gonçalves:
A vítima tem maiores probabilidades de obter a condenação do agente ao pagamento da indenização quando a sua responsabilidade deriva do descumprimento do contrato, ou seja, quando a responsabilidade é contratual, porque não precisa provar a culpa. Basta provar que o contrato não foi cumprido e, em consequência, houve o dano.
 
No que tange aos pressupostos da responsabilidade contratual, estes são: a existência de contrato válido, a inexecução do contrato, o dano e o nexo causal.

Ora, “para que haja responsabilidade contratual é indispensável, em primeiro lugar, a existência de um contrato válido entre o devedor e o credor, eis que é essência dessa forma de responsabilidade a violação de um contrato”.

Note-se que o pressuposto versa sobre contrato válido, sendo, portanto, excluído contrato eivado de nulidade, posto que este nem chegou a vingar.

Este contrato válido, para fins de responsabilização necessita ser violado, ou seja, inexecutado, posto que conforme amplamente debatido no bojo do presente trabalho a responsabilidade emana de uma afronta a um dever. Faz-se ainda mister a ocorrência do dano e do nexo causal entre o dano sofrido pela vítima e a conduta do lesionante.

Finalizando a exposição desta modalidade de responsabilidade, insta elencar algumas formas de responsabilidade contratual trazidas na doutrina pátria: responsabilidade do transportador, do construtor, do incorporador, do profissional, instituições bancárias e do segurador.

Não há dúvidas que a questão da responsabilidade contratual é muito mais ampla e complexa do que as abordagens ora ventiladas. Contudo, este trabalho não teria condições de trazer todo o colossal conteúdo desse tema, abstendo-se, portanto, de adentrar nos pormenores da questão contratual, destacando, contudo, o cerne da modalidade contratual de responsabilidade.
 
 
2.6 RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL
Ultrapassada a questão da responsabilidade contratual urge apresentar a responsabilidade extracontratual, também denominada pela doutrina de aquiliana.

Sérgio Cavalieiri Filho utiliza ainda os termos ilícito aquiliano ou absoluto para remeter-se à modalidade de responsabilidade civil que “[...] surge em virtude de lesão a direito subjetivo, sem que entre o ofensor e a vítima preexista qualquer relação jurídica [...]”.

Conforme aventado no tópico anterior, onde se afirmou que o posicionamento de Cavalieiri é de que dever preexiste não é questão exclusiva da responsabilidade contratual, neste momento frisa-se tal posicionamento adotado pelo ilustre autor.

Assevera Cavalieiri que “se a transgressão pertine a um dever jurídico imposto pela lei, o ilícito é extracontratual, por isso que gerado fora dos contratos, mais precisamente fora dos negócios jurídicos”. [95] Assim, conforme entendimento deste jurista, apesar de não haver uma relação anterior de contrato/avença entre as partes, existe um dever de obediência à lei, dever esse que é anterior, portanto, preexistente, ao dano causado. Por isso que este doutrinador defende a tese de que existe sim um dever preexistente, não decorrente de convenção, mas da lei.

A responsabilidade extracontratual divide-se em: extracontratual subjetiva e objetiva. Enquanto a extracontratual subjetiva depende da comprovação do elemento culpa, a extracontratual objetiva prescinde de tal fator.

Outro aspecto a se destacar quanto à responsabilidade aquiliana é que, consoante já abordado esta advém de ato ilícito (conceituado no Art. 186 CC). Contudo, existem situações que apesar de causar dano a outrem (fora de uma relação contratual, e, portanto, gerariam responsabilidade extracontratual), por sua natureza, isentam o lesionante da responsabilização. São as circunstâncias trazidas no Art. 188 do Código Civil.

Quando alguém pratica um ato em legítima defesa ou no exercício de um direito, mesmo que tenha causado um dano a terceiro, sua conduta não é considerada pela lei civil como ato ilícito, não comportando, via de consequência, responsabilização. Este é o teor do inciso I do Art. 188 da lei civil. Já, se determinada pessoa destrói objeto de outrem para fins de afastar um perigo iminente, igualmente não será responsabilizada pelo dano causado a bem alheio, na conformidade ao Art. 188, II, do diploma civil.

Do exposto, tem-se que a responsabilidade aquiliana, decorrente de ato ilícito, não é rigorosa ao ponto de em qualquer situação de dano responsabilizar, eis que mesmo havendo dano, se houver a subsunção da norma esculpida no Art. 188 CC ao fato concreto, haverá isenção da responsabilização.

A norma do Art. 188 do CC deixa ainda claro que não será tolerada qualquer alegação para fins de isenção de responsabilidade no caso do inciso II. O § único deste dispositivo versa que “No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo”.

Urge apreciar doravante, a responsabilidade aquiliana por atos ilícitos e lícitos.
 
Via de regra a obrigação de indenizar assenta-se na prática de um fato ilícito. É o caso, por exemplo, do motorista, que tem que pagar as despesas médico-hospitalares e os lucros cessantes da vítima que atropelou, por ter agido de forma imprudente, praticando um ato ilícito.
Outras vezes, porém, essa obrigação pode decorre, como vimos, do exercício de uma atividade perigosa. O dono da máquina que, em atividade, tenha causado dano a alguém (acidentes de trabalho, p. ex.) responde pela indenização não porque tenha cometido propriamente um ato ilícito ao utilizá-la, mas por ser quem, utilizando-a em seu proveito, suporta o risco (princípio que se funda a responsabilidade objetiva).
 
Do acima ventilado tem-se que a atividade geradora do evento danoso tanto pode ser de cunho lícito, como em casos abarcados pela teoria do risco apresentada alhures, como advinda de uma atividade ilícita caracterizada pelo dolo, imprudência, negligência ou imperícia.

O certo é que em ambos os casos, restando preenchidos os requisitos do dever de reparação, a condenação do lesionante é patente, desde que não haja nenhuma excludente de ilicitude.

Até o presente momento não foram apresentadas todas denominadas excludentes de ilicitude, somente apreciando-se as do Art. 188 do CC. Portanto, neste momento inicia-se a análise de tais excludentes.

Existem situações que apesar de lesionarem outrem não determinam a responsabilização do agente causador do evento danoso. São as chamadas excludentes de ilicitudes, que além das encontradas no rol do Art. 188, são: a culpa exclusiva da vítima, o fato de terceiro, o caso fortuito e a força maior.

A culpa exclusiva da vítima, como o próprio nome sugere exclui o dever de reparação do agente lesionante porquanto o evento danoso ocorreu por desatenção da própria vítima.

Quanto ao fato de terceiro, este também é uma das excludentes e ilicitude, pois o evento danoso ocorreu por culpa de terceiro, sendo que o exemplo mais corrente trazido na doutrina pátria é do atropelamento de ciclista por ônibus em razão de aquele ter caído após passar em cima de buraco na via. Ora, o motorista somente atropelou porque o ciclista sofreu uma queda abrupta em sua frente. E o ciclista, por seu turno, somente caiu, pois havia uma falha grosseira na pista. Não há, portanto culpa nem do motorista nem da vítima, mas de terceiro responsável pela manutenção das pistas.

No que tange ao caso fortuito ou de força maior estes igualmente excluem o dever de indenizar porquanto o primeiro decorre de algo imprevisível enquanto o segundo exsurge de acontecimento inevitável, como fenômenos da natureza.

Os exemplos acima apresentados são pequenas amostras das excludentes de ilicitude, sendo que dependendo da doutrina pesquisada encontram-se ainda outras questões tidas como excludentes. Contudo, o presente trabalho procurou abordar as mais importantes e correntes na doutrina pátria.
De toda a exposição trazida neste subtítulo, tem-se, em síntese, que a responsabilidade civil extracontratual encontrada no ordenamento pátrio é aquela decorrente de uma atitude dolosa, negligente, imprudente ou imperita do agente causador do dano e que este agente somente exime-se do dever de reparação se comprovar a existência de uma das excludentes de ilicitude.

3 DA RESPONSABILIDADE CIVIL DAS INSTITUIÇÕES MÉDICAS E DO ESTADO POR SANGUE CONTAMINADO POR HIV
Tema instigante e digno de uma acurada análise é a questão da responsabilidade civil como agente punitivo (e reparador, sob a ótica da vítima) de instituições médicas e do Estado, por transfusões sanguíneas catastróficas, em que o paciente transfundido acaba por contaminar-se com o sangue corrompido com o vírus da AIDS.

As peculiaridades da responsabilidade civil já foram devidamente apresentadas nos dois capítulos anteriores, restando a este derradeiro capítulo do presente trabalho, a árdua tarefa de ventilar questões concernentes às instituições médicas; asseverar a respeito do vírus da AIDS; abordar sobre o escorreito e legal procedimento a ser adotado quando de uma transfusão sanguínea e por fim, demonstrar o tipo de responsabilidade imputada a cada agente causador do dano, consubstanciado na contaminação do paciente transfundido.
 
3.1 DAS INSTITUIÇÕES MÉDICAS
Uma curiosidade que se percebe ao pesquisar o tema do presente trabalho é que quando se chega à fase de apreciar as instituições médicas, o pesquisador depara-se com a necessidade de sedimentar seu trabalho não somente na questão dos hospitais em si, como também trazer a lume entidades que igualmente respondem por uma falha de transfusão, que são os bancos de sangue e centros de hemoterapias. Portanto, o presente trabalho versará não apenas sobre os hospitais, também denominados nosocômios, como igualmente abarcará instituições que trabalham com a coleta de sangue.

Na linha de raciocínio acima proposta, tem-se que o trabalho em deslinde terá por base a instituição médica como um gênero, do qual os hospitais, bancos de sangue e centros de hemoterapias são as espécies.

Hospital, segundo conceito trazido no dicionário Mini Aurélio é “Estabelecimento onde se tratam doentes, internados ou não”.

O conceito supra-apreendido demonstra certa fragilidade em se tratando de tema tão complexo quanto o proposto, que visa investigar e apontar qual a modalidade de responsabilidade imputada a um hospital que injeta sangue contaminado com o vírus HIV em seus pacientes.

Para fins de não ficar apenas na superficialidade do termo apresentado pelo dicionário, traz-se o conceito de hospital sob a ótica do Ministério da Saúde (MS), in verbis:
O hospital é parte integrante de uma organização médica e social, cuja função básica consiste em proporcionar à população assistência-médico-sanitária completa, tanto curativa como preventiva, sob quaisquer regimes de atendimento, inclusive domiciliar e cujos serviços externos irradiam até o âmbito familiar, constituindo-se também em centro de educação, capacitação de recursos humanos e de pesquisas em saúde, bem como de encaminhamentos de pacientes, cabendo-lhes supervisionar e orientar os estabelecimentos de saúde a ele vinculados tecnicamente. Assim o hospital é também um centro de investigação biopsicossocial.
 
 
É elementar que, conforme conceito extraído do dicionário, o hospital tem por finalidade o tratamento de doentes. Contudo, tal definição é frugal ante a amplitude e desdobramentos das atividades praticadas em um nosocômio, por isso a importante definição extraída do Ministério da Saúde.

Dentre as atividades complexas que se realizam em hospitais, as transfusões sanguíneas encontram-se enquadradas, e sendo cediço que a transfusão é atividade de risco de contaminação, indispensável apurar a responsabilidade dos hospitais por contaminações com o vírus HIV em razão de referidas transfusões.

É certo que muito dos sangues transfundidos a pacientes de hospitais emanam de bancos de sangues ou estabelecimentos hemoterápicos, eis que estes são responsáveis pela coleta, armazenamento e processamento do sangue. [102] Logo, imprescindível o conhecimento sobre tais entidades que, frise-se, muitas das vezes são responsáveis pela captação e conservação do sangue, para, em uma fase ulterior, encaminhar ao hospital que se incumbirá, através do médico competente, da transfusão desse sangue.

O art. 3° da Lei do Sangue (que será apreciada de forma mais acurada no subtítulo que versa sobre o “Procedimento da Transfusão Sanguínea”) preconiza a respeito das atividades hemoterápicas, a saber:
 
Art. 3° - São atividades hemoterápicas, para os fins desta Lei, todo conjunto de ações referentes ao exercício das especialidades previstas em Normas Técnicas ou regulamentos do Ministério da Saúde, além da proteção específica ao doador, ao receptor e aos profissionais envolvidos, compreendendo:
I - captação, triagem clínica, laboratorial, sorológica, imunoematológica e demais exames laboratoriais do doador e do receptor, coleta, identificação, processamento, estocagem, distribuição, orientação e transfusão de sangue, componentes e hemoderivados, com finalidade terapêutica ou de pesquisa;
II - orientação, supervisão e indicação da transfusão do sangue, seus componentes e hemoderivados;
III - procedimentos hemoterápicos especiais, como aféreses, transfusões autólogas, de substituição e intra-uterina, criobiologia e outros que advenham de desenvolvimento científico e tecnológico, desde que validados pelas Normas Técnicas ou regulamentos do Ministério da Saúde;
IV - controle e garantia de qualidade dos procedimentos, equipamentos reagentes e correlatos;
V - prevenção, diagnóstico e atendimento imediato das reações transfusionais e adversas;
[...]
VI - prevenção, triagem, diagnóstico e aconselhamento das doenças hemotransmissíveis;
VII - proteção e orientação do doador inapto e seu encaminhamento às unidades que promovam sua reabilitação ou promovam o suporte clínico, terapêutico e laboratorial necessário ao seu bem-estar físico e emocional.
 
Da leitura do dispositivo acima colacionado tem-se que as entidades hemoterápicas são aquelas em que existe o exercício de uma gama de ações concernentes desde a captação do sangue até diagnóstico e aconselhamento sobre doenças transmissíveis pelo contato com sangue contaminado.

Os centros de hemoterapia, através de suas atividades peculiares esboçadas no Art. 3º da Lei do Sangue, são entidades fornecedoras do sangue aos hospitais que atendem pacientes com quadro de necessidade transfusional. Assim, se houver uma contaminação de AIDS em decorrência de transfusão de sangue proveniente dessas entidades, sua responsabilização é patente.

Outro aspecto relevante a se suscitar é a responsabilização do Estado quando da ocorrência de uma contaminação desta espécie. Ora, existe lei federal que versa sobre a exclusividade de competência do Governo Federal a respeito do disciplinamento e controle da hemoterapia, o que revela ser inconteste a responsabilidade civil do Estado em casos de contaminação por transfusão de sangue. Assim, não há a necessidade de se criar um tópico específico sobre a responsabilidade civil do Estado, eis que esta é consequência lógica de uma atividade desenvolvida por uma instituição médica, sendo, plenamente cabível, portanto, sua abordagem concomitantemente à análise da responsabilidade das instituições médicas.
 
 

3.2 HIV
Sendo uma doença de elevadíssimo risco de morte, a AIDS vem abatendo milhares de pessoas mundo afora por seu caráter violento e letal.
 
É cediço da comunidade médica que tal doença ataca o sistema imunológico do contaminado e que sua transmissão advém basicamente de fluidos corporais de portadores que infectam, geralmente, os parceiros sexuais.

Deve-se atentar, todavia, que diversamente do pensamento do senso comum que a AIDS somente é transmitida por relações sexuais sem o uso de preservativo, tal doença pode advir de situações diversas, dentre as quais, transfusão de sangue contaminado.

A par das questões supra abordadas, deve-se fazer um “raio-x” detalhado dessa doença, desde seu conceito até as formas de contaminação, para fins de um entendimento acerca da proporção do dano causado a um contaminado.

Iniciando pelo conceito e consequências da doença, confira-se posicionamento externado por Azevedo:
 
A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA), também conhecida como AIDS, foi identificada, em meados de 1981, como o conjunto de sinais e sintomas provocados por uma grave deficiência do sistema imunológico que é causada por um vírus que compromete, seriamente, a saúde do indivíduo, porque elimina as células de defesa de seu organismo.

Esse vírus, denominado vírus da imunodeficiência humana (VIH), também conhecido como HIV, danifica, violentamente, o sistema imunológico da pessoa, que fica suscetível a toda sorte de doenças e infecções, inclusive as que raramente são contraídas. E esse colapso do sistema de defesa vai-se agravando, progressivamente, levando a pessoa à morte, em curto espaço de tempo.

Esclareça-se que as pessoas portadoras do vírus HIV não morrem de AIDS, mas de uma ou mais doenças, denominadas infecções oportunistas, que estão associadas à AIDS e que, normalmente, não causam a morte de uma pessoa saudável, que esteja livre do vírus HIV.

Como esse vírus torna o sistema imunológico da pessoa ineficaz, doenças e infecções que normalmente são combatidas por essa defesa natural do organismo tornam-se mortais em pessoas portadoras do vírus da AIDS. (destaques não constam do original)
 
Da lição acima colacionada tem-se que AIDS é uma doença proveniente de um vírus que afeta o sistema imunológico do portador e que o torna passível de morte por ocasião de doenças corriqueiras, que em uma pessoa saudável normalmente não o levariam ao óbito.

Tal vírus gera gravíssimas lesões ao infectado, podendo, com uma simples pneumonia falecer em virtude de complicações decorrentes desta doença, que a princípio, parecia algo simples. Eis, portanto o caráter avassalador do vírus HIV.

A sintomática e evolução do vírus HIV é bem compreendida através da exposição do Ministério da Saúde, que através de seu portal eletrônico referente às doenças sexualmente transmissíveis apresenta com maestria os sintomas e as fases da AIDS, o que se colaciona:
 
Quando ocorre a infecção pelo vírus causador da aids, o sistema imunológico começa a ser atacado. E é na primeira fase, chamada de infecção aguda, que ocorre a incubação do HIV - tempo da exposição ao vírus até o surgimento dos primeiros sinais da doença. Esse período varia de 3 a 6 semanas. E o organismo leva de 8 a 12 semanas após a infecção para produzir anticorpos anti-HIV. Os primeiros sintomas são muito parecidos com os de uma gripe, como febre e mal-estar. Por isso, a maioria dos casos passa despercebido.

A próxima fase é marcada pela forte interação entre as células de defesa e as constantes e rápidas mutações do vírus. Mas que não enfraquece o organismo o suficiente para permitir novas doenças, pois os vírus amadurecem e morrem de forma equilibrada. Esse período, que pode durar muitos anos, é chamado de assintomático.

Com o frequente ataque, as células de defesa começam a funcionar com menos eficiência até serem destruídas. O organismo fica cada vez mais fraco e vulnerável a infecções comuns. A fase sintomática inicial é caracterizada pela alta redução dos linfócitos T CD4 - glóbulos brancos do sistema imunológico - que chegam a ficar abaixo de 200 unidades por mm³ de sangue. Em adultos saudáveis, esse valor varia entre 800 a 1.200 unidades. Os sintomas mais comuns são: febre, diarréia, suores noturnos e emagrecimento.

A baixa imunidade permite o aparecimento de doenças oportunistas, que recebem esse nome por se aproveitarem da fraqueza do organismo. Com isso, atinge-se o estágio mais avançado da doença, a aids. Quem chega a essa fase, por não saber ou não seguir o tratamento indicado pelos médicos, pode sofrer de hepatites virais, tuberculose, pneumonia, toxoplasmose e alguns tipos de câncer. Por isso, sempre que você transar sem camisinha ou passar por alguma outra situação de risco. [...]
 
No que tange à forma de contaminação/transmissão pelo vírus da AIDS, deve-se deixar de lado o vetusto estereótipo de que somente sofrem contaminação dessa doença pessoas preconceituosamente denominadas depravadas.

Tempos atrás, havia a idéia de que, sendo a AIDS doença advinda de contaminação de sangue e fluidos corporais, os portadores do vírus eram pessoas com vida desregrada e que mantinham relações sexuais com diversos parceiros.

Ora, de fato é certo que da relação sexual desprotegida existe a possibilidade de haver a contaminação pelo vírus, mas deve-se entender que outras são as maneiras de contaminação pela doença.

Por oportuno, traz-se a lição apresentada na obra AIDS e Responsabilidade Civil, in verbis:
 
[...] Segundo pesquisas realizadas, o vírus da AIDS pode ser transmitido pela troca, de uma pessoa para outra, de determinados fluidos do organismo, em razão de seu posterior contato com a corrente sanguínea.

Entre esses fluidos, somente o sangue, o sêmen ou a secreção da próstata, a secreção vaginal e o leite humano são capazes de transmitir o vírus da AIDS, em virtude da alta concentração de HIV que pode ser encontrada neles.

Constatou-se, portanto, que o vírus da AIDS pode ser transmitido da seguinte maneira: por meio de relações sexuais, pelo intercâmbio de sêmen ou secreções da próstata e de secreções vaginais, que, posteriormente, entram em contato com a corrente sanguínea, provocando a contaminação; pelo compartilhamento de seringas não esterilizadas, usada para injeção de drogas endovenosas, em razão do contato com sangue contaminado que permaneceu nas agulhas; em virtude do recebimento de doações de sangue, leite humano, órgãos e outros tecidos humanos que estejam contaminados pelo vírus; por meio de inseminação artificial, pela utilização de sêmen ou óvulo contaminado; pela utilização de instrumentos contaminados, não esterilizados; e, finalmente, da mãe para o filho, durante a gravidez, por ocasião do parto ou pela amamentação.

Por essa razão, considera-se comportamento de risco de contaminação a pluralidade de parceiros sexuais e a utilização, em grupo, de drogas psicotrópicas injetáveis, e encontram-se em situação de risco as pessoas que receberam transfusão de sangue ou doações de leite, órgãos e tecidos humanos. Essas pessoas integram os denominados “grupos de risco”, em razão de seu comportamento facilitar sua contaminação. (destaques não constam do original)
 
Do ensinamento acima coligido, resta nítido que variadas são a formas de contaminação pelo HIV, inclusive transfusões com sangues impuros.

A fim de apurar a real face da doença em tela, faz-se necessário demonstrar de forma cabal a implicação dessa contaminação na vida de uma pessoa, eis que ao final do presente capítulo haverá a demonstração do dano, dentre eles o moral. Assim, oportuno trazer alguns dos sintomas do qual um soropositivo padece para uma fiel aferição em sede de dano, dos prejuízos morais e patrimoniais comportados.

O indivíduo portador do vírus HIV tem perda considerável de peso em curto espaço de tempo; sofre de profunda fadiga capaz de acamá-lo por dias e até mesmo semanas; feridas orais grandes e de longa duração; prolongadas febres; irregularidades intestinais e urinárias; irritações na pele; tuberculose; pneumonia, sendo que estas últimas, em muitos casos, levam a pessoa a falecer.

Insta salientar que o paciente não suporta apenas a doença em si, mas também os efeitos colaterais decorrentes da medicação por ele utilizada para controle do vírus. 

Ora, “O tratamento da AIDS consiste na utilização de um “coquetel de drogas”, com os denominados “inibidores de protease”, que agem no organismo, reduzindo a quantidade de vírus circulantes na corrente sanguínea [...]”. Portanto, sopesando a fragilidade do indivíduo que padece dessa doença com a potência dos medicamentos que faz uso para controle do vírus tem-se a bombástica e inteligível reação de enfraquecimento do organismo. Das exposições acima declinadas tem-se induvidoso o caráter cruel e muitas vezes mortal da AIDS. 3.3 PROCEDIMENTO DA TRANSFUSÃO SANGUÍNEA
O conceito de sangue, segundo Mini Aurélio Século XXI – O minidicionário da língua portuguesa é “Líquido que transita pelo sistema circulatório levando material nutritivo e oxigênio às células, e delas trazendo produtos de desassimilação e dióxido de carbono; consiste em plasma e em células [hemácias, leucócitos, plaquetas]”.
O sangue, conforme conceito supra, é o líquido responsável por transportar os materiais necessários à nutrição e oxigenação das células do organismo, daí sua importância para os seres vivos.
Tamanha a importância conferida pelo ordenamento pátrio à questão do sangue que a Constituição Federal versa sobre o tema em seu art. 199, § 4º, a saber:
 
Art. 199 [...]
§ 4º - A lei disporá sobre as condições e os requisitos que facilitem a remoção de órgãos, tecidos e substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa e tratamento, bem como a coleta, processamento e transfusão de sangue e seus derivados, sendo vedado todo tipo de comercialização.
 
Tendo a Constituição Federal incumbido o legislador infraconstitucional de regulamentar a coleta, processamento e transfusão de sangue, coube à Lei n° 10.205, de 21 de março de 2001, tal tarefa, sendo que o art. 2° desta norma preconiza a respeito do sangue, conforme se depreende da leitura infra:
 
Art. 2° - Para efeitos desta Lei, entende-se por sangue, componentes e hemoderivados os produtos e subprodutos originados do sangue humano venoso, placentário ou de cordão umbilical, indicados para diagnóstico, prevenção e tratamento de doenças, assim definidos:
I - sangue: a quantidade total de tecido obtido na doação;
II - componentes: os produtos oriundos do sangue total ou do plasma, obtidos por meio de processamento físico;
III - hemoderivados: os produtos oriundos do sangue total ou do plasma, obtidos por meio de processamento físico-químico ou biotecnológico. [113] (destaques não constam do original)
 
Superada a fase de apresentação do conceito de sangue e sua normatização no ordenamento jurídico brasileiro, cumpre adentrar no procedimento da transfusão sanguínea.

O “líquido da vida” pode ser disponibilizado, eis que é renovável. Assim, um ser humano pode, sem prejuízo de sua saúde, retirar de seu organismo certa quantia de sangue para atender a necessidade de outrem. Esse processo altruístico de retirada de sangue em prol de terceiro necessitado chama-se doação de sangue. A pessoa que recebe o sangue passa pelo processo chamado de transfusão de sangue.

Em consulta ao Portal Educação foi possível extrair um conceito acurado de transfusão de sangue, bem como sua finalidade e apreciação acerca do risco concreto de contaminação.

Observe-se: A transfusão de sangue é a transferência de sangue ou de um hemocomponente (componente do sangue) de um indivíduo (doador) a outro (receptor). As transfusões são realizadas para aumentar a capacidade do sangue de transportar oxigênio, para restaurar o volume sanguíneo do organismo, para melhorar a imunidade ou para corrigir distúrbios da coagulação. Dependendo do motivo da transfusão, o médico pode prescrever sangue total ou um hemocomponente como, por exemplo, eritrócitos, plaquetas, fatores da coagulação sanguínea, plasma (a parte líquida do sangue) fresco congelado ou leucócitos. Sempre que possível, é realizada a transfusão apenas do hemocomponente que suprirá a necessidade específica do paciente, e não de sangue total. A administração de um hemocomponente específico é mais segura e evita o desperdício dos demais. Nos Estados Unidos, são realizadas anualmente aproximadamente 15 milhões de transfusões. Graças às melhores técnicas de triagem do sangue, as transfusões atualmente são mais seguras que nunca. No entanto, elas ainda apresentam riscos para o receptor (p.ex., reações alérgicas e infecções). Apesar da chance de infecção pelo vírus da AIDS ou da hepatite por transfusão ser remota, os médicos estão bem conscientes desse risco e somente a prescrevem quando não existe outra alternativa. (destaques não constam do original)
 
Sobre a questão do sangue humano com a finalidade de salvar vidas através do sistema de doação sanguínea, confira-se ainda importante argumentação do jurista Marcos de Almeida Villaça Azevedo:
 
O sangue é considerado parte destacável e renovável do corpo humano, o que possibilita que seu titular dele disponha, para fins humanitários e terapêuticos. Sua doação a bancos de sangue permite que eles atendam a necessidades prementes de hospitais e estabelecimentos de saúde, no sentido de preservar a vida e a saúde de pessoas. [115]
 
Acontece que a transfusão de sangue não é algo tão singelo quanto parece. Pelo contrário, é procedimento que, por envolver risco de contaminação é bastante complexo.

Conforme exposto no subtítulo que versou sobre a AIDS, uma das formas de contrair o vírus HIV é através de contaminação sanguínea, dentre as quais se engloba a transfusão de sangue.

Aliás, confira-se a ponderação de Azevedo a respeito da questão:
 
Acontece que o sangue de uma pessoa soropositiva apresenta grande concentração do vírus HIV. Desse modo, a AIDS pode ser transmitida por meio de transfusão de sangue, de seus componentes ou derivados, caso seu doador seja transfundido para uma pessoa não portadora do vírus. Nesse caso, o sangue contaminado entra na corrente sanguínea da pessoa receptora, e esta é infectada pelo vírus HIV.
 
Como se observa se não houver um efetivo cuidado na receptação do sangue é real o risco de estar-se transfundindo um sangue contaminado em um paciente.
Visando, portanto, atenuar os riscos de transfusão de sangue contaminado, o Brasil tem adotado uma política de prevenção à receptação de sangue impuro. Dessa forma, com a intervenção estatal, através da criação de procedimentos específicos para coleta sanguínea, procurou-se, se não exterminar, ao menos minimizar as chances de referida contaminação.

Pioneiro na edição de lei concernente à captação sanguínea, o Estado de São Paulo elaborou, em 20 de junho de 1986, a Lei n° 5.190, “que estabelece a obrigatoriedade de testes para detecção de anticorpos do vírus da AIDS, em todo sangue, componente de sangue e produto derivado do sangue, utilizado para transfusão”.

O livro AIDS e a responsabilidade civil, de autoria de Marcos Azevedo imputa à referida lei o caráter de precursora no combate à contaminação por transfusões de sangue, porquanto, no Brasil ainda não havia uma política efetiva de averiguação da qualidade do sangue captado. Confira-se o posicionamento infra exarado:
 
Em razão dessa lei, os hospitais, os bancos de sangue, as maternidades e os centros hemoterápicos, da rede privada, da rede pública estadual, bem como os particulares subvencionados pelo Estado, a partir dessa data, passaram a ser obrigados a realizar testes para detecção de anticorpos do vírus da AIDS, em todo material recolhido para transfusões de sangue e/ou derivados.
 
Em 1987 foi a vez do Estado do Rio de Janeiro elaborar sua lei a respeito do tema. Referida norma versa sobre a obrigatoriedade de serem feitos testes para verificação da qualidade do sangue.

No ano de 1988 foi editada a Lei Federal n° 7.649, de 25 de janeiro, denominada Lei Henfil, com a finalidade de estabelecer diretrizes sobre o controle da qualidade do sangue. Esta norma restou regulamentada pelo Decreto n° 95.721/88.

Consoante teor das legislações supra (Lei Henfil e Decreto n° 95.721/88) deve-se fazer um cadastramento do doador de sangue, sendo, por conseguinte, realizados “[...] exames laboratoriais para detectar a hepatite B, a sífilis, a doença de Chagas, a malária e a AIDS, segundo consta do art. 3° da Lei sub examine (art. 10, § 1° do aludido Decreto)”.

A respeito da ventilação supra, preconiza o Art. 3° da Lei Henfil e o Art. 10, § 1° do Decreto n° 95.721/88:
 
Art. 3° - As provas de laboratório referidas no art. 1° desta Lei incluirão, obrigatoriamente, aquelas destinadas a detectar as seguintes infecções: Hepatite B, Sífilis, Doença de Chagas, Malária e Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS).
Art. 10 – Compete ao Ministério da Saúde estabelecer as normas gerais sobre tipo de provas e testes laboratoriais, técnicas a serem empregadas e outros requisitos e condições, para o fie comprimento deste decreto.
 § 1° - Os exames e testes de laboratório referidos neste artigo incluirão, obrigatoriamente, para todo o território nacional, os destinados a detectar Hepatite “B”, Sífilis, Doença de Chagas e Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (AIDS) e, para zonas endêmicas a serem definidas pelo Ministério da Saúde, aqueles destinados à detecção da Malária.
 
Em caso de ser detectada qualquer dessas doenças a lei preconiza que o sangue deverá ser eliminado.

Digno de nota que, não apenas as leis estaduais, a federal e o decreto citado são os norteadores da questão do controle de qualidade do sangue. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) expediu uma série de resoluções com a finalidade de regular a matéria. O Ministério da Saúde igualmente desincumbiu-se de nortear a questão, ao expedir, por exemplo, a Portaria n° 790/2002 que versa sobre a estrutura do Plano Nacional de Sangue.

Impende ainda repisar que em 21 de março de 2001 foi publicada a Lei n° 10.205 (já mencionada quando da conceituação de sangue), que, conforme dispõe seu art. 1° versa sobre:
[...] a captação, proteção ao doador e ao receptor, coleta, processamento, estocagem, distribuição e transfusão de sangue, de seus componentes e derivados, vedada a compra, venda ou qualquer outro tipo de comercialização do sangue, componentes e hemoderivados, em todo o território nacional, seja por pessoas físicas ou jurídicas, em caráter eventual ou permanente, que estejam em desacordo com o ordenamento institucional estabelecido nesta Lei.
 
A lei acima apresentada é constituída de dois Títulos, sendo o primeiro denominado de Disposições Preliminares e o segundo de Da Política Nacional do Sangue, Componentes e Hemoderivados.

No transcurso de seus 27 Artigos (pois o Art. 19 restou vetado), a lei acima abordada versa, em apertada síntese, sobre o que são consideradas atividades hemoteráticas; a competência do Ministério da Saúde para elaborar Normas Técnicas para tais atividades; a necessidade da presença de médico hemoterapeuta ou hematologista quando do exercício de qualquer questão que envolva o sangue; o ordenamento institucional, entre outras questões.

Interessante ressaltar que o Capítulo II, Do Título II da lei em epígrafe, prescreve sobre importantes temas, tais como “obrigatoriedade de responsabilidade, supervisão e assistência médica na triagem de doadores, que avaliará seu estado de saúde, na coleta de sangue e durante o ato transfusional [...] (Art. 14, VII)”, bem como a “obrigatoriedade para que todos os materiais ou substâncias que entrem em contato com o sangue coletado, com finalidade transfusional, bem como seus componentes e derivados, sejam estéreis, apirogênicos e descartáveis” (Art. 14, X).
Outro aspecto importante da Lei do Sangue é o fato de ela vedar a testagem conjunta do sangue coletado, sendo obrigatório que o teste seja feito de forma individualizada, nos termos de seu Art. 14, XII.

Passa-se à elucidação concernente à transfusão de sangue em si, nas palavras de Azevedo, in verbis:
As transfusões devem ser realizadas por médico ou profissional de saúde habilitado, qualificado, e só podem ser feitas em local em que haja, pelo menos, um médico presente, que possa intervir em casos de reações ou complicações.

O paciente deve ter os seus sinais vitais verificados e registrados antes do início da transfusão. Os primeiros dez minutos de transfusão devem ser acompanhados pelo médico ou profissional de saúde qualificado para tal, que deve permanecer ao lado do paciente durante este intervalo de tempo. Durante o transcurso do ato transfusional o paciente deve ser periodicamente observado para possibilitar a detecção precoce de eventuais reações adversas. Se houver alguma reação adversa o médico deve ser chamado imediatamente.
 
Com tanta legislação regulando sobre o controle de qualidade do sangue doado, poderia chegar-se a ilusória conclusão de que o sangue advindo de doação e posteriormente transfundido é totalmente isento de impurezas, ou seja, completamente sadio. Todavia, Maria Helena Diniz é enfática em demonstrar que essa suposta segurança apresenta muito mais fragilidade do que se pode imaginar. Confira-se o que apregoa a insigne doutrinadora em sua obra O Estado Atual do Biodireito, in verbis:
 
É preciso não olvidar que no estágio atual do conhecimento humano o sangue a ser transfundido raramente será 100% seguro, porque os testes disponíveis na esfera não só nacional, mas também mundial, não podem levar à segurança absoluta da ausência de risco para o paciente, pois, como é sabido na comunidade científica, sempre haverá a possibilidade de existência da chamada janela imunológica, que se caracteriza pela produção de testes com resultados falsos negativos, já que os atualmente à disposição algumas vezes não são capazes de detectar a presença de doenças transmissíveis pelo sangue em alguns portadores saudáveis, o que poderá ocorrer, por exemplo, com certos portadores do vírus da AIDS, cujos testes poderão não detectar a presença do vírus transmissor da patologia. (destaques não constam do original)
 
A grande vilã da transfusão de sangue segura é a chamada janela imunológica que, conforme informação constante do site AIDS:
[...] é o intervalo de tempo entre a infecção pelo vírus da Aids e a produção de anticorpos anti-HIV no sangue. Esses anticorpos são produzidos pelo sistema de defesa do organismo em resposta ao HIV e os exames irão detectar a presença dos anticorpos, o que confirmará a infecção pelo vírus.
 
Quanto à janela imunológica, esta pode dar ensejo a um resultado falso negativo, haja vista que pode acontecer de na época da coleta do material para exame ainda não ter ocorrido a produção de anticorpos anti-HIV no sangue, eis que na maioria dos casos, para que o exame aponte resultado positivo para HIV é necessário um intervalo de 30 a 60 dias após a exposição ao HIV. Há casos ainda que o tempo pode ser maior.

Dos pontos acima declinados resta patente a possibilidade de haver um aproveitamento, através de transfusão, de um sangue contaminado com a AIDS, porquanto, em razão da janela imunológica, o doador pode ser considerado, em sede dos exames, isento da doença, quando na verdade o que ocorre é que ela existe em seu organismo, mas ainda não se manifestou.

Para constar, impende colacionar um trecho da matéria disponibilizada no site Pró-Sangue, em que esta entidade apela para o bom senso dos doadores de sangue para que não efetuem a doação se estiverem dentro do grupo de risco (usuários de drogas intravenosas e/ou possuírem múltiplos parceiros sexuais sem uso de preservativo), exatamente por haver a possibilidade do resultado anti-HIV sair negativo em decorrência da janela imunológica.
 
Importante: Se você é usuário de droga intravenosa, tem múltiplos parceiros sexuais, acha que sua saúde ou comportamento podem colocar em risco a vida de quem for receber seu sangue, ou sua real intenção é de apenas realizar o teste para o vírus HIV, NÃO DOE SANGUE, procure os Centros de Testagem e Aconselhamento.

Apesar de o sangue doado ser testado para as doenças transmissíveis conhecidas no momento, existe um período chamado de janela imunológica em que um doador contaminado por um determinado vírus já pode transmitir a doença através do seu sangue; entretanto, os testes realizados na bolsa ainda são negativos. Essa janela imunológica pode acontecer para os vírus HIV, HTLV I/II e para os vírus da Hepatite C e B. Por essa razão, se você pertence a alguma das situações acima, deve ser honesto no questionário e não doar sangue, pois você pode estar no período de janela imunológica. DA SUA HONESTIDADE DEPENDE A VIDA DE QUEM VAI RECEBER SEU SANGUE.
 
Ante a vulnerabilidade da detecção da AIDS, não há dúvidas que um paciente que é submetido a uma transfusão pode sair desse procedimento contaminado com a nefasta doença, o que demonstra a plausibilidade de se aventar acerca da responsabilização civil nesses casos.
 
 

3.4 TIPO DE RESPONSABILIDADE
Uma questão que deve ficar bem clara para que não haja qualquer dúvida no tocante à responsabilidade é que o Estado, enquanto ente de direito público interno tem o dever de fiscalização no concernente à matéria que envolva o sangue e seus derivados.

Conforme demonstrado no subtítulo anterior existem leis que normatizam o controle de qualidade do sangue, dentre as quais a Lei n° 10.205/2001, também denominada de Lei do Sangue, onde resta claro que o Estado, através do Ministério da Saúde é o responsável pela expedição de normas e o Órgão de Vigilância Sanitária, pela concessão de autorização anual para execução de atividades hemoteráticas. (Art. 3°, § 2° da lei)

Infere-se ainda que o Ministério da Saúde é a entidade responsável pelo credenciamento dos hemocentros e afins, o que implica em dizer novamente que o Estado tem total interesse na questão do sangue.

É no Título II da referida lei que resta cristalina a competência do Estado no tocante ao controle do sangue, porquanto o Art. 8° e seguintes prescreve acerca da composição do Sistema Nacional de Sangue (SINASAN), cuja criação visou a garantia da auto-suficiência do país e harmonização das ações do poder público em todos os níveis de governo, feita com a elaboração da Política Nacional do Sangue, Componentes e Hemoderivados.
 
Destaque-se que algumas atividades são exercidas sob a autorização e fiscalização do Estado, como a coleta, o armazenamento e a transfusão de sangue, a remoção e o transplante de órgãos e tecidos e o armazenamento de leite humano, existindo entre o Estado e os estabelecimentos que exercem tais atividades um vínculo de preposição, sendo aquele o comitente e estes os prepostos.
[...]
Desse modo, os estabelecimentos que são autorizados pelo Estado a exercer atividade subordinada a regras por este estabelecidas, e sob sua fiscalização (vigilância), consideram-se seus prepostos e, consequentemente, seus “agentes”, que, como tal, prestam serviço público.

Portanto, se forem causados danos a terceiros, em razão de atividade autorizada e fiscalizada pelo Estado, caberá a este o ressarcimento de tais prejuízos, tendo, ou não, sido constatada conduta culposa de seu agente ou preposto. (destaques não constam do original)
 
Analisando pormenorizadamente referida norma, exsurge induvidoso que a incumbência de fiscalização e controle do sangue é do Estado, através de seus agentes. Logo, analisar-se-á, primeiramente, a responsabilidade do Estado por contaminação com o vírus HIV decorrente de transfusão de sangue.

Aliás, confira-se o posicionamento infra:
Normalmente, o sangue utilizado nas transfusões é fornecido pelos denominados bancos de sangue e centros de hemoterapia, que são entidades que recebem doações de sangue e o armazenam, conservando suas qualidades, para ser utilizado, oportunamente, caso uma pessoa necessite.

Tendo em vista a possibilidade e o risco de o vírus ser transmitido por transfusão de sangue, houve necessidade de o Estado intervir nas atividades hemoterápicas, criando regras e procedimentos que devem ser seguidos, estritamente, pelos bancos de sangue, serviços de hemoterapia e entidades afins, para evitar novas contaminações pelo vírus da AIDS. (destaques não constam do original)
 
Fazendo remissão ao capítulo referente às “Modalidades de Responsabilidade Civil” do presente trabalho, tem-se que o Estado tem responsabilidade civil objetiva, ou seja, não há que se adentrar no mérito, se houve ou não culpa. Destarte, se o paciente sofreu o dano, consubstanciado na contaminação com o vírus da AIDS e o dano decorreu da transfusão de sangue (nexo causal), o Estado está obrigado a reparar/indenizar.
 
Sem a intenção de se aprofundar na extensa matéria relativa à responsabilidade civil do Estado, cumpre tecer breves considerações para demonstrar seu dever de ressarcir os danos causados às pessoas que forem contaminadas pelo vírus da AIDS, em razão de transfusões de sangue, transplantes de órgãos e tecidos e alimentação com leite humano. Será examinada, portanto, a responsabilidade extracontratual dessa pessoa jurídica de direito público.

A responsabilidade civil do Estado também sofreu uma evolução, com o passar do tempo, e teve de adequar-se às necessidades e aos reclamos da sociedade, para uma melhor tutela de seus interesses, pois repugnava ao Direito uma pessoa não ser ressarcida por um dano ou ter o difícil ônus de provar uma culpa anônima, para obter sua reparação; isso, em razão de um risco criado pelo próprio Estado.
 
Veja que não se discute se houve ou não a culpa do Estado, ou seja, não se questiona se o Estado, através de suas entidades de controle e fiscalização deixou ou não de cumprir seu papel. Sendo a responsabilidade objetiva, não há que se perquirir se houve conduta dolosa ou culposa, apenas imputa-se o dever de indenizar. Ademais, sendo um evento danoso decorrente não de uma relação contratual com o Estado, mas de um ato ilícito – sua omissão quanto à fiscalização -, além de objetiva, a responsabilidade do Estado é aquiliana ou extracontratual.

Confira-se entendimento de Azevedo sobre a responsabilidade civil do Estado nesses casos de contaminação sanguínea em transfusão de sangue.
 
[...] Portanto, basta a demonstração de que o dano teve como causa o funcionamento de um serviço público, para que se verifique a responsabilidade do Estado, não havendo necessidade de a pessoa lesada demonstrar que tal serviço não funcionou, que foi tardio ou inoportuno ou que funcionou mal, concluindo-se, pois, que a responsabilidade extracontratual do Estado é objetiva pura.
 
No que tange à responsabilidade das instituições médicas, confiram-se as considerações infra.
O que se observa na jurisprudência pátria é que, quando de um pleito indenizatório em que o autor, que é a pessoa contaminada pela AIDS em decorrência de transfusão de sangue, postula ação de indenização em face do hospital, este denuncia à lide o hemocentro, e quando o Tribunal aprecia a questão da legitimidade, julga pela responsabilidade solidária de hospital e hemocentro.

Outro fator que se verifica ao consultar os julgados dos mais variados tribunais pátrios é que tais Cortes, em geral, afastam a corrente alegação dos réus (hospitais e hemocentros) de que à época da transfusão ainda não havia a obrigatoriedade de testes de detecção do vírus, o que implicaria em isentar suas responsabilidades. Segundo o levantamento feito dos acórdãos, o que se depreende é que os desembargadores não acatam a argumentação de “falta de regulamentação legal de testes de detecção de doenças em sangue” para fins de eximir os hospitais e hemocentros da responsabilidade de reparar o dano, eis que entendem que por ser o atendimento desses entes ao paciente decorrente de um contrato, devem valer-se de muita cautela e de uma prestação de serviços satisfatória.

No que concerne ao tipo de responsabilidade das instituições médicas, esta é contratual, eis que deriva de um contrato de prestação de serviço que o paciente, ao adentrar seu recinto e lá ser tratado, tacitamente firma com tal entidade.

Sendo uma responsabilidade civil contratual decorrente de prestação de serviço infere-se que, pela lógica esculpida no Código de Defesa do Consumidor, tal responsabilidade é também objetiva.

Deve-se, todavia, atentar que analisando alguns julgados de tribunais de nosso país verifica-se que existem posicionamentos no sentido de que somente será objetiva a responsabilidade da instituição médica se a transfusão de sangue ocorreu antes da entrada em vigor do Código de Defesa do Consumidor, haja vista que este é que veio a consagrar a espécie objetiva de responsabilidade do prestador de serviço.

Estes são, em apertada síntese, os elementos mais importantes a serem abordados no concernente à responsabilidade, tanto do Estado quanto das instituições médicas, por transfundir sangue corrompido com AIDS a seus pacientes.
 
 

3.5 DO DANO CAUSADO
Uma pessoa acometida pelo vírus HIV sofre uma série de prejuízos no tocante a sua saúde. Os sintomas dessa doença, que já foram abordados no subtítulo denominado “HIV”, são tremendamente danosos e causam terrível sofrimento ao paciente.

A doença, conforme antes aventado, afeta o sistema imunológico do portador, o que implica em dizer que doenças simples, sem qualquer carga de periculosidade em pessoas saudáveis são extremamente ameaçadoras e podem até levar o paciente portador da AIDS à morte.

Na esteira do pensamento acima esposado, tem-se que o indivíduo submetido à transfusão de sangue e acaba sendo contaminado pelo vírus HIV é ferido não só em sua saúde física como também em sua moral. 

Ora, a doença é muito voraz e sem sombra de dúvida abala todo o emocional daquele que por ela é contaminado. Ademais, apesar de existirem campanhas de combate à discriminação ao portador do vírus da AIDS é cediço que o preconceito torna-se parte da vida do indivíduo que contrai a doença. Destarte, resta incontroverso que existe o dano moral em casos de contaminação de AIDS por transfusões de sangue impuro.

De outro norte não há que se olvidar que o dano material também se revela presente em casos de contaminação dessa natureza, eis que a pessoa contaminada passa a depender de uma série de medicamentos para controle do vírus, sendo que o custo destes é elevadíssimo. Destarte, além do dano moral existe ainda o dano patrimonial do indivíduo.

No que tange ao dano, traz-se à baila a lição infra:
[...] a transmissão do vírus da AIDS causa lesões gravíssimas nos direitos da personalidade da pessoa que é contaminada, principalmente em sua integridade física e em sua vida. Também são atingidas a liberdade e a intimidade da pessoa soropositiva, que é discriminada e impedida de exercer determinada atividade, e que tem seu estado de saúde revelado a terceiros, injustificadamente.

Destaque-se, neste passo, que essas lesões também acarretam danos materiais à pessoa contaminada, pois acaba necessitando de tratamento, que é complexo e tem um custo muito elevado, sem esquecer-se da pessoa portadora do vírus HIV, que acaba sofrendo constrangimentos e preconceitos, os quais, muitas vezes, a impedem de exercer um trabalho ou uma profissão, ficando a mesma desamparada, economicamente.

Por essa razão, aquele que, direta ou indiretamente, provocar as lesões referidas deverá ser responsabilizado por todos os danos experimentados pela pessoa lesada, tanto materiais como os morais.
 
Pelas questões ventiladas, resta clarividente o dever do causador do dano em ressarcir, bem como o direito inarredável do paciente contaminado em receber a devida reparação pelos imensos e incontestes prejuízos ao qual ficará vinculado por toda a sua vida.
 
 

3.5.1 Dano Material
No que concerne ao dano material sofrido pelo paciente que contrai AIDS em razão de transfusão de sangue contaminado este é incontroverso, sendo, portanto, analisado neste momento do trabalho.

Com efeito, para que reste efetivamente demonstrada a ocorrência deste dano, deve-se elucidar acerca do mesmo, apresentando seu conceito e peculiaridades, para fins de traçar um esboço a respeito dele.

Como bem acentua Carlos Roberto Gonçalves, existem duas categorias de danos, os patrimoniais, também chamados de materiais e os extrapatrimoniais, igualmente conceituados de morais.

Objeto da presente análise, dano material “é o dano que afeta somente o patrimônio do ofendido”, ou seja, é a espécie de dano que lesiona a estrutura financeira; por decorrência do sinistro a vítima acaba por despender gastos (dano emergente) ou deixar de auferir renda (lucro cessante).

O Art. 402 do Código Civil assim preconiza a respeito do critério para reparação do dano material, “Salvo exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar”.

As considerações esculpidas no artigo supracitado referem-se às perdas e danos que abarcam tanto o dano emergente quanto o lucro cessante, que nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves são assim definidos:
Dano emergente é o efetivo prejuízo, a diminuição patrimonial sofrida pela vítima. É, por exemplo, o que o dono do veículo danificado por outrem desembolsa para consertá-lo. Representa, pois, a diferença entre o patrimônio que a vítima tinha antes do ato ilícito e o que passou a ter depois. Lucro cessante é a frustração da expectativa de lucro. É a pena de um ganho esperado.
 
No caso de uma pessoa que em dado momento necessitou dos préstimos de uma instituição médica para fins de receber uma transfusão de sangue e em virtude de referido procedimento acaba acometida da grave doença que é a AIDS dificilmente terá sua vida da maneira que era antes da contaminação pelo vírus.

Segundo informa o Ministério da Saúde, o portador do vírus HIV, para fins de evitar ou atenuar a disseminação do vírus pelo organismo necessita de medicamentos antirretrovirais, que agirão, não de forma a exterminar o vírus, mas amenizar sua influência no enfraquecimento do sistema imunológico. Essa mesma fonte assegura que desde o ano de 1996 nosso país “distribui gratuitamente o coquetel antiaids para todos que necessitam do tratamento”.

Apesar de haver o acesso gratuito dos portadores à medicação imprescindível para seu tratamento, através da Unidade Dispensadora de Medicamentos, não há como negar que existe um custo muito elevado que, malgrado a existência desta unidade, o paciente acaba tendo que arcar.

Ora, a AIDS, conforme já explanado, causa um grande impacto na imunidade da pessoa. Assim, a pessoa acometida desta doença, antes de descobrir que está contaminada com esse vírus, sofrerá uma série de sintomas desagradáveis e que lhe causarão muito desconforto. E esse indivíduo, sem saber de qual mal está padecendo, buscará tratamento para a doença oportunista. Conforme exposto alhures, no começo o portador do vírus pode confundir seu mal estar com uma simples gripe, por exemplo. Destarte, despenderá gastos com medicamentos de combate à gripe. Isso só a título de exemplo, pois existe uma série de outras doenças que atacarão este indivíduo antes que ele percebe que algo mais grave está acontecendo. E enquanto o teste não é feito e a doença não é diagnosticada, os gastos com remédios serão feitos, configurando o dano patrimonial sofrido pela pessoa. Aí está a natureza do dano material do tipo dano emergente que a vítima sofre.
Deve-se atentar, contudo, que existe ainda uma outra modalidade de dano material que a vítima possivelmente sofrerá que é o lucro cessante, ou seja, o lucro que a pessoa nem chegou a angariar. Exemplo disso pode ser um caso em que o portador do vírus HIV é vendedor ambulante, auferindo, portanto renda diária, mas em razão da gravidade e da intensidade da atuação da doença em seu organismo deixa de laborar por estar muito debilitado.

Sobre essa questão dos gastos médicos e até mesmo, em casos em que a doença é letal, de despesas de funeral, leciona com muita propriedade o i. Marcos Azevedo ao aduzir:
[...] nos casos de transmissão do vírus da AIDS, a indenização deve compreender o pagamento de todas as despesas de tratamento e internação da pessoa lesada, inclusive os medicamentos e os honorários médicos (danos emergentes), bem como dos lucros cessantes, devidos até o fim da convalescença, conforme preceitua o art. 1.538 do Código Civil, combinado com o art. 1.059 desse mesmo Diploma legal.

Prevê, ainda, o art. 1.537 desse Estatuto Civil que, se a pessoa leasada vier a falecer, além das despesas de tratamento, mencionadas, deverá o lesante pagar, ainda, as despesas de funeral, bem como alimentos ao cônjuge viúvo, caso este não tenha fonte de renda, e, eventualmente, aos filhos menores do falecido.

Esse mesmo dispositivo legal menciona, ainda, que o lesante deverá indenizar o luto da família, cabendo ao Juiz arbitrar um montante indenizatório, que compreenda, de um lado, uma sanção ao causador do dano, e, de outro, uma compensação pela dor e sofrimento experimentados pelos familiares do falecido, principalmente o cônjuge viúvo e os filhos. Devem, pois, ser indenizados os danos morais a eles causados, em razão da perda ou privação por eles sofrida.
 
A gravidade da doença pode ensejar, conforme acima exposto, a morte da pessoa. Nesses casos, no entendimento traçado por Azevedo, corroborando a prescrição do Art. 1.537 do Código Civil, haverá outras implicações, como por exemplo, o ressarcimento dos gastos com o funeral e até mesmo, dependendo do caso concreto, a condenação do lesionante ao pagamento de alimentos ao cônjuge supérstite que comprove que dependia financeiramente do de cujus e/ou aos filhos menores.
 
 

3.5.2 Dano Moral
Além do dano material, o portador do vírus da AIDS que assumiu essa condição por ocasião de uma transfusão sanguínea, deve ser ressarcido em dano moral.

Hodiernamente muito se ventila a respeito do dano moral, sem que de fato se saiba realmente em que este consiste. A massificação do pedido de dano moral junto ao Poder Judiciário, tamanha a insensatez dos argumentos para tal pleito, tem sido vista com muita cautela pelos julgadores, ante o perigo de banalizar referido instituto.

Para fins de afastar qualquer dúvida a respeito do verossímil sentido do dano moral, traz-se o conceito do mesmo, nas palavras de Azevedo.
 
[...] o dano moral compreende invasão injusta na esfera jurídica da personalidade da pessoa, sendo atingidos sentimentos e valores que compõem sua essência, causando à mesma sensações desagradáveis, como dores, sofrimentos, angústias, traumas, complexos, inibições, vexames, constrangimentos etc.
 
Da lição supra sobre resta cristalino que a vítima de contaminação pelo vírus da AIDS nas condições entabuladas neste trabalho tem total direito à indenização por danos morais. A dor, o trauma e principalmente o medo constante da morte é algo presente nesses casos.

A agressividade dessa doença é inquestionável. Malgrado a evolução no tratamento da doença, o futuro de um indivíduo portador do HIV é sem sombra de uma incógnita, levando em conta que uma simples gripe pode complicar-se e virar uma pneumonia e causar-lhe a morte.

Considere-se ainda o fato do portador ser arrimo de família e conviver com a incerteza de seu amanhã e do futuro de sua família por ocasião da instabilidade da saúde que tal doença que causa. O medo da morte e a terrível sensação de que poderá deixar sua família a mercê da própria sorte é algo que ataca o psicológico desta pessoa.

Leve-se em conta ainda o fato de esta pessoa ter em sua mente, dia após dia o sentimento de ressentimento e muitas vezes revolta por ter sido acometido de uma doença em virtude de uma falha gravíssima de uma instituição médica que deveria lhe levar a cura e acabou por causar-lhe um mal terrível, uma doença penosa.

Todas as questões acima suscitadas demonstram de forma cabal o direito à indenização por dano moral ao indivíduo contaminado pelo vírus da AIDS em virtude de transfusão de sangue.

Não há que se falar, em tais casos, em “indústria do dano moral”, expressão hodiernamente utilizada para rechaçar pedidos de indenização descabidos. Casos de contaminação nos termos abordados no presente trabalho são indiscutivelmente causadores de uma profunda e imensurável dor, tanto para a pessoa contaminada como para sua família.

Fora as questões de cunho psicológico que o portador sofrerá outros são os dissabores pelo qual passará. O preconceito ainda é algo existente quando o assunto é AIDS. O portador dessa doença é alvo de uma série de discriminações e por diversas vezes encontrar-se-á em situações vexatórias e de dissensão.

Pelos fatos até então alinhavados, resta compreensível o posicionamento dos tribunais pátrios em condenar, concomitantemente à indenização por danos materiais, o lesionante a pagar os danos morais enfrentados pelo portador da AIDS que adquiriu esta condição por uma prestação de serviço falha.

O ressarcimento por dano moral amenizar a dor da vítima e ao mesmo tempo punir o agente causador do evento danoso, de forma a desestimular atitudes semelhantes de lesão.

Impende ainda salientar que havendo a morte do portador do vírus da AIDS é cabida a indenização por danos morais que à família deste, em virtude do sofrimento enfrentado, primeiramente pela própria vítima e também pela dor causada aos próprios familiares do indivíduo. Este é o entendimento dos tribunais de nosso país no que tange ao cabimento de ressarcimento aos parentes da vítima.

Por derradeiro, insta argumentar que posicionamento diverso, ou seja, que não entenda pelo cabimento da indenização por dano moral estaria lançando por terra a natureza do próprio instituto da responsabilidade civil bem como feriria o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, pois contrair uma enfermidade desta natureza dentro de uma instituição que tem por função prezar pela saúde dos pacientes é algo totalmente inaceitável e digno de reprimenda, tendo em conta o caráter mortífero da AIDS.  

CONCLUSÃO

Por toda a abordagem feita no bojo do presente trabalho conclui-se que a contaminação pelo vírus HIV através de transfusões sanguíneas não é algo irreal, pelo contrário, plenamente possível e, portanto, digna de acurado tratamento por parte de todos os ramos de conhecimento.

 

O Direito enquanto ciência humana que visa alcançar a justiça não pode ficar alheio ao problema das contaminações em procedimentos de transfusões de sangue, cabendo ao operador do Direito, como agente de estudo e busca pela solução pacífica de problemas sociais, apresentar sua parcela de contribuição para fins de aniquilar ou ao menos minimizar tal problemática.

 

Atuando como promotor da efetiva responsabilização do Estado e das instituições médicas que injetam sangue impuro em seus pacientes, o Direito, através de seus mais variados segmentos, cria condições propícias a um acentuado decréscimo na quantidade de casos de infecção com a temida doença AIDS dentro de instituições que deveriam primar pela saúde de seus pacientes.

 

Responsabilizar as entidades causadoras por este evento danoso é tarefa que compete a cada aplicador da lei ao caso concreto, ou seja, os magistrados, mas não exime os demais estudiosos da ciência do Direito da corrente apreciação e incessante estudo sobre o tema para fins de aprimorar leis que versam sobre o tema bem como ajudar na fundamentação de cada sentença e acórdão que julgar a matéria.

Pela apreciação da matéria tratada na presente monografia resta clarividente o posicionamento tanto da doutrina pátria como dos tribunais de nosso país no sentido de condenar instituições médicas e Estado por contaminar pacientes que padecem em seus leitos com AIDS através de transfusões sanguíneas em que o sangue injetado não tem a qualidade que deveria ser verificada em sede de fiscalização.

 

Embora haja posicionamentos minoritários no sentido de eximir de responsabilidade essas entidades quando a ocorrência da transfusão se deu antes da entrada em vigor da lei que torna obrigatório o teste de detecção do vírus da AIDS, o entendimento majoritário do ordenamento jurídico brasileiro é de que o Estado e as instituições médicas devem ressarcir os lesionados tanto em danos materiais como em danos morais.

 

Outra questão aferida no transcurso do trabalho é que a responsabilização do Estado e das instituições médicas é objetiva, ou seja, basta que reste comprovado o dano e o nexo causal para que a vítima tenha o direito à justa reparação do dano.

 

Quanto ao Estado é objetiva por força de norma constitucional que prescreve que este ente de direito público interno, ao agir de forma a lesionar outrem, responde independentemente de comprovação de culpa.

 

No que tange às instituições médicas, como agem dentro de relações de consumo, como prestadoras de serviço e, o Código de Defesa do Consumidor adotou a regra da responsabilidade objetiva, igualmente restarão condenadas ao pagamento de indenizações aos indivíduos lesionados, mesmo que não se demonstre a ocorrência de conduta dolosa ou culposa.

 

Aferida a responsabilidade objetiva tanto das instituições médicas quanto do Estado, mas por dispositivos legais diversos, passa-se à conclusão quanto à outra espécie de responsabilidade, contratual ou extracontratual.

 

As instituições médicas, ao internarem seus pacientes tornam-se por eles responsáveis por força de um contrato, ainda que tácito, de prestação de serviços médicos. Destarte, saindo um paciente de uma sala de transfusão de sangue acometido de AIDS, este, dentro de seu direito subjetivo à indenização, poderá pleitear a justa reparação pelo dano sofrido e o fará fundamento seu pleito em responsabilidade contratual daquele hospital ou centro de hemoterapia ou afins. Derivando de um contrato firmado entre paciente e instituição médica, o pleito pela ocorrência de um sinistro será consubstanciado nas peculiaridades do instituto da responsabilidade civil objetiva e contratual.

 

No que concerne ao Estado, este como agente que não firmou qualquer contrato, ainda que tácito com o indivíduo, diversamente dos nosocômios ou bancos de sangue e afins não restará responsabilizado dentro dos ditames da responsabilidade contratual, mas extracontratual.

Como foi demonstrado ao longo deste trabalho, a responsabilidade civil aquiliana ou extracontratual é aquela que emana de uma conduta alheia a qualquer relação contratual. Deriva sim, de um evento ilícito.

 

Quando o Estado deixa de fiscalizar as entidades que manipulam o sangue, age de forma reprovável e negligente, o que torna plenamente plausível sua inclusão no pólo passivo de uma demanda que visa a reparação de danos materiais e morais.

 

Na esteira das abordagens supra, resta configurada a responsabilidade objetiva e extracontratual do Estado quando houver lide que envolva contaminação por HIV em razão de transfusão de sangue.

 

Pelas questões até então ventiladas, cumpre salientar que o trabalho em deslinde alcançou seu objetivo eis que, dentro da temática desenvolvida, houve a demonstração da plausibilidade de um pleito indenizatório em face das instituições médicas e do Estado quando da ocorrência de lesão consubstanciada em contaminação com o vírus da AIDS nos termos apresentados e, conforme salientado alhures, não obstante haja posicionamento divergente quando a transfusão ocorreu antes da obrigatoriedade de testes de verificação da qualidade do sangue doado, tal posicionamento é minoritário e não tem o condão de refutar as brilhantes teses acatadas pelo ordenamento jurídico pátrio para fins de condenar os agentes lesionantes.

 

Outro aspecto que demonstra o alcance dos objetivos desta monografia é a apresentação de fundamentos jurídicos hábeis a condenar o agente lesionante tanto em danos materiais como em danos morais.

 

Tamanha a necessidade de se reparar o dano causado e ante a repugnância do ato causador do dano, existe o cristalizado entendimento de que se deve, além de ressarcir os danos materiais da vítima, os danos morais advindos da própria natureza da doença que é extremamente agressiva e abala a estrutura emocional do portador.

 

Pelos pontos acima declinados, resta incontroverso que a ordem jurídica pátria entende ser procedente o pleito por reparação de danos morais e materiais em face de instituições médicas e do Estado que lesionam seus pacientes quando de transfusões sanguíneas com sangue contaminado com o vírus da AIDS.

 

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Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


Priscila Figueiredo da Mata Medeiros

por Priscila Figueiredo da Mata Medeiros

Especialista em Educação a Distância -- UCDB e Portal Educação. Bacharel em Ciências Jurídicas - UCDB. Acadêmica de Letras - UEMS. Inglês Básico; Curso de Latim - NEL/UEMS; Curso de Espanhol - NEL/UEMS; Curso de Língua Brasileira de Sinais - (Nível I); Curso de Extensão em Biodireito; Curso "Como Produzir um Curso a Distância".

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