Papel do enfermeiro forense nas lesões por armas de fogo

Papel do enfermeiro forense nas lesões
Papel do enfermeiro forense nas lesões

Direito

20/03/2013

Vamos falar sobre as lesões provocadas por arma de fogo, mas para interpretarmos estas lesões é necessário um conhecimento básico de armas de fogo e suas munições.

Genericamente, uma arma é todo o instrumento destinado ao ataque e à defesa. Desde que a pólvora foi inventada, as armas de fogo têm se desenvolvido e cada vez são mais rápidas, tão rápidas que os nossos olhos não conseguem ver. Isto dificulta a avaliação de lesões e confunde os profissionais de saúde.

Embora possa parecer uma imensa variedade de armas, na prática, podemos dividir em mais ou menos, em três tipos:

- pistolas e metralhadoras

- caçadeiras

- espingardas e metralhadoras

As armas de fogo são classificadas pelos seguintes critérios: dimensões, funcionamento, modo de carregar, modo de percussão e calibre.

Em relação às dimensões as armas de fogo podem ser portáteis ou não portáteis.

As armas portáteis, também, conhecidas como individuais, são todas aquelas que podem ser transportadas e acionadas por uma única pessoa.

São as mais usadas, e, por isso, as que mais interessam na investigação forense. Podem ser de cano curto e cano longo.

Nas armas de cano curto temos as pistolas e os revólveres. Nas de cano longo temos as metralhadoras e as espingardas (estas são menos usadas nos casos forenses).

Em relação ao Funcionamento as armas podem ser automáticas, semiautomáticas e repetição.

As armas automáticas são aquelas que têm o funcionamento e o disparo automático. Geralmente, são armas de guerra, como por exemplo: metralhadoras pesadas.

As armas semiautomáticas são as que têm o funcionamento automático, porém o disparo é manual. Exemplos: revólver e pistola semiautomática.

As armas de repetição são as armas que exigem manuseamento completo para cada disparo, por exemplo: pistola.

Em relação ao modo de carregamento, as armas podem ser de antecarga ou retrocarga. As armas de antecarga são as armas que recebem a munição pela parte anterior do cano (boca), por exemplo: espingarda.

As armas de retrocarga são as armas que recebem a munição pela parte posterior do cano, no pente ou no tambor, por exemplo: revólver, pistola.

Em relação ao modo de Percussão (choque de dois corpos, neste caso, o percussor atinge a espoleta para transmitir fogo à pólvora), as armas podem ser de pederneira, de espoleta ou de percussão direta no cartucho.

A pederneira, sem qualquer importância para a Balística Forense por tratar-se de arma arcaica que consistia na produção de faísca pelo contato de percussor com uma pedra de sílex. Hoje se encontra completamente abolida.

A espoleta trata-se de um revestimento de metal que contém fulminato de mercúrio, que quando é percutido, explode e produz uma chama/faísca que irá desencadear a detonação.

O calibre da arma trata-se do diâmetro da boca da arma assim como o diâmetro do projétil (bala).

Na balística externa é importante percebermos o alcance da arma de fogo que não se trata nem mais nem menos da distância máxima a que o projétil pode ser lançado.

O projétil trata-se de um instrumento perfuro contundente, que na maioria dos casos é feito de chumbo ou coberto de uma liga metálica (níquel, estanho, ferro, antimônio, etc.).

O projétil pode ser constituído por uma bala (projétil simples) ou por grãos de chumbo (projétil múltiplo).

Os movimentos do projétil são essencialmente os de propulsão ou de deslocação para frente, que é resultado da força de expansão dos gases da pólvora, e da rotação, que lhe é comunicado pelas ranhuras do cano da arma, de modo a combater a resistência do ar.

A velocidade dos projéteis vai depender de vários fatores, mas principalmente do tipo de arma, pois quanto maior é sua velocidade, maior é sua força.

Se o projetil tiver um obstáculo na sua trajetória, irá sofrer uma série de modificações, tais como a fragmentação, a deformação, o esmagamento e a mudança de direção. (Almeida, 2010)

Existem muitos modelos e tipos de bala, e, portanto, o tipo de bala recuperada é significativa para o perito da arma de fogo. É importante separar as balas das diferentes lesões separadamente, a menos que isso seja impossível.

A detecção de resíduos da descarga da bala é fundamental, pois é possível detectar nas costas da mão do agressor (indivíduo que disparou), vestígios de metais de bário, antimónio e chumbo, provenientes do cartucho (da bala).

Para recolha destas amostras deve-se usar:

- algodão ou cotonetes ponta humedecida com ácido clorídrico a 10% ou com ácido nítrico a 5% são utilizados para recuperar.

A equipe forense deve compreender os aspetos básicos das lesões por arma de fogo, para poderem participar na investigação (documentação da cena do crime e coleta de evidências).

A documentação das lesões é fundamental na investigação forense. Numa lesão por arma de fogo e necessário avaliarmos e documentarmos três itens:

- Alcance do tiro

- Angulo do impacto

- Fatores interpostos (entre a arma e a vitima)

Ao falarmos em alcance do tiro estamos a avaliar a distancia do cano da arma (ou tiro) até ao alvo.
O alcance do tiro classifica-se em três tipos:

- Curto ou próximo alcance

- Médio alcance

- Longo ou distante alcance

(Russell, 1999)

O angulo do impacto permite-nos perceber a direção do disparo, a posição da arma, o tipo de arma. (Psit, 1993)

Na maior parte dos crimes, a bala ao atingir o alvo vai perfurar e atravessá-lo produzindo um orifício de entrada e um orifício de saída.

Lesões podem ter um orifício de entrada maior do que o orifício de saída, por diversas razões, por exemplo:

- O orifício de entrada tangencial pode ter um orifício menos angulado.

- As situações em que os tecidos moles à entrada da bala são rasgados por pressão dos gases (nos tiros de alcance curto) e orifício de saída é de tamanho médio, relativamente muito menor.

O orifício de entrada é como o próprio nome o indica o ponto de entrada da bala na vítima. Na maioria dos casos, encontra-se na pele, mas pode encontrar-se na mucosa num dos orifícios naturais (boca, nariz, etc.).

A forma do orifício de entrada depende da maneira que o projétil atingiu o alvo, estando, também, relacionada com a distância do tiro (encostado, à queima-roupa e a distância).

Se o projétil for disparado encostado ao alvo, vai romper e dilacerar os tecidos moles onde penetra sobtensão, produzindo, assim, orifício de entrada irregular, denteado, e algumas vezes com as margens invertidas, pelo efeito da bala.

Se o projétil for disparado à queima-roupa, o orifício de entrada assume uma forma arredondada ou oval, circundada por orlas e zonas.

Se o projétil disparado foi à distância, atinge a pele de raspão sem perfurá-la, produzindo apenas escoriações alongadas.

A dimensão do orifício de entrada depende da distância do tiro, da resistência dos tecidos e do próprio projétil, podendo ser igual, maior ou menor do que o calibre do projétil. O orifício de entrada é usualmente menor do que o calibre do projétil que o produziu.

As orlas e zonas de contorno são marcas caraterísticas ou manchas que se encontram em torno do orifício de entrada de um tiro, variando de acordo com a distância deste.

Estas aparecem porque o projétil ao ser disparado não vem só, mas acompanhado de chama, pólvora, gases, impurezas ou sujidade do cano da arma, etc., tudo isso formando um cone, chamado “cone do tiro”. (Lopes, 2002)

A trajetória é o caminho descrito pelo projétil desde o seu ponto de disparo até atingir o alvo. Por vezes confunde-se trajetória com trajeto, mas quando falamos em trajeto trata-se do percurso seguido pelo projétil dentro do alvo.

O orifício de saída só se apresenta nas lesões abertas, ou seja, nos casos de trajeto fechado esse não se verifica. O orifício de saída é produzido pelo projétil propriamente dito, isoladamente ou reforçado por corpos outros que a ele se juntem no trajeto do mesmo (roupa, botões, ossos, dentes).

O orifício de saída possui algumas caraterísticas que o distinguem do orifício de entrada, são elas:

- Maior que o orifício de entrada

- Tem um aspeto de fenda, quando o projétil não sofre deformação, ou forma irregular, quando este se deforma ou arrasta consigo alguns fragmentos, apresenta o rebordo invertido

- Não apresenta orlas, nem zonas de contorno, salvo uma aréola equimótica

- Apresenta maior sangramento
(Lopes, 2002).

A descrição da localização e as caraterísticas da ferida, não são suficientes para determinar se são feridas de entrada ou de saída.

Outro aspeto muito importante no exame e documentação da investigação são as roupas.

A preservação, análise e retenção da roupa devem ser destacadas e consideradas como uma prioridade em todos os casos de lesões por arma de fogo. Sem a roupa, pode ser difícil de determinar o tipo de disparo, isto é, se uma arma for disparada na proximidade de vestuário com alguma espessura, os resíduos são mais suscetíveis de ser sobre a roupa exterior, e não sobre a pele.

A roupa não deve ser cortada ou rasgada através do buraco da bala, sempre que for possível, em vez disso a roupa deve ser cortada no meio, à volta, a certa distância do buraco da bala.

O manuseio incorreto das roupas vai dificultar os exames em laboratório. Assim como, se for necessário remover cabelo ou pelos junto da ferida para realizar algum tratamento, devem ser preservados para análise de resíduos de tiro.
Os efeitos internos das balas são frequentemente mal interpretados. Uma bala tem capacidade para:

- Esmagamento, perfuração, e arrancamento

- Alongamento e corte

- Atrito

- Aquecimento

- Distorção, expansão e fragmentação

- Transmitir ligeiro movimento para o alvo

- Geração de ondas sonoras

- Sair e atacar outra coisa

- Rotação sobre o eixo longitudinal

Em termos práticos, existem duas principais interações entre bala e corpo:

- Esmagamento, perfuração, e arrancamento do tecido devido à passagem da bala. Isto depende do tamanho, configuração e atitude da bala à medida que penetrando alvo.

- Alongamento ou salpicar, quando a bala passa através do tecido, ele deixa um rastro ou salpicos, semelhante a um barco a acelerar, ou a uma pedra atirada à água.

Este efeito é também conhecido como cavitação temporária. Portanto, quando se olha para uma ferida, temos de ter em conta duas coisas:

- O caminho ao longo do qual a bala passou

- A quantidade de salpicos e estiramento ao longo das margens do tecido onde a bala passou.

A balística da lesão é o estudo da combinação destes dois efeitos, isto é, o estudo da interação dos projeteis e dos tecidos.

A documentação das lesões é fundamental. A enfermeira deve garantir a recolha de toda a informação necessária, seguindo uma checklist e preenchendo-a devidamente.

Para cada ferida, deve observar os seguintes itens:

- Localização

- Dimensão

- Natureza

A localização do orifício de entrada em relação a pontos de referência, tais como a linha média, a cabeça, isto é usando um diagrama.

A dimensão deve-se usar uma régua e usar a medida mais usada (cm) complementando com fotos.

A natureza inclui o tamanho e a descrição da ferida de entrada e de quaisquer caraterísticas que não sejam fuligem e manchas de pó deve ser registado. Fazer anotações relativas ao estado da roupa no local.

Observe quaisquer resíduos de bala visíveis, manchas, e fuligem na pele ou na roupa.

Concluindo a equipa forense tem que perceber que uma simplificação exagerada e suposições a respeito de balística podem comprometer processos de investigação (legais).

A preservação de provas e documentação é da responsabilidade dos profissionais de saúde.

Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


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