O Brasil ocupa a sexta posição no ranking de assassinatos
Direito
19/04/2013
O Brasil ocupa a sexta posição no ranking de assassinatos, seja de sua população em geral ou de sua população jovem (15 a 24 anos). Em ambos os casos, ele está atrás apenas dos seguintes países: El Salvador, Ilhas Virgens (EUA), Venezuela, Colômbia e Guatemala, todos estes países das Américas, e com características socioeconômicas distintas.
Vejamos alguns números da nossa violência juvenil, compilados no Mapa da Violência 2011: os Jovens no Brasil. O estudo revela, entre outras coisas, que há um novo padrão da mortalidade juvenil no Brasil, e ele estaria associado à substituição das mortes decorrentes de doenças pelas mortes denominadas violentas (homicídios, acidentes de trânsito e suicídios). Analisaremos aqui, apenas as mortes decorrentes de homicídios.
Se no Brasil a taxa de homicídios por 100 mil habitantes aumentou em 1,9% entre 1998 a 2008, por outro lado, a taxa de homicídios entre os jovens (15 a 24 anos) aumentou 19,9% no mesmo período. Ou seja, ela foi 10 vezes superior.
Como bem aponta o estudo, “se a magnitude de homicídios correspondentes ao conjunto da população já pode ser considerada muito elevada, a relativa ao grupo jovem adquire caráter de epidemia.” Isto porque, em 2008, os jovens representavam 34,6% do total da população, mas os homicídios neste grupo etário correspondem a 36,6% do total de homicídios na população, “indicando que a vitimização juvenil alcança proporções muito sérias”.[1]
Analisados por regiões, observarmos que a região Nordeste passa de penúltimo lugar em 1998, com 33,3 homicídios de jovens por 100 mil habitantes, ao primeiro lugar no ano de 2008, registrando uma taxa de 63,8/100 mil. Apesar do estado de Pernambuco ter registrado uma queda, a taxa de homicídios de jovens ali ainda é muito alta (106,1/100 mil), sendo superada apenas pelo estado de Alagoas que registrou, em 2008, a taxa mais alta de todo o país 125,3/100 mil.
O crescimento dos homicídios entre jovens no estado de Alagoas foi superior a 300% no período de 1998 a 2008 que é mais de três vezes superior ao crescimento registrado na região Nordeste (91,6%).
Na região Norte, destaca-se o estado do Pará, que passa da segunda menor taxa de homicídios (24,1/100 mil) entre os jovens em 1998, para a segunda maior taxa (71,3/100 mil) em 2008. Por sua vez, Roraima, que era o estado que apresentava a maior taxa de homicídios juvenis em 1998 (82,5/100 mil), registrou, em 2008, a menor taxa (18,1/100 mil), o que equivale a uma redução de 78% nos homicídios da população jovem.
Chama à atenção também o surpreendente aumento das taxas de homicídios entre os jovens registrados na região Sul do país. Foi o maior aumento verificado nas regiões (106,1%) no período analisado. Apesar de não crescer muito no ranking nacional – a região passa do último lugar (24,2/100 mil), em 1998, ao penúltimo (50/100 mil) em 2008 –, as chances dos jovens daquela região serem vítimas de homicídios mais do que duplicaram. Destacam-se os aumentos verificados nos estados do Paraná (157,3%) e em Santa Catarina (124,6%), que, no ano de 2008, registrou o segundo melhor IDH no Brasil.
Na região Centro-Oeste houve a menor variação de crescimento (42,1%) no período de 1998 a 2008. Merece aqui, especial destaque, o estado de Goiás, que passou de 19,6 homicídios de jovens por 100 mil habitantes para 57,7/100 mil, registrando um aumento de 194%. Com o menor crescimento no período (2,2%), o Distrito Federal continua liderando o ranking da região, com 77,2 homicídios de jovens por 100 mil habitantes em 2008.
No Sudeste, por sua vez, os números, apesar de ainda altos, são mais alentadores. Esta foi a única das cinco regiões de país que verificou uma redução na taxa de homicídios. Da região mais violenta do país, em 1998, com uma taxa de 69,4 homicídios de jovens/100 mil habitantes, à região menos violenta em 2008, com 43,5/100 mil, número inferior à média nacional. Os números dessa região poderiam ter sido melhores não fosse o aumento de 209,6% registrado no estado de Minas Gerais. Em 1998, Minas Gerais era o quarto estado brasileiro com menor taxa de homicídios entre os jovens, caindo cinco posições em 2008.
É importante registrar também, que a despeito de toda a percepção popular sobre violência, é no estado de Espírito Santo – e não no Rio de Janeiro – que se encontram as maiores taxas de homicídios entre os jovens, com 120/100 mil registrados em 2008.
Ao analisar os números, podemos concluir que a participação das regiões nos homicídios na população jovem sofreu mudanças nesses últimos 10 anos, da mesma forma que os homicídios no total da população.
Por enquanto, os números revelam-nos um aumento de mortes entre os jovens e uma nova distribuição espacial destas mortes. É importante ressaltar que, para compreender o fenômeno, não basta apenas analisar os números. Isto porque cada morte tem seu conjunto de determinantes e causas, “irredutíveis em sua diversidade e compreensíveis só a partir de seu contexto específico”.
Desta forma, cabe-nos perguntar: o que explicaria essas mudanças? Por que algumas regiões, relativamente seguras para a juventude, tornaram-se mais inseguras? Sabemos que a maior parte das mortes é causada por armas de fogo. Mas como os jovens têm acesso a elas?
O que explicaria o aumento de mortes de jovens em relação ao conjunto da população? Elas estariam associadas à participação desses jovens em organizações criminosas, seriam causadas por desavenças pessoais ou por uma maior vitimização da juventude pela polícia?
Tomemos, agora, como exemplo o caso dos dois países centro-americanos – El Salvador e Guatemala – que nos superam na violência juvenil para levantarmos algumas questões.
Diversos estudos apontam que a violência juvenil na Guatemala e em El Salvador estaria fortemente associada à atuação das maras ou pandillas, que são grupos compostos por jovens, em variadas idades, que surgem como alternativas de socialização e de pertencimento desses jovens na estrutura social de seus países devastados pelas sangrentas guerras civis.
De acordo com Nuñez (2008), “as maras tem se tornado uma expressão de organização social juvenil que impacta de forma contundente a cultura e as políticas centro-americanas (…). As maras são a expressão de uma marginalidade histórica e manifestam de forma espetacular a exclusão social que sofrem os jovens da região”. O fortalecimento e acentuação da violência destes grupos estariam associados ao aumento das desigualdades e da exclusão social nestes países.
“As maras ou pandillas são agrupamentos relativamente estáveis, caracterizados pela utilização dos espaços públicos urbanos, gerando padrões de identidade e articulando a economia e a vida cotidiana dos seus membros, e que, sem qualquer pretensão de institucionalidade, exibem um contra poder sustentado por uma violência inicialmente desordenada.”, na qual, “a maioria das vítimas surge do interior das próprias maras e pandillas, como ilustram as autênticas guerras que se dão entre os membros de maras rivais em prisões”. A mortalidade juvenil por homicídios em El Salvador e na Guatemala teria, portanto, como principal causa a afiliação destes jovens a estes grupos, cujo acesso a armas de fogo e a disputa por território (físico e simbólico) resultariam em confronto entre seus membros.
As experiências vivenciadas pela juventude nestes países poderiam oferecer pistas para o problema da violência juvenil no Brasil?
Seriam os nossos jovens, vítimas de homicídios, filiados a grupos como estes? Estariam eles se auto exterminando numa disputa por espaço e poder? Qual seria a principal causa dos homicídios entre os nossos jovens?
Os números nos alertam para a necessidade de desenvolver políticas públicas direcionadas a esta faixa da população, sobretudo de prevenção da violência e do crime, mas também de acesso à educação, cultura, lazer, trabalho e renda. Precisamos oferecer oportunidades e expectativas à nossa juventude. “Ao dar a todos os jovens as ferramentas de que precisam para melhorar suas próprias condições de vida, e ao envolvê-los em esforços para melhorar suas comunidades, estamos investindo na força de suas sociedades” http://www.blogdolfg.com.br/wp-admin/post-new.php - _ftn9.
No entanto, para poder desenhar estas políticas é preciso ir mais além dos números, é preciso investigar o contexto desses homicídios, compreendendo a sua complexidade no conjunto de fatores que os envolvem, senão continuaremos perdendo nossos jovens para a violência.
Como muito bem mencionou o relatório da UNICEF, “no Brasil, as reduções na taxa de mortalidade infantil entre 1998 e 2008 significam que foi possível preservar a vida de mais de 26 mil crianças; no entanto, no mesmo período, 81 mil adolescentes brasileiros, entre 15 e 19 anos de idade, foram assassinados. Com certeza, não queremos salvar crianças em sua primeira década de vida apenas para perdê-las na década seguinte”. (Unicef 2011).
Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.
por Luiz Flávio Gomes
Jurista e cientista criminal. Doutor em Direito penal pela Universidade Complutense de Madri e Mestre em Direito Penal pela USP. Presidente da Rede LFG. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001).
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