Entre o crime de bagatela, o dano potencial e a prevenção
O direito em si não é imutável
Direito
08/10/2014
“Princípio da Insignificância (crime de bagatela):
Descrição do Verbete: o princípio da insignificância tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, ou seja, não considera o ato praticado como um crime, por isso, sua aplicação resulta na absolvição do réu e não apenas na diminuição e substituição da pena ou não sua não aplicação. Para ser utilizado, faz-se necessária a presença de certos requisitos, tais como: (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada (exemplo: o furto de algo de baixo valor). Sua aplicação decorre no sentido de que o direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado cujo desvalor - por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes - não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social[1]”.
O direito em si não é imutável, pois decorre de fator circunstancial [psicológico] em cada geração. O princípio da insignificância, como o conhecemos atualmente no Brasil, não é o mesmo desde o descobrimento do Brasil. Quando Império, o Brasil puniu e matou muito, desde um furto simples (comida) até interesses pessoais da coroa portuguesa. As leis, na época, eram impostas pelos mais fortes, tanto em força física quanto em poder soberano.
Ao soberano, o deus vivo, não interessava se a pessoa furtasse algum alimento para comer. Aos escravos negros, a pena de morte seria executada pela forca cuja intenção era de coibir a prática de crimes. Misericórdia era raridade.
Desde a Constituição de 1891, o Brasil aboliu a pena de morte, salvo em caso de guerra. Infelizmente, com o Golpe Militar (1964 a 1985) e com a instituição do AI-5, a pena de morte para crimes políticos foi permitida. Infelizmente, a pena de morte, no Brasil, não foi abolida no meio civil, pois o sistema penal, como um todo, é uma máquina de destruição de vidas humanas. Verificam-se, muitíssimo bem, nos presídios brasileiros, cujas rebeliões desencadeiam as mais atrozes ações sádicas, execuções sumárias.
A ideia de “justiça”, no Brasil, ainda se protagoniza com as crueldades do império: “Quem duvida que tendo o Brasil três milhões de gente livre, incluídos ambos os sexos e todas as idades, este número não chegue para arrostar dois milhões de escravos, todos ou quase todos capazes de pegarem em armas! Quem, senão o temor da morte, fará conter essa gente imoral nos seus limites? A experiência tem mostrado que toda vez que há execuções em qualquer lugar do Brasil, os assassinos e outros crimes cessam, e que ao contrário, se se passam alguns anos sem execuções públicas, os malfeitores fazem desatinos e cometem todo o gênero de atrocidades. Daqui se vê que essa pena é eficacíssima”[2].
A frase acima, se comparada com o sistema prisional atual, não deixa dúvida de que a pena de morte [rebeliões em presídios] freia os ânimos. E isso está presente na mentalidade de muitos parlamentares, pois não há qualquer mudança no sistema [medieval] prisional. De outro ângulo, a sociedade vê as rebeliões como prejuízos, mas, também, como controladores populacionais – morrendo prisioneiro, menos um criminoso - nos presídios e no seio da sociedade.
Caos no sistema penitenciário dá muito lucro: aos que fornecem [por licitação] quentinhas, roupas, materiais de limpeza etc. Mesmo que não haja rebeliões dentro dos presídios brasileiros, ainda haverá empresas privadas a fornecerem tais materiais, contudo em escala menor. Consequentemente, o lucro diminuirá. Também não se muda o sistema prisional brasileiro, de medieval para ressocialização, pois violência dá votos aos candidatos com seus discursos enfadonhos. De outra forma, a massa humana nos presídios, que são em sua maioria os párias seculares, sendo ressocializados, irá causar uma superlotação nas metrópoles e, consequentemente, uma vivência perto das elites. Dizer que não há preconceito [velado] é dizer que o Brasil não é um país miscigenado.
O Brasil, com suas enormes discrepâncias sociais, mais a mentalidade darwinista, ainda apregoa a separação de classes sociais. Não se pode desmentir o que foi dito, pois, desde as mudanças políticas, quanto à atuação do Estado na vida social dos párias, de forma que pudessem ter acesso aos direitos sociais (art. 6º, da CF), muita relutância surgiu. O artigo 6º da CF foi considerado ações de comunistas e de socialistas, para dominar o Brasil. Ora, frenesi a parte, o artigo 6º consubstancia a segunda dimensão dos direitos humanos. Enquanto o artigo 6º existia, mas não se materializava na realidade brasileira, todos estavam plenos de satisfação – “todos”, claro, os não párias. O distanciamento se mantinha entre elite – a elite darwinista, que fique claro, pois há uma parcela elitizada que age em prol da melhoria social sem exclusões - e párias, desde a expulsão dos párias para as periferias e morros.
A conjuntura atual é que os párias possuem chances de acesso à educação, à moradia fora dos morros. Não diferente, as elites [darwinista] brasileiras passaram a se refugiarem em condomínios ultraluxuosos, surreais aos padrões de milhões de brasileiros. Os novos guetos surgem, no caso, os guetos das elites [darwinista].
Nessa tempestade de mudanças, não escapam os magistrados, que ora punem o cidadão que furtara uma maçã a pena de regime fechado, ora permitem que os maiores larápios consigam meras condenações (regime semiaberto ou aberto) e progressões de penas dignas de “País das Maravilhas” – como foram os sentenciados do PT, no maior esquema de corrupção da história do Brasil. E o que também salta aos olhos é a condenação pífia dos “fichas sujas”, onde muitos são condenados com pena convertida em prestação de serviços – e na maior cara de pau, se é que têm honra, ainda diz que “pagaram” os prejuízos à sociedade.
E como, então, a justiça, em geral, há de resolver suas confusões diante do Princípio da Insignificância? No contexto social em que o Brasil vivencia no inicio do século XXI, não há o que dizer “justiça” e “injustiça”. A mentalidade presente no Brasil é a de Lei de Gerson. Nas metrópoles, os indivíduos podem sobreviver, mesmo que miseravelmente, catando latas, papelões. E muitos destes indivíduos não cometem crimes. Os crimes atuais são cometidos por pessoas drogadas, principalmente pelo uso de crack, a droga maldita. Outra coisa é furtar uma maçã, por necessidade, e outra furtar pelo simples prazer de se sentir destemido.
Infelizmente, pela ausência secular de educação, por parte do Estado, aos párias, mais a imposição da lei do mais forte, pelos narcotraficantes, as crianças e os adolescentes veem como normal o ato de furtar. O furto, então, é conduta de parecer destemido, atrevido. Em certos casos serve como ritual primitivo da emancipação do menino para se tornar “guerreiro”. E como a Justiça resolverá esses casos? Se aplicado o Princípio da Insignificância, sem que haja reeducação, como tais crianças verão a justiça dos adultos? Quais serão os comportamentos das crianças e dos adolescentes no futuro? Da mesma forma, quando a justiça aplica condenações exíguas, aos crimes de grandes proporções de lesa a pátria [por exemplo, o mensalão do PT], como os jovens, em geral, verão a tal da “justiça”? Quais serão seus comportamentos futuros a sociedade corrompida?
Só algo poderá mudar os comportamentos incivilizados: educação. A educação deve começar nos primeiros anos de vida de qualquer ser humano. Sem ela, não há de ter civilidade. Por mais que se tente aperfeiçoar as leis brasileiras, os sistemas de monitoramento dos presidiários nada mudarão. O Brasil se iguala aos filmes Hollywoodianos da década de 1960, cujas cidades eram tomadas de marginais, a corrupção policial era insuportável, assim como as dos políticos, a sociedade se dividia em duas, os marginalizados e os “justos”. Nessa divisão, os “marginais” eram misturas de pessoas que foram excluídas pelas suas características genéticas com as pessoas puramente sádicas. Já os “justos”, uma combinação de mafiosos com pessoas alienadas à realidade das divisões de classes sociais. O Brasil não está longe desse cenário “futurista”.
Chegará um dia, se continuarmos desprezando o elemento civilizatório “educação”, em que a vida será insuportável. O medo aumentará, assim como as revoltas sociais em meio às lutas de classes e doutrinas doentias, dignas de filmes – “Laranja Mecânica”, “V de Vingança”.
Muitos dizem que a educação não basta, sendo parafraseado de “comunista”. Como, então, há quase nenhuma violência na Suécia, na Suíça, na Holanda, na Austrália? Como justificar o reduzido número de mortes, por arma de fogo, na Suíça, cujos cidadãos andam e pedalam com suas armas nas vias públicas para os campos de tiro? Há uma justificativa: educação. O Manual do Soldado é o princípio educacional para a construção e manutenção da civilidade nas relações humanas. Nos países mencionados neste parágrafo, a educação é o pilar e o norte nas condutas humanas. Os japoneses, por exemplo, na Copa Mundial deste ano, nos contemplou com o poder da educação.
O Supremo Tribunal Federal, o Supremo Tribunal de Justiça, o sistema judicial brasileiro, a cada dia se atola em processos, defesas, jurisprudências. Nada muda, pois a fonte do problema é a precariedade moral em que se encontra o Brasil. O verniz civilizatório, a cada instante, deixa de existir nas condutas dos brasileiros: trânsito, família, religiões, justiça. No esforço de conter a onda de violência crescente, bilhões são gastos, porém sem qualquer efetividade.
Discursos calorosos de pré-candidatos, livretos de sobre "soluções" à criminalidade, nada resolvem, porém apenas enchem de dúvidas os pais aflitos, que perdem seus filhos, prematuramente, nas garras da violência, que não tem cor, morfologia, estratificação social.
Mas quais candidatos às eleições, quais parlamentares, quais juristas, quais membros sociais - indiferente de religião, estratificação social, partido político, etnia -, estarão veementemente engajados na renovação da mentalidade brasileira pela educação humanitária? Referências:
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