Desproporção dos documentos solicitados pelo INSS e a concessão dos benefícios

Desproporção dos documentos solicitados pelo INSS
Desproporção dos documentos solicitados pelo INSS

Direito

25/01/2015

DESPROPORÇÃO ENTRE A GARANTIA DO DIREITO SOCIAL-PREVIDÊNCIA SOCIAL E O PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS (DOCUMENTAIS) SOLICITADOS PELO INSS.

 

“Devemos tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade” – Aristóteles.

 

O presente artigo vem apenas com a intenção de apresentar informações e uma reflexão geral sobre a dificuldade na concessão de alguns benefícios previdenciários causados pela desproporção e rigidez dos documentos solicitados pelo INSS, vindo à contramão da garantia à previdência social e assistência aos desamparados (assistência social) como indicados nos Artigo 6º; 193º e 194º, entre outros, da CF/88 e outras legislações, (direitos sociais, seguridade social, justiça social e etc).

É uma breve exposição de dados e opinião para que haja uma reflexão e porque não abrir uma maior discussão sobre o assunto. Para melhor entendimento, irei citar duas situações onde ocorre a indicada desproporção:

 

1. Comprovação da dependência econômica dos pais ou irmão menor de 21 anos ou inválido frente o segurado instituidor nos casos de pensão por morte/ auxilio reclusão.

 

De acordo com o artigo 121, II e III e § 2º da IN 77/2015, os pais e os irmãos menores de 21 anos ou inválidos devem comprovar que dependiam economicamente do segurado instituidor do benefício, nos casos de pensão por morte e auxilio reclusão. Ou seja, quando um filho ou irmão falece ou é recluso, desde que não haja cônjuge e filhos menores de 21 anos ou inválidos, os pais ou posteriormente os irmãos possuem direito ao benefício, entretanto, devem comprovar que dependiam economicamente do instituidor.

 

Art. 121. São beneficiários do RGPS, na condição de dependentes do segurado:

 

I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;

II - os pais; ou.

III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente.

 

§ 2º A dependência econômica das pessoas de que trata o inciso I do caput é presumida e a das demais deve ser comprovada.

 

Desta maneira, para a comprovação da dependência econômica, a autarquia através de legislação unilateral taxa através do artigo 135 da IN 77/2015, quais os documentos que podem ser utilizados:

 

Art. 135. Para fins de comprovação da união estável e da dependência econômica, conforme o caso deve ser apresentado, no mínimo, três dos seguintes documentos:

 

I - certidão de nascimento de filho havido em comum;

II - certidão de casamento religioso;

III - declaração do Imposto de Renda do segurado, em que conste o interessado como seu dependente;

IV - disposições testamentárias;

V - declaração especial feita perante tabelião;

VI - prova de mesmo domicílio;

VII - prova de encargos domésticos evidentes e existência de sociedade ou comunhão nos atos da vida civil;

VIII - procuração ou fiança reciprocamente outorgada;

IX - conta bancária conjunta;

X - registro em associação de qualquer natureza, onde conste o interessado como dependente do segurado;

XI - anotação constante de ficha ou livro de registro de empregados;

XII - apólice de seguro da qual conste o segurado como instituidor do seguro e a pessoa interessada como sua beneficiária;

XIII - ficha de tratamento em instituição de assistência médica, da qual conste o segurado como responsável;

XIV - escritura de compra e venda de imóvel pelo segurado em nome de dependente;

XV - declaração de não emancipação do dependente menor de 21 (vinte e um) anos; ou

XVI - quaisquer outros que possam levar à convicção do fato a comprovar.

 

Assim para a comprovação da dependência econômica dos pais/ irmãos frente o instituidor as provas dos incisos I, II, já perdem sua validade por serem incompatíveis.

Entre as outras provas, algumas podem ser consideradas relativamente mais fáceis, como prova do mesmo domicílio, conta bancária conjunta, registros em associações, livros de registro de empregados entre outras. Entretanto, pelo fato da maioria dos segurados do INSS serem de baixo nível sócio-econômico-cultural, dificilmente conseguirão apresentar tais documentos.

Em muitos casos os segurados e seus dependentes não possuem conta em banco (que dirá conjunta), seus empregos são temporários, dificilmente são associados de clubes ou instituições, não apresentam imposto de renda entre outras situações. Desta forma, em apenas alguns casos a comprovação será realizada tranquilamente, mas na maioria se torna complexa pela situação do instituidor e do dependente.

E ainda, o que se dirá da apresentação de procuração, disposições testamentárias, escrituras de compra e venda de imóvel, declarações registradas em tabeliões?!?! As chances de o dependente possuir tais documentos beira 0%, o que acaba por dificultar a concessão do benefício, gerando processos judiciais, as quais são mais maleáveis quanto à apresentação dos indícios de prova.

Ressaltando que, conforme autorizado pelo inciso XVI, qualquer documento apresentado que esteja fora da relação indicada dificilmente será aceito pelo INSS, ou seja, essa autorização se torna ineficaz.

 

2. Documentos para concessão do beneficio de prestação continuada – LOAS

 

Nos benefícios de prestação continuada, que se tratam de benefícios de caráter assistencial pago pela União através do INSS, a situação se repete. Vejamos os documentos solicitados:

 

a) Documentos Principais:

 

  • Número de Identificação do Trabalhador – NIT (PIS/PASEP) ou número de inscrição;
  • Documento de Identificação;
  • Cadastro de Pessoa Física - CPF;
  • Certidão de Nascimento ou Casamento (para documento emitido no exterior, saiba mais);
  • Certidão de Óbito do esposo(a) falecido(a), se for o caso;
  • Comprovante de Residência;
  • Comprovante de rendimentos dos membros do grupo familiar;
  • Documentos pessoais dos membros do grupo familiar (Identidade ou certidão de nascimento quando menor, CPF, Número do PIS/PASEP/NIT);
  • Tutela, no caso de menores de 18 anos filhos de pais falecidos ou desaparecidos ou que tenham sido destituídos do poder familiar.
  • Demais documentos

 

Perceba que são documentos básicos, entretanto, por se tratar de benefícios que na maioria dos casos cuida de cidadãos em situações sócio-econômicos-culturais criticas, até mesmo o básico se torna um empecilho.

Uma certidão de nascimento, por exemplo, que muitas vezes as pessoas nessas situações não possuem tem sua apresentação obrigatória, desta forma, o requerente teria que pagar para ter uma 2ª via. Pessoas que não possuem qualquer renda, que vivem da ajuda de terceiros, devem pagar para obter os documentos solicitados pelo INSS.

Um simples comprovante de residência, também como exemplo, muitas vezes está em nome de terceiros (casas/ quartos alugados, albergues e etc), e gera a necessidade de preenchimento de formulários e apresentação de documentos do dono do comprovante entre outras barreiras que podem se tornar dificultosas para a concessão do benefício.

 

b) Representante Legal (se for o caso), apresentar:

 

  • Cadastro de pessoa Física - CPF;
    • Documento de Identificação;
    • Termos de Tutela ou curatela, se for o caso.
    • Demais documentos

 

Para os casos de curadores/ tutela/ guarda são necessárias ordens judiciais para a representação, antes disso, não há como o benefício ser requerido, ou seja, imposição de regra que dificulta a concessão, e até mesmo a análise do benefício.

 

c) Formulários:

 

 

Sabemos que na maioria dos casos de requerimentos de LOAS, os mesmo são feitos por terceiros, como assistentes sociais e advogados, mas mesmo assim, a exigência de preenchimento de formulários é relativamente desproporcional ao que se pretende proteger, que são os necessitados.

Alguns como o próprio requerimento do LOAS, com informações importantes, são necessários, outros como declaração do titular de comprovante de residência com seu documento em anexo (original/ cópia autenticada) são desproporcionais.

Salienta-se que os formulários só são preenchidos se necessários para o caso concreto, entretanto, um benefício que visa à proteção aos necessitados é realmente necessário à imposição de tantos documentos comprobatórios? E informações? Não pode ser realizada apenas uma visita social, a qual já é feita normalmente. E nesta visita tirar todas as dúvidas e dados necessários?

      

Ponderações/ conclusões

 Notório que as agências da Previdência Social não mantêm uma unicidade nas suas formas de trabalho. Cada agência possui formas diferentes para realização dos diversos atos administrativos, sendo que em alguns lugares pode ser mais pacífico e em outros mais rígidos a análise e concessão de algum benefício ou prática de algum ato autárquico.

Mesmo assim, percebe-se no geral a imposição de regras cada vez mais difíceis de serem cumpridas pelos segurados/ dependentes, com uma maior rigidez na concessão dos benefícios previdenciários. Há outros exemplos que poderiam ser indicados, como a comprovação da atividade rural (segurado especial ou não) ou, ainda, a própria comprovação de união estável que se baseia nos mesmos documentos do caso da pensão/ reclusão.

É claro que deve ocorrer uma mínima ou até média solicitação de documentos e informações para que não ocorram fraudes ou outras situações que trariam prejuízo ao bem público, entretanto, deve haver uma melhor adequação das solicitações e das maneiras de se obterem as realidades dos fatos para facilitar quem tem direito aos benefícios.

Por fim, a intenção mor da apresentação destes argumentos é a busca de uma reflexão do atual sistema previdenciário e seus atos, os quais possuem relação com quase toda a população do país, já que em algum momento, praticamente todos os brasileiros irão procurar o INSS em busca de algum direito.

 Salienta-se que os sistemas previdenciário e assistencial se encontram pautados nos direitos fundamentais como os sociais e humanos, e, também, no estudo da sociologia e assistência social, portanto, são matérias multifatoriais que visam o cumprimento dos direitos básicos da sociedade em parâmetros de igualdade frente os desiguais, devendo sempre simplificar a busca da proteção e não torná-la mais distante.

 


REFERÊNCIAS

 ALENCAR. Hermes Arrais. Benefícios Previdenciários. Ed. 4. São Paulo – SP: Editora Universidade de Direito. 2009.


BRASIL.b. LEI Nº 8.213, DE 24 DE JULHO DE 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8213cons.htm> Acesso em: 16 de maio de 2014.


GONZAGA. Paulo. Perícia Médica da Previdência social. São Paulo: Ltr, 2000. P. 16.


IBRAHIM. Fabio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. Ed. 17. Rio de Janeiro – RJ: Impetus. 2012.


MOSER. Claudio. RECH. Daniel. Direitos Humanos no Brasil: diagnóstico e perspectivas. Ed. 2. Rio de Janeiro – RJ: Mauad. 2004.

 

PULINO, Daniel. Aposentadoria por invalidez no direito positivo brasileiro. Ed 1. São Paulo - SP: LTR, 2001.

 

VALERIANO, Sebastião Saulo. Previdência Social. Ed 1. Leme - SP: Editora de Direito, 2000.

OLIVEIRA, Moacyr Velloso Cardoso de. Curso de direito previdenciário. Ed. 1. São Paulo – SP: LTR. 2002.

 

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm - CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. Acessado em 25/01/2015.

 

http://www.normaslegais.com.br/legislacao/Instrucao-normativa-inss-77-2015.htm - IN77/2015 - Acessado em 2501/2015.

Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


Bruno Henrique Martins Pirolo

por Bruno Henrique Martins Pirolo

Graduado em Direito pela PUCPR Especialista em Direito Previdenciário pela UEL - Universidade Estadual de Londrina Pós Graduando em Direito Constitucional Contemporâneo no IDCC - Instituto de Direito Constitucional e Cidadania. Professor de Cursos Preparatórios para Concursos Púbicos na esfera previdenciária. Integrante da Comissão de Direito Previdenciário da OAB/PR

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