14/03/2016
SEGURANÇA INTERNACIONAL: UMA VISÃO GERAL SOBRE O TEMA
Durante a Guerra Fria todos ao se referirem à segurança internacional percebia que o que estava em jogo era o discurso bélico e ideológico dos realistas ou neorrealistas.[1] Após a Guerra Fria outras questões de segurança internacional surgem e consequentemente novas teorias aparecem para explicá-las. Os números de atores internacionais aumentam, tais como Organizações Internacionais. No entanto, o Estado continua sendo o principal ator internacional. E, a partir desse novo cenário político percebemos que nem tudo é uma questão de Segurança Internacional, pois, se tudo fosse questão de Segurança Internacional, deixaria de ser, porque algo apenas pode ser considerado questão de Segurança Internacional, uma vez que há algo que não é. Quando nos referimos a questão de Segurança Internacional, estamos dizendo que algo requer o uso da força, em último caso, pois é a possibilidade do uso da força que garante ao Estado manter a paz social. Segundo Kolodziej, não significa que segurança envolve violência sempre, mas que há uma possibilidade de violência está envolvida. Porque violência está ligada a questão de segurança ao representar uma ameaça existencial. Algo que precisamos salientar é que, tudo que é Segurança Internacional é político. Mas, nem tudo que é político é questão de Segurança Internacional.
Há um processo de securitização que possibilita que algo que não era tratado como questão de segurança passa ser visto como prioridade na agenda global e vice-versa. Algo para ser considerado questão de segurança internacional precisa observar três elementos:
Ameaça existência: algo se torna questão de segurança porque oferece ameaça a alguém ou a algo. Por exemplo, ameaça à democracia, civilização, humanidade, etc. Para isso, é necessário identificarmos o que é questão de segurança internacional.
Situação de emergência: devido a explicação do item anterior, uma vez que Hobbes afirma que o principal valor de um homem é a sua vida. Assim, torna-se prioridade na agenda política, por ser uma situação emergencial.
Possibilidade de quebras de regras: O campo de segurança lida com situação de exceção e para isso pode até passar por cima das regras se for necessário e em último caso, para garantir a existência de algo. Geralmente é o presidente que declara o que é questão de segurança, e se for necessário poderá quebra regras internacionais e nacionais. A função do político é decidir sobre essas questões. E relacionado a isto está a Ética da Convicção e a Ética da Responsabilidade. Sendo que, a primeira o político utiliza para tomar uma decisão com base em seus valores ou valores sociais. E a segunda é usada a partir do prisma dos fins ou objetivos a serem alcançados, e, se for necessário, possibilita a ação imoral. A Política é o âmbito da exceção, e, por isso, muitas vezes percebemos a quebra de regras, no caso de segurança internacional.
Todo tema que é securitizado envolve não necessariamente a quebra das regras. Toda questão de segurança pode quebrar regras quando for necessário, mas quando é necessário ninguém sabe ao certo, é o político que deve decidir. Portanto, através do processo de securitização percebemos que depois da guerra fria qualquer assunto pode ser questão de segurança internacional, como o meio ambiente, HIV. Quando determinado tema é securitizado, temos:
Atores securitizantes: é a pessoa que está afirmando aquilo que é questão de segurança, por exemplo, o Presidente;
Objetos securitizados: aquilo que está sendo ameaçado.
Todo processo de segurança internacional traz consequências para agenda global, pois o tema passa assumir a prioridade na discussão, temos mais legitimidade para investir em dinheiro e recursos para canalizar a existência que está sendo ameaçado.
Isso é a relação entre securitização e discurso, pois determinado tema passa ser questão de segurança não a partir do fenômeno objetivo, mas devido o discurso do ator securitizante. Ademais, toda questão de segurança envolve sigilo em certos temas, portanto não existe nenhum país no mundo que é totalmente transparente, porque em determinados momentos se for totalmente transparente em questões de segurança vai prejudicar a própria segurança. A questão é saber se o país está usando do sigilo para praticar atividades escusas. Por isso, o problema é decidir se algo deve ser sigiloso sem envolver a população na decisão.
Para Weber, o Estado possui o monopólio do uso legítimo (racional ou legal; carismático; tradicional) da força física (polícias, forças armadas) em um território (estatal = espaço aéreo, marítimo, terrestre, navios, etc.). A Legitimidade está relacionada a questão de confiança do povo, isto é, se o povo acredita na legitimidade do Estado, independente se esse Estado é Democrático ou não, Racional ou legal (baseado em lei), Carismático (nesse caso nem precisa de democracia, basta um governo popular ou ditatorial), Tradicional (monarquia obedece aos costumes).
A Segurança Internacional, para alguns autores internacionalistas, tais como Kolodziej, deve ser analisada também em tempos de paz, pois isso possibilita questionar o motivo pelo qual há ausência de guerra, algo fundamental, uma vez que, deste modo, podemos manter a paz, ao saber o que a fundamenta.
A Segurança Internacional de um país leva em conta o Soft Power, isto é, espionagem, simbologia, ideologia e demais meios adotados por um país para se manter a segurança interna e externa, e, o Hard Power, isto é, tanque, armas, explosivos, materiais bélicos em geral para garantir a ordem.
Mas, nem tudo é perfeito. A Segurança Internacional esbarra em algumas dificuldades, tais como a dificuldade de analisar e prever eventos ameaçadores a ordem internacional por meio de situações laboratoriais; a dificuldade de buscar meios de salvaguardar os seus objetivos, devido a rapidez com que muda o cenário analisado, principalmente em um ambiente de guerra, pois é quase impossível prevê esse cenário; há, também, a dificuldade de identificar as semelhanças entre períodos históricos diferentes, uma vez que por mais parecido que seja, na verdade são totalmente diferentes, por se encontrarem em cenários históricos diferentes. Por exemplo, muitos afirmam que o fato dos Estados Unidos terem perdido a guerra no Vietnã já demonstrava que também perderia na guerra contra o Afeganistão, o que não é verdade.
Outro tema fundamental, é a Segurança da Política, uma vez que esta pressupõe conflito. Toda política existe porque existem questões de escassez e consequentemente conflito. Segundo Carl Schmitt a política é o julgamento das situações com base em quem é o meu amigo (aquele que está do meu lado) ou inimigo (aquele que não está do meu lado). Por exemplo, na guerra das Malvinas, o Brasil disse que não ficaria do lado de ninguém, nem da Argentina e nem da Inglaterra, mas o fato dele ficar neutro, já aponta o lado que ele está que é ao lado da Inglaterra (por ser a parte mais forte). O inimigo é um grupo de pessoas que se contrapõem ao seu grupo, ou seja, é o hostil, o inimigo político.
Ademais, há diferença entre o termo inimigo e o termo hostil. Lembrando que na língua português brasileiro essas palavras são sinônimas. Hostil é algo político, pressupõe julgamento político. E inimigo é algo pessoal, pressupõe um julgamento pessoal. Por exemplo, muitos não condenam os Estados Unidos por matar muitas pessoas na guerra. Mas, todos condenam determinada pessoa entrar em uma escola e atirar em crianças. Isso se deve ao fato que os Estados Unidos em uma guerra estão combatendo o hostil, ou seja, o inimigo político, já a pessoa que assassina indivíduos em uma escola é vista como inimiga da sociedade.
A análise da Segurança Internacional é feita com base nos estudos de diversos teóricos, dentre eles os Clássicos da Segurança, tais como Care, Kichane e Waltz, Lock, Hobbes. Segundo Lock, no Estado de Natureza tudo era regido por uma certa harmonia, pois o homem com o receio de perder a sua vida procurava viver em paz, em cooperação um com os outros. Assim, não havia necessidade de transformar a sociedade em um estado leviatã. O Estado de Guerra surge quando o homem se impõe pela força (e não de forma racional). Nesse sentido, Bull entende que o ambiente internacional é marcado pela harmonia e não uma situação de conflito entre os Estados. Hobbes é o autor essencial em Relações Internacionais, uma vez que a maioria do que lemos e estudamos em Relações Internacionais tem fundamento neste autor. Segundo ele, a segurança é uma questão primordial, porque sempre apresenta ameaça existencial, justamente devido a composição da natureza humana, marcada pelo racional, relativa igualdade, pois somos diferentes, mas ninguém nasce superior ao outro e felicidade, ou seja, o que faz o homem ser feliz não é a posse ou propriedade, mas a necessidade de conquistar os seus desejos. Mas, após alcançar o seu objetivo a felicidade passa.
Para Hobbes, o Estado de Natureza é uma guerra de todos contra todos. Não tem regra. Os homens por serem um ser racional, em busca da felicidade e dotados de igualdade entre si encontram-se em uma guerra ou, pelo menos, a ameaça desta, colocando a sua vida em risco. Com isso, os homens decidem criar o Estado por meio do contrato social. O Estado de Leviatã, nome dado com base na história de Jó, demonstra a necessidade de um Estado dotado do monopólio da força com o escopo de defender a ordem e a paz social.
REFERÊNCIAS:
BULL, Hedley. A sociedade anárquica: um estudo da ordem na política mundial. São Paulo: Universidade de Brasília, 2002. xxviii, 361p. (Clássicos IPRI). ISBN 8523006354.
KOLODZIEJ, Edward A. A seguranca internacional depois da guerra fria: da globalizacao a regionalizacao. Contexto Internacional, v.17, n.2, p.313-349, jul./dez.1995.
SCHMITT, Carl; MOREIRA, Luiz. Legalidade e legitimidade. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. xxx, 102p. (Del Rey Internacional ; 11). ISBN 9788573089127.
SCHMITT, Carl; MOREIRA, Luiz (Coord.). O conceito do político; Teoria do partisan. Belo Horizonte: Del Rey, 2009. xix, 243p (Coleção Del Rey internacional). ISBN 9788573089882.
[1] O realismo se define nas teorias de oposição de Carr aos idealistas. Os realistas buscam vê o mundo da forma como ele realmente é, desvinculado de determinados princípios morais. O realismo se consolida após a Segunda Guerra Mundial, com a publicação do livro Política Entre as Nações de Hans Morgenthau
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Presidente do Núcleo Acadêmico de Pesquisa, na Faculdade Mineira de Direito / PUC Minas - Coração Eucarístico. Foi Monitora de Teoria da Constituição, Direito Constitucional I e II. Foi Pesquisadora Científica Bolsista da FAPEMIG na área de Direito Constitucional e Internacional.
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