Portaria nº 1.565/MS/GM, de 26 de agosto de 1994.

Farmácia

01/01/2008

DOU 29/08/94

Define o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária e sua abrangência, esclarece a competência das três esferas de governo e estabelece as bases para a descentralização da execução de serviços e ações de vigilância em saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde.

O Ministro de Estado da Saúde, usando da atribuição que lhe confere o artigo 87, inciso II, da Constituição Federal, e

Considerando que é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios cuidar da saúde da população (artigo 23, inciso II e artigo 30, inciso VII, da Constituição Federal);

Considerando que compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre proteção e defesa da saúde, e, os Municípios, legislar sobre assuntos de interesse local e suplementar a legislação federal e a estadual no que couber (artigo 24, inciso XII e artigo 30, incisos I e II, da Constituição Federal e artigo 18, inciso XII, da Lei n. 8.080(1), de 19 de setembro de 1990);

Considerando que no âmbito da legislação concorrente a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais (artigo 24, § 1º, da Constituição Federal), incluídos os casos em que a Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990, conferiu à Direção Nacional do Sistema Único de Saúde competência regulamentar e de normatização técnica e administrativa (artigo 16);

Considerando o disposto na Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990, especialmente nos seus artigos 15, 16, 17, 18 e 19, quanto às atribuições da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal no tocante às ações e aos serviços de promoção, proteção e recuperação da saúde;

Considerando a necessidade de demarcação do campo da vigilância sanitária em que devem atuar as três esferas de governo no SUS, para evitar omissão ou superposição de ações referentes à formulação de políticas, ao planejamento, à execução, ao controle e à fiscalização das atividades de proteção e defesa da saúde, individual e coletiva;

Considerando, sobretudo, o princípio da descentralização dos serviços e ações de saúde, com ênfase na municipalização e tendo em vista que a articulação inter-setorial se dá com mais facilidade e eficácia nas instâncias locais e regionais do Sistema (artigo 7º incisos IX, X, XI, XII e XIII da Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990);

Considerando, ainda, a diretriz política que visa à unificação conceitual da vigilância sanitária e da vigilância epidemiológica para o estabelecimento de práticas de Vigilância em Saúde, visando a promoção e proteção da qualidade de vida e da saúde integral dos cidadãos; e

Considerando, finalmente, a competência da Direção Nacional do Sistema Único de Saúde para definir e coordenar o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (artigo 16, inciso III, alínea "d", da Lei n. 8.080/90), resolve:

Disposições Preliminares

Art. 1º Esta Portaria define o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária e sua abrangência, esclarece a distribuição da competência material e legislativa da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e estabelece procedimentos para articulação política e administrativa das três esferas de governo do Sistema Único de Saúde.

Art. 2º Pela interdependência do seu conteúdo e do desenvolvimento de suas ações, a vigilância sanitária e a vigilância epidemiológica são consideradas, conceitualmente, como integrantes da Vigilância em Saúde, implicando compromisso solidário do Poder Público e da sociedade na proteção e defesa da qualidade de vida.

§ 1º Operativamente, a atuação da vigilância sanitária requererá fundamentação epidemiológica eficiente, voltada para a prevenção ou detecção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes da saúde individual e coletiva.

§ 2º Em face do disposto neste artigo todos os serviços do Sistema Único de Saúde participam da Vigilância em Saúde, mediante colaboração nas ações de saúde coletiva, e comunicação aos órgãos competentes, de fatos ou situações que possam exigir medidas corretivas.

Da abrangência do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária

Art. 3º Entende-se por vigilância sanitária o conjunto de ações capaz de:

I - eliminar, diminuir ou prevenir riscos e agravos à saúde do indivíduo e da coletividade;

II - intervir nos problemas sanitários decorrentes da produção, distribuição, comercialização e uso de bens de capital e consumo, e da prestação de serviços de interesse da saúde; e

III - exercer fiscalização e controle sobre o meio ambiente e os fatores que interferem na sua qualidade, abrangendo os processos e ambientes de trabalho, a habitação e o lazer.

Parágrafo único. As ações de vigilância sanitária enunciadas neste artigo incluem necessariamente:

a) as medidas de interação da política de saúde com as políticas econômicas e sociais cujos resultados constituem fatores determinantes e condicionantes do nível de saúde da população;

b) as medidas de interação dos profissionais de saúde em exercício nas atividades de vigilância sanitária com os órgãos e entidades, governamentais e não-governamentais, de defesa do consumidor e da cidadania;

c) o controle de todas as etapas e processos, da produção ao uso de bens de capital e de consumo e de prestação de serviços que, direta ou indiretamente, se relacionam com a saúde, com vista à garantia da sua qualidade; e

d) as ações destinadas à promoção e proteção da saúde do trabalhador submetido aos riscos e agravos advindos dos processos e ambiente de trabalho.

Bases do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária

Art. 4º As bases de atuação do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, são:

I - as recomendações emanadas do Conselho Nacional de Saúde, que deverão expressar o marco referencial do sistema;

II - a organização do sistema de modo a garantir:

a) a efetiva descentralização da execução dos serviços e ações da União para os Estados e Municípios, e dos Estados para os Municípios e instâncias regionais;

b) planejamento e definição de prioridades das ações a serem empreendidas em cada esfera de governo com base nas realidades loco-regionais, compatibilizadas a nível estadual e nacional;

c) colegiado e instâncias regionalizadas de representação técnica, administrativa e política que estabeleçam o planejamento e acompanhamento das ações de vigilância sanitária e compatibilizem os planos estaduais condicionando o planejamento a nível nacional;

d) a inclusão, nos quadros de pessoal, de classes de servidores técnicos e administrativos que devam integrar as equipes multidisciplinares para atender à diversidade de funções no campo da defesa e proteção da saúde; e

e) a efetiva participação do conjunto das profissões de saúde nas ações e serviços de vigilância sanitária.

III - a caracterização de uma Rede de Laboratórios Oficiais de Controle da Qualidade em saúde, cuja hierarquização e categorização constará de regimento próprio sendo representada por Conselho e sujeitos às seguintes exigências:

a) acessibilidade prioritária dos serviços técnicos dos órgãos e entidades do Sistema Único de Saúde, bem como do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos órgãos e entidades voltadas para a defesa do consumidor;

b) atuação orientada e controlada, do ponto de vista técnico-científico, por conselhos de laboratórios.

IV - a implantação de um Sistema Nacional de Informações em Vigilância Sanitária que permita:

a) a coleta, o processamento, a consolidação e análise sistemática de informações pertinentes às atividades de fiscalização e controle da produção, armazenamento, distribuição, comercialização e consumo de produtos e serviços de interesse à saúde individual e coletiva;

b) o monitoramento de fatores de risco à saúde a partir das informações disponíveis;

c) o planejamento e avaliação do impacto das ações de vigilância sanitária na manutenção e melhoria da qualidade de vida;

d) a democratização da informação com livre acesso a todos os participantes do Sistema de Vigilância, e particular e a toda a sociedade em geral às informações disponíveis.

V - a garantia do direito individual e coletivo de acesso ao sistema de informações sobre vigilância em saúde, para o desenvolvimento de ações com efetiva participação do cidadão.

Diretrizes do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária

Art. 5º A atuação do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, far-se-á integradamente com o Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica, e se orientará pelas seguintes diretrizes:

I - identificação e divulgação dos fatores condicionantes e determinantes da saúde, em territórios definidos;

II - formulação de política de saúde que leve em conta os fatores econômicos e sociais, determinantes de doenças e outros agravos à saúde;

III - promoção e proteção da saúde mediante a realização integrada de ações educativas e de informação, da prevenção de danos e agravos à saúde individual e coletiva, do diagnóstico e da terapêutica;

IV - a coleta sistemática, consolidação, análise e interpretação de dados e informações sobre produção, armazenagem, distribuição e consumo de produtos e serviços, condições de vida e de ambiente de trabalho com vistas a formulação de políticas, planos e programas;

V - estímulo e fortalecimento da participação da comunidade nas ações preventivas e corretivas de iniciativa do Poder Público, que dizem respeito à saúde coletiva;

VI - garantia de condições adequadas para o exercício de profissões relacionadas diretamente com a saúde, e para a prestação dos serviços de saúde de qualidade com acesso universalizado; e

VII - avaliação da tecnologia em saúde, com ênfase na identificação de inadequações na produção e no uso de equipamentos, medicamentos, imunobiológicos e outros insumos para a saúde.

Dos Campos de Exercício da Vigilância Sanitária

Art. 6º São os seguintes os campos onde se exercerá, nas três esferas de governo do Sistema Único de Saúde e segundo a respectiva competência legal, a ação da vigilância sanitária:

I - proteção do ambiente e defesa do desenvolvimento sustentado;

II - saneamento básico;

III - alimentos, água e bebidas para consumo humano;

IV - medicamentos, equipamentos, imunobiológicos e outros insumos de interesse para a saúde;

V - ambiente e processos de trabalho, e saúde do trabalhador;

VI - serviços de assistência à saúde;

VII - produção, transporte, guarda e utilização de outros bens, substâncias e produtos psicoativos, tóxicos e radiativos;

VIII - sangue e hemoderivados;

IX - radiações de qualquer natureza; e

X - portos, aeroportos e fronteiras.

§ 1º A atuação política e administrativa prevista nos incisos deste artigo será realizada por iniciativa própria dos órgãos incumbidos da vigilância sanitária, ou a partir de proposta ou notificação feita por outros órgãos e entidades públicas, e por qualquer cidadão, entidade de classe, associação comunitária ou órgão de defesa do consumidor.

§ 2º No tocante à matéria dos incisos I, II, III e X, a atuação dos órgãos e entidades do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária e a decorrente de articulação intersetorial com órgãos e entidades de outros Ministérios darão ênfase à preservação do equilíbrio dos ecossistemas regionais, protegendo-os da ação de fatores poluentes e da invasão de agentes biológicos.

§ 3º Além da realização e promoção de estudos e pesquisas interdisciplinares, da identificação de fatores potencialmente prejudiciais à qualidade de vida e da avaliação de resultados de interesse para a saúde, aos órgãos de vigilância sanitária cabe a aplicação de condicionamentos administrativos ao exercício de direitos individuais e coletivos.

Dos Condicionamentos de Direitos

Art. 7º Uma vez esgotada a eficácia das ações orientadoras, preventivas e persuasivas, o exercício do poder de polícia administrativa se efetivará, no campo da vigilância sanitária, sob o enfoque do poder de autoridade derivado da lei.

Art. 8º A Administração Pública responsável, em cada esfera de governo, pela função da vigilância sanitária, poderá impor condicionamentos administrativos ao exercício de direitos individuais e coletivos, sob as modalidades de limites, encargos e sujeições.

§ 1º Os condicionamentos administrativos, sob as modalidades de limites, encargos e sujeições, derivam diretamente da lei ou são impostos pela Administração, com base em lei autorizativa.

§ 2º Na realização da atividade administrativa ordenadora, o órgão competente do Sistema Único de Saúde observará o seguinte:

a) não se adotarão medidas obrigatórias que envolvam ou impliquem risco à vida;

b) os condicionamentos administrativos, sob as modalidades de limites, encargos e sujeições, serão proporcionais aos fins que em cada situação se busquem; e

c) se dará preferência, sempre, à colaboração voluntária do cidadão e da comunidade com as autoridades sanitárias.

Da Distribuição de Competência

Art. 9º Em consonância com o disposto nos incisos I a X do artigo 6º, compete a cada uma das esferas de governo do Sistema Único de Saúde:

I - à União, coordenar o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, prestar cooperação técnica e financeira aos Estados e Municípios e executar ações de sua exclusiva competência:

a) na execução de atividades de sua competência a União poderá contar com a cooperação de Estados ou Municípios.

II - ao Estado, coordenar, executar ações e implementar serviços de vigilância sanitária, em caráter complementar às atividades municipais e prestar apoio técnico e financeiro aos Municípios; e

a) na execução de atividades de sua competência o Estado poderá contar com a cooperação dos Municípios.

III - ao Município, executar ações e implementar serviços de vigilância sanitária, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado.

§ 1º A União e os Estados promoverão a descentralização político-administrativa estabelecida no artigo 4º, inciso II, alínea "a", de modo a que a articulação intersetorial prevista no § 2º do artigo 6º se concretize efetivamente no âmbito do Município e de instâncias regionais do Sistema Único de Saúde.

§ 2º No caso de Município que não tenha condições organizativas para executar ações e serviços de vigilância sanitária, na forma instituída na Lei Orgânica da Saúde, a cooperação técnica a ser prestada pelo Estado se efetivará mediante a execução dos serviços e ações correspondentes e o apoio para estabelecimento e desenvolvimento das condições técnico-científicas e administrativas necessárias para que o Município possa assumir, plenamente, os encargos que legalmente lhe são atribuídos.

§ 3º Em circunstâncias especiais, como na ocorrência de agravos inusitados à saúde que possam escapar ao controle da direção estadual ou municipal do Sistema Único de Saúde, ou que representem risco de disseminação estadual, regional ou nacional, a União e o Estado poderão executar ações de vigilância sanitária e de vigilância epidemiológica em qualquer localidade.

Art. 10. A vigilância sanitária a cargo da União, dos Estados e dos Municípios é exercida mediante a edição de normas, a execução de ações e implementação de serviços, e a articulação política e administrativa intersetorial.

§ 1º Incluídos os casos de competência regulamentar e de normatização técnica e administrativa atribuída à Direção Nacional do Sistema Único de Saúde pela Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990, a competência da União para legislar sobre vigilância sanitária limitar-se-á a estabelecer normas gerais, de alcance nacional; aos Estados caberá suplementar a legislação genérica de caráter nacional, editando normas para aplicação no seu território; e aos Municípios caberá suplementar, no que couber, a legislação nacional e estadual para atender às necessidades e prioridades de interesse predominantemente local.

§ 2º Na edição, interpretação e aplicação das normas e na execução de ações e implementação de serviços de vigilância sanitária, os órgãos e entidades do Sistema Único de Saúde, em cada esfera de governo, cuidarão para que a atuação do Poder Público se efetive da forma e do modo que melhor garantam a realização do fim público a que se dirige, com a menor restrição possível aos direitos e interesses particulares do cidadão.

Da Legislação Anterior

Art. 11. Os preceitos da legislação federal expedida anteriormente à vigência da Constituição e da Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990, que conservam o caráter de normas gerais e não são conflitantes com o novo texto constitucional e a legislação infraconstitucional, continuarão sendo de observância obrigatória em todo o Território Nacional.

Parágrafo único. As normas gerais da legislação federal referida neste artigo compreendem as normas consubstanciadas em leis e nos decretos, regulamentos e em outros atos normativos expedidos pelas autoridades administrativas para explicitar a lei, bem como decisões dos órgãos singulares ou coletivos de jurisdição administrativa a que a lei atribua eficácia normativa.

Da Vigilância Sanitária e da Defesa do Consumidor

Art. 12. O controle desempenhado pelos órgãos e entidades federais, estaduais e municipais que compõe o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária se fará, quando foro caso, em consonância com as ações desenvolvidas no âmbito do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, objeto da Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990, de modo a compreender, sempre que couber, soluções integradas e que se harmonizem com a política geral e setorial nas três esferas de governo.

Art. 13. O Secretário de Vigilância Sanitária se articulará com os setores competentes de outros Ministérios, notadamente os Ministérios do Trabalho; da Previdência Social; da Agricultura, do Abastecimento e da Reforma Agrária; do Meio Ambiente; da Educação e do Desporto; da Ciência e Tecnologia; da Indústria, Comércio e do Turismo e das Relações Exteriores; e o Departamento Nacional de Defesa do Consumidor, da Secretaria Nacional de Direito Econômico do Ministério da Justiça, visando:

I - a definição de atribuições em campo de atuação administrativa concorrente;

II - a consolidação da legislação nacional sanitária expedida anteriormente à Constituição e à Lei Orgânica da Saúde vigentes, e que seja com estas compatível;

III - a proposição de medidas que efetivem a descentralização político-administrativa de outros serviços da União para os Estados e Municípios e dos Estados para os Municípios, bem como a delegação de competência para a prática de atos administrativos por autoridades federais situadas nos Estados e Municípios;

IV - a formação específica de recursos humanos para os serviços e ações de vigilância sanitária, com ênfase na interdisciplinaridade dos conhecimentos; e

V - o estabelecimento de planos de carreira e estatutos específicos para os recursos humanos que exercerão atividade em serviços de vigilância sanitária a nível federal, estadual e municipal que contemple a multidisciplinaridade e multiprofissionalidade das ações e equipes e regularmente as competências e responsabilidades individuais no exercício de suas atividades profissionais específicas.

Art. 14. Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 15. Ficam revogadas as disposições em contrário

Henrique Santillo, Ministro da Saúde

 

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