Propostas para assistência farmacêutica e atuação do farmacêutico no SUS

Não são todas as Farmácias Populares do Brasil que possuem 02 Farmacêuticos
Não são todas as Farmácias Populares do Brasil que possuem 02 Farmacêuticos

Farmácia

27/06/2014

A realidade contemporânea municipal

Municípios sem farmacêutico gerenciando a assistência farmacêutica, sendo controlada por leigos e pelos chefes dos setores de licitação que controlam e desviam a finalidade do financiamento da atenção básica para os medicamentos do componente básico e não chega como deveria em quantidades e apresentações nas farmácias básicas, pois falta seleção, programação e planejamento da aquisição, além de falha nas demais etapas do ciclo da assistência farmacêutica.

Nas unidades básicas de saúde há dispensação mínima de medicamentos do Programa “HIPERDIA” e “Planejamento Familiar”, portanto, há anti-hipertensivos, antidiabéticos e anticoncepcionais, além de outros medicamentos que também existem nas unidades de saúde e na maioria das vezes quem dispensa é o recepcionista, a técnica de enfermagem ou os agentes comunitários de saúde, em uma atividade que é privativa do farmacêutico segundo a Política Nacional de Medicamentos, privando o direito da Orientação e do Uso Racional de Medicamentos.

Os municípios não possuem Relação Municipal de Medicamentos (REMUME), não possuem Comissão de Farmácia e Terapêutica (CFT), muitos nem possuem Central de Abastecimento Farmacêutico (CAF) e não há controle e organização dos estoques de medicamentos, materiais médico-hospitalares e odontológicos, o que acarreta muitas perdas e desvios.

Muitas vezes, acontece do município dispor apenas da Farmácia Básica, e esta ser distante da residência dos usuários do SUS e o custo de deslocamento não compensa ir buscar o medicamento, privando o direito do Acesso ao Medicamento.

Vale lembrar que muitos estados e municípios não estão cumprindo o repasse que é tripartite do componente básico da assistência farmacêutica, onde a população sobrevive com o repasse apenas da União para a compra de medicamentos, o que gera o desabastecimento, falta de medicamentos, não adesão medicamentosa, e aumento das complicações dos quadros clínicos não efetivamente tratados na atenção básica, gerando demanda para a atenção especializada e terciária do SUS, o que aumenta os gastos com a maior complexidade assistencial. Como não tem medicamentos nas unidades de saúde e falta nas farmácias básicas, por vários motivos citados acima, a população fica prejudicada, e não há maior resolutividade na atenção básica.

Os Farmacêuticos do NASF ficam sem muitas atividades a serem realizadas, pois como não há adesão medicamentosa, não há acompanhamento farmacoterapêutico, muitos ficam subutilizados e ociosos, na maioria das vezes se encaixando em atividades de educação em saúde nas unidades de saúde ou nas escolas, que com o tempo torna-se repetitivo e escasso de abordagens para a atenção básica, para comprovar a sua produtividade no AVEIAM.

A realidade dos programas Farmácia Popular e Aqui Tem Farmácia Popular

Muitos defendem o Programa “Farmácia Popular do Brasil”, mas se realizarem um estudo de farmacoeconomia deste programa perceberão que não é totalmente eficaz devido a sua subutilizado na maioria dos municípios, principalmente nas cidades com menos de 100.000 habitantes e muitas vezes relacionado ao gasto para sua manutenção que é bem superior quanto ao investimento que poderia ser mais resolutivo com o financiamento e estruturação da assistência farmacêutica na atenção básica, nas unidades de saúde do SUS.

Não são todas as Farmácias Populares do Brasil que possuem 02 Farmacêuticos (Gerente e Assistente como preconizado pelo programa) durante todo horário de funcionamento, tem servido como bico para muitos Farmacêuticos amigo/familiar dos políticos gestores da cidade em que estão implantadas, pois a maioria dos municípios não faz concurso para farmacêuticos por se tratar de um programa do governo federal ou mesmo para manter os seus “protegidos”.

O programa Aqui Tem Farmácia Popular, pode ter ampliado e muito a oferta e acesso a medicamentos para a população, ofertando medicamentos gratuitos nas Drogarias privadas, mas é claro e seria óbvio que sim, pois nas unidades de saúde não tem totalmente e a todo tempo disponível, nem nas farmácias básicas, e assim, as pessoas vão buscar de graça aonde encontrarem. Beneficia as drogarias que aumentam a clientela e que compram outros produtos agregado nas vendas, merchandising e compras por impulso, contudo, não garantem a Assistência Farmacêutica e Acompanhamento Farmacoterapêutico, devido a atual lógica mercantilista do varejo farmacêutico.

A precariedade do trabalho farmacêutico acarreta sérios prejuízos para o SUS

Em todo país se noticia que não tem Farmacêuticos presente na maioria das drogarias, no SUS municipal também, a realidade é semelhante, pois, por não haver um Piso Salarial Nacional para a categoria, os próprios municípios quem definem o salário base em Leis aprovadas no Legislativo Municipal, desta forma, a maioria das remunerações não estão sendo dignas para o exercício profissional.

Além disso, também não há normatização da jornada de trabalho, tendo municípios oferecendo 20, 30 e 40h por uma remuneração baixa, o que se torna desmotivante, e em casos de municípios pequenos, até inviável para o profissional se estabelecer na cidade, pois não encontra outras oportunidades para desempenhar suas funções e ter uma renda agregada que melhoria a sua qualidade de vida.

É por isso que há tanta corrupção nos serviços públicos, a maioria envolve as licitações e o fornecimento de produtos, entre eles, os medicamentos e materiais médico-hospitalares, e os gestores não querem farmacêuticos com cargo estável/ concursado gerenciando estes serviços, apenas prestadores de serviço e com função comissionada para cumprir a lei federal 5991/73 art. 15º.

Diariamente se vê notícias do que mais fazem por aí, superfaturando os preços, entregando quantidades inferiores ou até não entregando integralmente conforme descrito nas notas fiscais, e como os sistemas de controle de estoque são falhos ou não existem, passa despercebidos e nenhuma autoridade percebe os indícios da corrupção dos gestores, e isso está acontecendo com quase todas as prefeituras.

Nós farmacêuticos, assumindo seus postos de trabalho de forma estável e desprecarizada, com jornada de trabalho e salário digno para no gerenciamento do Ciclo da Assistência Farmacêutica (seleção, aquisição, armazenamento, distribuição, dispensação, acompanhamento farmacoterapêutico e promoção do uso racional de medicamentos), evitaria estes tipos de fraudes, riscos e insegurança à saúde, haja vista, que é um profissional habilitado e tem responsabilidades éticas e sanitárias, além das civis.

Propostas para o enfrentamento dos desafios e mudança social

- Defendo a substituição dos Farmacêuticos dos NASF pela inclusão na Estratégia Saúde da Família, para serem inclusos na Equipe de Saúde da Família e em cada unidade de saúde do SUS com dispensação de medicamentos e registro de ART com CRT nos CRF´s e alvará sanitário na VISA.

- Obrigatoriedade da Responsabilidade Técnica da Gestão da Assistência Farmacêutica para os Farmacêuticos, pois não se podem permitir leigos assumirem esta responsabilidade que afeta a vida e a terapêutica de uma população em um município, bem como, para evitar o uso político para troca de favores, conseguindo os medicamentos através de clientelismo e patrimonialismo, através de um prefeito, vereador, secretário ou outro político.

- Deveria ser obrigatória que toda dispensação de medicamentos dos Programas “Saúde da Família”, “Farmácia Básica”, “Farmácia Popular” e “Aqui Tem Farmácia Popular” fosse realizada por um Farmacêutico e houvesse um protocolo que contemplasse a consulta farmacêutica para acompanhamento do paciente e o uso de medicamentos para os pacientes, e maior responsabilização à utilização dos programas, maior controle e farmacoeconomia para o governo, diminuindo os riscos de fraudes, erros, riscos e prática insegura para o paciente. Na consulta farmacêutica, o farmacêutico seguiria um protocolo que contemplasse o preenchimento de um Formulário de Acompanhamento Farmacoterapêutico, o que eu chamaria de “Ficha F” para alimentação dos dados de todos os atendimentos e consultas no Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA-SUS) através da produtividade da Consulta Farmacêutica e exercício da Farmácia Clínica, que seriam mensalmente encaminhados para o setor de Vigilância em Saúde das Secretarias Municipais de Saúde. O Farmacêutico encaminhariam mensalmente para o Setor de Vigilância em Saúde das Secretarias Municipais de Saúde as “Fichas F” do Formulário de Acompanhamento Farmacoterapêutico e, além de alimentar o Sistema de Informações Ambulatoriais (SAI-SUS) com a produtividade do Farmacêutico, poderia utilizar as informações para a formulação de políticas públicas, planejamento e ações de saúde complementando as já existentes nos Sistemas de Informações em Saúde do SUS. Pode-se até propor, que os Farmacêuticos possam receber do SUS uma gratificação por cada atendimento e consulta Farmacêutica através da sua produtividade, assim como outros profissionais do SUS, pois o mesmo estaria contribuindo com a Assistência à Saúde, com a Epidemiologia e Vigilância em Saúde do SUS.
- Em relação à “Estratégia Saúde da Família”, os farmacêuticos poderiam contribuir com o sistema de Referência e Contra-Referência, através da emissão da Declaração de Serviços Farmacêuticos prestados aos Pacientes, bem como, através de Prescrição de ações Farmacológicas e Não farmacológicas, conforme regulamentados pela Res. CFF 586/13. Art. 3º, e também, participando de ações de educação em saúde em conjunto com a equipe das unidades de saúde e NASF de acordo com a territorialização sanitária, determinado pelo município para cada unidade básica de saúde.

- Em relação ao “Programa Farmácias Notificadoras/NOTIVISA e de Segurança ao Paciente”, os farmacêuticos seriam treinados e qualificados para participar e enquadrar-se no “Programa Farmácias Notificadoras” e cadastrados no sistema NOTIVISA da ANVISA, contribuindo com a Vigilância de produtos farmacêuticos, com ações de Farmacovigilância através de notificações de Queixas Técnicas (quebrado, vazando, avariado, rotulagem, acondicionamento, etc.) e Eventos Adversos à Medicamentos (Necessidade, Efetividade e Segurança ao Uso de Medicamentos), bem como, de Eventos Adversos à Assistência à Saúde (Falha na Administração do Medicamento, Identificação do Paciente, Erro de Medicação) no Programa de “Segurança ao Paciente”.

- É preciso garantir a disponibilidade dos medicamentos nas unidades de saúde, através da descentralização dos medicamentos para as mesmas, modificando a atual política de dispensação centralizada em farmácias básicas, com o intuito de aumentar a adesão aos tratamentos e a resolutividade das intervenções de saúde na atenção básica.

- Para realizar a descentralização é necessária a estruturação de uma Central de Abastecimento Farmacêutico (CAF) e das unidades de saúde para armazenar os medicamentos, assim como, a normatização de boas práticas de dispensação de medicamentos, contando com a presença de um profissional qualificado para tal, que é o farmacêutico. Como também, a definição de procedimentos para equidade de distribuição e a promoção do uso racional de medicamentos, inclusive, com normatização também das prescrições.
- Outro ponto importante é a padronização dos medicamentos através da definição de uma Relação Municipal de Medicamentos Essenciais (REMUME) para melhorar os processos de programação e planejamento para disponibilidade dos medicamentos e regularidade no abastecimento, através da estruturação de um sistema de logística para a Assistência Farmacêutica.

- Para o controle dos medicamentos, o Ministério da Saúde adotou um Sistema Informatizado através de um Software denominado Hórus, a qual, os municípios necessitam realizar a adesão e pactuar compromissos para receber a estrutura do mesmo, com treinamento e qualificação, e desta forma, buscar encaminhar a implementação do mesmo é essencial. Também é importante adotar uma política para controle dos medicamentos com prazo de validade expirado e desvios de qualidade para evitar as perdas e dispensação inadequada.

- Para os processos de compras, fazem-se necessários uma definição de critérios obrigatórios de controle de qualidade e para responsabilização da garantia de fornecimento pelos fornecedores, estabelecendo regras e prazos nos editais de licitação, responsabilizando os fornecedores que não cumprirem as recomendações.

- Outra questão importante é a ampliação da participação do Núcleo Estadual de Assistência Farmacêutica das Secretarias Estaduais de Saúde e do Departamento de Assistência Farmacêutica do Ministério da Saúde, de forma a dar apoio aos municípios nos seus processos de estruturação e formulação da Política de Assistência Farmacêutica nos Municípios.

- Há a necessidade de padronizarem diretrizes e ações em uma rede local de saúde, onde a gestão municipal possa realizar um desenvolvimento gerencial e de recursos de poder a fim de promover a mudança dos processos de trabalho local e garantir a prática das diretrizes nacionais pactuadas, para que as políticas públicas sejam implementadas e efetivadas com qualidade e garantia de bons resultados para a população através da regularidade das mesmas.

- A atuação técnico-gerencial do farmacêutico, para lidar com o ciclo da Assistência farmacêutica é imprescindível e requer a sensibilização dos gestores para a inserção dos mesmos neste contexto, como estratégia para promover a farmacoeconomia, o uso racional de medicamentos e uma maior resolutividade da atenção básica.

Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


Francicleber Medeiros de Souza

por Francicleber Medeiros de Souza

Farmacêutico Excelsior e Sanitarista, Especialista em Saúde Pública, em Saúde da Família, em Gestão da Saúde, em Gestão Pública Municipal e em Educação, Mestre em Ciências da Educação. Associado na Sociedade Brasileira de Farmácia Comunitária.

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