Fonoaudiologia e educação especial: a trajetória histórica

Educação especial
Educação especial

Fonoaudiologia

15/07/2013

A construção da relação entre a Fonoaudiologia e a Educação Especial, perpassa a história de formação e consolidação das duas ciências, mediante a fundação em 1854 do Imperial Colégio para meninos cegos, hoje Instituto Benjamim Constant (JANNUZZI, 2004). E em 1855, com a fundação do Colégio Nacional, destinado ao ensino dos surdos, que passou por vários nomes até ser reconhecido, em 1857, como Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES).

Em 1912 o Dr. Augusto Linhares, um precursor da Fonoaudiologia no Brasil, já propunha a diferenciação entre a Fonoaudiologia e a Educação Especial e inicia as pesquisas em reabilitação dos distúrbios da voz e da fala, bem como elaborou e ofereceu conferências sobre o “Tratamento da Voz” e “Gagueira” para orientar professores e outros profissionais. (IROS, 2006)

Segundo Jannuzzi (2004), a história da Educação Especial no Brasil decorre dos conhecimentos advindos de diversas ciências, desde a época imperial em que os deficientes eram isolados em asilos e hospitais. Em 1854, ainda no Brasil Colônia, a criação das instituições especializadas para cegos e surdos, coincide com duas vertentes educacionais: médico-pedagógica e a psicopedagógica, em que a primeira enfatizava a determinação médica, tanto para o diagnóstico quanto para as práticas escolares, e a segunda priorizava os princípios psicológicos.

No período republicano essas vertentes continuam fortalecidas e a visão médica foi preponderante, pois médicos eram os maiores interessados em estudar a educação dos deficientes, o que resultou em segregação, pois a concepção de deficiência articulava-se como doença. (JANNUZZI, 1992)

Já com a adesão de psicólogos na educação, a vertente psicopedagógica da educação acentua-se. No que tange à Educação Especial os partidários desta concepção propunham testes de inteligência para identificar os deficientes mentais e propor métodos de ensino especiais.

Em 1929, chega ao Brasil à psicóloga russa, Helena Antipoff, e dissemina várias ações que mudaram o panorama da educação especial no país. A partir daí houve uma organização de propostas para compor serviços de diagnósticos, classes homogêneas na rede comum do ensino primário e classes especiais para deficientes mentais. Em 1932 surge a Sociedade Pestalozzi e em 1954 a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais. (JANNUZZI, 1992).

Nunes, Ferreira e Mendes (2004) apontam que na década de 1970, devido à necessidade de atendimento à clientela da Educação Especial, garantida por meio de legislação (Lei 5.602/71), criou-se serviços de Educação Especial. Esta necessidade já estava apontada em legislação anterior, embora o foco estivesse centrado mais na abordagem terapêutica do que na educacional.

Este impulso na criação dos serviços de Educação Especial culmina, em 1973, com a formação do primeiro órgão Nacional de Política de Educação Especial, o CENESP, responsável pela mobilização e crescimento de movimentos nacionais e hoje órgão subordinado ao Ministério da Educação - MEC.

Um momento crucial para a Educação Especial ocorreu em 1994, após a Declaração de Salamanca, que repercutiu em novas concepções sobre as pessoas com necessidades especiais e propôs uma escola inclusiva para gerar estudos e publicações que enfatizassem a inclusão e não mais a integração desse aluno nas escolas da rede regular de ensino.

A Educação Especial apareceu pela primeira vez na LDB 4.024/61 com a referência à educação dos excepcionais, enquadrando-a no sistema geral de educação. Já na LDB 9.394/96, o art.58 refere-se à Educação Especial como uma modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede de ensino regular, para educar o portador de necessidades especiais.

Para tanto, Mazzotta (1996), esclarece que a Educação Especial tem a finalidade de: [...] Oferecer atendimento especializado aos educandos portadores de deficiência, respeitando as necessidades e diferenças de cada criança, com o objetivo de proporcionar o desenvolvimento global desses alunos, em seus aspectos: cognitivo, afetivo, psicomotor, linguístico e social, tornando possível não só o reconhecimento de suas potencialidades como sua integração na sociedade.

Neste breve histórico da Educação Especial podemos verificar as concepções que permearam esse campo de conhecimento. No bojo da construção dessa área, verifica-se que a Educação Especial é multidisciplinar e incorporou pesquisas, técnicas e trabalhos de outras áreas de conhecimento para operacionalizar e desenvolver as habilidades das pessoas com necessidades especiais. Segundo Silva (2004), as temáticas estudadas pela Educação Especial estão relacionadas com a prevenção, reabilitação e equiparação de oportunidades.

Na interface entre a Fonoaudiologia e a Educação Especial são significativas as pesquisas na área de linguagem e audição que associa as áreas e complementam suas formações.
Alguns desses trabalhos podem ser visualizados aqui, tais como Paro (2002) que realizou avaliação audiológica periférica e processamento auditivo em portadores de Síndrome de Down, comparou os resultados com um grupo controle, correlacionando-os aos processos terapêuticos e educacionais, demonstrou a importância da audição periférica e das habilidades do processamento auditivo para o processo terapêutico e educacional, além de, considerar significativa a sistematização de tais avaliações nesta clientela, com a finalidade de detectar, intervir e minimizar os prejuízos de tais alterações deste modo, proporcionar melhor qualidade de vida aos portadores de Síndrome de Down.

Andrade (2002) realizou estudo que teve por objetivo a avaliação qualitativa do desenvolvimento de crianças com alterações sensório-motoras de origem sindrômica de zero a três anos através do trabalho de reeducação destas crianças, durante o período de orientação fonoaudiológica das mães. Os resultados demonstram que a evolução do desenvolvimento das crianças estava diretamente relacionada à interação mãe-criança.

Já Bello (2009) por meio da análise bibliométrica mapeou a produção científica da área da Educação Especial com interface em Fonoaudiologia nas dissertações e teses defendidas no PPGEEs/UFSCar no período de 1981 a2005 e identificou em 74 trabalhos que a deficiência auditiva foi a mais investigada; a temática focada nos trabalhos foi “Ensino-aprendizagem” e ao realizar a análise quantitativa das referências utilizadas nos trabalhos que fazem correlação com a área de Fonoaudiologia observou-se que se encontraram indexados na Pro-fono: Revista de Atualização Científica e no Journal of Speech and Hearing Disorders; já os da área de Educação Especial na Revista Brasileira de Educação Especial, assim o estudo caminhou na direção de valorizar a interdisciplinaridade existente entre estas áreas de conhecimento.

Dessa forma pode-se observar que a Fonoaudiologia e a Educação Especial estabelecem relações de proximidade por possuírem objetos de estudos semelhantes, além de que o trabalho integrado entre os profissionais maximiza possibilidades de crescimento para ambas as áreas de conhecimento.
Bibliografia
ANDRADE, R.V. Trabalho de reeducação quanto à comunicação oral de crianças com alterações sensório-motoras de origem sindrômica (0 a 3 anos): enfoque na orientação das mães. 2002. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, 2002.
BELLO SF. Interfaces Educação Especial e Fonoaudiologia: um estudo baseado na produção científica de dissertações e teses [dissertação]. São Carlos: PPGEEs/UFSCar; 2009.
JANNUZZI, G.M. A educação do deficiente no Brasil: dos primórdios ao inicio do século XXI. Campinas: Autores Associados, 2004.
JANNUZZI, G.M. A luta pela educação do deficiente mental no Brasil. Campinas: Autores Associados, 1992.
INSTITUTO DE REABILITAÇÃO ORGÂNICA E SENSORIAL - IROS. Histórico da Fonoaudiologia. Disponível em:<http://www.iros-fonoaudiologia.med.br/conhecimento.htm>. Acesso em: 20 ago. 2006.
MAZZOTTA, M.J.S. Educação Especial no Brasil: história e políticas públicas. São Paulo: Cortez, 1996.
NUNES, L.R.O.P.; FERREIRA, J.R.; MENDES, E.G. A produção discente da pós-graduação em educação especial e psicologia sobre o indivíduo com necessidades educacionais especiais. In: ALMEIDA, M.A.; WILLIAMS, L.C.A.; MENDES, E.G. Temas em Educação Especial: avanços recentes. São Carlos: Edufscar, 2004. p.131-141.
PARO, P.M.M. Incidência de perdas aditivas e desordens do processamento auditivo em portadores de Síndrome de Down implicações educacionais. 2002. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em Educação Especial, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2002.
SILVA, M.R. Análise bibliométrica da produção científica do Programa de Pós-graduação em Educação Especial da UFSCar. 1998 – 2003. 2004. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Educação Especial, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2004.

Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


Suzelei Faria Bello

por Suzelei Faria Bello

Graduada em Fonoaudiologia pela UNESP/Marilia, Pedagoga, Psicopedagogia, Mestre e Doutora em Educação Especial pela UFSCar, Tem experiência na área de fonoaudiologia escolar, inclusão, produção científica.

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