06/10/2015
O Brasil enfrenta grave crise econômica e política. Soluções são propostas, desfeitas ou logo em seguida abandonadas. Mas raramente as causas das crises são abordadas de modo responsável, na maioria das vezes atribuídas a "fatores externos". Aliás, identificar as causas como "fatores externos" carrega implicitamento o reconhecimento da inabilidade para controlar e influenciar os fatores de risco que desequilibram a manutenção da prosperidade e bem estar econômicos.
No Brasil, os problemas são em geral enfrentados de modo reativo. Soluções "ad hoc" são propostas e, muitas vezes, com elevados custos. Houvesse comportamento proativo, aqui entendido como capacidade na previsão e adoção de medidas corretivas, tais situações seriam duradouramente controladas. Mas como se desenvolve a capacidade de previsão de riscos?
Para além da adoção de tecnologias de ponta como ferramentas na solução de problemas encontra-se um fator de baixíssimo custo, acessível por todos, mas que exige aquilo que os inovadores norte-americamos denominam "hard work" e que não significa apenas "trabalho duro" em uma tradução literal, mas engajamento, controle, domínio e criatividade. Ou, de forma bastante singela, habilidade para gerar ideias e ações articuladas.
A noção de ideias e ações logicamente articuladas não é recente. Jean Piaget, criador da epistemologia genética, um modelo de desenvolvimento cognitivo a que todas as pessoas estão submetidas, identifica o quarto estágio do desenvolvimento intelectual com o surgimento da habilidade de execução mental de operações sobre fatos e objetos voltadas para o alcance de objetivos. Ao estabelecer que as operações são mentais, portanto sem materialidade física, e tem por base fatos e objetos empíricos, estamos diante do desenvolvimento da habilidade de planejamento e previsibilidade de resultados. Pela imaginação, a experimentação e validação de diferentes possibilidades permitem a visualização da solução mais adequada.
Oposto à articulação das ideias na solução de problemas temos o modelo de aprendizagem fragmentado. Este é o modelo, implicitamente, adotado na maioria das escolas brasileiras. Por ele, o aluno aprende conceitos pela memorização, mas não desenvolve adequadamente a capacidade de correlacionar conceitos para a solução de problemas corriqueiros no cotidiano. Piaget identificou a memorização como estágio de desenvolvimento intelectual, em que problemas são resolvidos somente pela reprodução de soluções passadas. No Brasil, o Instituto Paulo Montenegro, na pesquisa e mensuração das habilidades e práticas de leitura, escrita e cálculos aplicáveis ao cotidiano entre a população brasileira na faixa de 15 a 64 anos (INAF - Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional), aponta que aproximadamente 65% desse contingente não desenvolveu suficientemente tais habilidades. Ou seja, memoriza conceitos, mas não sabe contextualizá-los e aplicá-los no cotidiano de suas existências.
Uma demonstração de que predominantemente a escola brasileira incentiva a memorização pode ser verificado nos métodos avaliativos adotados. As questões não são interdisciplinares e muitas vezes concentram-se na definição de conceitos sem explorarem suas aplicabilidades para além do contexto específico em que são ministradas. Se assim não fosse, os indicadores de alfabetismo funcional do Instituto Paulo Montenegro recém citados não retratariam uma realidade tão desanimadora. Se inexiste correlacão entre conceitos, a habilidade de planejamento e previsibilidade de resultados inexiste; se inexiste planejamento, a capacidade de inventar o futuro e prever riscos, necessários a proatividade, inexiste; se inexiste proatividade, o pleno desenvolvimento econômico e social, em contextos de competitividade econômica, inexiste; se inexiste pleno desenvolvimento econômico e social ... permanecemos estagnados no padrão de vida já alcançado ou retrocedemos em relação às nações mais desenvolvidas, com crises quando a razão necessidades materiais / crescimento econômico rompe determinados limites.
Neste ponto do texto, é esclarecedor retomarmos a ideia de "hard work" acima exposta: seu sentido é a necessidade de compreensão do contexto competitivo contemporâneo e aceitar que o incremento nas habilidades cognitivas não ocorre de modo natural, como supõem muitos profissionais da educação adeptos do "cognitivismo" inato e que, portanto, possuem responsabilidade nos índicadores negativos da educação (os dados do MEC expressos na Avaliação Nacional de Alfabetização 2014 indicam que 56,17% dos estudantes brasileiros no 3º ano do ensino fundamental têm baixo nível de leitura). As formas adequados para o desenvolvimento cognitivo passam pela análise fria dos dados (e não das crenças), com a identificação individual das inabilidades e, racionalmente, o estabelecimento de planejamento para superar tais deficiências .
Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.
Graduado em Psicologia pelo Centro Universitário de Santo André (2004); Graduado em Direito pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo (2006); Mestre em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela Faculdade de Direito da USP (2010); Especialização em Planejamento, Implementação e Gestão de EAD pela UFF (2014) e Especialização em Tecnologia e Sistemas da Informação pela UFABC (2015).
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