Uso de medicamentos em idosos: anestésicos locais

A caracterização da dor é importante para conduta a ser adotada
A caracterização da dor é importante para conduta a ser adotada

Odontologia

14/02/2013

A dor é um problema comum a todas as especialidades da Odontologia. Infecções orais, cáries, doença periodontal, próteses mal adaptadas ou outras doenças das estruturas orais causam dor. Além disso, o próprio tratamento odontológico pode determinar algum ¬grau de desconforto ou dor.

A caracterização da dor é importante para conduta anestésica e analgésica a ser adotada. A dor aguda em Odontologia compreende a dor da dentina exposta e a dor inflamatória. A primeira caracteriza-se por uma dor súbita que ocorre após estímulos como o frio e presença de açúcares. Postula-se que haja movimento de fluido nos túbulos dentários que estimularia fibras nociceptivas localizadas na porção pulpar dos micro túbulos. A exposição de dentina ocorre por perda de esmalte, de cemento ou gengiva, aumentando a sensibilidade com a idade ou após a irritação crônica.

A dor proveniente de processo inflamatório tem um curso mais prolongado devido a estímulos mais sustentados em nociceptores periféricos, determinando a liberação de mediadores químicos locais. Pode ainda haver edema, eritema, aumento de temperatura local e perda da função. Por vezes, apesar da origem inflamatória, esses sinais concomitantes estão ausentes, sendo a dor um fenômeno isolado, e como tal devendo ser manejada.

A dor crônica, de menor frequência em Odontologia, inclui a odontalgia atípica, a dor facial psicogênica, a neuropatia diabética, as desordens tempomandibulares e a fibromialgia. Nesses casos, o tratamento da dor torna-se mais complexo.

A intensidade da dor dentária pode suplantar a das originadas em outras estruturas orgânicas ou dependentes de patologias diversas. Melzack (1975) comparou através de um de dor total, as sensações advindas de procedimentos odontológicos e de outras condições.

Da mesma forma como acontece com os demais pacientes odontológicos, a anestesia local é o procedimento mais rotineiro nos idosos. Por isso, o cirurgião-dentista deve sempre observar alguns procedimentos importantes na sua execução, como o conhecimento sobre o estado de saúde geral do paciente, seleção correta do anestésico que está injetando e domínio da técnica anestésica escolhida.

Especificamente no idoso sabe-se que, com o avanço da idade, ocorrem importantes alterações nos processos de distribuição, metabolização e eliminação dos medicamentos. Isso não é diferente com relação aos anestésicos locais, já que uma vez administrados na cavidade oral, também são absorvidos, distribuídos, metabolizados e eliminados, como qualquer outro medicamento. Além disso, após a absorção para a corrente sanguínea, os anestésicos locais passam a agir sistemicamente em todas as células com membranas excitáveis, principalmente as células nervosas e cardíacas.

O anestésico local até então mais utilizado em odontologia é a lidocaína, que sofre metabolização no fígado e eliminação pelos rins. Portanto, em pacientes com atividade hepática ou filtração glomerular reduzida, como é o caso dos idosos, o risco de sobredose é maior.

Em função disto, recomenda-se que as doses de lidocaína neste grupo de pacientes devam ser reduzidas, sendo que a dose máxima não deve ultrapassar o equivalente ao contido em três tubetes de uma solução de lidocaína a 2%.

Agregados à lidocaína, encontram-se os vasoconstritores nas soluções anestésicas locais, que normalmente pertencem ao grupo das aminas simpatomiméticas: adrenalina (epinefrina), noradrenalina (norepinefrina) e fenilefrina. Essas drogas possuem ação sobre o sistema cardiovascular; a adrenalina provoca por estimulação direta, aumento da atividade cardíaca, desencadeando a taquicardia; já a noradrenalina e a fenilefrina provocam bradicardia por ação reflexa, devido a uma ação constritora sobre os vasos periféricos. Dependendo da situação, essa atividade bradicárdica pode levar o paciente a uma parada cardíaca.

Portanto, nos idosos portadores de insuficiência cardíaca crônica ou arritmia cardíaca, sob acompanhamento médico, recomenda-se evitar o uso de soluções anestésicas contendo vasoconstritores do tipo noradrenalina ou fenilefrina, devendo-se optar por aquelas soluções contenham adrenalina em baixas concentrações (1:100.000 ou 1:200.000).

Da mesma forma que nos pacientes de outras faixas etárias, deve-se evitar o uso de soluções anestésicas locais sem vasoconstritor, pois se o paciente sentir dor durante o atendimento, poderá ocorrer uma liberação endógena de adrenalina pelas glândulas suprarrenais em até 40 vezes, podendo acarretar efeitos sistêmicos relevantes. Além disso, o uso desses agentes em pacientes diabéticos tem efeito mínimo no nível de glicemia, provavelmente devido à sua absorção relativamente lenta, sua baixa concentração e aos pequenos volumes usados. Uma anestesia profunda com vasoconstritores diminui a liberação de epinefrina endógena, contribuindo para a manutenção dos níveis glicêmicos dos pacientes diabéticos.

Quando houver contra indicação absoluta da utilização de vasoconstritores, pode-se optar pela mepivacaína 3%, um anestésico local quimicamente similar à lidocaína, que além de apresentar baixa toxicidade, possui uma menor atividade vasodilatadora, podendo ser empregada sem estar associada aos vasoconstritores em procedimentos com duração de até 30 minutos.

No Brasil a mepivacaína também é encontrada na concentração de 2%, associada à adrenalina 1:100.000, que também pode ser empregada no idoso, sem esquecer de que ela também é metabolizada pelo fígado e, portanto, deve ser usada em doses baixas para evitar possibilidade de níveis plasmáticos altos. Recomenda-se o seu emprego na concentração de 2% associada à adrenalina a 1: 100.000, até o limite de três tubetes anestésicos.

A prilocaína deve ser empregada com precaução em pacientes idosos, principalmente naqueles que apresentam alterações da série vermelha do sangue e nos que estejam fazendo uso de medicamentos que contenham paracetamol ou fenacetina, substâncias estas que sabidamente também podem provocar metemoglobinemia. Este anestésico, após metabolizado, gera orto toluidina. Em função dessa característica química, seu uso em altas doses pode provocar o quadro clínico de metemoglobinemia, caracterizado por um aumento do teor de metemoglobina no sangue, que pode induzir à cianose.
No Brasil a prilocaína está disponível na concentração de 3% associada à felipressina 0,03 UI/ml, comumente conhecida como octapressin®. A ação vasoconstritora da felipressina é muito menor quando comparada com a exercida pelas aminas simpatomiméticas. Por isso se acredita que a felipressina seja desprovida de uma ação sistêmica significativa sobre o sistema cardiovascular, recomendando seu uso em pacientes que não podem receber vasoconstritores do tipo amina simpatomimética.

Da mesma forma que os demais anestésicos locais, a prilocaína é metabolizada principalmente pelo fígado e, além disso, apresenta uma menor taxa de ligação às proteínas plasmáticas. Como no idoso há uma redução da quantidade das proteínas plasmáticas, haverá um aumento do teor de prilocaína circulante e, como consequência, uma possibilidade maior de efeitos tóxicos. Diante disso, a prilocaína, quando selecionada para pacientes idosos, não deve ultrapassar a quantidade contida em dois tubetes anestésicos.

Uma última opção que pode ser considerada para o idoso é a bupivacaína, um anestésico local quimicamente derivado da mepivacaína, que se encontra no comércio associado à adrenalina 1 :200.000.

Para técnicas tronculares de bloqueio, a bupivacaína é cerca de 3 a 4 vezes mais potente que a lidocaína, proporcionando uma anestesia mais intensa e de maior duração de ação, chegando a durar por 6 a 7 horas, em média. Essa característica é bastante útil, principalmente em intervenções cirúrgicas complexas, onde há perspectiva de dor pós-operatória de maior intensidade. Outro aspecto a ser considerado é a baixa concentração de vasoconstritor associado a este sal anestésico (adrenalina 1 :200.000), permitindo sua utilização no idoso.

Por outro lado, como também é metabolizada no fígado, as doses devem ser reduzidas. No idoso, não se deve ultrapassar a utilização em dois tubetes anestésicos, sendo que normalmente apenas um tubete (1,8 ml) é suficiente para a maioria das intervenções odontológicas nestes pacientes.

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