17/04/2014
Introdução - A Importância da Literatura para o Indivíduo:
Hoje, cabe ao ensino de literatura a responsabilidade pela formação do leitor, visto que a literatura está diretamente associada à leitura. Através da literatura é possível viajar pelo mundo da fantasia sem sair do lugar, aprender a lidar com as experiências e sentimentos presentes em nossa vida, de forma mais amena. Temos que conscientizar os jovens que tudo se aprende na prática: aprende-se a ler, lendo; aprende-se a escrever, escrevendo, dentro de um processo de aprendizagem contínuo, que não deve parar nunca. “Hoje, se me pergunto por que amo a literatura, a resposta que me vem à cabeça é porque ela me ajuda a viver. Não é mais ao caso de pedir a ela, como ocorria na adolescência, que me preservasse das feridas que eu poderia sofrer nos encontros com pessoas reais; em lugar de excluir as experiências vividas, ela me faz descobrir mundos que se colocam em continuidade com essas Experiências e me permite melhor compreendê-las [...]”(Todorov 2009, p.23-24) “Mais densa e mais eloqüente que a vida cotidiana, mas não radicalmente diferente, a literatura amplia nosso universo, incita-nos a imaginar outras maneiras de concebê-lo e organizá-lo. Ela nos proporciona sensações insubstituíveis que fazem o mundo real tornar-se mais pleno de sentido e mais belo. Longe de ser um simples entretenimento, uma distração reservada às pessoas educadas, ela permite que cada um responda melhor à sua vocação de ser humano.” (idem, ibidem).
Farei uma citação relatada em “A arte de ler” (Petit 2009, p.17) sobre exemplos de como a literatura pode ajudar as pessoas em situações extremas como em períodos de guerras, após uma desilusão amorosa, um luto, uma doença, etc.: “Minha avó lia sem parar. E eu apanhava tudo o que me caía nas mãos [...] Com doze anos descobri Guerra e Paz e não fiquei mais doente. Continuo acreditando que Tolstoi me salvou.” A fuga da realidade mesmo que seja de forma momentânea, em certos casos é essencial à vida. Alguém que está desempregado pode buscar na leitura uma oportunidade de se distanciar de sua realidade dura e crua. Nos tempos difíceis em que vivemos, também referenciados no livro de Petit (2009, p.20), após o dia 11 de setembro de 2001, segundo o Jornal Le Monde, de 22/09/2001: “o público se volta para a leitura para compreender a crise.”, por conseqüência da multidão que acorria às livrarias nova iorquinas.
Por outro lado, acredita-se que o interesse pela leitura possa ser despertado quando a criança ainda pequena não sabe ler, pelos seus pais, que podem contar-lhe histórias, pois à medida que esta criança for crescendo e chegar à idade escolar, ela por si própria sentirá o desejo de ler e descobrir novos universos e assim adquirir o hábito da leitura desde cedo e não de maneira obrigatória com vista única para o vestibular, como vemos acontecer nas escolas. As interações com as obras devem fruir de forma mais natural e com resultados muito mais significativos.
Podemos pensar também que se educar é extrair as experiências cotidianas e ensinar a enfrentá-las, é possível relacionar a literatura com a educação para a vida, pois altera o comportamento de cada indivíduo e o ajuda a viver em sociedade. Isto posto, porque não apresentar as obras de Shakespeare através de algumas adaptações de suas obras mais importantes, para preparar o jovem leitor e depois com os clássicos fazê-lo ter uma leitura de fruição que o faça questionar, dialogar, confrontar, formar sua opinião, fazendo-o buscar suas próprias respostas aos enigmas que surgirem.
Através das adaptações como as Graphic Novels da Editora Heinle-Cencage Learning, é possível reproduzir as peças em forma de história em quadrinhos com ilustrações fascinantes e com CD de áudio, assim como os comics e hangás, retratando de forma jovial, com uma linguagem mais simples provida de ação, brotando assim nas mentes dos adolescentes o interesse pelas tramas de Shakespeare, fazendo-os participar como se eles também fossem personagens.
Podemos citar exemplos atuais de sua popularidade: A encenação de suas peças por atores como Thiago Lacerda em “Sonho de Uma noite de Verão” e “Hamlet”, por Wagner Moura, ambos excelentes e populares atores em contraposição com o erudito. A “Megera Domada” foi fonte de inspiração para a novela “O Cravo e a Rosa”, exibida pela Rede Globo de Televisão em 2000. Lembremos que Shakespeare já era popular em sua época e continua sendo até mesmo no cotidiano das pessoas, que às vezes, sem querer usam e falam Shakespeare para se expressar. Expressões conhecidas foram utilizadas em suas peças: “Nem tudo que reluz é ouro”, “Num piscar de olhos”, “O que não tem remédio, remediado está”, “Parar o carro na frente dos bois” e o inevitável “Ser ou não ser...”.
Com a orientação fundamental do professor de literatura e com os recursos e meios necessários para os alunos terem acesso a todo conteúdo citado, podendo fazer uma leitura em voz alta e compartilhada de trechos de obras e parando em antes de pontos como o clímax, o que incitará os alunos a lerem estas obras integralmente, ou seja, tudo isso pode ser aprimorado, desenvolvido, gerando debates, discussões, opiniões, até representações de trechos de obras originais escritas para o teatro.
Acredita-se que a literatura de Shakespeare, com toda a sua paixão pelo ser humano e seus aspectos mais ocultos e misteriosos, despertará grande interesse por parte de seu jovem leitor, por estarmos cada vez mais afastados do nosso lado “humano” em sua essência, tentar buscar um caminho para resgatar o amor nas relações humanas. A possível leitura das obras de Shakespeare pode metamorfosear-se em uma leitura de fruição, uma leitura desafiadora, que deixará seu leitor em conflito, desconfortável. Este trabalho tem como objetivo encontrar maneiras de aproximar as obras de Shakespeare com o público adolescente do nosso século.
Observamos que um aspecto muito importante para chamar a atenção num livro adaptado está relacionado com sua estética, como é seu formato, se possui ilustrações, o tipo e tamanho de fonte, sua linguagem simples pode tornar-se exótica aos olhos do público jovem, que devido aos graus de literariedade pode ler textos de fruição que possam tornar-se prazeirosos. Encontramos várias adaptações, uma que nos chama muito a atenção é a coleção da Editora Dimensão que fez dos clássicos, adaptações fantásticas.
Citarei a obra “A Megera Domada” (1995), que ganhou várias premiações como melhor Projeto Editorial (1996) da APCA e Melhor Tradução (1996) da FNLIJ (Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil) e foi selecionado para a Organização de Bibliotecas do MEC (1997). O livro tem formato A4 com capa dura, a disposição do texto se dá numa página e na página ao lado vem as figuras, que com sua impecabilidade conseguem transgredir a riqueza da literatura, sua arte e beleza.
Segundo comentário do tradutor Floriano Tescarolo (1995) no mesmo livro retro-mencionado: “Nas mãos dos irmãos Charles & Mary Lamb, as narrativas atingem os corações e as mentes, dando um antegosto do prazer que os leitores deverão encontrar na leitura da obra completa do genial Shakespeare”. Analisando o objetivo e a justificativa deste projeto, adentramos na sua genialidade, Shakespeare acreditava no amor perfeito, a admiração pelo humano ou a busca do que significa ser humano, que é belo fisicamente e intelectualmente, o que não ocorre na realidade, diante de tanta maldade, guerra e desamor entre os indivíduos. Esta visão criará um confronto entre a ficção e o real, uma discussão de como é e como deveria ser.
Contudo, temos uma certeza: a literatura surge para desautomatizar nossa visão do cotidiano, desenvolvendo e despertando nossa sensibilidade, inteligência, até mesmo indignação e denunciando, rompendo o silêncio e desmascarando a realidade transformando nossa consciência acerca do mundo, fazendo com que os papéis sociais sejam assim representados. Para Ezequiel Theodoro (2008): “Literatura: palavra em liberdade, de infinitos caminhos e direções, puxando o interlocutor para a prática da participação e do prazer [...]” “Há que ser literatura para romper o silêncio, desentrevando e retro-alimentando os sentimentos e a inteligência do mundo. A fruição de um bom romance é como a produção de uma esculta de mármore: transforma, fica.” (p. 25 a 28)
O mundo da ficção com o qual nos deparamos na literatura, em especial nas obras de Shakespeare, nos propõe ao que parecem ser problemas sejam pessoais ou sociais, uma possível solução para as situações difíceis que enfrentamos no dia a dia.
Shakespeare e suas obras:
Apresentarei uma pequena biografia de Shakespeare, suas cinco obras escolhidas que terão destaque e a justificativa da escolha de cada uma.
1564: Nasce a estrela maior: “William Shakespeare”, em 23 de abril em Stratford-upon-Avon;
1582: Aos 18 anos, casa-se com Anne Hathaway, grávida de 3 meses de sua primeira filha, Susanna;
1585: Nascem os gêmeos Hamnet e Judith;
1592: Após sete anos, Shakespeare surge em Londres como dramaturgo conhecido pela peça “Henrique VI” e escreve sua obra-prima, “Ricardo III”;
1593: Por conta de uma epidemia de peste bubônica, os teatros de Londres fecham suas portas, o que fez nosso dramaturgo escrever poesias também;
1594: Escreve: “A Megera Domada”;
1595: Escreve: “Sonho de uma Noite de Verão”, “Romeu e Julieta”. Na época sua companhia de teatro já se apresentava frequentemente para a Rainha Elizabeth I;
1598: Escreve: “Muito barulho por nada”;
1599: A companhia de teatro de Shakespeare constrói seu próprio teatro “The Globe” e ele se torna acionista do imóvel, escreve “Julio César”, “Muito barulho por nada” e “Henrique V”;
1601: Escreve “Hamlet”, a mais importante de suas obras;
1603: Com a morte da Rainha Elizabeth I, assume o trono de rei da Grã Bretanha, Jaime I da Escócia. Shakespeare cai nas graças do rei e sua trupe;
1604: Escreve três de suas tragédias: “Otelo”, “Rei Lear” e “Macbeth”;
1611: Escreve sua última grande peça: “A Tempestade”;
1613: Um incêndio destrói o teatro “The Globe”, que é reconstruído em seguida no mesmo ano. Shakespeare volta a viver em sua cidade natal;
1616: Morre William Shakespeare no mesmo dia e mês de seu nascimento, nos deixando um legado de aproximadamente 39 peças entre textos de outros gêneros.
Com o surgimento e a descoberta de Shakespeare e sua obra, o homem ocupa o “centro do palco”. Nascem as comédias, as tragédias e os sonetos. Suas peças foram escritas para serem encenadas e para encantar a todos. Através da magia da linguagem ele era capaz de retratar sua realidade poética que tocava de perto sua platéia assim como é até hoje. Suas peças já foram representadas em palcos espalhados pelo Brasil e pelo mundo, tornando-se imortalizadas, já que tratam de emoções e sentimentos comuns a todos nós, seres humanos. Sua genialidade persiste nos sonetos, que simbolizam um amor perfeito e imutável, a admiração do ser humano pela beleza física, a melancolia decorrente talvez de uma desilusão amorosa, explorando a temática do amor.
As cinco obras escolhidas para este trabalho são: Romeu e Julieta, Macbeth, Sonho de uma Noite de Verão, Muito Barulho por Nada e Hamlet. Esta escolha foi feita através de pesquisas, observações das adaptações criadas que foram consagradas e que possuem funcionalidade e potencialidade para o leitor, cada uma à sua maneira, de acordo com seu enredo, que resumirei nas próximas páginas, a partir do texto de Heliodora (2008).
“Something is rotten in the state of Denmark (...) There are more things in Heaven and Earth (…) Than are dreamt of in our philosophy.” (Hamlet)
1) Romeu e Julieta:
Tragédia lírica cuja história foi baseada no poema “A trágica história de Romeu e Julieta”, de Arthur Brooke. Essência moralizante da obra, morte do casal pela desobediência de Julieta à sua mãe, contando com o apoio da Ama e de Frei Lourenço. Brooke por ser protestante queria dizer com isto que o casamento por um padre é ilegítimo e o caminho da corrupção e da prostituição. Shakespeare abre espaço na peça com outra questão: Romeu e Julieta são vítimas do ódio entre suas famílias, tornando a peça uma história de amor e uma afronta à guerra civil. No poema original eles permanecem casados por 6 meses, em Shakespeare dura quatro dias considerando-se a culpa da inconsequência dos jovens.
2) Macbeth:
Personagem coberto de maldade, herói das batalhas, dotado de virtudes e defensor do reino. É tomado pela ambição e poder, o que ele mal imaginava estava o conduzindo ao caminho da sua destruição. Sua mulher Lady Macbeth, é sua grande parceira e apóia o marido na conquista da coroa, acreditando que isto lhes trará a felicidade suprema. Há a impressão que a força dominante vem de Lady Macbeth, mas o grande herói trágico shakesperiano é o pleno responsável por seus atos. A função dela é estimular cada vez mais sua ambição. Macbeth mergulhado em suas dúvidas, através de seu passado guerreiro que lhe possibilitou ter consciência do que significa um corpo sangrando, coisa que sua mulher era incapaz de imaginar. O crime separa o casal, que antes fora tão unido. Após o primeiro assassinato, Macbeth ignora sua esposa e a deixa fora de seus planos, numa espécie de suicídio moral, com o hábito matando a sensibilidade. Os dois voltam a se encontrar no banquete no castelo em comemoração ao seu reinado. Durante o banquete diante do fantasma de Banquo, desesperada Lady Macbeth tenta amenizar o delírio da culpa do marido.
Ironicamente, ela enlouquece ao ver a imagem ensangüentada do Rei Duncan e se suicida longe do marido, restando a Macbeth sua coragem de guerreiro, porém estava consciente que perdeu sua alma por uma vida sem sentido. O mais impressionante durante a tragédia são as bruxas que o perseguem, os “seres indefiníveis, esquálidas e estranhas criaturas que não parecem habitantes da Terra”. Isto o assombrava, pois elas previam tudo que estava prestes a acontecer e inclusive profetizaram que ele seria o novo rei da Escócia, o que logo se concretizou com a morte de Sir Cawdor, anunciada por um servo que atribuiu as terras e o título a Macbeth. Vou detalhar um pouco mais como tudo se passou, visto que darei mais ênfase à esta obra: O Rei Duncan passaria a noite no castelo e esta era a oportunidade que a diabólica malfeitora Lady Macbeth queria para persuadir o marido a matar o Rei. No banquete ele ficou sabendo que Banquo estava morto mas seu filho Fleance estava vivo. Na caverna Macbeth indagou as bruxas sobre seu futuro e elas lhe revelaram coisas terríveis que estavam por vir. Eis que vieram as críticas ao seu reinado opressivo. Macduff que teve mulher e filhos assassinados pelo tirano expressa sua dor e espera por justiça. Malcolm, líder da força inglesa, determinou que cada soldado atirasse em Macbeth. Foi nesta noite que Lady Macbeth agitou-se blasfemando contra o próprio remorso que a levaria à loucura e à morte. Macbeth foi informado da morte de sua esposa, então se preparou para combater seus inimigos, acreditando ser invencível. Durante a batalha Macduff encontrou Macbeth e investiu contra ele, que proferiu as mesmas palavras das bruxas: “ninguém nascido de mulher poderia matá-lo”. Macduff diz: “fui arrancado do ventre de minha mãe” e fere Macbeth mortalmente.
3) Sonho de uma Noite de Verão:
Foi escrito em 1595 com várias fontes de inspiração como os Contos de Cantuária (The Cantebury Tales), do medieval Geoffrey Chaucer, as fadas folclóricas e Puck conheceu em sua infância. Dois universos distintos: na corte de Teseu, dias antes da data de seu casamento com Hipólita, em decorrência da oposição do pai ao casamento de Hérmia e Lisandro, que fogem para a floresta, onde vão encontrar o mundo da magia, da fantasia. Peça escrita para uma festa de casamento, todas as tramas giram em torno do amor e dos caprichos do percurso até encontrar o amor verdadeiro. Dois casais que por suas incertezas brigam como adolescentes. Oberon e Titânia, em um mundo de sonho e liberdade, brigam por ciúmes e por um pequeno pajem. Teseu e Hipólita, os mais maduros só se casam em paz depois de se enfrentarem na guerra. Ilustra a felicidade de um jovem casal cujo amor é contrariado pela família. Puck derrama o suco da flor que tem o poder de deformar nos olhos de Titânia que se apaixona por Bobina com cabeça de burro. Cenário: Grécia Antiga rodeada pela influência mitológica. Desfeitos todos os enganos de amor que entraram pelos olhos, que ocorrem à noite na floresta, a peça volta à Corte com apresentação do hilário espetáculo dos três casamentos, inspirado na ética Tudor de poder, preocupação como governante.
4) Muito Barulho por Nada:
Na realidade “nada” era uma forma irônica e até sarcástica de tratar uma grave acusação moral feita a Hero, a noiva, na própria cerimônia do casamento. A parte mais divertida durante a trama é as costumeiras brigas entre Beatrice e Benedick, que só admitem seu amor “por acaso”, quando ouvem seus amigos dizer que um está apaixonado pelo outro. O dialeto da linguagem utilizada é cheio de jogos de palavras, contraste entre os personagens opostos por classe, sexo, gênero ou poder, que vão desde as canções e prevalecem no decorrer de toda a história. Alusões e conotações sexuais. Disfarces e confusão: Tanto Beatrice quanto Benedick diziam que jamais se casariam e sequer se apaixonariam, pois não acreditavam no amor e acabam por cair no próprio feitiço, ou seja, sempre se amaram mas não queriam admitir pois para ambos isto significava uma fraqueza. A pureza e a honra de Hero são contestadas, na hora do aceite Cláudio diz “não” e a humilha na frente de todos. Frei Francisco deu a idéia brilhante para que Hero se passasse por morta até que fosse provada sua inocência. Os guardas os prenderam e tudo foi esclarecido, ao escutarem a conversa dos vilões que haviam planejado a maldade de fazer Cláudio acreditar que Hero não era mais pura e se encontrava com Borracho. No final todos casam-se e aparentemente vivem alegres e felizes.
5) Hamlet:
Composta entre 1601 e 1602, conta o drama de Hamlet, príncipe da Dinamarca que teve que abandonar seus estudos para morar na Corte, após a morte de seu pai. Apresenta as várias faces do talento literário de Shakespeare, num texto em que drama histórico, tragédia, sátira e romance mesclam-se na trajetória do jovem príncipe. Apresenta uma capacidade inquietante de atravessar os mistérios da mente humana, desnudando paixões, iluminando desejos, apontando os grandes fantasmas que sempre perseguiram a humanidade. Prevalecem dúvidas, dores, medos, injustiça e paixões.
“Ser ou não ser, eis a questão”, frase famosa citada por Hamlet em momento de dúvida e desespero.
Uma seqüência de angústias iniciam-se quando Hamlet mata Polônio, pai de Ofélia, ao confundi-lo com seu tio Cláudio. Ele é deportado para Inglaterra como louco. O suicídio de Ofélia e a traição do Rei marcam o final da trama. A troca acidental de armas entre Hamlet e o príncipe Laertes que fora atingido com a espada envenenada e a morte da rainha ao beber do vinho que o rei Cláudio pretendia oferecer a Hamlet. Esta tragédia mostra as dúvidas e o desespero de um príncipe diante da violência do mundo. As aparências que enganam e o predomínio das paixões sobre a razão são evidentes. Quando ele começa a ter visitas do fantasma do seu pai, que exigia vingança, ele decide fingir que havia enlouquecido no intuito de sobreviver a tudo a sua volta. Após surpreender seu tio assistindo uma peça cujos atos se assemelhavam à uma simulação da morte de seu pai e que isso perturbara profundamente o rei, Hamlet convenceu-se que seu tio realmente era o assassino de seu pai. Permanecem os conflitos dentro de sua mente: Devia matar seu tio ou não? Ou devia simplesmente perdoá-lo?
A relevância das adaptações diante dos clássicos:
Conforme constante nos capítulos anteriores, hoje em dia vemos um grande acervo de adaptações das obras de Shakespeare, dentre elas peças reencenadas com diálogos menos complexos, filmes recentes em versões hollywoodianas que têm como foco mais o enredo das tramas do que os próprios diálogos com sua linguagem bem elaborada e trabalhada, o que realmente visa um público jovem. Podemos ter como exemplo também as adaptações que citei no primeiro capítulo (p.5-7), as quais possuem um resultado muito positivo e funcional de acordo com a crítica literária. Surgem as questões: Até que ponto essas adaptações podem trazer benefícios para a formação do leitor? E quanto aos clássicos; a leitura canônica, como e quando devem ser abordados?
De acordo com o artigo: “Shakespeare na cena curitibana – Renovação da Tradição popular em Sonho de uma noite de verão” (2009), de Anna Stegh, por esta ser uma peça popular, já foi adaptada e reinventada de diversas formas midiáticas, culturais e linguagens distintas. Os maiores desafios foram encontrados ao relacionar a linguagem cênica com a época atual, promovendo uma reflexão sobre os problemas e inquietações da contemporaneidade. A peça dirigida pelo encenador paranaense Marcelo Marchioro (Curitiba, 1991), tinha como objetivo o distanciamento com as reconstituições anteriores, ousou captar e renovar o espírito festivo de Shakespeare com elementos circenses e investigar abordagens contemporâneas para aproximá-lo do expectador da atualidade. Assimilando a montagem antológica de Peter Brook (1960), Marchioro privilegiou 3 aspectos do “Sonho...”, a teatralidade, o humor e a magia, desprezando o exotismo, a exuberância do cenário e os clichês românticos exauridos nas peças do século XIX. Destacou a complexidade e a sutileza verbal do texto shakesperiano, que se espelhava em nossos envolvimentos emocionais e vida afetiva, como confusões amorosas, relações amor x ódio, paixões, desejos proibidos, desvarios, comportamentos irracionais e cruéis que lançam a razão sobre a emoção: principalmente as dicotomias: claro/escuro, razão/instinto e corpo/espírito.
O sucesso da adaptação cênica resultou-se da poética, da harmonia das linguagens abordadas, do ecletismo dos figurinos, da cenografia criativa adequada a seus objetivos, da versatilidade do palco elisabetano, da referência conceitual dos espelhos d’água, da beleza da sonoplastia e da iluminação, da magia do circo, que representava o universo mágico e fantasioso de Shakespeare, em linguagem contemporânea, numa espécie de “carnavalização bakhtiniana”, já que “A carnavalização é a transposição do espírito carnavalesco para a arte” (Introdução ao pensamento de Bakhtin, Fiorin J.L., cap.5, 2008), em que não há diferença de gênero e classe social, tudo se integra e se mistura. A popularidade do “bobo” estava ligada com seu relacionamento com o povo, mediando o palco e o público. A diferenciação das linguagens exploradas simbolizavam o verso branco para os nobres, versos rimados para o reino das fadas e prosa para os rústicos artesãos, o que inspirou a estética de criação em 3 linhas de atuação com completo aproveitamento. Os figurinos idealizados tinham o intuito de promover uma fusão entre o tempo da história e o nosso cotidiano, conforme definição de Santaella (2003): “um todo mesclado e interconectado de sistemas de signos que se juntam para formar uma sintaxe integrada.” Marchioro promove a fusão da dramaturgia de Shakespeare, as linguagens cênicas do contemporâneo e o acréscimo de elementos da cultura popular de hoje.
Encontramos no artigo:”Adaptação de Shakespeare para a Formação Literária” (2008), de Renato G. Lopes (FAC-Limeira), as adaptações dos clássicos citadas de forma crítica, dialogando com as indicações do Ministério da Educação e os professores de literatura. O autor instiga que as obras literárias canônicas, se forem adaptadas perdem suas características poéticas, sua linguagem própria rebuscada, faz críticas acerca das motivações de cunho pedagógico, literário e comercial, defendendo a idéia de que o professor deve insistir e oferecer aos seus alunos os clássicos originais, pois experiências de leitura formadora com textos clássicos originais e de interesse dos alunos podem ser satisfatórios aos objetivos de formação literária.
O professor deve assumir o papel de mediador e de incentivador sem temer a noção de que os clássicos ainda têm algo a nos dizer. Em citação à adaptação de Ana Maria Machado de “Sonho...”, ele questiona a idéia de que a obra deva ser adaptada para assim ser compreendida pelo aluno, abolindo a oportunidade do mesmo aluno de contatar a arte dramática shakesperiana e apreciar seu lirismo, já que as versões facilitadas impossibilitam até mesmo a interpretação, fundamento da leitura literária. Julga-se pressupostamente que os leitores em formação encontrarão dificuldades em demasia ou má vontade e que as adaptações impostas e obrigatórias possibilitam ao aluno saber de forma superficial quem foi “aquele autor famoso”, portanto conclui que este tipo de leitura não lida com a literatura: “Por que oferecer Shakespeare, se o Shakespeare que se oferece é falsificado?”
O que se busca, inclusive de acordo com os PCN’s (1999), através das habilidades e competências, é o papel da escola em passar as técnicas de leitura na aprendizagem da literatura, que chega ao resultado final na forma da logomarca, o status, o produto Shakespeare, infelizmente. Vê-se aí o ajustamento das adaptações às atuais necessidades da escola moderna. Eis que surge uma nova questão: “Cânone e gosto pela leitura: como unir essa duas noções?” Para Lopes (2008), os professores mais tradicionais e zelosos hão de avaliar o livro adaptado, sua autenticidade como objeto literário-pedagógico, se há qualidade e funcionalidade. Os termos “cânone, clássico e literário” renegam a denominada alta costura por entediante, difícil, quiçá elitista. A realidade é que àqueles que não tiveram uma educação seguida de uma formação literária, lhes foi negada a possibilidade de se aproximar de maneira prazerosa de um clássico, de enredo atraente e bem elaborado, a possibilidade de igualdade à uma elite “culta”, o que lhe facilitaria o acesso a bens cultuais e materiais em sua função ora psicológica, ora espiritual do enriquecimento do ser.
De acordo com as OCN’s (2006), Conhecimentos de literatura - cap.2: “Concluído o ensino fundamental, supõe-se que os alunos que ingressam no ensino médio já estejam preparados para a leitura de textos mais complexos da cultura literária, que poderão ser trabalhados lado a lado com outras modalidades com as quais estão mais familiarizados, como o hip-hop as letras de música, os quadrinhos, o cordel, entre outras relacionadas ao contexto cultural menos ou mais urbano em que tais gêneros se produzem na sociedade”.
O filme: “Shakespeare apaixonado”, de 1998, que utiliza-se da metalinguagem para explicar de forma superficial um pouco da vida, obra e da genialidade de Shakespeare, é de fácil compreensão por parte do expectador, por ser uma comédia romântica estilo anos 90. Pode ser utilizado como forma de iniciação; introdução ao jovem para ele ter uma noção de como era a época do teatro elizabetano e assim despertar neste jovem um interesse em conhecer mais sobre nosso autor referenciado e suas obras.
Adentrando na área da metodologia de ensino de literatura, seguimos com um excerto do livro “Leitura, literatura e escola: a formação do gosto”(1989), por Maria do Rosário Magnani: Aprende-se a ler e a gostar de ler; aprende-se a acompanhar os modismos de leitura; aprende-se a ter critérios e opiniões de leitura; aprende-se a julgar valores estéticos. Tudo isto se aprende lendo dentro e fora da escola. As concepções de história e linguagem dimensionam o papel e função da aprendizagem na escola, instituição que tem o papel de construção e formação do gosto pela literatura literária. É questionado novamente até que ponto a pedagogia da facilitação pode bloquear funções importantes da leitura da literatura para o desenvolvimento de crianças e jovens, fazendo com que haja um conformismo educacional e cultural. Os critérios de seleção dos textos ou livros de literatura é o que se amolda ao gosto dos alunos. Conclui-se que o que se expande na escola é um tipo de “funcionamento conforme” da leitura e da literatura, o que acarreta em não formar leitores, mas sim consumidores da trivialidade histórica, lingüística, literária, cultural e poética. E este problema segundo Magnani, não se resume somente às questões dos conteúdos à faixa etária ou ao gosto dos alunos, técnicas milagrosas, etc. É muito mais complexo: A leitura de acordo com o conteúdo, com a aprendizagem e com a compreensão do discurso do outro (leitor e autor), havendo um diálogo entre o texto e seu destinatário, seu público alvo. A linguagem não deve ser pensada como um conjunto de códigos e normais irrevogáveis, mas como um trabalho social em constante mutação. Do ponto de vista didático-pedagógico, as concepções se elucidam pelo construtivismo/interacionismo. O aluno constrói conhecimento a partir de conceitos específicos de cada disciplina escolar. Além de ajudar no pensamento, na sua natureza física, psicológica e social, os problemas vão se solucionando e os pensamentos se organizando para que o aluno seja capaz de ter uma consciência crítica.
A repetição de atos, movimentos e linguagens estão presentes em todo o processo de aprendizagem, assim que a criança aprende e se torna membro da sociedade, com o auxílio do professor, vai aprendendo a lidar com os conflitos internos e externos à sua volta e suas transformações. Afinal é pela leitura que se aprende através dos conteúdos ensinados, também a literatura. O texto literário pode ser ficcional, fazendo parte da fantasia, entretanto uma ficção capaz de atuar em zonas profundas, propiciando a superação de conflitos internos. A leitura não acontece isolada, e só na sala de aula, contudo está articulada às práticas de produção e análise de textos. O professor é personagem de máxima importância nesse processo, é alguém que lê, estuda, expõe sua leitura e suas preferências e seu repertório: “Não podemos abdicar do papel histórico que nos cabe, como sujeitos, professores, de nos formarmos como leitores para interferirmos criticamente na formação de outros leitores”. A leitura da literatura pode mobilizar a imaginação, oferecendo inúmeras opções, caminhos a serem percorridos, ajudando cada um a esquecer sua própria história; seu próprio papel na sociedade.
Outra menção que não poderia faltar é novamente de Bárbara Heliodora, em seu livro: “Por que ler Shakespeare? ”(2008), em que a autora ilustra: “No reinado de Henrique VIII, a cultura crescia em torno de hábitos e tradições nativas e mais populares. O Teatro na Inglaterra, a esta altura, já tinha 300 anos e graças à evolução da dramaturgia, Shakespeare apesar de nunca ter freqüentado uma universidade, pois àquele tempo uma parcela muito pequena da população conseguia atingir este nível de escolaridade. Em 1592, o êxito de Shakespeare já incomodava outros autores, quando ele se torna o grande mestre da sondagem do abismo existente entre o ser humano e seus ideais”. “Shakespeare, um autor que raramente mencionava Deus ou os deuses, pode ter sido o que se chama de existencialista, mesmo que o termo existencialismo não existisse ainda na época em que escreveu seu trabalho.” (Bloom, 2001)
“The isle is full of noise. Sounds and sweet airs that give delight and hurt not.” (The Tempest)
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