A linguagem é, antes de tudo, social. Portanto, sua função inicial é a comunicação, expressão e compreensão. É por meio das relações sociais que o ser humano aprende e ensina, constrói e desconstrói conhecimento. A constante interação entre o sujeito e o mundo exterior é o processo pelo qual se dá o desenvolvimento intelectual humano (PIAGET, 1978, p. 59). Assim sendo, a concepção de linguagem mais aceita atualmente compreende a língua como uma atividade coletiva, realizadora de ações através da interação social e cognitiva.
A verdadeira substância da linguagem não é constituída por um sistema abstrato de formas linguísticas, nem pela enunciação monológica isolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno social da interação verbal, realizada pela enunciação ou pelas enunciações. A interação constitui, assim, a realidade fundamental da linguagem. (BAKHTIN, 1986, p. 123)
De acordo com o dicionário Michaelis, o termo linguagem possui as seguintes definições: “faculdade de expressão audível e articulada do homem; conjunto de sinais falados, escritos ou gesticulados de que se serve o homem para exprimir suas ideias e sentimentos; sons dos animais.” (MICHAELIS, 2009)
Pelas acepções do dicionário, ressalta-se principalmente a ideia de expressão da língua. A capacidade humana de exprimir ideias e sentimentos implica em uma necessidade de se fazer ouvir, expressar e entender. A comunicação se dá a partir do momento em que há troca, correspondência, ação recíproca de dois ou mais corpos, ou seja, quando há interação.
Durante séculos, a linguagem foi considerada um instrumento passivo de comunicação, que permitia ao ser humano apenas descrever o que percebia, sentia ou pensava. Hoje se reconhece que, ao falar, o indivíduo não só descreve o que observa, mas atua no mundo e faz com que certas coisas aconteçam. Por meio da linguagem, ele também pode modificar suas relações com os demais e desenvolver sua própria identidade. (KOCH, 2003, p. 123)
Conforme Travaglia (2000, p. 23) a respeito da linguagem como meio de interação:
“O que o indivíduo faz ao usar a língua não é tão somente traduzir e exteriorizar um pensamento, ou transmitir informações a outrem, mas sim realizar ações, agir, atuar, sobre o interlocutor (ouvinte/leitor). A linguagem é, pois um lugar de interação humana, de interação comunicativa pela produção de efeitos de sentido entre interlocutores, em uma dada situação de comunicação e em um contexto sócio-histórico e ideológico.”
A interação de um indivíduo com o grupo social ao qual pertence ou em que se encontra inserido ocorre a partir do momento em que o mesmo passa a assimilar a cultura desse grupo social. Essa interação só será possível por meio da comunicação, do diálogo, da expressão, da troca de ideias, ou seja, por intermédio da linguagem.
É preciso pensar a linguagem humana como lugar de interação, de constituição das identidades, de representação de papéis, de negociação de sentidos, por palavras, é preciso encarar a linguagem não apenas como representação do mundo e do pensamento ou como instrumento de comunicação, mas sim, acima de tudo, como forma de interação social. (KOCH, 2003, p. 128)
Segundo a teoria histórico-social de Vygotsky (1994, p. 24), quem fala com alguém fala de algum lugar social específico e carrega todas as marcas de sua persona na construção do significado: papel sexual, classe social, raça etc. A linguagem não ocorre em um vácuo social. A construção conjunta da aprendizagem coloca foco na linguagem, isto é, na interação social, sendo que através do contato desenvolvido pelos participantes do diálogo é que ocorre uma construção de aprendizagem.
Para Vygotsky, a relação entre pensamento e linguagem é estreita. A linguagem (verbal, gestual e escrita) é nosso instrumento de relação com os outros e, por isso, é importantíssima na nossa constituição como sujeitos. Além disso, é através da linguagem que aprendemos a pensar. (RIBEIRO, 2005)
A linguagem é uma ação interativa que, se bem desempenhada, pode ter efeitos decisivos na vida do indivíduo e na vida das pessoas ao seu redor. O poder transformador da ação implica que toda atuação acarreta consequências, de caráter validativo ou não (CAGLIARI, 2009, p. 34). É no contexto social que percebemos e tomamos noção do poder que nossas palavras exercem e se através delas estamos alimentando relações de qualidade ou não.
A comunicação é permeada de um caráter problematizador que gera consciência crítica e permite a busca do compromisso de transformação da realidade. Não podemos, portanto, pensar em competências intelectuais sem passarmos por competências linguísticas, as quais dão subsídios para interagir com o mundo, com o outro e consigo mesmo (KOCH, 2003, p. 125).
Interação e linguagem são elementos que se complementam. A vida social do ser humano se constitui a partir de sua capacidade de interagir com seus semelhantes por meio da linguagem. Desta forma, cada indivíduo, ao utilizar a língua, não apenas diz o que pensa, mas também age sobre as pessoas, visando influenciar determinadas atitudes ou comportamentos. Esse contato entre o sujeito e o grupo acaba por resultar na construção de conhecimentos e em uma aprendizagem significativa para todos. Dentro deste contexto, educação e interação se entrelaçam, sendo que a comunicação entre professor e aluno acontece por intercâmbio da linguagem, e, desta forma, promove-se a interação. Cabe a cada um de nós nos utilizarmos da maneira mais sabia possível desta poderosa fusão que é a interação através da linguagem.
As pessoas falam para serem “ouvidas”, às vezes para serem respeitadas e também para exercer uma influência no ambiente em que realizam os atos linguísticos. O poder da palavra é o poder de mobilizar a autoridade acumulada pelo falante e concentrá-la num ato linguístico. (BOURDIEU, 2006, p. 7) Referências bibliográficas
BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1988.
BOURDIU, Pierre. O poder simbólico. São Paula: Bertrand Brasil, 2006.
CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização e Linguística. São Paulo: Scipione: 2009.
KOCH, Ingedore. V. A interação pela linguagem. São Paulo: Contexto, 2003.
MICHAELIS. Dicionário Escolar de Língua Portuguesa. São Paulo: Melhoramentos, 2009.
PIAGET, Jean. A formação do símbolo na criança. São Paulo: Zaher, 1978.
RABELO, E. T. e PASSOS, J. S. Vygotsky e o desenvolvimento humano. Disponível em <http://www.josesilveira.com>. Acesso em 29 de maio de 2012.
RIBEIRO, A. M. Curso de Formação Profissional em Educação Infantil. Rio de Janeiro: EPSJV/Creche Fiocruz, 2005.
TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Gramática e interação: uma proposta para o ensino de gramática. São Paulo: Cortez, 2009.
VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1994.
Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.
por Júnior de Arruda
Licenciado em Pedagogia pela Faculdade CNEC Farroupilha. Atualmente, cursa especialização em Orientação e Supervisão Educacional e é aluno especial do programa de pós-graduação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Dedica-se ao ensino de língua inglesa para crianças, adolescentes e adultos, além de utilizar recursos tecnológicos como ferramentas pedagógicas e promover oficinas.
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