28/02/2016
Desde o estudos saussurianos muitos teóricos e filósofos da linguagem, tentaram repor e contribuir com as exclusões feita por Saussure. Resultado desses debates pós-Saussure, são as formas de como a língua é concebida, rompendo assim, com a premissa da significação interna do sistema linguístico proposta por ele.
As novas direções, que agora cedem espaço para elementos externos, para o sujeito, para o enunciado em uma relação recíproca entre a língua e sujeito, é proposta por Bakhtin (2010) que, distancia-se de Saussure a medida em que se debruça sobre os aspectos que dizem respeito aos domínios do extralinguístico, ao passo que Saussure se dedica aos estudos linguísticos que dizem respeito apenas ao sistema linguístico. Dessa maneira, Bakhtin (2010), ao abordar as questões relacionadas ao extralinguístico nos apresenta seus estudos Metalinguísticos, distanciando-se mais ainda da Linguística de Saussure (1999).
O Filósofo russo, segue outra direção em seus estudos, mas não deixa de reconhecer o trabalho importante do Mestre genebrino para a Linguística, dessa forma podemos dizer que Bakhtin (2010) dialoga com Sausurre (1999) a medida em que aquele, ao reconhecer os estudos saussurianos, os utiliza para constituir uma nova forma de pensar as questões referentes à linguagem.
Uma questão interessante, é que em Marxismo e Filosofia da Linguagem (2014), percebemos forte critica a linguística de Saussure (1999), diferente de outros textos do Filósofo, como em Problemas da Poética de Dostoievski (2010) e Estética da Criação verbal (2011), o que nos deixa em dúvida de quem realmente teria escrito Marxismo e Filosofia da Linguagem, pois na parte dedicada ao debate do Objetivismo Abstrato, atribuído a Saussurre (1999), trás forte critica ao Mestre genebrino.
Sausurre (1999), ao explanar qual seria o objeto da Linguística, ressalta que ‘‘bem longe de dizer que o objeto precede o ponto de vista, diríamos que é o ponto de vista que cria o objeto’’ (SAUSURRE, 1999, p. 15). Dessa forma Bakhtin (2010) tem posição análoga a afirmação de Saussure (1999), a medida em que Bakhtin (2010) escreve:
Intitulamos este capítulo de "O discurso em Dostoiévski" porque temos em vista o discurso, ou seja, a língua em sua integridade concreta e viva e não a língua como objeto específico da linguística, obtido por meio de uma abstração absolutamente legítima e necessária a alguns aspectos da vida concreta do discurso. Mas são justamente esses aspectos, abstraídos pela linguística, os que têm importância primordial para os nossos fins. Por este motivo, as nossas análises subsequentes não são linguísticas no sentido rigoroso do termo. Podem ser situadas na metalinguística, subtendendo-a como um estudo – ainda não-constituído em disciplinas particulares definidas – daqueles aspectos da vida do discurso que ultrapassam – de modo absolutamente legítimo – os limites da Linguística. As pesquisas metalinguísticas, evidentemente, não podem ignorar a Linguística e devem aplicar os seus resultados. A Linguística e a Metalinguística estudam um mesmo fenômeno concreto, muito complexo e multifacético – o discurso, mas estudam sob diferentes aspectos e diferentes ângulos de visão. Devem completar-se mutuamente e não fundir-se. Na prática, os limites entre elas são violados com muita frequência (BAKHTIN, 2010, p.207).
Segundo o Filosofo russo, as questões levantadas por Sausurre (1999) não interessavam as preocupações dos linguísticas contemporâneo ao Suíço, como os tipos e as ‘‘formas de relações dialógicas entre os enunciados e das suas formas tipológicas[...], o estudo de elementos extralinguísticos e ao mesmo tempo extrasemânticos (artísticos, científicos etc.) do enunciado’’ (BAKHTIN, 2010, p. 313).
Dessa forma, Bakhtin (2010) não se sobresai com sua metalinguística, ao contrario, ao propor questões metalinguísticas a coloca em posição complementar a linguística, ‘‘as pesquisas metalingüusticas evidentemente, não podem ignorar a linguística e devem aplicar os seus resultados [...]. além do que devem completar-se mutuamente, e não se fundir’’(BAKHTIN, 2010, p. 207).
Assim, a finalidade dada a metalinguística, analisa o discurso em sua totalidade, de maneira em que a língua seja percebida em utilização real e em condições reais de interação social, ao passo que para a linguística o objetivo é estudar a língua, abstraindo o que concerne a concretude do discurso (BAKHTIN, 2010). Nesse caso, ao optar pela metalinguística e deixar de lado os pressupostos abordados por Sausurre (1999), o Filósofo propõe um novo olhar sobre o objeto de investigação da linguística. Poderíamos pensar, quem sabe, que Bakhtin (2010) acabou por discutir uma nova vertente da linguística, como um ramo da linguística.
Do mesmo modo, o interesse nos enunciados concretos que Bakhtin (2010) se propõe a estudar, a Sausurre (1999) interessava as unidades da língua, justificando seu interesse argumentando que ‘‘[...] o emprego da língua efetua-se em fora de enunciado (orais e escritos) concretos e únicos, proferidos pelos integrantes desse ou daquele campo da atividade humana’’ (BAKHTIN, 2010, p. 261) e que a língua ‘‘[...] passa a integrar a vida através de enunciados concretos (que a realizam) [...]’’ (BAKHTIN, 2010, p. 265). E ainda ‘‘aprender a falar significa aprender a construir enunciados (porque falamos por enunciados e não por orações isoladas e, evidentemente, não por palavras isoladas)’’ (BAKHTIN, 2010, p. 261).
Assim, Bakhtin (2010) ao tomar os enunciados concretos como objeto dos seus estudos enfatiza os sentidos e não os significados. Pois, diferente da linguística, que costumava reter suas análises a fim de buscar a identificação de um significado, com o enunciado concreto, em situação real de produção, possibilita acesso não ao significado mas sim ao sentido, ‘‘[...] isto é, um sentido pleno, relacionado com o valor - com a verdade, a beleza, etc. [...]’’ (BAKHTIN, 2010, p 332).
Focando na compreensão do sentido, através dos enunciados, Bakhtin (2010) se aproxima da concepção de signo de modo a analisá-lo como entidade ideológica, assim, ‘‘[...]os elementos abstratos da língua, idênticos entre si, carregam se de diferentes conteúdos semânticos e axiológicos, ressoando de diversas maneiras no interior destas diferentes perspectivas (BAKHTIN, 2010, p. 96) ao passo que para Sausurre (1999, p. 81) o signo e uma entidade psíquica resultante da combinação entre as faces significante e significado.
Dessa forma segundo o Filósofo russo (2010, p. 330) em determinadas relações que acontecem entre os enunciados efetivamente produzido por sujeitos reais, não são estudados pela lingüística, mais um fator característico que constitui o objeto da metalinguística.
Nesse contexto o principio de dialogismo torna-se uma das peças chave como constitutivo da linguagem. Assim, o principio de outras discussões de Bakhtin (2010) não podem ser pensadas a não ser em relação com o dialogismo. Bakhtin (2010), assume que a linguística de sausurriana se atem, em menor escala, aos estudos dialógicos, ressaltando que a linguística de Sausurre (2010) ‘‘[...] conhece, evidentemente, a forma composicional do ‘‘discurso dialógico’’ e estuda suas particularidades sintáticas léxico-semanticas. Mas ela as estuda como fenômenos puramente linguisitcos’’ (BAKHTIN, 2010, p. 208).
A mobilidade do autor em relação ao dialogismo se refere ao modo que funciona a linguagem, a maneira pela qual ela se realiza, ou seja, a linguaugem só se constitui porque existe diálogo entre os enunciados, invariavelmente, todos os enunciados produzidos, dialogam com outros enunciados.
O Filósofo russo, parte então, da concepção de linguagem como forma de interação verbl, segundo a qual, os sujeitos agem socialmente uns em relação aos outros parceiros do processo de comunicação verbal, para explicar que ocorre algo de semelhante com os enunciados, visto que eles dialogam uns com os outros.
Com essa constatação, com esse pensamento a respeito da linguagem, podemos remeter também a certa critica feita aos estudos linguísticos do século XIX, em que a linguagem era concebida como forma de expressão do pensamento, sendo a comunicação posta em segundo plano.
Do mesmo modo, se estabelece uma diferença entre enunciado e oração. A oração é vista como uma unidade da língua, ao passo que o enunciado toma corpo por ser uma unidade que participa da comunicação discursiva. Dessa maneira, a oração nunca é determinada pela alternância entre o sujeito do discurso, premissa que tornaria a oração um enunciado. A oração é acabada, não se relaciona com o contexto, com o extraverbal, muito menos com a realidade, que vemos na enunciação de outros falantes. Assim o conjunto de enunciados, conversam entre si e com o sujeito e a realidade a sua volta, de maneira que manifeste a intenção discursiva do falando, que por sua vez, determina também o sentido de dialogismo visto não apenas como a orientação da palavra para o outro, mas sim, o confronto através do enunciado, entre as diversas vozes do discurso de um grupo ou de um único sujeito, bancando então a tensão entre o Eu e o Tu. Segundo Bakhtin (2010):
Um enunciado é um elo na cadeia da comunicação verbal de uma dada esfera. As fronteiras desse enunciado determinam-se pela alternância dos sujeitos falantes. Os enunciados não são indiferentes uns aos outros nem são auto-suficientes, conhecem- se uns aos outros, refletem-se mutuamente. São precisamente esses reflexos recíprocos que lhes determinam o caráter. O enunciado está repleto dos ecos e lembranças de outros enunciados, aos quais está vinculado no interior de uma esfera comum da comunicação verbal. O enunciado deve ser considerado acima de tudo como uma resposta a enunciados anteriores dentro de uma dada esfera. (BAKHTIN, 2010, p. 316)
Referências
BAKHTIN, M. Problemas da poética de Dostoiévski. Tradução: Paulo Bezerra. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2010.
______. Estética da criação verbal. Tradução: Paulo Bezerra. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
______. Marxismo e Filosofia da Linguagem. São Paulo: Hucitec Editora, 16. ed. 2014.
BENVENISTE, É. Saussure após meio século. In: Problemas de linguística geral I. Tradução: Maria da Glória Novak; Maria Luisa Neri. 4. ed. Campinas: Pontes.
FIORIN, J. L. Introdução ao pensamento de Bakhtin. 1. ed. São Paulo: Ática, 2006.
GIACOMELLI, K. A enunciação em Benveniste e Bakhtin: exclusões saussurianas. In: Anais do Encontro do Círculo de Estudos Linguísticos do Sul – CELSUL, 4, 2000, Curitiba/PR. Curitiba: Mídia Curitibana, 2001. Disponível em <http://www.celsul.org.br/Encontros/04/artigos/028.htm>. Acesso em 10 set. 2015.
SAUSSURE, F. Curso de linguística geral. São Paulo: Cultrix, 1999.
Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.
Discente do Curso de Letras - Português e Inglês, licenciatura da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. É membro dos Grupos de Pesquisa em: Estudos da Linguagem; Discurso, Tecnologia e Identidades; e Estudos dos Sons da Fala.
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