Adoção tardia: Repensando suas práticas

Processo adotivo envolve crianças acima de dois anos de idade
Processo adotivo envolve crianças acima de dois anos de idade

Psicologia

21/04/2014

INTRODUÇÃO

Este presente trabalho foi desenvolvido com base em pesquisas bibliográficas, tendo como objetivo abordar o tema referente à adoção tardia, a qual assim é denominada quando o processo adotivo envolve crianças acima de dois anos de idade.


Neste trabalho será relatado como se deu a história da adoção bem como os significados deste processo, discutiremos a mudança do sentido da adoção, os protagonistas dessas mudanças, os valores e a importância desta, com o passar do tempo. Abordaremos, como objetivo principal deste tema, o papel e a importância do psicólogo na adoção, assim como, no processo da destituição, sendo este o principal fator para dar inicio ao processo da adoção, sabendo que este acontece somente após a destituição. Serão apresentadas as razões legais que levam aos processos de destituição de uma criança, atuação do psicólogo no momento da destituição. Como também será discutido a importância do cuidador na formação de vínculos para a constituição da criança.


Contudo, em nossa atualidade, a maioria dos adotantes tem preferência por bebês brancos, do sexo feminino e sem nenhum problema de saúde, isto, na maioria das vezes, quando os pais são impossibilitados de ter filhos biológicos. Mas, geralmente, pais mais velhos e na maioria das vezes, aqueles em que já tiveram filhos, apresentam maior altruísmo, adotando crianças e/ou adolescentes com idade acima do padrão esperado.


No decorrer do referencial teórico, foram utilizadas citações e informações pesquisadas no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Código Civil.


HISTÓRICO DA ADOÇÃO


No Período da Antiguidade, a adoção de crianças existia sob a influência de ordens culturais, religiosas, políticas e econômicas, dentre as civilizações antigas, os egípcios, hebreus, gregos e romanos. A adoção foi criada com o escopo de propagar o culto dos antepassados, pois, uma vez que o casal que não tivesse filhos não teria quem continuasse o seu culto familiar, nem mesmo quem realizasse o seu funeral e cultuasse sua memória, ou seja, não havia a preocupação em garantir à criança ou ao adolescente o direito fundamental à convivência familiar que, por algum motivo anterior, foi violado.


Tendo em vista que nesse momento histórico o convívio da criança com a família não era o fator primordial a se pensar. De acordo com Jason Albergaria (1996, p.29), “[...] o filho adotado continuava o culto do pai adotivo.” Assim, ao adotar um filho, era como garantir a continuidade do culto doméstico e da própria família.


Paiva (2004) ressalta, que a partir do século V, na Idade Média, o instituto da adoção passa a contrariar o interesse dos senhores feudal, provavelmente devido à influência da Igreja. Nesta época, as famílias que não apresentavam herdeiros, passavam seus patrimônios para serem administrados pela Igreja ou pelo senhor feudal. Este modo de constituição, era visto pelos sacerdotes como uma possibilidade de reconhecimento de filhos adulterinos ou incestuosos (PAIVA, 2004, p. 17).


Segundo Silva Filho (1997, p.35) o cristianismo foi o principal fator que modificou o fundo político e religioso da organização familiar, contribuindo, assim, para diminuir a importância da adoção. As doutrinas do cristianismo asseguravam aos cristãos a garantia da morada eterna após a morte, e anulavam os temores daqueles que não possuíam descendência, desta forma, desestimulavam o uso da filiação adotiva com os mesmos fins utilizados na Antiguidade. A finalidade religiosa da adoção foi modificada, mas permaneceu o objetivo de perpetuar a família e solucionar os problemas dos casais sem filhos. No século XIX, se inicia um processo de visualização do filho adotivo como sujeito de sua história e não simplesmente como objeto de pertencimento dos adotantes para a satisfação de suas frustrações e desejos. Percebe-se neste século uma crescente preocupação com a história de vida da criança e não somente com o perfil procurado pelos adotantes. (SILVA FILHO, 1997, p. 35).


Na Idade Contemporânea, houve modificações nas legislações no que se refere à infância e, consequentemente avanços referentes à adoção em outros países. Segundo o que relata Marcílio (1998), foi somente na Primeira Guerra Mundial que os legisladores passaram a ter maior preocupação com a adoção, primeiramente pelo grande número de órfãos deixados pela Guerra. No Brasil a prática da adoção de crianças e de adolescentes deu-se início desde a época da colonização, uma vez em que esta se encontrava relacionada com a caridade, na qual os ricos prestavam assistência aos mais pobres. Com isso percebe-se que a prática de adoção no Brasil se deu através da caridade Cristã.


Paiva (2004) coloca que a primeira vez em que a adoção surgiu na legislação brasileira foi em 1828, tendo como função solucionar os problemas dos casais os quais não poderiam ter filhos biológicos. O Código Civil de 1916 juntamente com a lei 3071/16 foi um marco importante no que se refere à prática da adoção, pois segundo Weber (2006), a referência ao tema da adoção aparecia de forma escassa nos textos jurídicos anteriores. Foi somente com a legislação de 1988 que a lei 6.697/79 , conhecida como código de menores, teve o objetivo de tratar todos os filhos de maneira igualitária, sendo este o pressuposto legal que alicerçou o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), desta forma, abolindo a adoção simples (a qual se tratava de crianças maiores de sete anos de idade até adolescentes menores de 18 anos estando em situação irregular) e ampliando os benefícios da adoção plena (na qual para as crianças de até sete anos de idade passava-se a condição de filho, sendo este ato irrevogável) a todos os menores de 18 anos de idade e desta forma, assegurando-lhes os mesmos direitos dos filhos biológicos, pois as leis nacionais anteriores ao ECA tratavam com distinção os filhos adotivos, dando menos direito a estes, desta forma priorizando o fator biológico e, consequentemente valorizando os “laços de sangue”.


No cenário brasileiro, a adoção é regulamentada pela Lei Nacional de Adoção nº 12.010/2009, pelo Código Civil Lei nº 10.406/2002 e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA Lei nº 8.069/1990 estabelecendo seus princípios nas necessidades básicas do ser humano, sendo que no início da vida, na infância e na juventude estas necessitam e tem direito a uma família para serem criados e educados. (SILVA, 2009, p.11)

A ADOÇÃO/ADOÇÃO TARDIA E SEUS SIGNIFICADOS

Segundo o Direito Civil, a adoção é caracterizada pelo ato jurídico na qual uma pessoa é assumida permanentemente como filho de outra pessoa ou de um casal que não os pais biológicos. (AO, 1945). Para a Psicologia, a adoção é um processo no qual se atribui o lugar de filho a uma criança e/ou adolescente que não descenda da mesma história familiar que o casal, ou seja, é a possibilidade de integração na dinâmica familiar de uma pessoa proveniente de outra história de vida. Adoção é o ato de atribuir ao adotado a condição de filho, com os mesmos direitos e deveres do filho biológico, inclusive sucessório, desligando-o completamente da família de origem. (VARGAS, 1998, p.85).


Para Souza (2008), entre os principais motivos que levam as pessoas a adotarem, estão os casais que apresentam problemas de infertilidade, que mesmo tendo filhos biológicos apresentam o desejo de adotar uma criança, casais que se casam novamente e um dos cônjuges fez algum método de esterilização (vasectomia ou ligação das trompas), que tiveram um filho no qual este faleceu e obtém o desejo de reconstruir a família mesmo estando cientes de que este, não substituirá o filho anterior, mulheres que por motivo pessoal não gostariam de passar pelo processo da gravidez, entre outros casos.


Segundo Lanser (2002), ao optar por um ser humano que não geramos há que se ter motivações claras e corações generosos para aceitar as diferenças que enriquecem qualquer relacionamento. É preciso mostrar que sua motivação para adotar é plena de maturidade e que foi antecipada de séria reflexão.


Souza (2008) em seu livro “Adoção: Exercício da Fertilidade” nos coloca que a adoção tardia é aquela em que a criança apresenta mais de dois anos de idade. Desta forma, como cita a autora, os adotantes de crianças nesta faixa etária, precisam de um período de adaptação, pois em muitos casos, a criança pode apresentar baixa autoestima em consequência de não ter sido adotada até o momento. Faz-se necessário destacar a importância da adaptação da criança dentro da família adotante, afinal, esta criança estará entrando em um novo lar, com novos costumes ou até mesmo uma cultura diferente.


Já Teffaine (1987), observa que é a partir dos três anos que se deve dar uma maior atenção à criança, observando sua individualidade, bem como descobrindo os reais motivos de seu abandono para desta forma, compreender sua situação atual. Analisando caso por caso, tendo em vista que cada criança sofreu algum tipo de violência e que cada uma enfrenta e significa de forma diferente. É importante ressaltar que a maneira como a criança lida com o processo de adoção refletirá em sua relação com esta “nova família”, pois há casos em que esta criança sofreu agressões tanto físicas como psicológicas, interferindo, muitas vezes, na obtenção de novos laços familiares, onde a criança possa ter dificuldade em se relacionar e se permitir confiar, pois o fato dela ter sido abandonada uma vez, ou mais, pode levar a desconfiança e o receio de ser apenas mais uma família que vai abandoná-la depois.


Ao citarem os efeitos referentes à períodos prolongados de institucionalização, Siqueira e Dell'aglio (2006) afirmam que este processo poderá acarretar experiências negativas no futuro da criança, quando se pensa em uma infância digna, vivida junto aos devaneios de brincar, sonhar; uma infância que deve ser tratada com carinho e proteção por sua família podendo, desta forma, interferir muito na sociabilidade e na formação de vínculos afetivos quando esta estiver em sua vida adulta. Ainda nesta linha de raciocínio, Weber (1999a) relata que estas crianças podem vir a se sentir rejeitadas e sofrerem muito com este processo de institucionalização, uma vez em que muitas permanecem vários anos dentro de uma instituição aguardando por um processo de adoção (WEBER, 1999a).


Bernard This apud Maldonado (1999), afirma que na realidade “todos somos pais e filhos adotivos”, pois mesmo gerando filhos biológicos, há a real necessidade de estes pais adotarem este filho que nasce, ou seja, existe todo um planejamento durante a gestação de como os pais querem que seu filho nasça, porém, na maioria das vezes este filho vem com outras características e com isso, havendo a necessidade desta “adoção” da criança, ou seja, a aceitação das características do filho, diferente daquilo que os pais sonharam.
O PROCESSO DE DESTITUIÇÃO X A PARTICIPAÇÃO DO PSICÓLOGO NA ADOÇÃO

A destituição do poder familiar visa a proteção da criança e do adolescente, para que seu desenvolvimento integral postulado no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) seja garantido. Desta forma, compreende-se que a destituição e a adoção ocorrem quase que ao mesmo tempo ou deveria ser assim, uma vez em que a criança ao ser destituída não poderá permanecer sem uma família, por medidas de proteção. Compreendendo a permanente proteção da criança e dos adolescentes:

A política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente, regulamentada pelo ECA, prevê a articulação de um conjunto de ações governamentais e não governamentais, de forma a implantar políticas sociais básicas e de caráter supletivo, dentre outras linhas de ação, bem como a municipalização do atendimento e a criação e manutenção de conselhos de direitos, fundos vinculados a esses conselhos tutelares (FÁVERO, 2001, P. 109).



Com isso, é possível entender que as ações de proteção à criança, bem como a toda família, são de responsabilidade do Estado, juntamente com a sociedade civil.


É fundamental destacar a importância de que todos saibam que a pobreza não pode acarretar a perda dos filhos. Assim, cada criança com problemas corresponde uma família em dificuldade. Ninguém tem o direito de orfanizar a criança pobre (VICENTE, 2005, p. 56).



[...] o abandono material e moral da criança não justifica a destituição do pátrio poder, sem que seja explicitado o abandono dos pais pelo Estado, que não implementa políticas de corte social, possibilitadoras de acesso por parte deles a bens materiais e culturais (FÁVERO, 2001, p. 172).

Desta forma, é possível perceber que o processo de destituição não é somente realizado por motivos de maus tratos, de violência e de pobreza de que a família vive. Existe toda uma complexidade, havendo análises críticas da realidade, bem como tentativas de inclusão em sociedade, para haver um restabelecimento dos vínculos familiares que de uma forma ou de outra foram rompidos.


A autora Maria Helena Diniz (2009), relata que “a destituição do poder familiar é uma sanção” e que esta “é, pois uma sanção que visa a preservar os interesses do filho, afastando-o da má influência dos pais que violam o poder familiar conforme a lei”. Ainda neste ponto de vista, Pereira (2009), diz que “a perda do poder familiar é a mais grave sanção imposta ao que faltar aos seus deveres para com o filho, ou falhar em relação à sua condição paterna ou materna”. (TOMIZAWA e MOREIRA, p. 14. 2009.).


A destituição do poder familiar ocorre nos “casos previstos pela legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações a que alude o art. 22” (art. 24, ECA). Segundo o artigo 1.635 do código Civil, o poder familiar é retirado

I- pela morte dos pais ou do filho;

II- pela emancipação, nos termos do art. 5º, parágrafo único;

III- pela maioridade;

IV- pela adoção;

V- por decisão judicial, na forma do artigo 1.638. (CÓDIGO CIVIL, art. 1.635).


Segundo estudiosos como Tabajaski, Rodrigues e Gaiger (1998), a participação efetiva do psicólogo no que se refere à adoção deu-se na década de 80 mudando, desta forma, o trabalho da equipe de adoção, onde se muda o objetivo desta equipe, focando na busca de uma família para uma criança e não mais na busca de uma criança para uma família.


Com isso, é possível perceber que há uma dificuldade no processo de adoção tardia, muitas vezes pelo fato dos adotantes saberem pouco no que se refere ao histórico do “futuro filho”. Neste momento, seria importante, os pais procurarem um profissional da psicologia, onde este poderia tratar os pais como sendo “grávidos emocionalmente”, ou seja, trabalhando tanto com as angústias, como com os medos advindos desta nova etapa. (SCHETTINI, AMAZONAS E DIAS, 2006, p. 03).


Levinzon (2004), nos coloca que outra contribuição do acompanhamento psicológico para com estes “futuros pais”, seria trabalhar com a questão das motivações conscientes e inconscientes para a adoção, fazendo com que desta forma, as exigências que possam surgir quanto as características desejadas como filho se tornem um tanto quanto mais “flexíveis”, assim, se assemelhando a criança real.
Deve-se mostrar que pode ser tranquila a adoção de crianças maiores, trabalhando com essas famílias as vantagens e as virtudes em realizar esse processo, assim como, identificar dificuldades características no manejo com crianças dessa idade (WEBER 1999a). Como relata Maldonado (1995, p.86), “a rede de apoio bem coordenada é muito importante para facilitar [...] o processo de adoção de bebês e de crianças maiores.”.


Para Vargas (1998a), especialmente nas adoções tardias, é de fundamental importância à preparação e o acompanhamento da família, específico à situação de crise que se instala a partir da formação do novo grupo familiar. Segundo Vargas (1998b), num trabalho de preparação, com aproximações sucessivas, pode-se chegar a uma adequação da família sonhada com a família possível.


Vargas (1998b) apresenta as atribuições do psicólogo nos Juizados: orientar, aconselhar, acompanhar, constatar mudanças e alterações, encaminhar e cadastrar candidatos. Entretanto, alerta para o fato de que nos serviços de adoção dos Juizados, a relação entre o psicólogo e o cliente será permeada pela relação de poder que a instituição representa, já que o parecer psicológico orientará a determinação judicial. Tal fato interfere de forma significativa na formação de um vínculo de confiança entre o profissional e os envolvidos.


Para Weber (2004), os profissionais da psicologia participam do processo de adoção por meio de uma assessoria constante para as famílias adotivas, tanto antes quanto depois da colocação da criança. A equipe técnica dos Juizados da Infância e da Juventude deve saber recrutar candidatos para as crianças que precisam de uma família e ajudar os postulantes a se tornarem pais capazes de satisfazer às necessidades de um filho adotivo.


A primeira tarefa de uma equipe de adoção é garantir que os candidatos estejam dentro dos limites das disposições legais e a segunda é iniciar um programa de trabalho com os postulantes aceitos, elaborado especialmente para assessorar, informar e avaliar os interessados, e não apenas "selecionar" os mais aptos (Weber, 1997, p. 487). Como a adoção é um vínculo irrevogável, o estudo psicossocial torna-se primordial para garantir o cumprimento da lei, prevenindo assim a negligência, o abuso, a rejeição ou a devolução.


Além do trabalho desenvolvido junto aos Juizados da Infância e Juventude, existe também o dos psicólogos que trabalham nas Instituições de Proteção Especial. Essas instituições têm como objetivo oferecer um cuidado especial capaz de minorar os efeitos da institucionalização, proporcionando às crianças e aos adolescentes abrigados uma vivência que se aproxima à realidade familiar. Os vínculos estabelecidos com os monitores que cuidam delas são facilitadores do vínculo posterior na adoção, uma vez que se estabelece e se mantém nos mesmos a capacidade de vincular-se afetivamente. As relações substitutas provisórias, representadas pelo acolhimento institucional que abriga os que aguardam uma possibilidade de inclusão em família substituta, são decisivas para o desenlace do processo de adoção (Albornoz, 2001, p. 487).


O papel do psicólogo em casos de destituição é fundamental. É preciso considerar que a decisão de separar uma criança de sua família é muito séria, pois desencadeia uma série de acontecimentos que afetarão, em maior ou menor grau, toda a sua vida futura. Independentemente da causa da remoção - doença, negligência, abandono, maus-tratos, abuso sexual, ineficiência ou morte dos pais - a transferência da responsabilidade para estranhos jamais deve ser feita sem muita reflexão (Cesca, 2004, p. 487).


PAIS E A RELAÇÃO COM ADOÇÃO DE CRIANÇAS MAIORES

Partindo do ponto de vista psicológico, a integração a uma nova família, possibilita à criança reconstruir sua identidade a partir do estabelecimento de um relacionamento que seja satisfatório com as novas figuras parentais, desta forma, os pais adotivos proporcionarão a satisfação das necessidades básicas (PEREIRA e SANTOS, 1998, p. 32). Contudo, percebe-se que não são somente o afeto e a satisfação das necessidades básicas que resolvem a questão destes possíveis traumas advindos dos primeiros laços afetivos. É importante ressaltar que para a criança conseguir lidar com isto, há a necessidade de um acompanhamento psicológico, bem como a participação dos pais adotantes dentro deste contexto. Para essa criança, essa relação com novos “pai e mãe” pode ser apenas de mais algumas pessoas que a abandonarão no futuro, tendo em vista que esse é o modelo de relação que conhece, é muito importante não burlar as diferenças existentes, mas sim enfrentá-las no seu devido tempo, e aprender seus caminhos que melhor se encaixam para lidar com elas (NOAL E NEIVA – SILVA, 2007, p. 06).


Ainda nesse debate, Hamad (2002) afirma que “o desejo de parentalidade é diferente para homens e mulheres em virtude de suas diferentes posições no conflito edípico.”. Para a mulher seria como o preenchimento de um vazio, algo que estava faltando e foi completado. Segundo Freud (1933[1932]/1976, p. 158), quando a mulher consegue tornar-se mãe, tornar-se real uma fantasia de infância. Mannoni (1985) refere que o desejo de filho remonta a um passado arcaico, em que o mesmo representa para a mãe uma oportunidade de recompensa, de reparação afetiva daquilo não vivido, ou tido como insuficiente na própria infância, ou ainda, uma possibilidade de reeditar, prolongar as vivências boas de sua própria infância perdida. O processo de adotar para mulher tem um sentido mais afetivo, relacionado ao seu passado de filha.


Já no caso do homem esta associada à provação de sua masculinidade, segundo Maldonado (1995), o homem só é considerado "macho" de fato se consegue engravidar a sua mulher. Por sua vez além da provação de virilidade, a paternidade também esta associado ao fato de dar continuidade ao seu nome, ou seja suas gerações que ainda permaneceram no mundo. A paternidade para o homem vai além de um desejo, ate por ser uma construção cultural e histórica onde o homem desde muito tempo é a continuidade de seus antepassados, "assumir o lugar do pai". A continuação da linhagem e do patrimônio genético. "O que ele prioriza se situa mais do lado da transmissão genética" (HAMAD, 2002, p. 77).


O que de fato acontece muito e leva a adoção, são pais estéreis, para Levinzon (2004), a esterilidade é uma situação a dois, porque frustra a realização do desejo de um casal. Por isso é importante aos pais que se disponibilizam a adotar estar preparado para elaborar o luto de serem pais biológicos, e saber lidar com o sentimento de perda e decepção.


“As pessoas que procuram a adoção como método de solução à infertilidade não estão aptos para exercer a parentalidade. A criança está sendo unicamente desejado para resolver um problema do casal, o que certamente desembocará em dificuldades ao longo do seu processo educativo” (MORALES, 2004).
A adoção, desta maneira, termina por não ser um processo simples, especialmente aquela relativa a crianças mais velhas. Mas, como questionam Weber e Kossobudzki (1996, p. 124), "será que a sociedade não é capaz de mudar, de preparar as pessoas e proporcionar de fato o encontro de pais para todas as crianças?" O sucesso da adoção tardia esta principalmente na preparação dos adotantes, pois é eles que vão amparar a criança que vem com uma bagagem pronta, expectativas e traumas já impostos e esse pré-conceito, da sociedade em relação à adoção tardia é quase unânime, e de fato a criança e os pais iram sofrer preconceitos.


Este estar preparado para a adoção implica na capacidade de tolerar as frustrações decorrentes de condições insatisfatórias, sem esquivar-se destas, vendo-as e enfrentando-as de forma realista, com constância e equilíbrio do comportamento (ANDRADE & ALVES, 1993, p. 03).


O PAPEL DA MÃE/CUIDADOR DA CRIANÇA NA FORMAÇÃO DE VÍNCULOS AFETIVOS

Segundo Winnicott (1999), algumas falhas que ocorrem no desenvolvimento emocional da criança, bem como, na personalidade e no caráter desta, estão relacionados à ausência de segurança materna. Seguindo este raciocínio, o autor relata que a presença de uma mãe “suficientemente boa” é o essencial para que haja o desenvolvimento de seus primeiros momentos de vida, com isso, Winnicott (1999), esclarece que a relação mãe/bebê é de extrema importância no que se refere à construção da vida psíquica do ser humano.


Esta mãe suficientemente boa a qual o autor acima relata seria uma mãe ideal e flexível no acompanhamento e na adaptação das necessidades do filho, desta forma, isto se daria através do prolongamento do plano biológico intrauterino para o psicológico (WINNICOTT apud STENGEL, 2004).


No que se refere ao estabelecimento de vínculos, Winnicott considera que

[...] sem ter alguém dedicado especificamente às necessidades, o bebê não consegue estabelecer uma relação eficiente com o mundo externo. Sem alguém para dar-lhe gratificações instintivas e satisfatórias, o bebê não consegue descobrir seu próprio corpo nem desenvolver uma personalidade integrada. (WINNICOTT, 1983, p. 52).


Pensando no processo da adoção, Nazareth (2004), ressalta que o afeto deve ser conquistado na convivência diária. Partindo deste pressuposto, Ebrahin (2001), coloca que as pessoas que adotam crianças acima de dois anos de idade apresentam maior estabilidade emocional e, consequentemente uma maior maturidade, isto pelo fato da maioria dos adotantes apresentarem uma maior preocupação em relação a historia de vida da criança. Seguindo este raciocínio, Ebrahin (2001) ressalta que as maiorias dos adotantes tardios possuem filhos biológicos e, muitos destes têm um nível socioeconômico mais elevado.


Para que haja uma boa relação parental, bem como, um espaço que seja acolhedor para seus filhos, é necessário os pais assimilarem as especificidades do processo adotivo, sendo desta maneira, “verdadeiros pais” (SCHETTINI, AMAZONAS E DIAS, 2006). Para Weber (1999), as primeiras pessoas a entender que toda forma de amor é construída e que se perde a importância dos laços de sangue no momento em que são construídos os laços de ternura e de amor, são os pais adotivos.


Winnicott (1999), ressalta também a importância da harmonia do casal no desenvolvimento criança. A união dos pais e seus cuidados mantêm para criança um contexto através do qual ela possa encontrar a si mesma, o mundo, e uma relação entre ela e o mundo. O contexto do lar onde a criança vai ser "gerada", e a harmonia e a forma de convivência do casal são fatores que vão influenciar nas possibilidades de desenvolvimento das funções materna e paterna.


Para que a criança possa ter desenvolvimento normal, conforme afirma M. Klein (1932), é necessário “uma atitude amorosa por parte da mãe que muito contribui para o êxito desse processo. Se a criança coloca no seu mundo interno a mãe como um objeto bom e merecedor de confiança, um elemento de vigor é adicionado ao ego (...)” (M. Klein, 1959, p. 3). O ego se desenvolve em grande parte em torno desse objeto bom, e a identificação com as boas características da mãe torna-se a base para ulteriores identificações benfazejas. Khan (1977) constrói a hipótese de que a mãe tem papel preponderante de proteção, desempenhando verdadeira função de para-excitação diante da criança.


Para que possa ser observado se há as reais possibilidades desta família se formar, Silva, Mesquita e Carvalho (2010), concluem que é obrigatório realizar o processo do estágio de convivência, desta maneira os adotantes podem pensar nas possibilidades da formação da nova família. Este estágio de convivência é realizado sempre com a supervisão e com o auxílio de grupos de apoio e de uma equipe multidisciplinar da Vara da Infância e da Juventude. Existem alguns casos que não necessitam passar pelo processo do estágio de convivência, nestes casos estão incluídas crianças menores de um ano de idade e casos em que a criança já convive com os adotantes.


[...] se as significações sobre adoção, suas práticas e regulamentações legais sofreram inúmeras mudanças ao longo da história, elas sempre atenderam aos interesses dos adultos e das sociedades, sendo as necessidades das crianças pouco consideradas. Por isso, podemos afirmar que vivemos de algumas décadas pra cá um processo novo. Uma era pelo melhor interesse da criança, filosofia internacional que norteia as regulamentações e políticas de atenção à criança em vários países. (PALÁCIOS; AMORÓS, 2006 apud COSTA; FERREIRA, 2010, p. 425).


Faz-se necessário frisar que durante um processo de adoção há a necessidade de analisar tanto se os pais estão aptos para o processo quanto se a criança está preparada para adoção. (SILVA, MESQUITA E CARVALHO, 2010, p. 11).
É comum os pais adotivos alimentarem a fantasia de que seus filhos adotados, movidos pelo desejo de conhecer os pais biológicos e impulsionados pela força dos laços de sangue, os abandonem e partam em busca desses pais. O temor de que o poder dos laços sanguíneos vá determinar a preferência pelos pais biológicos está muito presente nessas situações.

Desse modo, na adoção, há uma tendência cultural a fazê-la constituir-se como se fosse natural, no sentido biológico.
A criança adotada é trazida como no parto, elas são “gestadas”, elas “nascem”. São usadas várias expressões como metáforas de uma filiação biológica. E a finalidade da adoção é efetuar uma substituição completa a família biológica pela adotiva. Tudo isto se elabora, em princípio, sobre uma negação de que a parentalidade e a filiação adotivas são diferentes, ou, pelo menos, se apresentam de maneira diferente (BRAGA, 2006, p. 48).


Diante do exposto, Costa e Ferreira (2007), recomendam que haja uma busca de uma família para uma criança e não uma criança para uma família, uma vez em que as pessoas são diferentes e, neste momento, as famílias devem se adaptar de acordo com estas diferenças.



CONSIDERAÇÕES FINAIS


Diante do trabalho exposto conclui-se que o processo de adoção tardia, muitas vezes se torna um procedimento difícil, pois no mesmo momento em que há a história de vida da família substituta, há também a história de vida da criança a ser adotada, uma vez em que esta criança apresenta a consciência de que será adota por uma família desconhecida e que ambas as histórias apresentam suas particularidades, com isso terão que aprender a conviver juntos. Seguindo esse raciocínio, a adoção de crianças mais velhas até nos parece mais simples, o que de fato não é, adotar é um gesto nobre, mas não simples, porém existem pessoas do senso comum que tendem a dizer que “pra adotar é preciso ter coragem” acreditam que o amor de pais e filhos está relacionado ao biológico e não no amor e no afeto que esta família poderá vir a ter com este futuro filho. Porém o sentimento materno e paterno vem com a decisão e/ou fato de se tornar pais, independente da carga genética. Sendo assim, aparecem algumas indagações referentes às mães que abandonam seus filhos, isso significa que esta mãe não o ama? É falta de recursos financeiros? E será que toda mulher nasceu pra ser mãe?


Com todas estas indagações fica nítida a ideia de como o processo de adoção é complexo desde a historia de vida da criança, os pais que a abandonaram ou por consequências da vida essa criança está para adoção, seja essa morte dos pais, abandono ou pais que apresentam risco a criança e são destituídas das famílias, os pais adotivos que por vários motivos decidiram adotar e o trabalho completamente cauteloso da equipe preparada para realizar todo esse processo. Todas estas questões estão ligadas à complexidade deste processo.


De fato, há um esforço excessivo na naturalização e valorização da adoção, ao mesmo tempo há certa dificuldade em lidar com o tema: enquanto se ressalta que a verdadeira paternidade/maternidade é de quem cuida, ensina e educa a necessidade de suprimir conflitos e sofrimentos, acaba- se usando metáforas para designar a relação de adoção onde revela não apenas a função de contar a verdade à criança , mas a defesa, para o convencimento de si e dos outros, da especialidade de uma relação construída na pura afetividade.


Diante disso constata-se que crianças acima de dois anos de idade no Brasil são menos procuradas para adoção, sendo preferíveis as de menor idade, porém, a preferência de pais estrangeiros é justamente por crianças maiores, podendo esta diferença, ser por questões culturais.


Referente ao processo de destituição frisa-se que este processo é feito através de visitas na casa, na escola, nos vizinhos, enfim, são realizados uma série de estudos para verificar se realmente há a necessidade de se destituir a criança da família. Diante disso, quando não há possibilidade de retorno à família de origem destas crianças e adolescentes devido a fatores que colocam sua vida em risco, existe o desenvolvimento de ações voltadas para a adoção.


É importante destacar que no período pré-adotivo, período este que antecede a adoção, o psicólogo apresenta algumas funções como a observação, a investigação e a conclusão de seu trabalho com a apresentação de um lado, com isso, diagnosticando as situações que envolvem a criança ou o adolescente e sua família, com os encaminhamentos pertinentes ao caso. Após o processo de adoção ser realizado, há um acompanhamento pós-adoção que é realizado pela Vara da Infância, sendo que este acompanhamento pode ser tanto individual com a família bem como, com a criança ou adolescente adotado, como também em grupos de apoio. Com isso ressalta-se que este acompanhamento pós-adotivo, é extremamente útil para que o ciclo adotivo se complete uma vez em que este ciclo adotivo se complete de maneira satisfatória.


Diante disso, percebe-se o tamanho da importância ao se falar no acompanhamento pré e pós-adoção, tanto no que se refere à preparação dos adotantes neste processo quanto ao acompanhamento desta nova família. Com isso, este trabalho de preparação oportuniza as crianças institucionalizadas o preenchimento de algumas necessidades, criando condições que visem o estabelecimento de novos modelos de identificação.


Portanto, todas as vezes que for falado em adoção, bem como, no processo de destituição, está se falando de violência, pois toda e qualquer tipo de adoção e de destituição é seguida de violência, seja ela constituída de violência física, sexual ou psicológica, em suma, nenhuma adoção e nenhum processo que envolva a destituição acontece sem antes ter ocorrido algum tipo de violência. Pois se aconteceu algo que fez com que a criança fosse institucionalizada ou mesmo abandonada, desta forma, ocorrendo à entrada em um processo adotivo, desde o início está se falando em violência.


Em se falando da realização do estágio de convivência, logo, percebe-se a importância deste processo, pois há uma garantia de sucesso do processo adotivo, evitando, assim, possíveis problemas advindos do futuro. Os adotantes devem ter em mente que filhos biológicos também apresentam problemas de adaptação aos pais, às regras do lar, e de fases (idades), contudo, não são devolvidos, e, quando se diz de filhos adotivos, cogita esta alternativa, que deveria ser abolida. Por isso o ato de adotar deve ser pensado, analisado e refletido, pois estamos falando de crianças, de destinos, de famílias. Retirar uma criança da família ou a família de alguma forma ter abandonando-a, institucionalizá-la, destituí-la, inseri-la em uma nova família é muito mais do que novos pais e novos filhos, é uma questão delicada onde passamos por um longo processo tanto judicial e principalmente emocional.


O trabalho do psicólogo nesse processo é essencial e de muita importância, de certa forma é "decidir destinos", é dizer e às vezes até impor o que é e o que não é melhor para essa criança. Seguindo essa ideia, antes da tomada de decisão da destituição, o psicólogo e outros profissionais capacitados da equipe multidisciplinar devem investigar a necessidade da destituição e a possibilidade de não acontecer, se for o caso de crianças órfãs, investigar a possibilidade da guarda ficar com parentes, em último caso a criança é destituída e levada para um abrigo e estará sujeita ao processo de adoção.

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Emília Marques Stall

por Emília Marques Stall

Nome: Emília Marques Stall Nascimento: 28/09/1990 Atua como Psicóloga e Psicopedagoga Clínica.

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