Psicologia Construtivista: Aplicação de provas Piagetianas

Cada uma dessas fases é caracterizada por formas diferentes de organização mental
Cada uma dessas fases é caracterizada por formas diferentes de organização mental

Psicologia

22/04/2014

INTRODUÇÃO
Como é do nosso conhecimento, Piaget aborda os seguintes períodos no processo evolutivo no desenvolvimento humano, que são caracterizados por aquilo que o indivíduo consegue realizar com excelência, ao longo de cada fase, ou faixa etária do seu processo de desenvolvimento. Esses períodos ou estágios são: 1º período: Sensório-motor (0 a 2 anos); 2º período: Pré-operatório(2 a 7 anos);3º período: Operações concretas (7 a 11 ou 12 anos); 4º período: Operações formais (11 ou 12 anos em diante)


Cada uma dessas fases é caracterizada por formas diferentes de organização mental que possibilitam as diferentes maneiras do indivíduo relacionar-se com a realidade que o rodeia (Coll e Gillièron, 1987). De uma forma geral, todos os indivíduos vivenciam essas 4 fases na mesma sequência, porém o início e o término de cada uma delas pode sofrer variações em função das características da estrutura biológica de cada indivíduo e da riqueza (ou não) dos estímulos proporcionados pelo meio ambiente em que ele estiver inserido. Por isso mesmo é que "a divisão nessas faixas etárias é uma referência, e não uma norma rígida", conforme lembra Furtado (op.cit.). Abordaremos, a seguir, sem entrar em uma descrição detalhada, as principais características de cada um desses períodos.


Período Sensório-motor (0 a 2 anos):

Piaget usa a expressão "a passagem do caos ao cosmo" para traduzir o que o estudo sobre a construção do real descreve e explica. De acordo com a tese piagetiana, "a criança nasce em um universo para ela caótico, habitado por objetos evanescentes (que desapareceriam uma vez fora do campo da percepção), com tempo e espaço subjetivamente sentidos, e causalidade reduzida ao poder das ações, em uma forma de onipotência". No recém nascido, portanto, as funções mentais limitam-se ao exercício dos aparelhos reflexos inatos. Assim sendo, o universo que circunda a criança é conquistado mediante a percepção e os movimentos (como a sucção, o movimento dos olhos, por exemplo).


Progressivamente, a criança vai aperfeiçoando tais movimentos reflexos e adquirindo habilidades e chega ao final do período sensório-motor já se concebendo dentro de um cosmo "com objetos, tempo, espaço, causalidade objetivados e solidários, entre os quais situa a si mesma como um objeto específico, agente e paciente dos eventos que nele ocorrem" (id ibid).

Período pré-operatório (2 a 7 anos):
Piaget afirma o que marca a passagem do período sensório-motor para o pré-operatório é o aparecimento da função simbólica ou semiótica, ou seja, é a emergência da linguagem. Nessa concepção, a inteligência é anterior à emergência da linguagem e por isso mesmo "não se pode atribuir à linguagem a origem da lógica, que constitui o núcleo do pensamento racional" .). Na linha piagetiana, desse modo, a linguagem é considerada como uma condição necessária mas não suficiente ao desenvolvimento, pois existe um trabalho de reorganização da ação cognitiva que não é dado pela linguagem. Em uma palavra, isso implica entender que o desenvolvimento da linguagem depende do desenvolvimento da inteligência.


Contudo, embora o alcance do pensamento apresente transformações importantes, ele caracteriza-se, ainda, pelo egocentrismo, uma vez que a criança não concebe uma realidade da qual não faça parte, devido à ausência de esquemas conceituais e da lógica. Para citar um exemplo pessoal relacionado à questão, lembro-me muito bem que me chamava à atenção o fato de, nessa faixa etária, o meu filho dizer coisas do tipo "o meu carro do meu pai", sugerindo, portanto, o egocentrismo característico desta fase do desenvolvimento. Assim, neste estágio, embora a criança apresente a capacidade de atuar de forma lógica e coerente (em função da aquisição de esquemas sensoriais-motores na fase anterior) ela apresentará, paradoxalmente, um entendimento da realidade desequilibrado (em função da ausência de esquemas conceituais).


Período das operações concretas (7 a 11, 12 anos):

Neste período o egocentrismo intelectual e social (incapacidade de se colocar no ponto de vista de outros) que caracteriza a fase anterior dá lugar à emergência da capacidade da criança de estabelecer relações e coordenar pontos de vista diferentes (próprios e de outrem) e de integrá-los de modo lógico e coerente . Um outro aspecto importante neste estágio refere-se ao aparecimento da capacidade da criança de interiorizar as ações, ou seja, ela começa a realizar operações mentalmente e não mais apenas através de ações físicas típicas da inteligência sensório-motor (se lhe perguntarem, por exemplo, qual é a vareta maior, entre várias, ela será capaz de responder acertadamente comparando-as mediante a ação mental, ou seja, sem precisar medi-las usando a ação física).Exemplo, a ausência de conservação da quantidade quando se transvaza o conteúdo de um copo A para outro B, de diâmetro menor)", tal reversibilidade será construída ao longo dos estágios operatório concreto e formal.


Período das operações formais (12 anos em diante):
Já nesta fase a criança, ampliando as capacidades conquistadas na fase anterior, já consegue raciocinar sobre hipóteses na medida em que ela é capaz de formar esquemas conceituais abstratos e através deles executar operações mentais dentro de princípios da lógica formal. A criança adquire "capacidade de criticar os sistemas sociais e propor novos códigos de conduta: discute valores morais de seus pais e constrói os seus próprios (adquirindo, portanto, autonomia)".


De acordo com a tese piagetiana, ao atingir esta fase, o indivíduo adquire a sua forma final de equilíbrio, ou seja, ele consegue alcançar o padrão intelectual que persistirá durante a idade adulta. Isso não quer dizer que ocorra uma estagnação das funções cognitivas, a partir do ápice adquirido na adolescência. Esta será a forma predominante de raciocínio utilizada pelo adulto. Seu desenvolvimento posterior consistirá numa ampliação de conhecimentos tanto em extensão como em profundidade, mas não na aquisição de novos modos de funcionamento mental.


Assim sendo, Piaget argumenta que o desenvolvimento da moral abrange 3 fases:
(a) anomia (crianças até 5 anos), em que a moral não se coloca, ou seja, as regras são seguidas, porém o indivíduo ainda não está mobilizado pelas relações bem x mal e sim pelo sentido de hábito, de dever;

(b) heteronomia (crianças até 9, 10 anos de idade),em que a moral é = a autoridade, ou seja, as regras não correspondem a um acordo mútuo firmado entre os jogadores, mas sim como algo imposto pela tradição e, portanto, imutável;

(c) autonomia
, corresponde ao último estágio do desenvolvimento da moral, em que há a legitimação das regras e a criança pensa a moral pela reciprocidade, quer seja o respeito a regras é entendido como decorrente de acordos mútuos entre os jogadores, sendo que cada um deles consegue conceber a si próprio como possível 'legislador' em regime de cooperação entre todos os membros do grupo.


Para Piaget, a própria moral pressupõe inteligência, haja vista que as relações entre moral x inteligência têm a mesma lógica atribuída às relações inteligência x linguagem. Quer dizer, a inteligência é uma condição necessária, porém não suficiente ao desenvolvimento da moral. Nesse sentido, a moralidade implica pensar o racional, em 3 dimensões: a) regras: que são formulações verbais concretas, explícitas (como os 10 Mandamentos, por exemplo); b) princípios: que representam o espírito das regras (amai-vos uns aos outros, por exemplo); c) valores: que dão respostas aos deveres e aos sentidos da vida, permitindo entender de onde são derivados os princípios das regras a serem seguidas.


Assim sendo, as relações interindividuais que são regidas por regras envolvem, por sua vez, relações de coação - que corresponde à noção de dever; e de cooperação - que pressupõe a noção de articulação de operações de dois ou mais sujeitos, envolvendo não apenas a noção de 'dever' mas a de 'querer' fazer. Vemos, portanto, que uma das peculiaridades do modelo piagetiano consiste em que o papel das relações interindividuais no processo evolutivo do homem é focalizado sob a perspectiva da ética (La Taille, 1992). Isso implica entender que "o desenvolvimento cognitivo é condição necessária ao pleno exercício da cooperação, mas não condição suficiente, pois uma postura ética deverá completar o quadro" (idem p. 21).
1. PROVA: SERIAÇÃO DE BASTONETES

Segundo Piaget, 1971, existem maneiras de se avaliar o desenvolvimento infantil e conseguir identificar as fases em que a criança se encontra desse desenvolvimento cognitivo. Para isso desenvolveu testes que contribuem com essas análises e possuem grande influência no diagnóstico de uma criança.


Cada prova resulta em um determinado tipo de diagnóstico, porém é preciso analisar todo o contexto, estabelecendo relações com os resultados obtidos juntamente com a história da criança.


Uma das provas realizadas foi a dos bastonetes, na qual podemos analisar a seriação da criança no período pré- operatório e operatório. A prova é feita inicialmente convidando a criança para uma brincadeira na qual ela deve colocar os bastonetes em uma “fileira” ordenada, como se fosse uma bonita escada, após a orientação é necessário analisar quais são as respostas da criança frente a prova, podendo interagir e fazer questionamentos que levem as respostas necessárias para análise, com isso poder obter o diagnóstico da noção que a criança tem de seriação operatória, quando tem êxito nas três situações propostas: Construção da série, intercalação e contraprova.




1. MATERIAIS E MÉTODOS:

1.1 Materiais


O material utilizado foram 10 Bastonetes adaptados, ou seja feitos com EVA, para facilitar o manuseio da criança, variando de 10,6 a 16 cm, intercalados a cada 0,6 cm, todos colocados em um apoio de EVA também.



1.2 Critério de Aplicação

As provas foram aplicadas em 2 crianças com 4 anos(período pré-operatório) e 8 anos (período pré-operacional concreto), aplicamos algumas questões e analisamos algumas respostas.
1.3 Objetivo da prova
Provas Operatórias desenvolvidas por Jean Piaget Têm como objetivo avaliar características distintas do pensamento com provas independentes: Conservação de Peso, Conservação de Líquidos, Seriação de Palitos etc. Desempenho da criança em cada prova permite saber em qual nível de desenvolvimento ela se encontra.


2. ENTREVISTA I

Foi entrevistada uma criança de 4 anos chamada Sarah, em sua própria residência, na presença de sua mãe e de seu avô.
Inicialmente ela estava um pouco tímida, porém conforme apresentamos a brincadeira ela foi interagindo cada vez mais. Convidamos a Sarah para “brincar” c montar uma linda escada, colocando um do lado do outro. Ela começou escolhendo o maior e depois foi colocando os pequenos próximos, mas depois ela inverteu colocou primeiro os pequenos e depois os grandes, ela ficou um pouco confusa com os medianos, mas basicamente colocou quase todos em ordem. Perguntamos a ela por que havia colocado o pequeno primeiro? e ela respondeu que primeiro teria que ser o menorzinho, depois o médio e depois o grande igual a historinha dos ursos que viu na apresentação da sua escolinha, ela me explicou que tinham o três ursos que comeram o mingau e cada um tinha sua cadeirinha, o filhotinho tinha a cadeira menor, a mãe a cadeira média e o pai que já era grande a cadeira maior. Mas ela ficou um pouco na dúvida quando me referi a todos os bastonetes, pois ela havia utilizado somente alguns, então após ter colocado as três referências os demais foram colocados rapidamente, mas alguns fora da ordem.


Dando continuidade, permanecemos com a ideia da escada, então partimos para a segunda pergunta, que foi onde ela colocaria aquele Bastonete para que fique bem arranjado na escada e a escada não se desmonte? Então fomos surpreendidos, pois a Sarah intercalou a maioria corretamente e ainda encenou que estava consertando a escada com um martelo e a terceira pergunta que foi a contraprova , ela ficava medindo um bastonete com o outro antes de dar para que montássemos a escada, porém ainda sim ficou na dúvida com os medianos e alguns foram montados na ordem errada.


Diagnóstico:

Com base na avaliação feita percebemos que a criança está no estágio de transição, quando acerta algumas da situações e erra outras, e não ocorre o ensaio e erro no momento da intercalação, que segundo Piaget a criança procura o lugar do referido bastonete entre os maiores do que ele.


2.1 ENTREVISTA II

Construção da série


Entrevistador: Você vai fazer uma escadinha com todos esses pauzinhos, colocando-os em ordem do menor para o maior.
R.S.L. 8 anos: Êxito sistemático

Entrevistador: Por que você colocou este aqui?(apontando para o primeiro bastonete) e por que colocou aquele ali?(apontando para o ultimo).

R.S.L. Por que este é menor(apontando para o primeiro),e aquele é maior(apontando para o último).


Intercalação
Entrevistador: Onde você pode colocar este bastonete para que ele fique bem arranjado e a escada não desmanche?(dar a criança a série de bastonetes na seguinte ordem: 3,9,1,8,6,5,4,7,2(onde 1 é o maior).

R.S.L.Êxito sistemático .A criança colocou os bastonetes em ordem.


Contraprova
Entrevista: Agora é a minha vez de fazer a escada, você deve me dar os bastonetes um após o outro, como eu devo colocá-los para que minha escada fique tão bonita quanto a sua? Me entregue na ordem certa.

R.S.L.Êxito sistemático


Diagnóstico
A criança possui a noção de seriação operatória.
Período das operações concretas (7 a 11, 12 anos): neste período o egocentrismo intelectual e social (incapacidade de se colocar no ponto de vista de outros) que caracteriza a fase anterior dá lugar à emergência da capacidade da criança de estabelecer relações e coordenar pontos de vista diferentes (próprios e de outrem ) e de integrá-los de modo lógico e coerente (Rappaport, op.cit.). Um outro aspecto importante neste estágio refere-se ao aparecimento da capacidade da criança de interiorizar as ações, ou seja, ela começa a realizar operações mentalmente e não mais apenas através de ações físicas típicas da inteligência sensório-motor (se lhe perguntarem, por exemplo, qual é a vareta maior, entre várias, ela será capaz de responder acertadamente comparando-as mediante a ação mental, ou seja, sem precisar medi-las usando a ação física).


Crença Espontânea
Segundo Piaget, o que avaliamos é agora patrimônio da conduta da criança, algo que pertence a ela, um real instrumento de troca da criança, o qual não podemos tirar dela, é com isso que ela cria, reinventa redescobre e interpreta o mundo, opera transformações, reconhece e interpreta as variâncias.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A referência deste nosso estudo foi à teoria de Piaget cujas proposições nucleares dão conta de que a compreensão do desenvolvimento humano equivale à compreensão de como se dá o processo de constituição do pensamento lógico-formal, matemático. Tal processo, que é explicado segundo o pressuposto de que existe uma conjuntura de relações interdependentes entre o sujeito conhecedor e o objeto a conhecer, envolve mecanismos complexos e intrincados que englobam aspectos que se entrelaçam e se complementam, tais como: o processo de maturação do organismo, a experiência com objetos, a vivência social e, sobretudo, a equilibrarão do organismo ao meio.


Em face às discussões apresentadas no decorrer do trabalho, cremos ser lícito concluir que as ideias de Piaget representam um salto qualitativo na compreensão do desenvolvimento humano, na medida em que é evidenciada uma tentativa de integração entre o sujeito e o mundo que o circunda. Paradoxalmente, contudo - no que pese a rejeição de Piaget pelo antagonismo das tendências objetivista e subjetivista - o papel do meio no funcionamento do indivíduo é relegado a um plano secundário, uma vez que permanece, ainda, a predominância do indivíduo em detrimento das influências que o meio exerce na construção do seu conhecimento.




REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


ASSIS,O.Z.M. Provas para Diagnóstico do Comportamento Unicamp.


BECKER, F. A propósito da "desconstrução". Educação e Realidade, Porto Alegre, 19(1):3-6, jan/jun. 1994


COLL, C. As contribuições da Psicologia para a Educação: Teoria Genética e Aprendizagem Escolar. In LEITE, L.B. (Org) Piaget e a Escola de Genebra. São Paulo: Editora Cortez,1992. p. 164-197.


COLL,C.; GILLIÈRON. C. Jean Piaget: o desenvolvimento da inteligência e a construção do pensamento racional. In, LEITE, L.B. (org) Piaget e a Escolade Genebra. São Paulo: Cortez, 1987. p. 15-49


DELVAL, J. Introdução à prática do Método Clínico: descobrindo o pensamento das crianças. Porto Alegre: Artmed, 2002.


FREITAS, M.T.A. de. Vygotsky e Bakhtin: Psicologia e Educação: um intertexto. São Paulo: Editora Ática, 2000


FURTADO, O.; BOCK,A.M.B; TEIXEIRA, M.L.T. Psicologias: uma introdução ao estudo de psiclogia. 13.ed. São Paulo: Saraiva, 1999

Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


Geisse Scarpellini Laurindo

por Geisse Scarpellini Laurindo

Professora, Psicopedagoga, Terapeuta Cognitivo Comportamental, mestre em neurociências.

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