O sofrimento psíquico do paciente oncológico

Lidar com o sofrimento do outro não é tarefa fácil
Lidar com o sofrimento do outro não é tarefa fácil

Psicologia

29/08/2014

O lidar com o sofrimento do outro não é tarefa fácil, principalmente quando ele vem acompanhado da dor, da insegurança, da depressão e do receio trazidos por um diagnóstico de câncer, que impacta na rotina do indivíduo e na de sua família. Nesse sentido, a tarefa dos membros de uma equipe multidisciplinar deve estar relacionada à escuta e ao apoio pessoal.


Trabalhar com pacientes oncológicos é envolver-se com a prevenção, o tratamento, a reabilitação e a fase terminal, visando ao atendimento integral do paciente para diminuir o sofrimento inerente ao processo da doença (COSTA NAKAMOTO; ZENI, 2009).


O Câncer pode ser caracterizado pela perda do controle da divisão celular e a capacidade de invadir outras estruturas orgânicas (metástases), pois essas células tendem a ser muito agressivas e invasivas, formando tumores desencadeados a partir de um crescimento celular desordenado (INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER, 2014).


Trazendo a nossa reflexão para o aspecto psicológico, ressalta-se que toda doença encontra-se repleta de subjetividade. Com isso, o papel do psicólogo e de toda a equipe multidisciplinar envolvida no atendimento ao paciente oncológico é de extrema importância, pois é necessário focar no sujeito além da doença, abordando vivências relativas ao adoecer e possibilitando não só a elaboração do sofrimento psíquico implicado nesse contexto, mas também a reapropriação do sentido da vida, permitindo uma maior compreensão do paciente sobre o significado do câncer em sua existência.


É preciso olhar para as pessoas doentes e não para a doença, evidenciando o sujeito acometido pelo câncer dentro de sua história pessoal, ou seja, lembrar que ali existe um sujeito, não um determinado tumor que, inclusive o nomeia (ANGERAMI – CAMON, 1994).


A principal tarefa dos profissionais das diversas áreas é resgatar vida nesses pacientes, englobando os aspectos físicos e psíquicos para, assim, permitir a eles revelarem seus medos, desejos, emoções e sentimentos. É fundamental estar em contato autêntico com este ser humano. E no caso do psicólogo, ele se vale de seu único e legítimo instrumento: a palavra. “ E já que o foco está na palavra: O trabalho clínico consiste em ajudar a pessoa a reencontrar a magia das palavras”. (FREUD, 1980).


O diagnóstico de uma doença grave como o câncer, exige alteração de papéis e busca de estratégias para o enfrentamento do problema e adaptação às mudanças, uma vez que quebra o equilíbrio homeostático e provoca desequilíbrio psicológico do indivíduo, gerando a concomitância do sofrer físico e orgânico com o sofrer psíquico originado pela doença.

Perda da autoestima, dores fortes, ansiedade, medo da morte, estresses, aborrecimentos, interrupção dos planos de vida, mudanças da imagem corporal e dos estilos social e financeiro são fatores extremamente relevantes dentro do contexto de avaliação do sofrimento psíquico, pois deixam os pacientes desmotivados e deprimidos. Não há dúvidas que a eficácia do tratamento dependerá muito do estado emocional do paciente.


É necessário enfrentar, lidar, lutar diante do diagnóstico de câncer. O enfrentamento é um fator relevante para a qualidade de vida, pois traz, por exemplo, a potencialização da esperança como estratégia importante para a trajetória do câncer, que pode mudar o transcorrer do tratamento. Na fase inicial do diagnóstico, a esperança aparece, em geral, focada na cura. Já na fase terminal, a esperança pode centrar-se nos aspectos gratificantes de viver o momento presente, propiciando no futuro, por exemplo, uma morte tranquila.


A partir de uma perspectiva psicanalítica, pode-se falar não de um processo analítico, mas de uma escuta analítica, em que há um sujeito de um suposto saber e um desejo do analista, que pode levar o paciente a elaborar e a lidar melhor com a situação traumática vivida.


Aquele que adoece e sofre é um sujeito e não um corpo (FIGUEIREDO, 2002). Portanto, sua fala não deve ser vista, prioritariamente, como manifestação patológica, a qual exige correção, mas sim, como possibilidade de fazer emergir uma dimensão singular da queixa enquanto pedido de ajuda.


O suporte psicológico e do tratamento em geral, oferecido ao paciente deve pautar-se no esclarecimento e na afirmação de que a doença é um marco em sua trajetória e não um fim sentenciado pelo diagnóstico. E aqui entra a importância da interação completa da medicina com a psicologia. O objetivo maior das equipes multidisciplinares é contemplar os pacientes em sua totalidade psíquica, visando resgatar, continuamente, a perspectiva humana, mesmo diante dos inúmeros procedimentos técnicos.


O paciente precisa retomar o sentido da existência. É preciso fazê-lo resgatar suas forças e concentrar-se em seus projetos de vida, dando a ele a oportunidade de falar de suas dores, elaborar suas perdas e refletir sobre suas escolhas, entendendo melhor o significado pessoal do câncer para sua vida. E é com a escuta clínica, o apoio psicológico oferecido a ele e seus familiares e cuidadores, além do tratamento humanizado e individualizado prestado por toda a equipe multidisciplinar, que podemos chegar à efetiva diminuição do sofrimento psíquico do paciente oncológico.


Como em todo processo de adoecer, ao reconhecer o diagnóstico, o paciente passa a perceber-se enfermo e adota uma nova condição: ser doente e, portanto ser passivo. É importante fortalecer as considerações dos sentimentos do outro, pois para os pacientes, o relacionamento humano é a essência do cuidado que sustenta a fé e a esperança nos momentos mais difíceis. Sendo assim, a preocupação com o ser humano e o alívio de sua dor, seja física, seja emocional, são deveres de toda a equipe que está atuando.


Seja qual for a origem dos sintomas e do quadro geral que o paciente apresenta, é necessário explicar, da melhor forma possível, sobre o que está ocorrendo e as possíveis questões que possam estar preocupá-lo. Também a família deve estar bem informada (SÁNCHEZ, 2000).


Nosso olhar deve estar atento ao fato de que o paciente está vivendo um emaranhado de emoções que incluem a ansiedade, lutas pela sua dignidade e conforto, além de um acentuado receio do por vir, que está relacionado com as alterações na sua rotina diária, composta por necessidades que vão além do cuidado médico. Ele precisa de apoio, precisa sentir-se digno, amparado e protegido.


Enfim, o câncer ainda assusta muito as pessoas e não se deve menosprezar esse sentimento em relação á doença. É preciso valorizar essas vivências relacionadas ao adoecimento para compreender os aspectos psicológicos que envolvem o sofrimento físico. É uma parte do corpo que está doente, mas existe, no corpo, um sujeito único e singular que está lidando com suas fragilidades, receios e medos.

REFERÊNCIAS

AGERAMI-CAMON, V A. Psicologia Hospitalar: teoria e prática. São Paulo: Pioneira, 1994


COSTA, C. L.; NAKAMOTO, L. H.; ZENI, L. L. Psico-oncologia em discussão. São Paulo: LEMAR, 2009.


FIGUEIREDO, A. C. Vastas confusões e atendimentos imperfeitos. 3. Ed. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2002



FREUD, S. Título do Capítulo. In: __________. Conferências Introdutórias sobre Psicanálise I e II. Rio de Janeiro: Imago, 1980. (Edição standart brasileira das obras psicanalíticas completas de Sigmund Freud, v. 15).


INSTITUTO NACIONAL DO CÂNCER (Brasil). Estimativa da Incidência de câncer para 2008 no Brasil e nas cinco regiões. (200?). Disponível em: <http: //www.inca.gov.br/conteudo_view.asp.id=1793>. Acesso em 29 mar. 2014.


KUBLER – ROSS, E. Sobre a morte e o morrer. 8. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.


SÁNCHEZ, (2000). Dificuldades do paciente em receber o diagnóstico de que está com câncer. Recuperado de: http://www.psicologianet.com.br/dificuldades-do-paciente-ao-receber-o-diagnostico-de-que-esta-com-cancer/2272/.

Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


Andrea Antonia Ladislau

por Andrea Antonia Ladislau

Andréa Ladislau Graduada em Letras - Português/ Inglês pela PUC / BH Formada em Psicanálise - Sociedade Miesperanza/ RJ Pós Graduada em Gestão em Saúde/ Administração Hospitalar - Estácio de Sá/ RJ Administração de Empresas - Faculdade AIEC Pós Graduada em Psicopedagogia e Inclusão Social

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