09/11/2014
O assunto é largamente abordado em um ensaio chamado Pode-se Ensinar Psicanaliticamente a Psicanálise? do Renato Mezan. O mesmo consta no livro A Vingança da Esfinge. Toda a argumentação do autor trata da formação analítica e o mesmo traz interessantes pontos para pensarmos a nossa própria formação e o nosso desenvolver clínico. Ele diz: "Tem-se discutido muito acerca da formação analítica (...). Parece claro que esta formação se realiza num espaço delimitado por três coordenadas: a análise pessoal, a supervisão e o estudo da teoria." (1995, p.168)
Acerca do modelo da análise pessoal Mezan diz:
A análise pessoal é sem dúvida o mais significativo desses planos, pelas razões que todos conhecemos: é mediante a experiência que faz da eficácia de seu próprio inconsciente que o futuro analista se capacita a escutar e poder compreender algo do que lhe dirão futuros pacientes, no registro propriamente psicanalítico. Para que essa experiência se efetive, é indispensável a presença de um psicanalista, que passou pelo mesmo processo, e em cuja escuta estarão implícitas as marcas de sua própria análise pessoal com outro analista, anterior. (p.169)
Mezan sustenta esse plano da análise pessoal como o mais importante das três coordenadas por ser imprescindível a presença de um outro nesse processo: o analista. Embora diga que um professor e um supervisor possam ajudar bastante no encaminhamento do pensar, essas atividades (Teoria e Supervisão, "auto-supervisão" no caso) podem ser feitas por conta própria.
Sobre a supervisão:
Nesse espaço algo importante de ser pensado é que as nossas interpretações acerca da dinâmica psíquica do paciente possam ser questionadas "não com o supervisor, mas a partir do diálogo com o supervisor." (p. 177). O papel do supervisor seria então de suscitar outras possibilidades de intervenções e interpretações no terapeuta iniciante "que lhe permitam questionar o que faz com seu paciente e o que esse último faz com ele." (Ibid, p.178)
Como cerne do que deve acontecer na supervisão teríamos:
Na supervisão, trata-se de sensibilizar o terapeuta iniciante para as peculiaridades do processo psicanalítico, na vertente da escuta da interpretação, inclusive nos movimentos contratransferenciais. Isto significa fazer junto com o supervisionando um trabalho sobre a sua prática, porém sem substituir a sua prática à prática do seu supervisor: "Não um "faça como eu", mas um "faça comigo", nas palavras de Marilena Chauí. (Ibid, p.177)
Sobre o estudo teórico:
Pelo menos em Psicanálise é algo bastante dificultoso, pois cada conceito remete a uma série de outros. Logo, não existiria assim uma "porta de entrada" pra teoria.O papel do professor é de grande ajuda para que o interessado no assunto possa conseguir ferramentas com as quais a tarefa de desbravar a vasta obra de Freud e Lacan, por exemplo, se torne menos árdua. Essa coordenada também é importante, pois estará imbricada com o que é dito e apresentado na supervisão.
Neste ponto teríamos também a figura do professor de psicanálise como um facilitador do aprendizado do analista em formação, tendo o papel de “(...) pôr à disposição de seu aluno o instrumental necessário para efetuar, por sua própria conta, este percurso.” (p.181). O professor também deve estimular o aluno em pensar acerca das pontes teóricas que resultam da sua própria prática analítica com seus pacientes. Sobre isso Mezan diz: “Aprender teoria psicanalítica não pode, portanto, ser equivalente a receber do exterior o resultado desse processo de reflexão, sob sua forma conclusiva, mas tornar-se apto a ressuscitá-lo enquanto processo de reflexão (...)”.
Esse “processo” ao qual Mezan faz menção é o de se fazer metapsicologia. Freud nos ensinou que toda a teoria da psicanálise só é possível de ser criada quando advinda do próprio fazer clínico. É ao se aplicar o método da psicanálise, a interpretação, que um edifício de saber pode ser erigido. O psicanalista Joel Birman chama esse mesmo processo de “Psicanálise Pura”, tamanha sua importância.
Estas três coordenadas, portanto, são as balizadoras de uma formação em psicanálise. Mesmo que cada uma comporte suas peculiaridades, estas estarão sempre presentes no empreendimento clínico de todos os praticantes desse saber que Freud nos legou.
Referência
MEZAN, Renato. Pode-se Ensinar Psicanaliticamente a Psicanálise?. Em A Vingança da Esfinge. 2.ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 1995.
Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.
Possui graduação em Psicologia pela Universidade Federal de Pernambuco.
UOL CURSOS TECNOLOGIA EDUCACIONAL LTDA, com sede na cidade de São Paulo, SP, na Alameda Barão de Limeira, 425, 7º andar - Santa Cecília CEP 01202-001 CNPJ: 17.543.049/0001-93