Tanatologia: o estudo da morte e do morrer

A tanatologia tenta entender a morte e humanizar o acolhimento aos que estão sofrendo perdas
A tanatologia tenta entender a morte e humanizar o acolhimento aos que estão sofrendo perdas

Psicologia

21/03/2015

Na mitologia da Grécia antiga Thanatos é um personagem que aparece em inúmeros mitos e lendas. Filho de Nix (a Noite) e Érebo (a Escuridão) e irmão gêmeo de Hipnos (o Sono), habitava os Campos Elíseos (o paraíso do país de Hades, o mundo dos mortos). Thanatos é a personificação e é o deus da morte.


A palavra Tanatologia provém de: Thanatos= morte e Logos= estudo. Ou seja, o estudo da morte e do morrer, especialmente em seus aspectos psicológicos e sociais. Assim, a Tanatologia é a ciência da vida e da morte que visa entender o processo do morrer e do luto. E, simultaneamente, humanizar o atendimento aos que estão sofrendo perdas graves, podendo contribuir dessa forma na melhor qualificação dos profissionais que se interessam pelos Cuidados Paliativos, procedimentos que visam atenuar a dor e o sofrimento e aprimorar a qualidade de vida dos pacientes e de seus familiares diante de uma quadro ou doença terminal.


Segundo Kübler-Ross (1992) um paciente em estágio terminal e seus familiares podem passar por cinco fases no processo do morrer:


Negação:
ajuda a aliviar o impacto da notícia, servindo como uma defesa necessária a seu equilíbrio. Geralmente em pacientes informados abruptamente e prematuramente. O paciente desconfia de troca de exames ou competência da equipe de saúde. Geralmente o pensamento que traduz essa defesa é: "não, eu não, não é verdade". O médico deve respeitar, porém ter o cuidado de não estimular, compactuar ou reforçar a negação.


Raiva: o paciente já assimilou seu diagnóstico e prognóstico, mas se revolta por ter sido escolhido. Surgem sentimentos de ira, revolta, e ressentimento e tenta arranjar um culpado por sua condenação. Geralmente se mostra muito queixoso e exigente, procurando ter certeza de não estar sendo esquecido, reclamando atenção, talvez como último brado: Não esqueçam que ainda estou vivo! Nesta fase deve-se tentar compreender o momento emocional do paciente, dando espaço para que ele expresse seus sentimentos, não tomando as explosões de humor como agressões pessoais.


Negociação: tentativa de negociar o prazo de sua morte, através de promessas e orações. A pessoa já aceita o fato, mas tenta adiá-lo. Deve-se respeitar e ajudar o paciente.


Depressão: aceita o fim próximo, fazendo uma revisão da vida, mostrando-se quieto e pensativo. É um instrumento na preparação da perda iminente, facilitando o estado de aceitação. Neste momento, as pessoas que o acompanham devem procurar ficar próximas e em silêncio. Cabe ressaltar que o termo "depressão" não está sendo utilizado aqui para designar a doença depressiva, mas sim um estado de espírito.


Aceitação: a pessoa espera a evolução natural de sua doença. Poderá ter alguma esperança de sobreviver, mas não há angústia e sim paz e tranquilidade. Procura terminar o que deixou pela metade, fazer suas despedidas e se preparar para morrer.


São fatores que dificultam a aceitação da morte:

• Desequilíbrio financeiro que o tratamento da doença ou a falta daquela pessoa podem acarretar à família.

• Dificuldade da pessoa em aceitar cuidados, quando esta estiver acostumada com o cuidar.

• História e elaboração de perdas anteriores e crenças com relação a morte.

• Momento em que a morte ocorre no ciclo da vida, quanto mais jovem for o paciente, mais difícil será a aceitação de sua morte.

• A morte súbita impede os familiares de elaborarem gradativamente o luto, ao contrário da morte prolongada.


A fim de ajudar o paciente e seus familiares o profissional de saúde pode:

• Ajudar a pessoa a enfrentar a crise, auxiliando-a a expressar seus sentimentos.

• Ajudar a pessoa a descobrir os fatos, desmistificando fantasias e esclarecendo suas dúvidas, evitando especulações sobre a doença.

• Não dar a pessoa uma falsa confiança, oferecendo ajuda e reconhecendo a validade de seus temores.

• Não encorajar a pessoa a culpar as outras.

• Ajudá-la a aceitar ajuda.

• Incentivar e sugerir uma reorganização das tarefas cotidianas, para que a pessoa receba assistência.


Não há uma ordem para a ocorrência dessas manifestações, tão pouco uma cronologia, sendo que o paciente pode vivenciar mais de uma destas fases, concomitantemente, num mesmo período ou até mesmo não vivenciar algumas delas.
Estas fases são como mecanismos de defesa para enfrentar o processo desconhecido do morrer, em que os conflitos de ordem emocional, material, psicológica, familiar, social, espiritual, entre outros, surgem de forma acentuada.
Há um vasto rol de situações de perdas que podem levar ao luto e que segundo Viorst (1998, p.13):

[...] perdemos, não só pela morte, mas também por abandonar e ser abandonado, por mudar e deixar coisas para trás e seguir nosso caminho. E nossas perdas incluem não apenas separações e partidas dos que amamos, mas também a perda consciente ou inconsciente de sonhos românticos, expectativas impossíveis, ilusões de liberdade e poder, ilusões de segurança – e a perda do nosso próprio eu jovem, o eu que se julgava para sempre imune às rugas, invulnerável e imortal.

Kovács (1996, p.12) complementa dizendo que são várias as experiências de morte em vida e que embora não tendo acontecido no concreto, implicam em sentimentos de dor, ruptura, interrupção, desconhecimento, tristeza:

[...] separações, doenças, situações-limite com muita dor e sofrimento. Já outras, estão camufladas porque podem ser de cunho festivo, tais como: homenagens e acontecimentos onde a alegria parece ser o sentimento que predomina, mas, observando melhor, vê-se o espectro da “morte”, ou seja, o fim de uma situação ou estado: início e o final da adolescência, viagens, entrada na universidade, casamento, nascimento do filho, etc.



Evidencia-se, portanto, que há dois tipos de perdas: 1) a real, quando acontece a morte de uma pessoa amada ou algo concreto (privação do que foi perdido) há uma ausência física, são perdas tangíveis. Por exemplo: além da morte, perda de um membro ou parte do corpo por amputação ou trauma, separação, divórcio, perda de emprego ou uma posição importante; 2) E a simbólica, que são perdas de natureza psicossocial. Tais como: velhice, gravidez e o nascimento do filho, final da infância, o final da adolescência, etc.


Para elaborar este processo ocorre o estado de luto, que consiste em uma elaboração da consciência da perda, ou seja, num processo de absorção da experiência e a reestruturação de sua vida (processo que leva o enlutado a uma ação, em outras palavras, a se adaptar a nova realidade a ser vivida).


O luto é uma reação natural e saudável à perda. Na maioria dos casos, este é descomplicado, com sinais, manifestações ou expressões de luto saudáveis. Porém, quando este é extensamente prolongado por anos a fio, diz-se que seja um luto patológico, uma vez que a pessoa não se torna capaz de concluir este processo (RANGEL, 2008).


As reações consideradas normais no luto são:

• Sensações físicas: sensação de vazio no estômago; aperto no peito; nó na garganta; extrema sensibilidade ao barulho; sentimento de irrealidade e despersonalização; respiração curta; falta de ar; fraqueza muscular; baixa energia e secura na boca;


• Cognições ou padrões diferentes de pensamento: descrença (reação inicial numa função protetora), confusão, preocupação, sensação de presença e alucinações (ex: ouvir a voz do falecido ou achar ter visto sua imagem);


• Comportamentos associados: distúrbios do sono, do apetite, comportamento aéreo, tendência a esquecer das coisas, isolamento social, sonhos com a pessoa que faleceu, evitação de coisas que lembrem o morto, procurar e chamar pela pessoa, suspiros, hiperatividade, choro, dentre outros;


• Sentimentos:
frustração, dor, sofrimento, revolta, etc.


• A insensibilidade pode manifestar-se como um período de indiferença que não deve persistir por mais de duas semanas. Intelectualmente, há uma conformidade com o que aconteceu, mas sem estar acompanhado de sentimento. A sensação para a pessoa é de um sonho, pois se sente perdida e irreal.
Já os indícios de um luto não elaborado incluem:

→ a pessoa não consegue falar do morto sem se fazer acompanhar de sentimentos intensos;

→ pequenos fatos desencadeiam intensa reação de luto;

→ o enlutado não quer mexer com os pertences do morto;

→ o enlutado apresenta sintomas físicos iguais àqueles que o morto sentia;

→ o enlutado faz mudanças radicais em seu estilo de vida no pós-perda ou exclui de seu relacionamento pessoas com as quais convivia antes da perda;

→ o enlutado pode apresentar depressão (doença) ou euforia (extrema reação de bem-estar com ideias ou reações fora da realidade);

→ como uma compensação pela perda o enlutado, identificando-se com o morto, tem uma compulsão por imitá-lo;

→ aparecimento de impulsos autodestrutivos numa variedade de situações;

→ uma tristeza não justificada em datas nas quais o enlutado passava com o morto, como feriados e aniversários;

→ o enlutado apresenta fobia de alguma doença ou morte relacionada ao acontecimento com o morto;

→ uma falta de contato com o que cercou a morte, tais como participação em rituais e visitas ao túmulo.


Por estas considerações, entende-se que o entendimento sobre o processo da morte ou do morrer é necessário, não apenas, para a visão do profissional da área da saúde, mas também para sua própria vivência pessoal.

Referências bibliográficas

KÓVACS, M.J. Morte e desenvolvimento humano. São Paulo: Casa do Psicólogo; 1996.


KÜBLER-ROSS, E. Sobre a morte e o morrer. São Paulo, Martins Fontes, 1992.


RANGEL, A. P. F. N. Amor infinito: histórias de pais que perderam seus filhos. São Paulo: Vetor, 2008.


VIORST, E. Perdas necessárias. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


Thiago Ribeiro Borges

por Thiago Ribeiro Borges

Especialista em Docência no Ensino Superior e em Psicologia Analítica. Graduado e licenciado em Psicologia pelo UNISAL. Pesquisador dos Grupos de Pesquisa Desempenho Acadêmico e Metodologias Aplicadas e Desenvolvimento Humano e Saúde Mental. É professor de psicologia em cursos técnicos, psicólogo clínico e orientador educacional (Tutor EAD) no Centro Universitário Internacional.

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