As Dificuldades de Diagnosticar o Transtorno de Afetividade Bipolar

O transtorno bipolar acomete 4% da população brasileira
O transtorno bipolar acomete 4% da população brasileira

Psicologia

25/06/2015

Sem um diagnóstico correto, os portadores de Transtorno de Afetividade Bipolar costumam levar a vida numa montanha russa de emoções, colecionando ao longo do tempo perdas, muitas vezes irreparáveis. O tempo médio entre a procura por ajuda e o diagnóstico correto de TAB é de dez a quinze anos.


É, em geral, no momento depressivo do ciclo que os pacientes procuram ajuda. É muito comum que a doença passe por depressão e quase sempre o tratamento começa com antidepressivos. Mas para um paciente bipolar, os antidepressivos podem levar a uma mudança brusca tanto comportamentais e cognitivas como em energia e produtividade. Sair de um período de intensa tristeza e desesperança e entrar em seguida numa crescente de entusiasmo e energia frequentemente leva o portador de TAB e as pessoas com quem convive a acreditarem que o tratamento fez efeito e está tudo de acordo com o esperado. É nessa fase que grande parte dos pacientes abandona o tratamento julgando estar curada.


Nos momentos de mania ou hipomania a própria pessoa não percebe que está vivendo um episódio disfuncional. Pode se sentir muito bem, mais confiante, expansiva, otimista, corajosa. É o que todo mundo quer, não é mesmo? Dificilmente alguém vai procurar ajuda pra cortar essa onda. Também pode haver muita irritabilidade, a pessoa fica suscetível aos estímulos do ambiente ao redor, absorvendo tudo e reagindo muitas vezes de forma desproporcional. Fala muito rápido, pensa rápido demais mudando de um assunto para outro sem que as outras pessoas consigam acompanhar seu raciocínio, tem bastante ansiedade e dificuldade de concentração comprometendo assim sua produtividade nos estudos e no trabalho.


Portadores de TAB podem acabar ficando pouco tempo num mesmo emprego, pois tanto na fase depressiva quanto na eufórica ele pode ter dificuldade de para realizar as tarefas dele esperadas.


Se alguém lhe disser pra procurar ajuda médica, provavelmente se sentirá ofendido, não julgará uma ideia coerente. Mas é justamente as pessoas de fora que vão reparar os primeiros sinais de que há algo errado. Com o passar dos anos, sem tratamento adequado, os sintomas vão se agravando, os episódios tendem a ser mais severos e persistentes. Vivendo em ciclos onde se sente, hora impotente e apático, hora cheio de vigor e entusiasmo, o portador vai acumulando perdas.


Relacionamentos, projetos, estudos, trabalhos, vida social. Tudo é afetado. Num dado momento a pessoa sente necessidade de interagir e produzir, para então cair numa ascendente de perda de energia e apatia. Tudo começa e fica pela metade. Muito tempo se passa até que a pessoa perceba que é um padrão que se repete que não se trata de uma maneira errada de ser, de uma personalidade difícil, intratável, mas de sintomas de uma doença que a consome cada vez mais, como um câncer “na alma”.


Quando se dão conta, já se passou muito tempo. Muitas coisas não podem ser recuperadas. Ao receber o diagnóstico correto e entender finalmente o que se passa, a pessoa olha para trás e percebe que estava andando pelo mundo sem enxergar sua própria realidade, que muito sofrimento poderia ter sido evitado.

A doença pode começar com uma depressão unipolar. Depois, por fatores diversos, como o ambiente, estresse, genética ou mesmo uma resposta inadequada ao tratamento com antidepressivos, pode surgir o primeiro episódio de euforia (mania ou hipomania, sua forma mais branda). O primeiro episódio de euforia costuma acontecer entre 15 e 25 anos, comumente no adulto jovem. Mas dificilmente é percebida seguindo por anos em ciclos que vão gradualmente se tornando mais severos. Crianças e adultos mais velhos também podem desenvolver o transtorno bipolar.


Outro aspecto importante é que abuso de drogas lícitas e ilícitas e outras doenças podem mascarar os sintomas. São recursos usados com frequência para o enfrentamento das diversas dificuldades e percalços pelos quais um bipolar passa cotidianamente. É um coquetel perigoso a mistura de álcool e/ou drogas com os sintomas da doença favorecendo a evolução do quadro, mas, por outro lado, tornando muito mais difícil dissociar os sintomas do TAB das consequências do uso abusivo de drogas. Por tanto, não raramente o paciente busca primeiro ajuda para o vício, como por exemplo o AA, e sendo superada a dependência ou esta controlada, é que a busca verdadeira pelo problema que funcionou como gatilho do comportamento viciado se inicia.


Como alguém que se despe, camadas e camadas de comportamentos disfuncionais são compreendidas retiradas aos poucos e com o tratamento adequado é possível enxergar claramente ou o mais próximo disso. A visão nunca será perfeita. Mas a autoconsciência desenvolvida permite que o próprio bipolar consiga perceber quando está ficando mais agitado que o normal, quando está sentindo que vai entrar numa crise ou quando o stress ameaça disparar mais uma delas.


Dessa forma, o tratamento não se reduz a tomar a medicação recomendada. Voar sem vendas tem mais a ver com ser capaz de conseguir ministrar os sentimentos da forma mais adequada, proporcional e equilibrada, perceber-se e criar mecanismos de defesa e enfrentamento quando for necessário. Tem a ver com traçar um plano para se ter à mão e executar quando não for possível evitar um episódio de mania ou depressão, de forma que aja rapidamente para sair do estado crítico o mais rápido possível e com menos danos.

Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


Juliana Carvalho dos Santos

por Juliana Carvalho dos Santos

Licenciada em Ciências Biológicas pela Universidade de Brasília.

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