"NON, JE NE REGRETTE RIEN"

Psicologia

15/03/2016

“NON, JE NE REGRETTE RIEN”

 

 

Terminei de ouvir pela “enésima” vez a música “Non! Je ne regrette rien” de Charles Dumont com letra de Michel Vaucaire que foi eternizada nas vozes de Edith Piaf (“a alma de Paris”), Isabelle Boulay, sem falar na maravilhosa interpretação de Cássia Eller.

Seu biografo conta que quando Edith Piaf a ouviu pela primeira vez, disse: “_gostei! Esta é a história da minha vida! Quero cantá-la”.

“Non, je ne regrette rien” (“Não, não me arrependo de nada”). Quem de nós poderia afirmar que de nada se arrepende? Quem de nós poderia dizer que as nossas escolhas passadas foram sempre certas? Quem de nós não se envergonha de uma palavra mal dita, de uma atitude impensada ou de uma decisão errada? Talvez porque vivemos numa sociedade onde a imagem é tudo, as pessoas carecem negar seus erros. Cada um precisa manter as aparências e mostrar ser bom, bonito(a), inteligente... o marido, a esposa, o(a) filho(a), o(a) empregado(a) que todos gostariam de ter. É o medo da rejeição. E se descobrirem que sou humano e não santo? E se desvendarem que não sou perfeito, mas vulnerável? Por outro lado, vale a pena perguntar: Por quanto tempo conseguiremos manter o nosso mundo de faz de contas, de aparências?

Está pago, varrido, esquecido... todos os meus temores... Não me importa o passado”. Ah! Como seria bom se isso fosse verdade. O passado é a sombra que nos acompanha, quando não nos persegue. De fato, o passado deixa em nós (e nos outros) marcas indeléveis. Mas, gosto da ideia de “está pago, varrido, esquecido”. Informa-me que o passado às vezes é demasiado pesado para ser carregado para o futuro e que preciso confiar em algo maior do que eu.

Recomeço do zero”. A psicologia chama isso resiliência. O termo advém do latim resilliens e indica a capacidade de voltar ao normal depois de uma situação difícil, fronteiriça; designa a predisposição de recuperar o equilíbrio após sofrer um forte revés na vida; ou logo após ter sido empurrado para baixo, de ter sido sufocado ou submetido a uma insuportável pressão. Não importa onde, nem quanto, nem por que e muito menos por quem você foi parado (a). Levantar e recomeçar é preciso. Como disse o poeta, “Recomeçar é dar uma nova chance a si mesmo, é renovar as esperanças na vida e o mais importante, acreditar em você de novo” (Carlos Drummond de Andrade). 

Nem o bem que me fizeram, nem o mal – tudo isso me parece igual”. Confesso, ainda que “todas as coisas contribuem para o bem” (Romanos 8.28), bem e mal não me parecem iguais. Rejeito o maniqueísmo tão popular em nossos dias. Entretanto, reconheço: ambos me tocam e despertem em mim emoções profundas às quais nem sempre estou consciente. As discussões filosóficas me atraem (seria o mal a ausência ou o outro lado do bem?), mas o fato é que o mistério continua e você e eu estamos no meio dele.

“Non, je ne regrette rien”. Discordo. Ao contrário, advogo a necessidade continua de arrependimento. Esse exige deixar de lado a arrogância, a prepotência e a onipotência. Demanda assumir-se como falho, imperfeito, vulneral. Isso é, como humano. No grego, arrependimento é metanoia (μετ?νοια) e implica numa conversão que envolve a totalidade da pessoa (espiritual, emocional, intelectual e volição). Abarca assumir uma atitude contraria à tomada anteriormente, assim como uma mudança de direção de vida.

 

 

“Oui, je regrette” . Sim, defendo o arrependimento como caminho para vencer o medo da rejeição; para aprender que somos amados não pelo que aparentamos ser, mas apesar do que somos. Sim, faço apologia da metanoia como a estrada para desativar as preocupações da mente, as quais distorcem a percepção do presente, fazendo rever repetidamente a imagem do erro cometido e aciona o gatilho da culpa que drena as energias, a qualidade de vida e a possibilidade de viver o presente em paz. 

Oui, je préconise la repentance” como vereda da humildade, que leva a aprender com os erros e a “dar meia volta” e dizer: “Errei feio. Pisei na bola! Machuquei você. Não tenho nenhum direito de exigir nada. Não posso nem pedir que me aceites. Entretanto, serei grato se me acolheres e me tratares como acolhes e tratas os desconhecidos. Então, que trilha tomarás - a da culpa, do remorso, da enfermidade e do orgulho (“non, je ne regrette rien”) - ou a do equilíbrio e da saúde (“oui, je regrette tout”)?

  

Maruilson Souza, Ph.D

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Maruilson Menezes de Souza

por Maruilson Menezes de Souza

Doutor em Educação Teológica (PhD).

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