Transtorno Obsessivo Compulsivo: um artigo para entender e sentir
Transtorno Obsessivo Compulsivo
Psicologia
05/04/2016
“O Transtorno Obsessivo Compulsivo é caracterizado por obsessões e compulsões, sendo uma doença paralisante e incapacitante que afeta todas as áreas da vida”
O TOC, sigla para o Transtorno Obsessivo Compulsivo, é um tipo de distúrbio de ansiedade que se caracteriza basicamente por obsessões, compulsões ou a modalidade mista destes dois sintomas.
Acomete de 3 a 4% da população, independentemente de ser homens, mulheres ou crianças, sendo o quarto lugar em índice de atendimentos dentre os transtornos psiquiátricos.
O TOC pode ocasionar outras comorbidades, como por exemplo, a compulsão alimentar. Trinta por cento dos pacientes apresentam também tiques motores.
Geralmente o TOC inicia-se na infância e principalmente na adolescência. No entanto, também é comum entre os adultos.
Pacientes expostos a fatores ambientais estressógenos e com história de trauma psicológico, tendem a aumentar ou agravar o distúrbio. O tratamento é prolongado, podendo durar de 3 a 6 meses.
É importante elucidar que o TOC não é uma doença e sim um transtorno. A doença é causado por micróbios, vírus, etc. O transtorno, diferente da doença tem como característica principal ser de ordem multifatorial: fatores genéticos, hormonais, biopsicofisiológicos (disfunção química cerebral), genética comportamental e a estória de vida do paciente, revelam a complexidade da etiologia do TOC. As somatizações tendem a ser exacerbadas neste quadro clinico, bem como características a exemplificar: perfeccionismo exagerado, simetria, organização de objetos por categorias (cores, tamanhos, etc).
O que são obsessões e compulsões?
As obsessões são ideias ou pensamentos intrusivos, invasivos e recorrentes, que sobrevém a mente do paciente sem que este tenha controle. O TOC é o “transtorno da culpa”, pois quem sofre deste distúrbio tem pensamentos intrusivos, geralmente de teor agressivo e sexual caracterizados pela absurdidade.
Deste modo, diante dos pensamentos invasivos, existe um enorme sentimento de culpa em pensar, por exemplo, em fazer algum mal a alguém (Ex.: matar, torturar), em ter relações sexuais com santos, com os filhos, com a mãe ou o pai. Sendo assim, o TOC causa imenso sofrimento psíquico, visto que a pessoa sabe da improcedência, da incoerência e da absurdidade destes pensamentos, mas ao mesmo tempo não tem controle sobre eles, causando, deste modo muito desconforto emocional, culpa, vergonha e ansiedade.
A função do ritual no TOC é baixar a ansiedade, mas ao mesmo tempo, este torna-se um hábito constante na vida do indivíduo, fortalecendo, deste modo o círculo vicioso “ritual-pensamento-ritual”, e consequentemente reforçando o próprio TOC. Os pacientes perdem muito tempo com estes rituais (de verificação, simetria, limpeza, etc.), de modo que afeta ou prejudica todas as áreas da vida: pessoal, familiar, lavorativa, social, etc. Por exemplo, chegar atrasado ao trabalho ou a um compromisso por conta da execução dos rituais.
As compulsões são comportamentos ritualísticos, portanto repetitivos, e tem por objetivo, neutralizar as obsessões ou pensamentos intrusivos, causando alívio temporário à angustia gerada por estes pensamentos obsessivos.
Temos como exemplo de rituais no TOC: lavar as mãos muitas vezes ao dia, abrir e fechar diversas vezes a porta no intuito de se convencer que de fato ela está fechada. Este processo vale para as luzes do aposento, a porta do carro, etc.
O ritual de conferência é uma característica muito forte para quem sofre deste transtorno, bem como a questão do medo apresenta também papel relevante, pois o portador acredita que se ele não realizar os rituais, vai acontecer algo de muito ruim com ele ou com pessoas queridas, familiares, amigos, a ele mesmo, causando, desta forma, muito sofrimento psíquico.
Traços de personalidade e TOC:
Algumas pessoas apresentam alguns traços de personalidade que podem ser confundidos com o TOC, mas que não chegam a caracterizar o transtorno. Todos nós temos algumas manias, gostamos de limpeza e das coisas organizadas.
O que caracteriza o TOC é sua disfuncionalidade comportamental, exacerbação emocional, sofrimento psíquico intenso e prejuízo nas áreas da vida. O TOC incapacita a pessoa de ter uma vida normal.
Tipologias do TOC:
As principais modalidades do Transtorno Obsessivo-Compulsivo são:
1- TOC por Medo de contaminação:
Caracterizado principalmente pelo comportamento de evitação. O paciente evita: sentar-se em bancos públicos, utilizar copos e talheres de restaurantes, evitar o contato físico, por exemplo, no momento de apresentar-se a alguém por medo de contaminação por germes. Deste modo, o TOC é caracterizado pela exclusividade comportamental.
2- TOC por Acúmulo de objetos:
Caracterizado por amontoar objetos que o paciente acredita que em algum momento será útil ou que tenha um valor afetivo significativo. O acúmulo destes utensílios, pode chegar a dimensões gigantescas caracterizando-se como entulho, o que impossibilita as pessoas de viver dentro da própria casa, pois não há mais espaço para nada. Vale a pena salientar que o TOC por acúmulo de entulhos é muito diferente do colecionismo. O colecionismo não se caracteriza como disfuncionalidade e nem impede a pessoa de ter uma vida normal. Por exemplo: uma pessoa pode ter uma coleção de selos, de porta-chaves, ou de qualquer objeto, sem que com isso se configure uma patologia.
3- TOC por ordem e simetria:
Todos nós temos a necessidade de ter uma vida organizada, pois a organização do ambiente externo é importante também para nossa organização interna. Produzimos melhor em um ambiente organizado e isto facilita a vida e não se configura como uma patologia. No entanto, TOC de ordem e simetria é a exacerbação desta necessidade de organização, como por exemplo: objetos, utensílios ou quaisquer outros materiais devem estar em ordem por categoria, seja de cor, de formato ou tamanho. Caso a ordem destes objetos sejam modificadas, causa intensa angústia no paciente. Neste tipo de TOC, os talheres, os copos, as cadeiras e quadros devem estar milimetricamente alinhados. Em uma pessoa que é organizada e que não sofre de TOC, ela pode olhar algo fora do lugar e não sofrer com isto. Já no paciente, o simples fato de ter algo fora do lugar é motivo para o gatilho da ansiedade.
4- TOC por mania de limpeza:
O paciente com esta modalidade de TOC acredita que por mais que limpe a casa ou que tenha uma higiene pessoal satisfatória, sempre vai existir resquícios de sujeira ou germes, que precisam ser removidos, reiniciando-se assim, todo o processo de limpeza e gastando tempo significativo. Como uma das características do TOC é o perfeccionismo, a pessoa sempre vai achar que o trabalho está incompleto. Uma pessoa pode gastar até 6 horas em um ritual de banho. Tem pacientes que lavam tanto as mãos que chegam a lesioná-las. Outra característica é a constante troca de roupas de cama e toalhas de banho. 5- TOC de Comportamento de superstição:
A superstição faz parte da nossa cultura. Há quem diga que no Ano Novo o aconselhável é vestir determinadas cores de roupas, pois isto atrairá bons fluidos. Tem quem acredite que sete ondas de costas no mar, eliminam cargas negativas, ou mesmo tem pessoas que não gostam de passar por debaixo de escadas. Existe uma certa legitimidade nestes comportamentos, já que tem uma convenção social acerca destas crenças, e o fato de não fazê-las não acarretaria sofrimento para as pessoas. Mas quem sofre de TOC é bem diferente. Neste caso, as superstições são “levadas muito a sério”, é patológico, pois caso use uma determinada cor (quando não deveria usar) ou por exemplo, veja um gato preto, ou pronuncie palavras que para eles são de mau agouro ou que possa trazer algum tipo de azar ou infortúnio, é motivo suficiente para causar imensa angústia. Neste caso, mais uma vez, eles se utilizam de rituais para anular os efeitos “maléficos” que estas ocasiões reportam e que se não forem feitos os rituais, trariam acontecimentos catastróficos.
6- TOC de verificação:
Esta modalidade é bastante comum e se caracteriza, como o próprio nome sugere, uma necessidade constante de verificar, por exemplo, se a porta da casa ou do carro foi fechada. O mesmo serve para a verificação do desligamento de luzes e de fios de eletricidade tais como ferro de engomar e ventilador. Às vezes, pode acontecer que, em um dia em que estamos mais distraídos ou preocupados, não tivemos uma observação sucinta que de fato fechamos a porta, ou que desligamos o ferro de engomar. No caso do TOC, a pessoa não confere somente uma vez. Ela sente a necessidade de checar várias vezes e, mesmo convencida de que o procedimento foi feito, ela volta a controlar se realmente a porta, a luz ou o ventilador foram fechados.
A questão da contagem e numeração no TOC:
Em todas as modalidades de TOC, o paciente apresenta o ritual de contagem. Por exemplo: para entrar em um aposento, bate-se a porta determinado número de vezes; para colocar os chinelos nos pés tira-se e retira-se várias vezes; lava-se as mãos por exemplo 3 vezes ou mais. A contagem varia de paciente para paciente. Isto acontece porque o paciente de TOC possui um substrato de personalidade com características perfeccionistas. Neste caso a repetição acontece porque o paciente não se “convenceu” de que realizou aquela atividade de maneira satisfatória. Com relação a numeração, o paciente tem preferência por números pares, pois os números ímpares seriam incompletos e não preencheriam o requisito “perfeição”, que como foi corroborado, é muito forte neste tipo de transtorno.
Intervenções terapêuticas:
O TOC tem tratamento e o quanto mais cedo for diagnosticado, melhor o prognóstico do paciente. Para que o tratamento tenha resultado satisfatório, é necessário associar medicação e psicoterapia, principalmente a TCC ou terapia cognitivo-comportamental, que tem se mostrado muito eficiente em casos de Transtornos de Ansiedade em geral e particularmente no transtorno obsessivo-compulsivo. No caso de pacientes em estado grave ou refratários, ou seja, pacientes que não respondem ao tratamento, a ultima opção é recorrer à eletroterapia e à neurocirurgia.
TOC e Sociedade:
É imprescindível contextualizar a saúde mental com a nossa sociedade ocidental contemporânea. Hoje, vivemos no nosso limite. A competitividade, a descartabilidade, a busca pela perfeição, a realização de atividades simultâneas, com prazo de tempo para entrega, faz com que a pessoa viva com uma sobrecarga física e emocional sem precedentes, sendo a causa para o surgimento de sintomas psicossomáticos que nos alertam constantemente que precisamos de uma pausa. Temos que admitir que criamos uma sociedade doentia e sem qualidade de vida. Para reverter este quadro é necessário rever nossa conduta diária e avaliar os pontos que necessitam ser modificados; e isto é totalmente personalizado e urgente.
TOC e ajuda familiar:
O tratamento do TOC deve ser obrigatoriamente sistêmico, ou seja, ter apoio familiar. Para este fim, é necessário orientar os familiares e as pessoas que convivem com o paciente para que estes não se acomodem com os sintomas e nem os reforcem. Em outras palavras, a família não deve compactuar com as manias e os rituais do paciente. Por exemplo: a regra é lavar as mãos apenas uma vez antes das refeições e não várias vezes; não ter exclusividade de talheres e copos se estes estiverem devidamente higienizados. Para uma maior eficácia, o tratamento do TOC deve se estender da clínica para a residência do paciente através do grupo de apoio social, que consiste na família e amigos do membro da família com TOC.
Em alguns casos, o problema se complica, pois na convivência familiar, internalizamos os preocupantes, as manias, etc. Quando existe um membro da família que tem essa referência de lidar com as situações de maneira rígida, inflexível e que também tem suas manias, pode ser um reforçador para o membro que está doente. Faz-se necessário, neste caso específico, a psicoterapia familiar, pois alguns membros da família podem apresentar o TOC subclínico, sendo um agravante para o membro que apresenta o TOC propriamente dito. Psicologia preventiva e psicoeducação:
Quando falamos em saúde física ou saúde mental, é imprescindível nominar estes dois conceitos: Psicologia preventiva e psicoeducação.
Infelizmente não temos uma cultura voltada para a prevenção. Tenho observado este fenômeno não só no Brasil, mas também em outros países, em outras culturas. O que acontece é que geralmente o paciente só procura o profissional de saúde quando o problema já está deflagrado, ou seja, quando o quadro clínico da doença já está em evolução. Com o Transtorno Obsessivo-Compulsivo não é diferente, e ainda é pior, pois devido à sintomatologia característica dos sintomas obsessivos (Ex.: pensamentos bizarros de ordem sexual ou violentos), bem como os comportamentos compulsivos ou ritualísticos que podem ser motivo de zombaria ou escárnio social, o paciente tende a se isolar, a esconder estas características da doença. Por este motivo, é muito comum comorbidades como depressão e fobia social neste transtorno.
Sendo assim, é necessário diagnosticar e tratar precocemente o TOC para que este não evolua para um quadro mais grave e com comorbidades.
Por este motivo, é importante realizar um trabalho psicoeducativo junto à população, esclarecendo acerca das características do transtorno, dos principais sintomas, da questão genética familiar, pois quanto mais cedo for diagnosticado e tratado, melhor para a qualidade de vida do paciente.
Notas da autora:
Este artigo tem função informativa e psicoeducativa, não substituindo o diagnóstico profissional.
Sobre o tema explanado, você pode expressar suas ideias e opiniões, bem como sugestões, questionamentos e dúvidas.
Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.
por Soraya Rodrigues de Aragão
Soraya Rodrigues de Aragão é psicóloga, escritora e palestrante. Realizou seus estudos acadêmicos na Unifor e Universidade de Roma (Lumsa). Equivalência do curso de Psicologia na Itália resultando em Mestrado. Especializou-se em Psicotraumatologia pela A.R.P. de Milão. É sócia da Sociedade Italiana de Neuropsicofarmacologia e membro da Sociedade Italiana de Neuropsicologia.
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