Stress no Ambiente Organizacional

Recursos Humanos

13/01/2016

Stress no Ambiente Organizacional:

Fatores Causais e Recursos Interventivos

Uma Breve Reflexão sob a Perspectiva da Psicodinâmica do Trabalho

 

   Comecemos pelos aspectos pertinentes ao que tange a definição da expressão “stress”. Podemos encontrar diversas interpretações; encontrando definições como stress funcional (positivo, estimulante e motivador) e disfuncional (negativo, limitante e desmotivador), particularmente defino stress como: “Todo o estado físico, mental e/ou emocional que nos retira de nossa zona de segurança”, prefiro usar a expressão “zona de segurança” ao invés de “zona de conforto”, pois nem sempre essa zona é confortável, muito pelo contrário; já a sensação de segurança está sempre presente, mesmo quando  o posicionamento e atitudes internas são claramente desagradáveis para o sujeito.

Atualmente o stress é considerado o mal do nosso século, pela classe científica, quiçá do milênio; data visto que ao analisarmos friamente as dinâmicas econômicas e o desenvolvimento social contemporâneo, impulsionados pela globalização, fica claro que independente das diferenças socioculturais inerentes a cada povo e cultura, todos e todas de certa forma compartilham e reproduzem as mesmas expectativas, pressões e exigências que regem e balizam os ditames econômicos, os quais exercem forte influência na sociedade contemporânea, tanto em níveis micro quanto macro.

Somos bombardeados diariamente com toda uma parafernália falácia de receitas para a felicidade. Vale tudo, desde propagandas audiovisuais apelativas referenciando mais o contexto envolvido na propaganda a fim de atingir-nos no nível inconsciente, até todo o tipo de poluição sonora, visual e até mesmo o tal “Marketing Sensorial”, tudo para que sejamos convencidos inconscientemente a adquirir aquilo que de alguma forma nos dê a ilusão de preenchimento de um vazio ou frustração, que sempre existirá em nós, e que tende a ser cultivado pelo próprio sistema social e cultural, para que com isso sejamos mais uma peça da grande engrenagem que movimenta a economia e sustenta essa filosofia perversa chamada Consumismo.

Convencidos em embarcar no “Sonho Americano” somos facilmente compelidos a realizá-lo. Entretanto, tudo tem seu preço, ou quase tudo; e o próximo passo é a construção de uma leva de sonhos e status quo derivados do nosso poder de produção, realização e conquistas; geralmente ligadas diretamente à obtenção de bens materiais como símbolos não de valor pessoal, mas de autoconvencimento de “vitória na selva”, o que levará à falsa sensação de realização pessoal.

 O ser humano é um ser social, se constrói através do outro, no outro e muitas vezes pelo outro, e de certa forma tudo faz parte de nossa expressão pessoal, tanto nossos equilíbrios e desequilíbrios expressados através dos objetos externos, o que pode deflagrar facilmente uma perigosa dependência exógena, quanto sob uma perspectiva sincrônica, o movimento inverso talvez seja ainda mais perigoso. Internalizando “regras”, paradigmas e convenções sociais como sendo nossas, tornando-nos escravos da diluição de nossos verdadeiros valores, adotando e aceitando as demandas externas em detrimento das demandas internas, levando-as à camuflagem por vezes tão cristalizada que se torna difícil responder à simples perguntas como: “- o que eu realmente quero de mim, para mim e para a minha vida?” levando nossa vida aos valores regidos pelo mote: “-mais vale ser verossímil do que ser verdadeiro”.

Todo esse carrossel de estímulos e pressões gera e gerará cada vez mais stress; pois é um ciclo que se realimenta constantemente; o preço é exatamente o nosso equilíbrio interno e consequentemente externo. Somos impelidos a trabalhar cada vez mais, para gastar mais, e assim ter mais, o que levará a termos novamente que trabalhar mais para manter o que conquistamos, assim reiniciando o ciclo.

Frente a todo o cenário interno e externo estamos expostos a uma infinidade de fatores causais que podem explicar ao menos em parte essa verdadeira epidemia de stress que vivenciamos em nosso tempo.

Podemos dividi-las em:

Fatores Internos – diz respeito à aspectos psicológicos, mentais, intrapessoais, emocionais, relacionais, perceptuais e ideológicos.

Exemplos:

  • Problemas de relacionamento no trabalho
  • Autoimagem distorcida
  • Más percepções do ambiente e do outro
  • Preconceitos
  • Crenças Segregadoras
  • Fadiga Mental
  • Timidez
  • Baixa Autoestima

 

Fatores Externos – diz respeito à aspectos estruturais, espaço físico, organização, poluição física, sonora e visual, desconforto físico e interferências climáticas.

Exemplos:

  • Trânsito
  • Destemperes Climáticas
  • Atrasos de Transporte
  • Acidentes
  • Fadiga Física
  • Imprevistos
  • Falta de Infraestrutura
  • Dores Físicas
  • L.E.R (lesão por esforço repetitivo)
  • Poluição – Gases poluentes, alto índice de barulho e luzes e brilhos como faróis de veículos e excesso de comunicação visual em grandes cidades.

Fatores Inter-relacionais – mau convívio, desgaste de relacionamentos, ruídos na comunicação, erros de interpretação, dificuldade em se fazer ouvir, conflitos.

Exemplos:

  • Superiores diretos autoritários
  • Conflitos com colegas
  • Conflitos grupais
  • Saturação relacional
  • Insatisfação com a atual função
  • Desvalorização profissional
  • Insatisfação com meios de transporte
  • Problemas familiares
  • Divórcio
  • Falta de credibilidade nos ambientes familiar e/ou profissional
  • Não realização pessoal   

 

 

Cabe destacar o fato de que todos esses aspectos e seus desdobramentos se entremeiam de forma quase caótica (imprevisível), sua livre associação varia de pessoa para pessoa e o que se sabe é que de uma forma ou de outra essas interações levam a quadros diversos, resultados diversos e consequências diversas; entretanto, todos levarão a um estado de maior ou menor stress.

 

 

 

 

 

Um Caso de Stress no Ambiente Organizacional

 

 

Certo dia recebi uma proposta de emprego; uma empresa de conexão de internet por fibra óptica havia iniciando suas atividades de planejamento estratégico; a proposta era assumir o departamento de Marketing e a função de Gestor de Pessoas e consequentemente auxiliar a empresa dentro de meus conhecimentos e experiência, pois a mesma se encontrava na sua fase inicial e boas sugestões seriam bem vindas.

 

No entanto, o contato havia sido por telefone ou e-mails, e aparentemente parecia que tudo seguiria dentro do esperado. Chega a data de conhecer o empreendedor responsável, vou até o local combinado, chegando lá... bem, como posso dizer... no mínimo surpreendente, mas não no aspecto positivo, muito pelo contrário, a primeira impressão que tive foi no mínimo péssima; o cenário era parecido com uma frente de “boteco” mal construída e desgastada de 20 anos atrás, o telhando estava “empenado” torto, era um espaço pequeno, havia cerca de quinze pessoas sentadas, algumas na calçada, outras em cadeiras empoeiradas, cada uma no seu smartphone, dois andavam a esmo buscando quinquilharias e lixo de construção, levando de um lado para o outro, havia dois banners acabados de chegar de uma gráfica, eram péssimos, poluídos, cheios cores e mensagens pictográficas exageradas, aparentemente satisfatórios para leigos.

    

O interior era ainda pior, não havia iluminação interna, a pouca iluminação vinha de um pequeno vitro à esquerda de quem entrava, a fraca luz que entrava dava ao ambiente um aspecto lúgubre e decadente, algo um tanto “novel noir” do fim do século XIX, algo próximo dos Thrillers de Hollywood, a desorganização era marcante; papeis espalhados, paredes escuras e mal acabadas, o piso, bem, nem piso tinha, era de cimento “queimado” com alguma tinta de tom pastel toda desgastada e descascada; os móveis eram uma lástima, e os equipamentos, mesmo sendo caros, estavam todos jogados e amontoados, chegavam a parecer sucata. As pessoas quase não se comunicavam, e o “empreendedor” era um completo desleixado, não tinha o mínimo perfil e comportamento de líder, não trazia a atenção para si, não inspirava confiança, sua linguagem corporal era contraditória e insegura, sua figura inspirava desconfiança e incredibilidade; se comunicava mal, não olhava nos olhos, desviava o olhar quando ia falar com alguém, vestia-se mal e nitidamente não parecia se preocupar com uma boa imagem e asseio.

 

Naquele dia fiquei eu e minha equipe em pé por horas, sem simplesmente ter o que fazer, apenas fui cumprimentado com um aperto de mão frouxo e distante, o que já se mostrou como um mau prenúncio do que se sucederia por todo aquele mês. Com o passar dos dias, o senso de adaptação, a racionalização baseada em não ser preconceituoso e a boa fé fizeram o seu papel, aos poucos tudo parecia estar se encaminhando, até que por conta de uma infinidade de mentiras, falta de compromisso, atrasos e mais atrasos no pagamento, falta de consideração, estrutura zero, e demais desgastes a equipe foi sendo reduzida  até eu mesmo também me desligar de toda aquela insanidade. O desligamento foi necessário, pois durante a experiência passei a dormir mal, tinha crises de enxaqueca, irritabilidade e grande frustração e insegurança; o assunto era sempre o mesmo, minha vida profissional se reduzia às desconfianças, discussões e sinais negativos que se mostravam cada vez mais factuais. Ao me desligar, tirei um peso dos ombros, consegui ao menos em parte reestabelecer antigos padrões positivos de comportamento e manter alguma positividade.

 

Conclusões e Métodos de Combate ao Stress no Ambiente Organizacional

 

Como ficou claro no caso acima narrado, o stress no trabalho pode ser responsável por uma série de resultados negativos e até mesmo desastrosos; uma vez que a pessoa não consiga se aperceber, se auto-observar e identificar as fontes do stress ficará cada vez mais difícil adotar uma ação interventiva terapêutica, mudança de hábito, de atitude, de postura e dependendo da situação até mesmo um desligamento da fonte causal, caso nenhum tipo de ação anterior tenha surtido efeito.

 

Um dos recursos mais interessantes é utilizar os conhecimentos e competências de um gestor de pessoas especializado em traçar perfis psicossociais situacionais nas organizações; uma espécie de diagnóstico profundo. Em primeiro lugar focado nos aspecto macro, utilizando uma perspectiva holística, compreendendo o todo, suas manifestações, fenômenos e interações; um tipo de “Panorama Geral”, levando em consideração tanto a cultura quanto o clima organizacional. Em segundo lugar o aspecto social, focado em seus grupos e subgrupos, possíveis contraculturas, costumes, conflitos grupais e percepções coletivas. Por fim, em terceiro lugar os aspectos micro; ou seja, os indivíduos, suas percepções individuais, suas crenças, facilidades e satisfações assim como suas dificuldades e insatisfações dentro da organização.

 

Por fim, esse profissional será capaz de traçar um plano de ação envolvendo uma série de ferramentas e recursos para “reoxigenar” o clima organizacional, revitalizando-o e devolvendo a vida emocional da empresa ou organização. Recursos como palestras motivacionais, treinamento e reciclagem, readequação de pessoal, novas diretrizes de gestão de pessoas, atividades artísticas corporativas, academias dentro da empresa, atividades e dinâmicas que fortaleçam o espírito de equipe e até mesmo processos de coaching voltados à alta cúpula, diretoria e altos gestores.

 

Existem diversas ações terapêuticas preventivas, reativas e interventivas no combate ao stress; neste caso especificamente voltadas ao ambiente organizacional. Podemos destacá-las subdividindo-as em três grupos; Preventivas, Reativas e Interventivas. Abaixo alguns exemplos de medidas possíveis de serem adotadas no combate ao stress organizacional.

 

 

 

 

Preventivas:

  • Autoconhecimento
  • Pesquisar a organização na qual pretende atuar; cultura e clima organizacional
  • Ser claro consigo mesmo em relação à: Valores Pessoais x Valores Financeiros.
  • Criar mentalmente um roteiro, ensaio mental e refletir à respeito; onde, como e de que forma quero chegar lá.
  • Avaliar constantemente de forma realista sua atual situação; custo benefício.
  • Não ter medo de admitir suas insatisfações e sonhos com sua vida profissional
  • Buscar se inspirar constantemente, assim como inspirar os outros
  • Ouvir as pessoas, se pôr no lugar delas compreendendo que elas não são você, elas têm limitações, competências e percepções diferentes das suas.
  • Não julgar, e sim avaliar.

 

Reativas

  • Esclarecer fatos, dúvidas e mal entendidos no momento em que acontecem.
  • Não conter raiva e nem direcioná-la a alguém, apenas expressar suas opiniões de forma assertiva e estar aberto a ouvir.
  • Buscar soluções efetivas e sólidas, reais, não dar espaço à ironia ou demagogia.
  • Transformar os conflitos velados, latentes ou abertos em problemas, com isso engajando os demais na busca pela resolução em detrimento da vitória de um dos lados.
  • Buscar melhorar o que estiver ao seu alcance ao invés de reclamar e delegar a outrem a responsabilidade pela sua frustração ou reclamação; ser proativo.
  • Utilizar técnicas de meditação diariamente e durante o expediente, respiração negativa e positiva por exemplo.
  • Estar disposto a reagir pelo bem de todos, não permitir acúmulos de tensão dentro da realidade da situação.

 

Interventivas

  • Práticas de esporte
  • Práticas de atividades artísticas
  • Prática de atividades físicas
  • Sessões de massoterapia
  • Práticas de relaxamento
  • Reeducação alimentar
  • Readequação de hábitos cotidianos
  • Acompanhamento Psicológico
  • Acompanhamento Psicanalítico
  • Uso de técnicas de Medicina Complementar
  • Desenvolvimento de Hobbies
  • Trabalho Voluntário Filantrópico      

 

Ao adotar ao menos algumas das medidas acima citadas será possível à pessoa munir-se de recursos e ferramentas para que aos poucos, dentro do seu próprio ritmo o sujeito possa se atentar para o cenário real que o cerca na organização onde está inserido/ligado direta ou indiretamente; assim questionando suas percepções e cultivando o equilíbrio almejado, e consequentemente conseguindo dar o talvez grande “passo” para uma vida profissional mais saudável; Decisão, palavra que vem da raiz francesa ciseaux, que significa “Tesoura”, ou seja, cortar; cortar algo, abrir mão de, desligar-se, desapegar-se de algo, interno ou externo.

Para Refletir: “A grande dificuldade da decisão não reside no que iremos adquirir, mas no que precisaremos abrir mão”.

Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


David Alexandre Martins

por David Alexandre Martins

Cursando Gestão de Recursos Humanos - ênfase em Gestão Estratégica de Pessoas, Gestão de Conflitos, Coaching e Psicodinâmica do Trabalho. Pesquisador nas áreas de Comportamento Humano, Filosofia, Sociologia, Psicologia, Psicanálise, Sexologia, Antropologia, dentre outras.

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