Conservação da carne durante estocagem refrigerada e congelada

Os processos de conservação inibem a ação dos microrganismos
Os processos de conservação inibem a ação dos microrganismos

Veterinária

30/10/2012

A conservação de alimentos tem como objetivos manter a qualidade nutritiva e características organolépticas, além de impedir a ação de microrganismos e de suas toxinas, aumentando a vida de prateleira e estabilidade dos produtos. Os processos de conservação visam eliminar ou inibir a ação dos microrganismos, evitar a proliferação patogênica, impedir reações enzimáticas, reduzir a velocidade das reações químicas de oxidação e preservar as características originais da carne (BRASIL, 2004; MARTINS, 2008).

Segundo Porto (1996), a temperatura é um fator que influencia diretamente no desenvolvimento microbiano, sendo que quanto menor, mais lenta será a multiplicação destes e também a velocidade das reações químicas. De acordo com Warriss (2004), a atividade enzimática depende da temperatura de armazenamento, que vai influenciar na redução do pH a partir da produção de ácido lático e da velocidade de ocorrência do processo de rigor mortis. A refrigeração permite que ocorra o processo de maturação da carne pela hidrólise parcial das proteínas dos músculos com consequente amaciamento. Durante a estocagem em temperaturas de -1 a 8ºC, os microrganismos multiplicam-se mais lentamente favorecendo o prolongamento da vida de prateleira que dependerá essencialmente do tipo e número inicial de microrganismos, sendo que com a refrigeração ocorrerá a inibição ou a suspensão da multiplicação microbiana. Deve-se considerar que em temperaturas menores que 5ºC, a maior parte dos microrganismos patogênicos não se proliferam (PORTO, 1996; FEIJÓ, 1999; ORDÓÑEZ et al., 2005b).

É importante ressaltar que para o máximo tempo de vida de prateleira, os cortes cárneos devem ser armazenados em menor temperatura de refrigeração possível (JAKOBSEN e BERTELSEN, 2002). O congelamento é um dos métodos mais eficientes na conservação em longo prazo que pode inibir a multiplicação dos microrganismos responsáveis pela maioria das alterações e também reduzir a velocidade de reação de processos bioquímicos (PARDI et al., 2006), já que cerca de 80% da água contida no produto é transformada em gelo quando é submetida à temperaturas abaixo de -2ºC (URBAIN e CAMPBELL, 1994; GENOT, 2003). O congelamento pode ser lento ou rápido, sendo que este último possui diversas vantagens que auxiliam na manutenção da qualidade do produto, dentre elas a formação de pequenos cristais intracelulares de água. Como consequência, esta característica promove uma menor ocorrência de ruptura celular, exsudação e perda de nutrientes particularmente no processo de descongelamento em ambiente refrigerado, além de minimizar a ocorrência de reações químicas e enzimáticas, devido aos processos de oxidação lipídica e degradação proteica, que são as principais alterações de deterioração em carnes congeladas (ERICKSON e HUNG, 1997; MONTEBELLO e ARAÚJO, 2009; MUELA et al., 2010; TOLDRÁ, 2010).

Em relação às alterações moleculares ocorridas em carne bovina, suína e de aves durante congelamento à temperatura de -18ºC, Ballin e Lametsch (2008) citam que cerca de 8 a 10% da água que constitui o tecido animal permanece, mesmo após o congelamento, disponível para a ocorrência de reações químicas e físicas que promovem consequentemente a desnaturação proteica pelo acúmulo de sal e injúrias às organelas celulares devido à atração osmótica. A carne quando descongelada perde líquidos juntamente com inúmeros nutrientes, que vão oferecer a formação de um ambiente propício para o desenvolvimento de microrganismos, sendo que esta perda, variando de 0,2 a 1,8%, está diretamente relacionada com a capacidade de retenção de água pelas proteínas e modificações físicas e químicas ocasionadas durante o processo de congelamento (GENOT, 2003). Além disto, a formação de cristais de gelo intracelulares pode provocar injúrias e aumentar a liberação de exsudado após o descongelamento (MORENO, LOUREIRO e SOUZA, 2008). REFERÊNCIAS

BALLIN, N.Z.; LAMETSCH, R. Analytical methods for authentication of fresh vs. thawed meat - A review. Meat Science, Barking, v.80, p.151-158, 2008.

BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC nº 216, de 15 de setembro de 2004. 2004. Disponível em: . Acesso em 09 Mar. 2009.

ERICKSON, M.C.; HUNG, Y.-C. Quality in frozen food. New York: Chapman & Hall Book, 1997. 479p. FEIJÓ, G. L. D. Embrapa Gado de Corte. Curso conhecendo a carne que você consome - Qualidade da carne bovina. 1999. Disponível em: . Acesso em: 13 fev. 2010.

GENOT, C. Congelación y calidad de La carne. Zaragoza: Acribia, 2003. 104p.

JAKOBSEN, M.; BERTELSEN, G. Color stability and lipid oxidation of fresh beef. Development of a response surface model for predicting the effects of temperature, storage time, and modified atmosphere composition. Meat Science, Barking, v.54, n.1, p.49-57, 2000.

MARTINS, T. R. Métodos de conservação de alimentos I. 2008. Disponível em: . Acesso em: 09 mar. 2009.

MONTEBELLO, N.P.; ARAÚJO, W.M.C. Carne & Cia. 2.ed. Brasília: Senac-DF, 2009. 324p. v.1.

MORENO, G. M. B; LOUREIRO, C. M. B.; SOUZA, H. B. A. Características qualitativas da carne ovina. Revista Nacional da Carne, São Paulo, n.381, p.76-90, 2008.

MUELA, E. et al. Effect of freezing method and frozen storage duration on instrumental quality of lamb throughout display. Meat Science, Barking, v.84, p.662-669, 2010.

ORDÓÑEZ, J.A.P. et al. Tecnologia de Alimentos: alimentos de origem animal. Porto Alegre: Artmed, 2005b. Cap.9, 294p. v.2.

PARDI, M.C. et al. Ciência, higiene e tecnologia da carne. 2.ed. Goiânia: UFG, 2006. 624p. v.1. PORTO, E. Resfriamento e congelamento na indústria da carne - Aspectos microbiológicos da refrigeração. Campinas: CTC/ITAL, 1996. p.1-3; 6.

TOLDRÁ, F. Handbook of meat processing. Ames: Wiley-Blackwell, 2010. 584p.

URBAIN, W.M.; CAMPBELL, J.F. La conservación de la carne. In: PRICE, J.F.; SCHWEIGERT, B.S. Ciencia de la carne y de los productos carnicos. 2.ed. Zaragoza: Acribia, 1994. Cap.10, p.337-375.

WARRISS, P.D. Meat science: An introductory text. Cambridge: CABI Publishing, 2004. 310p.

Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


Rafaella de Paula Paseto Fernandes

por Rafaella de Paula Paseto Fernandes

Médica Veterinária, Mestre em Ciências da Engenharia de Alimentos na Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos da USP e atualmente Doutoranda na mesma área de concentração e instituição.

Portal Educação

UOL CURSOS TECNOLOGIA EDUCACIONAL LTDA, com sede na cidade de São Paulo, SP, na Alameda Barão de Limeira, 425, 7º andar - Santa Cecília CEP 01202-001 CNPJ: 17.543.049/0001-93