Lipídeos na alimentação de peixes tropicais

O uso de lipídeos na alimentação de peixes tropicais é essencial
O uso de lipídeos na alimentação de peixes tropicais é essencial

Veterinária

03/09/2014

Os lipídeos são compostos por ácidos graxos pertencentes, em grande número, a dois grupos: o dos ácidos graxos insaturados e dos ácidos graxos saturados (FRANCO, 2001). Juntamente com os óleos e gorduras, os lipídeos são compostos químicos que apresentam características particulares, como baixa solubilidade em água e alta solubilidade em solventes orgânicos (PUPA, 2004).

Acredita-se que a gordura seja a principal forma de armazenamento de energia corporal, devido as suas características de repulsão da água, facilidade que as moléculas de triacilgliceróis têm de arranjar-se no interior dos adipócitos, e a quantidade de energia que é fornecida, quando comparado aos carboidratos e proteína (LEGNINGER, 2011).

Os lipídeos são importantes componentes da dieta e fornecem de maneira eficiente energia e ácidos graxos essenciais (AGE), no entanto, dietas com altos teores de lipídeos podem influenciar no metabolismo animal e na composição da carcaça, com acúmulo indesejável de gordura (RIBEIRO et al., 2008).

Uma grande diversidade de lipídeos de origem animal e vegetal tem sido usada para formular rações para peixes (MOURENTE et al., 2005), sendo que deste último grupo, o óleo de soja, milho, girassol, linhaça e arroz tem sido muito empregado.

FUNÇÃO DOS LIPÍDEOS

Destaque-se como função dos lipídeos o armazenamento e a produção de energia, mas diferentes funções podem ser atribuídas a este nutriente, como por exemplo, dar origem aos AGE, solubilizar compostos apolares e regular o metabolismo dos animais, já que são constituintes de hormônios esteroides e prostaglandinas (BERNADINO et al., 2009). Haliloglu et al. (2004), afirmaram que as funções dos lipídeos no crescimento dos peixes são bem estabelecidas, como função hormonal, energética, estrutural, além de precursores de eicosanoides.

Meurer et al. (2002), ressaltam que as fontes de óleo em rações para peixes tem assegurado excelentes respostas quanto ao desenvolvimento, sobrevivência e deposição dos nutrientes. Respostas positivas também foram observadas por Melo et al. (2002) e Losekann et al. (2008), que reafirmam que os lipídeos são imprescindíveis para o bom desempenho de larvas e alevinos de peixes.

APROVEITAMENTO DOS LIPÍDEOS POR PEIXES TROPICAIS

Pesquisas comprovam que os lipídeos são imprescindíveis para o desenvolvimento das larvas e alevinos de peixes, tendo apenas variação quanto à concentração, devido à espécie (marinha ou de água doce), temperatura do ambiente e a fase de vida (LÉGER, 1980).

Da mesma forma como ocorre em animais monogástricos, à composição dos lipídeos nos tecidos dos peixes reflete a alimentação recebida. De modo que, alterações na dieta também causam alterações no perfil de lipídeos dos tecidos (RIBEIRO et al., 2008).

Justi et al. (2003) afirmam que a composição dos filés dos peixes podem ser influenciados pela qualidade da dieta, tal como as variações no que desrespeito aos teores de proteína e lipídeos da dieta. Diante dessa circunstância, o uso de óleo como fonte de lipídeos permite reduzir a quantidade de proteína e o custo da dieta, além de fornecer AGE necessários para o crescimento dos peixes (MARTINO et al., 2002).

De acordo com Wang et al. (2005), é no fígado que ocorrem os processos lipogênicos dos peixes, através da ação de enzimas exclusivas (glicose-6-fosfato- desidrogenase e a enzima málica), que fornecem energia para tais processos bioquímicos. Porém, nos teleósteos essas enzimas são proporcionais à qualidade e quantidade de lipídeos na dieta.

Os lipídeos são apontados como fonte de energia metabólica, com maior aporte de energia que carboidratos e proteínas. Segundo Pezzato (1999), os lipídeos são as melhores fontes de energia para os peixes, seguido pelas proteínas e carboidratos, mas devem estar devidamente balanceado na dieta de modo a atender às exigências nutricionais da espécie.

A capacidade de utilizar a gordura como fonte de energia varia de acordo com a espécie, além de ser influenciada pelo hábito alimentar da mesma, como por exemplo, as rações para carnívoros, que podem conter níveis mais elevados de gordura quando comparados com espécies onívoras e herbívoras (WILSON, 1998).

Por possuírem preços mais acessíveis, as gorduras têm sido mais utilizadas como fonte lipídica, mas devido à deficiência de AGE, faz-se necessário a adição de outra fonte que forneça tais nutrientes (RIBEIRO et al., 2007). Boscolo et al. (2004) afirmaram que os peixes adquirem o AGE através da ração ou alimentos naturais disponíveis no ambiente de cultivo, uma vez que não podem ser sintetizados pelo próprio organismo a partir de um precursor.

Bell (1999) resaltam que os ácidos linoléico e linolênico não podem ser produzidos pelos peixes e por isso devem ser incorporados na dieta. Essa adição se faz necessária pelo fato de os AGE serem constituintes dos fosfolipídeos, e assim participam da formação das membranas celular, proporcionando permeabilidade e flexibilidade, mas dependendo da espécie, da temperatura e da fase de desenvolvimento, a exigência de AGE pode variar (MELO et al., 2002), principalmente nas fases iniciais de desenvolvimento, em razão do rápido crescimento, que ultrapassa a capacidade de produção endógena de fosfolipídeos (TRONCO et al., 2007).

A digestão de fosfolipídeos é relativamente pouco estudada em peixes, mas presume-se que os mecanismos são geralmente semelhantes aos mamíferos, em que os fosfolipídeos são digeridos pela enzima fosfolipase A2, secretada pelo pâncreas, resultando na formação dos lisofosfolipídeos e dos ácidos graxos livres, que são absorvidos pelas células da mucosa do intestino (SARGENT et al., 1989).

Rotta (2003) também salienta que os peixes absorvem lipídeos da mesma forma que outros vertebrados. Posteriormente a ação dos sais biliares, os lipídeos são quebrados e passam a formar as micelas. Estas permitem que os lipídeos da digesta sejam emulsificado e solubilizado, favorecendo a ação das enzimas. A absorção dos lipídeos se dá, sobretudo na forma de ácidos graxos e monoglicerídios, ao passo que os ácidos graxos de cadeia curta são absorvidos por difusão pelos enterócitos.

Da mesma forma, Ribeiro et al. (2007) mencionam semelhança nos processos digestivos de lipídeos nos peixes com o dos mamíferos, porém com algumas modificações devido as diferenças referentes ao trato digestório e a anatomia dos peixes, quando comparada com outras espécies. Ainda segundo o autor, os diferentes hábitos alimentares (onívoros, herbívoros ou carnívoros) associados ao comprimento do trato digestório e produção de enzimas, são determinantes nos processos de digestão dos lipídeos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O uso de lipídeos na alimentação de peixes tropicais é essencial para o crescimento e desenvolvimento desses animais, uma vez que fornece energia de baixo custo (produção e armazenamento), além de ser fonte de AGE e atuar no controle do metabolismo. Entretanto, o seu emprego como fonte de energia, deve respeitar a espécie, assim como fase de vida e hábito alimentar.

Grande parte dos óleos vegetais são ótimas fontes de ácido linolênico e quando adicionadas na dieta de peixes podem trazer bons resultados no crescimento e desempenho zootécnico.

REFERÊNCIAS

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Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


Érica Bevitorio Passinato

por Érica Bevitorio Passinato

Zootecnista pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e Mestre em Ciência Animal pela Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC).

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